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QUESTÕES FILOSÓFICAS CONTEMPORÂNEAS: HEIDEGGER E O HUMANISMO

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Academic year: 2021

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QUESTÕES FILOSÓFICAS

CONTEMPORÂNEAS: HEIDEGGER E

O HUMANISMO

Bernardo Goytacazes de Araújo

Professor Docente de Filosofia da Universidade Castelo Branco Especialista em Filosofia Moderna e Contemporânea

bernardogoyara@hotmail.com

“O homem é o pastor do ser. E este mesmo SER é o mais longínquo que qualquer ente. E este SER está mais próximo do homem que qualquer ente. O SER é o mais próximo.” (Heidegger, “Carta sobre o Humanismo”)

Heidegger faz uma série de considerações para poder dizer sobre a questão do Humanismo. E escreve a Carta sobre o Humanismo (1947), logo após a segunda grande guerra, respondendo a Jean Beaufret, para poder se posicionar frente a um conjunto de questionamentos que, anteriormente, lhe fora mandado pelo mesmo. E neste contexto, não se pode perder de vista, que Jean Paul Sartre, em 1943 na França já havia publicado o Ser e o Nada, e estava propagando as suas idéias de que o existencialismo era humanismo e dissipava um conjunto de pressupostos, mostrando em que se firmava seu pensar. A forma do pensar que Heidegger propõe, coloca justamente a originalidade anterior ao pensamento do Ser e o Nada, pois pergunta sobre: por que há antes o ser e não antes o nada? A questão se torna anterior a do pensamento de Sartre. A busca é pela condição de possibilidade de, para que isso ocorresse.

O autor nos diz que o Humanismo, como se dá na forma do pensamento de Sartre e de tantos outros anteriores a ele, está vinculado com a questão do existencialismo, e por isso permanece na questão metafísica, em que se discute a essência e a existência. O que

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Sartre faz, é apenas inverter a questão de essência colocando primeiro a existência1. Sendo que: existo, logo penso, repensando o dito cartesiano do: penso, logo existo.

Heidegger é perguntado sobre o que venha a ser então todo este pensar retomando a questão do SER. Ele vai se colocar em preocupação, com o SER. Com aquele que é para nós condição de possibilidade de2.

Quando dizemos que o homem é animal racional, estamos definindo-o a partir de sua essência: animal racional3. Outrossim, o que o autor nos pede é que pensemos antes desse “humanismo”, mas que pensemos naquilo que é mais original do que esta definição; que pensemos na condição de possibilidade que nós fossemos, antes de existirmos; que possibilitasse a nossa ex-sitência4! O homem é como a réplica ex-sistente do SER, mais que o animal rationale. O homem não é o senhor do ente. O homem é o pastor do SER. O homem ganha, quando atinge a verdade do ser. Ele ganha a essencial pobreza do pastor.5 Só porque ele é pastor do SER é que ele pode manipular os entes. (Mas na verdade ele não domina a si mesmo).

Desde a renascença quando se voltou com toda esta vivência de humanismo, o homem vem fazendo cada vez mais sobre si uma reflexão metafísica. Já no final da Idade Média e com o advento da Modernidade toda esta grande retomada pelo homem, como centro do universo, o fez ficar cada vez mais preso em si, buscando bases “humanísticas” para sua existência! Com o cogito cartesiano, ainda mais se formou a capacidade do homem ser o grande pensador, humanizado e pleno de si, deixando o que o cerca “de lado”. Mas nem tudo foi mudado, o homem continuou tendo que se expressar por meio da linguagem. E justamente neste ponto, no sentir de Heidegger é que o SER continuou se

1

“Sartre, pelo contrário, exprime assim o princípio do existencialismo: a existência precede a essência. Ele toma, ao dizer isto, existentia e essentia na acepção da Metafísica que, desde Platão, diz: a essentia precede a

existentia. Sartre inverte esta proposição. Mas a inversão de uma frase Metafísica permanece uma frase

metafísica.” (p.52)

2

Supondo que o homem, no futuro, seja capaz de pensar a verdade do SER, então ele pensará a partir da ex-sistência.

3

Na visão Metafísica, a existência do homem é a sua substância. Expulso da verdade do SER o homem gira, por toda a parte, em torno de si mesmo, como animal rationale. (p.69)

4

O homem se diferencia dos animais porque ex-siste, e porque ex-siste é que tem razão. E isso é a essência do homem, e isso consiste nele ser mais do que simples homem, na medida em que este é representado como o ser vivo racional. Este mais significa mais originário e por isso mais radical em sua essência. O homem é na condição-de-ser-jogado (Geworfenheit).

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manifestando6, possibilitando que o dasein7 viesse a aflorar de maneira esplendida, mas escondendo a sua condição de possibilidade. O ente8 existe e está ai! Mas o que lhe propiciou este “estar aí, jogado no mundo”? O pensar de Heidegger procura retomar o questionamento do SER9 e a busca de seu fundamento, por intermédio da linguagem10 originária. E a originalidade do pensamento de Heidegger está em retomar o pensamento pré-socrático, em que outrora o SER fora pensado, e traz estas questões para a contemporaneidade. O homem seria o ente portador da verdade que sua essência seria a preservação dessa verdade, por intermédio de um pensar radical, calcado na busca do ser.

O humanismo deveria ser uma meditação sobre o homem, para que este preservasse cada vez mais a sua humanidade e suas características principais, em sua essência, até mesmo se perguntando por aquilo que os fez ser capaz de estarem ali.

A essência do homem não se resumiu apenas no dito “moderno” e isto resumiria o homem em suas definições científicas, deixando de lado aquilo que ele pode ser em sua grandiosidade. Heidegger então vai propor que o homem passe a pensar a partir da condição de possibilidade de sua ex-sistência11. Isto é daquilo que se apresenta como ser ai, a própria essência do dasein! Mas para experimentarmos esta condição de ser ai, devemos nos colocar diante do pensar sobre o ser, e sobre a clareira que este abre para nós, possibilitando que tomemos parte com aquilo que é manifestado para nós. Na abertura do SER, os entes se manifestam e com isso nos esquecemos de observar aquela condição de possibilidade que deixou que o ente aparecesse.

Com esta ação do SER, percebemos que ele é contraditório, ao mesmo tempo em que se abre na clareira12 e habita na linguagem13 do dasein, ele se esconde na Metafísica,

6

O dar-se do SER é a grande questão da Filosofia. O pensamento é repensar o passado. É um ter sido, que se abre para um por vir!

7

Ser no mundo é ser no tempo. Nós somos tempo. O Dasein que tem mundo, tem tempo. O sentido do SER é a temporalidade. O pensar está tão interessado em que seja experimentada a historicidade do ser-aí. (p.62)

8

A abertura do SER proporciona o dar-se dos entes.

9

O SER permanece misteriosamente a singela proximidade de um imperador que não se impõe à força. (p.58)

10

O homem é homem na linguagem. É a linguagem que adquire o homem. A linguagem nos toma.

11

“A essência ex-stática do homem reside na sua ex-sitência, que permanece distinta da existência pensada metafisicamente”. (p. 48) “A frase: ‘o homem ex-siste’ não responde à pergunta se o homem é real ou não, mas responde à questão da ‘essência do homem’”. (p.50)

12

“O homem desdobra-se assim no seu ser (west) que ele é o “aí”, isto é a clareira do ser.” (p.48)

13

“A linguagem é a casa do SER. Nesta habitação do ser mora o homem. Os pensadores e os poetas são os guardas desta habitação.” (p. 33) “A Linguagem é advento iluminador-velador do próprio SER.” (p.50)

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fazendo com que toda a História do pensar Ocidental, fosse uma constante lembrança do ente e um grande esquecimento do SER; com isso se deu um grande processo de niilismo14. Assim, o que Heidegger propõe como forma de se pensar o ser ai plasmado no mundo é que ele se volte para sua pergunta mais originária. Que o homem se questione sobre aquilo que venha a ser antes de qualquer definição ou ato. Deve-se buscar aquilo que foi a condição de ex-sitência15 do dasein! E isto nos aproxima do SER. O que está em jogo não é tanto o homem, mas a sua história e origem do ponto de vista da verdade do ser. E o sucesso deste pensar originário depende da linguagem e do acesso originário que pertence àquela linguagem, ou seja, aquilo que está por de trás das formas, das palavras e dos símbolos, mas da condição de manifestação do SER por meio desta. Em suma a essência do homem reside na ex-sistência. Ou seja, o humanismo deveria ter-se voltado não para o ente humano, mas para a sua condição de dasein, de ser no mundo, como existência autêntica na verdade do SER que se abre na clareira. Assim, o grande pensar do homem deveria ser a busca pela sua condição de ex-sistência, o SER!

É o humanismo que pensa a humanidade do homem desde a proximidade do SER. Mas, é ao mesmo tempo, o humanismo no qual está em jogo, não o homem, mas a essência historial do homem, na sua origem desde a verdade do SER. O Humanismo que é proposto, no pensar de Heidegger, não quer considerar o homem só como animal racional, mas quer pensar o mais originário, antes desse pensar racional16. Mas a existência não é aqui a realidade efetiva do ego cogito.

Ex-sistência é, numa diferença fundamental como qualquer existência e ‘existence’, o morar ex-stático na proximidade do SER. Ela é a vigilância, isto é, o cuidado pelo SER. Pelo fato de neste pensar dever ser pensado algo simples, parece ele tão difícil ao tipo de representação que nos foi transmitido como Filosofia17. A Filosofia na Grécia buscava falar do SER e tudo estava junto. Agora a Filosofia divide as coisas, de maneira que se perdeu a grande unidade, e tudo está dividido em lógica, estética, ética...

14

A técnica é, em sua essência, um destino ontológico-historial da verdade do SER, que reside no esquecimento. Na técnica valos entes e ficamos presos ao ente. (p.67)

15

Ex-sistência: relação do ser com o homem. O homem lançado no mundo é constitutivo do homem; o homem é homem na relação com as coisas e também nas relações com outros daseins. Somos sempre no mundo; estamos imersos entre entes. Já a existência está ligada com a concretude – visão metafísica.

16

(p.70)

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O pensar poderia assumir uma postura de atenção, não para o humanismo, mas para a humanitas do homo humanus e sua fundamentação. Poder-se-ia despertar uma reflexão que pensasse, não apenas sobre o homem, mas sobre a natureza do homem; não apenas sobre a natureza, mas ainda mais sobre a natureza originária da essência do homem, determinada a partir do próprio SER. E não é porque se fala contra o humanismo que estamos pensando em um in-humano18. Em toda à parte, se fala contra aquilo que para a humanidade vale como elevado e sagrado.

O mundo é a clareira do SER na qual o homem penetrou a partir da condição de ser-projetado de sua essência. O ‘ser-no-mundo’ nomeia a essência da ex-sistência, com vista à dimensão iluminada, desde a qual desdobra o seu SER o ‘ex’ da ex-sistência19.

O homem primeiro é em sua essência, ex-sistente na abertura do SER, cujo aberto ilumina o ‘ente’ em cujo seio pode ser uma relação de sujeito e objeto. Ele é primeiro ex-sistente, e é essa relação que permite a relação sujeito e objeto. ,

Na idade da técnica falta ao homem se abrir à verdade do SER e procurar menos por este desvelar do mistério que é proposto, e ao apego que fazemos ao ente. Pensar a verdade do SER significa, ao mesmo tempo: pensar a humanitas do homo humanus. Importa a humanitas o serviço da verdade do SER, mas sem o humanismo no sentido metafísico.

18

(p.75)

Referências

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