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Artigo - Jutra - Bacenjud - Execução - Eletrônica _Luciano Athayde_ - 20_07_2008

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A

CONSTRIÇÃO JUDICIAL DE ATIVOS PELO SISTEMA

B

ACENJUD E OUTRAS FERRAMENTAS ELETRÔNICAS NA EXECUÇÃO NA

J

USTIÇA DO

T

RABALHO NO

B

RASIL (*)

LUCIANO ATHAYDE CHAVES(**)

A internet é o tecido de nossas vidas. Se a tecnologia da informação é hoje o que a eletricidade foi na Era Industrial, em nossa época a internet poderia ser equiparada tanto a uma rede elétrica quanto ao motor elétrico, em razão de sua capacidade de distribuir a força da informação por todo o domínio da atividade humana. Ademais, à medida que novas tecnologias de geração e distribuição de energia tornaram possível a fábrica e a grande corporação como os fundamentos organizacionais da sociedade industrial, a internet passou a ser a base tecnológica para a forma organizacional da Era da Informação: a rede.

Manuel Castells

RESUMO: O presente estudo pretende examinar o instituto da constrição judicial sobre ativos financeiros através dos meios eletrônicos vinculados à plataforma da rede mundial de computadores, privilegiando aspectos essenciais do sistema BACENJUD (Sistema para envio de ordens judiciais ao Sistema Financeiro

Nacional via Internet), atualmente oferecido pelo Banco Central do Brasil aos diversos órgãos que compõem

a complexa estrutura do Poder Judiciário brasileiro. Além disso, a investigação examina alguns outros recursos eletrônicos disponíveis ao sistema judiciário, como os modernos sistemas de expropriação judicial pela internet, com especial destaque para o potencial de efetividade processual neles contidos.

ABSTRACT: This study seeks to examine the institution of the judiciary constriction on financial assets through electronic means connected to the platform of the global network of computers, preferring BACENJUD essential aspects of the system (System for transmission of court orders to National Financial System via Internet), currently offered by Central Bank of Brazil to the various bodies that make up the complex structure of the Judiciary Brazil. In addition, the research examines some other electronic resources available to the judiciary, as the modern judicial systems expropriation by the Internet, with special emphasis on the potential effectiveness of procedural contained.

SUMÁRIO: 1. O Poder Judiciário no panorama das tecnologias da informação; 2. Do sistema eletrônico

de constrição de ativos financeiros (BACENJUD); 2.1. Sobre o surgimento do uso dos meios eletrônicos

como ferramenta auxiliar da atividade executiva do Juiz do Trabalho; 2.2. Das lições do Direito comparado. A penhora de depósitos bancários no Direito Processual Português; 2.3. Da preferência do sistema processual pela penhora de créditos pelo meio eletrônico, da introdução do tema no Código de Processo Civil pela Lei n. 11.382/2006 e da possibilidade de penhora de crédito em execução provisória da sentença; 2.4. A desconsideração da pessoa jurídica e a constrição eletrônica de ativos dos sócios; 2.5. O problema do bloqueio em múltiplas contas; 2.6. Da tomada de posição do Conselho Nacional de Justiça em defesa do uso do BACENJUD; 3. Da possibilidade de expropriação por meios eletrônicos; 4. Referências

bibliográficas.

PALAVRAS-CHAVE: Direito Processual. Penhora. Meios eletrônicos. Expropriação. Internet.

(*)

Texto apresentado como contribuição científica ao IV Encontro Luso-Brasileiro de Direito do Trabalho, realizado no Instituto Superior de Ciências do Trabalho e da Empresa, Lisboa, Portugal, pela Associação Luso-Brasileira de Juristas do Trabalho, nos dias 13 e 14 de março de 2008.

(**)

Juiz do Trabalho da 21ª Região, Rio Grande do Norte, Brasil. Professor de Direito Processual do Trabalho da Faculdade de Direito da Universidade Federal da Paraíba. Mestre em Ciências Sociais pela Universidade Federal do Rio Grande do Norte. Membro do Instituto Brasileiro de Direito Processual – IBDP. E-mail: lac@digi.com.br.

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1.OPODER JUDICIÁRIO NO PANORAMA DAS TECNOLOGIAS DA INFORMAÇÃO

Aos olhos de um homem médio, certas práticas em curso nas dependências do Poder Judiciário desafiam a compreensão.

Num ambiente social que massifica, em escala exponencial, as relações entre pessoas através de meios eletrônicos, chega a se apresentar como medieval a maioria das rotinas praticadas na Justiça brasileira.

Enquanto se pagam contas e se transferem fundos em terminais bancários espalhados por todos os lados; consulta-se o jornal do dia em tempo real; afere-se a previsão do tempo nos portais especializados, realizam-se inscrições em concursos públicos; obtêm-se certidões e outros documentos oficiais; dentre outras incontáveis possibilidades pelos meios informacionais, especialmente com o auxílio da plataforma da rede mundial de computadores, não é difícil encontrar nos cartórios e secretarias judiciárias uma quantidade importante de carimbos, perfuradores, grampeadores e muito, mas muito papel, a ponto de comprometer a estrutura física de certas unidades judiciárias e tribunais.1

E pior: não raro, os direitos - ou o exame judicial deles - sucumbem à ausência de um documento, de um carimbo, de uma autenticação cartorária, de uma assinatura.2

1

Sérgio Tejada, ex-secretário-geral do Conselho Nacional de Justiça (CNJ), estima que o Poder Judiciário brasileiro receba anualmente cerca de 40 mil toneladas de papel, e complementa: “para fabricar essa

quantidade, há um imenso impacto ambiental: todos os anos, mais de 600 mil árvores, que crescem em 400 hectares, são derrubadas e trituradas. E cerca de 1,5 milhão de metros cúbicos de água são usados para fabricar todo esse papel. Esse volume é suficiente para abastecer uma cidade com 27 mil habitantes”. Por

isso o autor, que é o Secretário do Conselho Nacional de Justiça, sustenta o aspecto ambientalmente interessante da introdução do processo eletrônico na Justiça brasileira (GARCIA, Sérgio Renato Tejada. ‘Modernização: a verdadeira reforma do judiciário’. In CORDEIRO, Juliana Vignoli et alii (coord.). O

processo como instrumento de realização dos direitos fundamentais. São Paulo: LTr, 2008, p. 158).

2

Esse aspecto não passou despercebido na análise que Boaventura de Sousa Santos faz do Poder Judiciário no Brasil, ainda muito marcado pela cultura técnico-burocrática, que, dentre outras formas, se expressa pelo que denominou de ‘refúgio burocrático. Nas suas palavras: “a quinta manifestação dessa cultura é a

preferência por tudo o que é institucional, burocraticamente formatado. São os seguintes os sintomas mais evidentes desta manifestação: uma gestão burocrática dos processos, privilegiando-se a circulação decisão – o chamado andamento aparente dos processos; a preferência por decisões processuais, em detrimento de decisões substantivas [...]” (SANTOS, Boaventura de Sousa. Para uma revolução democrática da justiça”.

São Paulo: Cortez, 2007, p. 70). Efeito deletério dessa para a celeridade dos processos judiciais é o fenômeno que esse autor denomina de ‘morosidade sistêmica’, que decorre da faceta fenomenológica da burocracia, do positivismo e do legalismo. A essa morosidade sistêmica se junta a ‘morosidade ativa’, fruto da ‘intencional não decisão em decorrência do conflito de interesses estampado no caso. Nesse tipo de morosidade, esclarece Boaventura Santos, “é natural que as partes e os responsáveis por encaminhar uma decisão utilizem todos os

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Se antes essas formalidades foram introduzidas para emprestar maior segurança ao andamento dos processos, hoje boa parte delas parece destoar – a não mais poder – das práticas sociais mais ordinárias.

Talvez houvesse uma justificável desconfiança no uso das ferramentas eletrônicas por parte do Judiciário, mas o fato é que, atualmente, parece que as práticas forenses permaneceram tempo demais na obscuridade das rotinas tradicionais, fator que considero de grande relevo para explicar, pelo menos em alguma medida, a baixa efetividade das tutelas jurisdicionais.

Outros segmentos da sociedade identificaram mais cedo o grande potencial das ferramentas eletrônicas. O setor bancário, por exemplo, há décadas investe grandes somas de capital no desenvolvimento e na implementação de tecnologias da informação, tanto para atender os fluxos internos de controle, quanto para promover a interface entre os serviços bancários e seu consumidor final.3

Após a fase de alguma incerteza quanto à segurança desses sistemas, assistimos hoje a uma verdadeira ‘aceleração histórica’ (David Harvey) em relação ao acesso e ao uso dos serviços bancários por meios informacionais, hoje disponíveis até mesmo através de um telefone móvel (o que transforma o uso do computador portátil com acesso à internet, uma das maravilhas da tecnologia moderna, uma ferramenta na direção de se tornar, em breve, obsoleta).

As tecnologias informacionais também constituem um capítulo todo especial da recente compressão da idéia de espaço/tempo, marca indelével do fenômeno da mundialização das relações sócio-econômicas. Sem as facilidades dessas tecnologias, permitindo a comunicação de pessoas e a transmissão rápida e a baixo custo de dados, talvez não seria possível a existência das práticas sociais e comerciais de hoje em dia.

Aliás, esse aspecto me parece muito presente na análise dos fenômenos sócio-econômicos contemporâneos que Thomas Friedman apresenta em seu best seller O mundo

é plano (Rio de Janeiro: Objetiva, 2005). A produção descentralizada de bens e as

plataformas de logística de transporte dependem – e muito – da capacidade de gestão de informações em tempo real através de globo terrestre.

3

Sobre a introdução das tecnologias de informação no setor bancário, conferir CHAVES, Luciano Athayde.

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Mas, não é só nos ambientes produtivos que essas tecnologias estão apresentando grande potencial de desenvolvimento. Em outro best seller recente (O laptop de leonardo:

como o novo renascimento já está mudando a sua vida. Rio de Janeiro: Nova Fronteira,

2006), Bem Shneiderman destaca como um dos focos da ‘nova informática’ a utilização das ferramentas informacionais pelos governos, de modo a concretizar o que denominou ‘governo eletrônico’.

Essas tendências, gradativamente, foram se incorporando às práticas administrativas do Poder Público brasileiro, ainda que com certo atraso.

No Poder Executivo, já está em curso a edição e transmissão de atos governamentais por meios exclusivamente eletrônicos, após a implementação da Infra-Estrutura de Chaves-Públicas Brasileira – ICP Brasil. 4

Os portais do Congresso Nacional oferecem uma série de serviços ao usuário, inclusive a consulta aos textos das proposições legislativas e à sua tramitação. Além disso, há a possibilidade de acompanhar algumas das atividades do Parlamento através de programas áudio-visuais transmitidos pela internet.

O Poder Judiciário começou a introduzir a informática com o uso dos editores de textos, para a elaboração de despachos, certidões e decisões. Ainda que, num primeiro momento, tratasse de uma espécie de substituição da máquina de escrever pelo computador, o uso desses editores eletrônicos revolucionaram a forma de ser das rotinas judiciais, na medida em que potencializaram a produtividade desses atos, permitiram rotinas de arquivamento eletrônico de dados e fundaram as bases para a etapa seguinte, que foi a de desenvolvimento de sistemas de acompanhamento processual, para consulta por parte dos jurisdicionados, que hoje pode ser feita até pela internet.

Pelo menos nessa última década, muitas ferramentas foram desenvolvidas, basicamente como auxiliares das rotinas, se bem que algumas experiências avançaram bastante na direção da digitalização do processo.5

Importante passo nessa direção é fruto do advento da Lei 9.800/99, que autorizou a transmissão de documentos por fac símile, ainda que condicionada à apresentação dos

4

Sobre o ICP-Brasil e outras ferramentas eletrônicas desenvolvidas pelo Poder Executivo Federal, consultar o portal Governo Eletrônico (www.governoeletronico.gov.br). Sobre o funcionamento do sistema de chaves públicas, cf. CHAVES, Luciano Athayde. A recente reforma no processo comum e seus reflexos no direito

judiciário do trabalho. São Paulo: LTr, 2007a, p. 122 e ss.

5

Exemplo desse avanço é o sistema de cartas precatórias eletrônicas na Justiça do Trabalho, em uso há pouco tempo, mas com resultados muito bons.

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originais no prazo legal. Tratou-se de uma inovação importantíssima, porque despertou no Judiciário a possibilidade de utilização de outras tecnologias nas rotinas processuais. Mais do que isso, viabilizou, um pouco mais tarde, já com a expansão da rede mundial de computadores, uma releitura do texto legal, permitindo a transmissão de documentos de forma totalmente eletrônica.

Sucede que essas ferramentas não dispensavam a impressão do documento eletronicamente transmitido em papel e a sua juntada tradicional aos autos, o que, além do custo, não revolucionava efetivamente o desenho processual em vigor. Nada obstante, os avanços registrados foram fundamentais para a percepção das vantagens do uso das tecnologias de informação para o desenvolvimento das rotinas judiciárias.

Nesta altura, o Judiciário viu esgotar-se o modelo tradicional, uma vez que as tendências apresentadas pelas relações sociais contemporâneas, como vimos, apontavam para a substituição efetiva de rotinas tradicionais pelas novas tecnologias informacionais dos fluxos de trabalho.

Em momento bem próximo, mercê da edição da Lei n. 11.419/2006, as iniciativas apresentadas nessa área no âmbito do Poder Judiciário, ganharam o potencial universalizante de mudança das relações entre os atores sociais em ação no Judiciário.6

Esse potencial, todavia, ainda passará pelo processo de consolidação das ferramentas eletrônicas no seio da comunidade jurídica. Isso porque, além da esperada transição entre o uso das rotinas tradicionais e as eletrônicas, haveremos de aguardar a palavra final do Supremo Tribunal Federal em relação a alguns pontos da Lei n. 11.419/2006, impugnados pelo Conselho Federal da Ordem dos Advogados do Brasil, por meio de Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI 3880-DF, Rel. Min. Ricardo Lewandowski).

Na ADI, a OAB questiona o modelo indicado na legislação para a assinatura eletrônica (pela certificação digital ou pelo sistema de chaves, mediante o cadastro de senhas nos portais dos tribunais, nos termos do art. 1º, § 2º, inciso III da Lei), pois somente a assinatura eletrônica de advogado certificada pela entidade certificadora da OAB

6

Sobre a gênese da Lei n. 11.419/2006 e seus aspectos importantes, ver: SILVA JÚNIOR. Walter Nunes. ‘Informatização do processo’. In CHAVES, Luciano Athayde. Direito processual do trabalho: reforma e

efetividade. São Paulo: LTr, 2007b, p. 415 e ss.; GARBELLINI, Alex Duboc. ‘Processo digital’. In

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OAB) seria apta a operar o sistema, não sendo possível ao advogado acessar o processo eletrônico através de cadastro de senhas no tribunal, o que fugiria ao controle da OAB.

Da mesma forma, o art. 2º atritaria com a Constituição, segundo a OAB, porque submete a atuação do advogado a prévio credenciamento junto ao Poder Judiciário para viabilizar o seu acesso ao processo eletrônico, usurpando a sua competência para ‘ordenar os advogados brasileiros’.

Por fim, insurge-se a OAB contra a previsão da existência de diários oficiais totalmente eletrônicos, além da possibilidade de regulamentação supletiva da Lei por ato dos próprios tribunais.

Em que pese o respeito que merece a impugnação, não me parece haver plausibilidade na pretensão. A previsão de acesso mediante assinatura digital certificada ou por meios de chaves cadastradas diretamente no sistema tem o propósito de facilitar e ampliar ao máximo o acesso ao sistema, sem perder confiabilidade. Exigir-se unicamente o sistema de certificação digital e, ainda assim, unicamente aquele oferecido pela OAB, pode contribuir, isso sim, para dificultar a implementação do processo digital.

Aliás, o problema do controle profissional pode ser equacionado de outro modo, até mesmo mediante convênio entre a Ordem e os tribunais, para checagem da licença profissional.

De outro lado, sinto que a argüição de inconstitucionalidade em relação ao diário oficial eletrônico, fundada no custo do acesso à internet e nas dimensões continentais de nosso país, olvida por completo o fato de ser o diário oficial tradicional, em papel, um produto muito caro, de pouca circulação nacional e inacessível à maioria dos profissionais de Direito. Desse ponto de vista, o acesso às informações processuais pela internet se apresenta hoje com custo mais reduzido, e com viés de baixa, sem falar na multiplicidade no oferecimento do serviço de banda larga em diversas mídias diferentes.

Por derradeiro, é razoável a abertura para alguma regulamentação local do sistema, eis que a Lei – em vista do seu caráter mais geral – não poderia dar conta das múltiplas realidades em curso nos tribunais brasileiros, inclusive em relação às plataformas de equipamentos e sistemas. Ademais, é de se considerar que diversos institutos previstos no Código de Processo Civil admitem disciplina por órgãos judiciários, como, por exemplo, a alienação por iniciativa particular e o leilão eletrônico.

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Ainda que não me afigure plausível a impugnação à legitimidade constitucional da Lei n. 11.419/2006, trata-se de um fato importante no sentido de revelar a descontinuidade histórica da superação de modelos processuais, jungida que é ao jogo de forças decorrente da atuação dos atores sociais envolvidos no cenário da Justiça, os quais, com freqüência, buscam a preservação de espaços de influência.

Sucede, porém, que os esforços nesse campo devem mirar na teleologia das mudanças, respaldadas pela busca da efetividade e economia processuais, fazendo com que os fluxos de trabalho no Judiciário se aproximem, pelo menos em importante medida, dos ganhos de produtividade já alcançados por outros setores sociais através do uso das tecnologias da informação.

Ademais, é objetivo da Administração Pública – e da Justiça – primar pelo desempenho de suas tarefas com eficiência (art. 37, caput, CF). Logo, não é plausível examinar essas novas mudanças com eixos interpretativos tradicionais, sob risco de se promover uma interpretação retrospectiva da nova lei do processo eletrônico, comprometendo sua eficácia.

Pois bem. Conquanto não tenhamos, pelo menos ainda, em pleno funcionamento o processo eletrônico em todos os tribunais do país, a percepção que se tem é a de que esse futuro, com a edição da lei e dos regulamentos7 necessários ao balizamento do desenvolvimento dos programadas, está bem próximo.

Neste texto, pretendo apresentar ao leitor algumas reflexões sobre a chamada ‘penhora eletrônica’ na execução trabalhista, traduzida na ferramenta do BacenJud (Sistema para envio de ordens judiciais ao Sistema Financeiro Nacional via Internet), exemplo importante dessa trajetória de introdução de novas tecnologias no espaço judiciário.

Também serão abordados outros mecanismos eletrônicos de otimização das tarefas judiciárias, como a expropriação eletrônica e a disponibilização e registro informatizado da certidão premonitória.

7

No âmbito da Justiça do Trabalho, a Lei n. 11.419/2006 está regulamentada pela Instrução Normativa n. 30/2007, do Tribunal Superior do Trabalho.

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2.DO SISTEMA ELETRÔNICO DE CONSTRIÇÃO DE ATIVOS FINANCEIROS (BACENJUD)

2.1.SOBRE O SURGIMENTO DO USO DOS MEIOS ELETRÔNICOS COMO FERRAMENTA AUXILIAR DA ATIVIDADE EXECUTIVA DO JUIZ DO TRABALHO

Desejo introduzir a presente análise da constrição eletrônica de ativos financeiros apresentando ao leitor uma breve passagem de minha trajetória profissional que tem estreita relação com o tema.

Certa vez, antes de se falar em BacenJud, recebi a visita de um gerente da agência local de um banco público que me apresentou em mãos cópia de um ofício através do qual houvera determinado o bloqueio e transferência, até o limite do crédito exeqüendo, de uma conta corrente vinculada a agência do mesmo banco em outro Estado da Federação.

Disse-me então o gerente que não poderia cumprir tal ordem, em vista de um parecer da procuradoria jurídica do banco, o qual indicava a impossibilidade de cumprimento de bloqueios eletrônico em agências fora dos limites territoriais de jurisdição do Juízo subscritor da ordem. Arrematou dizendo que o caso seria, de acordo com as orientações internas, próprio de carta precatória, de modo que a ordem fosse cumprida pelo gerente da agência onde o devedor mantinha a conta corrente.

Ouvi tudo de forma atenta. Depois, perguntei ao gerente: o Senhor sabe o que é e como funciona uma carta precatória?

Como a resposta foi negativa, passei a fazer um breve relato.

Comecei explicando que a carta precatória é um expediente epistolar entre dois Juízos, onde um deles (o deprecante) requer a um outro (o deprecado), localizado fora dos limites de sua jurisdição, que pratique um ou mais atos processuais especificados na carta. Expliquei que a carta é um documento assinado pelo Juiz e enviado ao deprecado pelo correio, mediante aviso de recebimento, que o recebe alguns dias depois e providencia a sua autuação (recebe uma capa, uma etiqueta) e registro no sistema.

Em seguida, prossegui, a carta é lavada ao conhecimento de um Juiz, que a despacha, normalmente ordenando o cumprimento da ordem: no caso de nossa conversa, a expedição de um ofício ou um mandado judicial. A carta, então, vai à secretaria para que seja providenciada a expedição da ordem, para envio ao destinatário. Se se tratar de

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mandado, a situação é mais complicada ainda, pois dependerá de distribuição ao oficial de justiça, que dispõe, em média, de nove dias úteis para cumprimento.

Se, até este ponto, tudo deu certo, é provável que o bloqueio ordenado pelo Juiz deprecante tenha sido feito. Agora, é só esperar pela certificação na carta e por novo despacho do juiz, determinando a transferência do numerário bloqueado (se já não o foi ao tempo do cumprimento da ordem de bloqueio) e a devolução da carta, por malote via Correios, para o deprecante, que a receberá e a juntará aos autos principais para a liberação do crédito, na ausência de impugnações.

Conclui dizendo que, com muita sorte – considerando que, no caso concreto, o Juízo deprecado seria o localizado em grande centro econômico, de forte tramitação processual, pois -, essa carta poderia retornar cumprida por volta de 60 a 90 dias, se ainda tivéssemos a boa graça de encontrar ativos em nome do executado ao tempo do seu efetivo cumprimento pelo deprecado.

Ato contínuo ao término dessa breve explicação sobre a tramitação de uma carta precatória, indaguei do gerente como os clientes do banco podem, mercê das tecnologias já então em pleno funcionamento, transferir os seus ativos. Daí ele me disse que até por telefone eles podem obter a imediata e instantânea movimentação de seus ativos financeiros por quaisquer das agências desse ou de qualquer outro banco.

Fiquei novamente em silêncio, no propósito de que os fatos falassem por si sós. Foi então que o gerente me participou que procuraria cumprir imediatamente a ordem.

Esse relato revela que o desenvolvimento de uma ferramenta eletrônico com tais propósitos não é uma idéia revolucionária ou distante das coisas. Pelo contrário, a constrição eletrônica judicial é corolário do próprio ritmo de desenvolvimento da técnica, no caso da microeletrônica associada aos meios de transmissão de dados.

Poderia, então, o executado movimentar seu patrimônio, sob a forma de capital financeiro, livremente pelo planeta com um simples apertar de botão, enquanto ao Judiciário, a quem a sociedade confia a função de pacificação social e de resolução dos conflitos de interesses, é reservada a atuação executiva a partir de técnicas cartoriais em franco desuso no meio social? Poderia o Juiz se valer apenas de meios tradicionais, hoje de reconhecida ineficácia em contraste com as tecnologias da informação, pois assim disporia o Código e as leis processuais?

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Insistir nas técnicas processuais superadas pelo tempo é desprezar a própria fenomenologia do Direito procedimental, o qual, como qualquer outro, deve ser aberto aos avanços científicos e técnicos de uma sociedade. Este é o desafio do intérprete e aplicador do Direito, como ensina Carlos Maximiliano: “o intérprete é o renovador inteligente e

cauto, o sociólogo do Direito. O seu trabalho rejuvenesce e fecunda a fórmula prematuramente decrépita, e atua como elemento integrador e complementar da própria lei escrita. Esta é a estática, e a função interpretativa, a dinâmica do Direito”

(Hermenêutica e aplicação do direito. Rio de Janeiro: Forense, 1995, p. 12).

Tenho insistido para a percepção desse fenômeno de uma integração mais complexa da fenomenologia processual, que silenciosamente se renova a partir do desenvolvimento próprio dos sistemas jurídicos, os quais se (re)configuram amiúde diante das quebras sistêmicas e lacunas que têm lugar pelos habituais atritos entre os subsistemas jurídicos – em constante intercâmbio – e pelos abalos do equilíbrio desses subsistemas com os fenômenos e valores sociais que os compõe, já que a norma jurídica não tem eficácia sem a isomorfia necessária da dimensão de validade normativa com as dimensões axiológica e factual.8

Talvez por inobservância a postulados dessa grandeza é que até hoje não faltam críticos ao sistema do BACENJUD, movidos pelos mais diversos interesses. Ações junto ao Supremo Tribunal Federal já foram, até aqui sem sucesso, ajuizadas9. Projetos de lei também foram apresentados ao Congresso Nacional, que também não mereceram prosperar.10

8

Sobre o problema da integração complexa do Direito Processual do Trabalho, consultar CHAVES, Luciano Athayde. ‘As lacunas no direito processual do trabalho’; CORDEIRO, Wolney de Macedo. ‘Da releitura do método de aplicação subsidiária das normas de direito processual comum ao processo do trabalho’. In CHAVES, Luciano Athayde, 2007b; e LEITE, Carlos Henrique Bezerra, Curso de direito processual do

trabalho. São Paulo: LTr, 2007.

9

Dentre as diversas impugnações propostas perante o Judiciário contra o BACENJUD, destaco a Ação Direta de Inconstitucionalidade n. 3.091-DF (Relator Ministro Joaquim Barbosa), ajuizada em 17.12.2003 pelo então Partido da Frente Liberal (PFL), atual partido dos Democratas (DEM), perante o Supremo Tribunal Federal. Apesar do pedido de concessão de medida cautelar, não houve ainda deliberação do Plenário. Em 23 de junho de 2004, a Associação Nacional dos Magistrados da Justiça do Trabalho (ANAMATRA), que já houvera divulgado diversas notas públicas em defesa do sistema, teve seu ingresso nos autos admitido pelo relator da ação na qualidade de ‘amicus curiae’. Ao tempo da redação deste texto, o feito aguarda julgamento, com parecer do Procurador-Geral da República pela improcedência da pretensão.

10

Exemplo paradigmático dessas iniciativas é o Projeto de Lei n. 2.597/2003, proposta perante a Câmara dos Deputados em 2003 pelo Deputado Federal César Bandeira (PFL-MA), através do qual se buscava a alteração da parte processual da Consolidação das Leis do Trabalho – CLT, mais precisamente o art. 883, parágrafo único, para dispor que o uso da penhora eletrônica somente teria lugar se somente se esgotadas todas as demais formas tradicionais de constrição, ou seja, se outros bens não forem localizados ou indicados. Na Comissão de Constituição, Justiça e Cidadania da Câmara o projeto foi relatado pelo Deputado Alceu Collares, que apresentou parecer contrário à juridicidade da proposição e de cujo relatório destaco os

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Ingressei na Justiça do Trabalho em momento anterior ao BacenJud. Naquela época, primeira metade da década de 90, a técnica de bloqueio de ativos passou a fazer parte da agenda de opções no panorama da jurisdição executiva, diante da rápida ‘bancarização’ da vida cotidiana. Isso porque a espiral inflacionária houvera incorporado à cultura brasileira o uso das instituições financeiras, que também passaram a prestar diversos serviços de cobranças de contas, integrando a vida do cidadão comum ao sistema financeiro nacional.

Não era rara a indicação de contas bancárias do devedor para bloqueio, o que àquela altura era feito através de mandado judicial. Naqueles casos em que a conta estava alojada em agência fora dos limites da jurisdição, a opção da carta precatória dividia espaço com outras opções de atuação, como no exemplo que narrei há pouco, qual seja, a expedição de ordem para que a agência local cumprisse a constrição dos ativos em outra agência.

Aquele começo foi especialmente difícil. Alguns tribunais entendiam que a ordem jurídica, por exemplo, não permitia a penhora ‘on line’ determinada pelo Juiz, notadamente quando a conta bancária estava localizada fora de sua jurisdição. Cuidava-se de uma interpretação formalista e altamente conservadora, vez que expunha uma leitura hermética da legislação, como se o Direito se resumisse à lei e como se essa fosse imutável e blindada aos efeitos das lacunas ontológicas, decorrentes do desenvolvimento das técnicas e das relações sociais.

Em texto recentemente publicado sobre o tema da penhora eletrônica, Valério Soares Heringer relembra a publicação de um importante artigo do Juiz Marcos Neves Fava, ao tempo em que a Corregedoria-Geral da Justiça do Trabalho chegou a determinar, seguintes e significativos trechos: “Com efeito, o processo de Execução – que se faz em proveito e no

interesse do credor, e que é inerente não apenas à Justiça do Trabalho, mas a todo o Poder Judiciário –, tem por finalidade exatamente propiciar ao credor a entrega da prestação não adimplida pelo devedor. Esse princípio da efetividade é que deve nortear a legislação que compreende o instituto jurídico da Execução e não o contrário, como é o caso do Projeto em questão que retira a eficácia de Justiça ao proibir, em última análise, que se procure dinheiro em poder do devedor. E à medida em que o Projeto pretende atingir apenas o Judiciário Trabalhista, torna-se ainda mais gritante sua falta de juridicidade por discriminar o credor trabalhista (pois o sistema da penhora on line continuará sendo adotado por outros ramos do Judiciário, vale dizer, em favor do credor tributário, do credor banqueiro etc.), contrariando a preferência de crédito trabalhista estabelecida em nossa legislação pátria (o que inclui a Constituição Federal), em função de sua inequívoca natureza alimentar. De resto, qualquer norma que obstaculize ou que dificulte a satisfação de crédito reconhecido em juízo, contraria não apenas o arcabouço jurídico que norteia o instituto da Execução, mas também afronta, por decorrência lógica, os próprios pilares que fundamentam as instituições de um Estado Democrático de Direito”. O projeto, ao final, acabou sendo arquiva definitivamente em 31 de

janeiro de 2007. Outros projetos tramitaram na Câmara dos Deputados com semelhante objetivo. Cito os Projetos de Lei Complementar ns. 212/2004 e 227/004, que visavam proibir o bloqueio de contas pertencentes a pessoas físicas.

(12)

no Pedido de Providências n. 762.513/2001.0, “aos corregedores regionais a atuação

destes junto aos magistrados de primeiro grau no sentido destes últimos se absterem de determinar aos administradores e gerentes de agência do Banco do Brasil o cumprimento de ordem de bloqueio ou penhora ‘on line’ de numerário encontrado em conta corrente de entidade executada fora dos limites territoriais da vara do trabalho respectiva”.11

E acrescentou Heringer: “naquela ocasião, o magistrado enfatizava que os donos

do capital transitam com o seu dinheiro – desde operações financeiras e aquisição de ações em qualquer parte do mundo a simples pagamento de faturas – com enorme velocidade: ‘tudo se processa ‘on line’ e nenhum desses capitalistas dá sinais de querer voltar ao passado’” (HERINGER, Valério Soares. ‘Novos contornos da execução

trabalhista’. In VIGNOLI, 2008, p. 136).

Note, portanto, o leitor que, no âmbito da própria Justiça do Trabalho, a afirmação do uso das novas tecnologias para alcançar os enormes desafios da execução por sub-rogação não foi imune a incompreensões, as quais soem ter lugar nos momentos de grandes desafios jurídico-institucionais, verdadeiros ‘pontos de mutação’ (Fritof Capra) entre velhos modelos e as novas técnicas, entre o apego meramente formal ao texto da lei e o potencial desenvolvimento dos institutos diante das inovações da técnica.

A força da história, todavia, não encontraria entre nós, pelo menos no terreno interno, crescente resistência.

A então orientação da Corregedoria-Geral, enquanto perdurou (eis que seria revista mais adiante, após a celebração do Convênio Bacen/TST) não pareceu meritória a ponto de firmar a condução dos Juízes, que passaram a reforçar o uso das novas tecnologias instaladas nas instituições financeiras para prestar efetividade processual, na forma de constrição do bem mais intercambiável: dinheiro.

11

Trata-se de despacho publicado em 16.07.2001 no Diário da Justiça da União. Todavia, em decisão da Corregedoria publicada em 08.05.2002, o Pedido de Providências foi extinto, em virtude da celebração do convênio entre o Tribunal Superior do Trabalho e o Banco Centra do Brasil para a operacionalização do BacenJud 1.0, que esvaziou por completo o objeto da irresignação do requerente (Banco do Brasil S/A), já que o novo sistema se assentava precisamente na possibilidade do espraiamento da ordem judicial de bloqueio por todo a rede financeira nacional, ultrapassando conceitualmente a jurisdição territorial do Juízo. A concessão da liminar, no entanto, revela as características e os conflitos ideológicos dessa transição do modelo tradicional de constrição de ativos financeiros e o novo modelo inaugurado pelo BacenJud, mais afinado com as tecnologias da informação e com a próprias relações sociais contemporâneas, redefinidoras que são do conceito espaço-tempo, quebrando, assim, a tradição do contingenciamento da atuação do Juiz aos limites físicos de sua jurisdição, circunstância incompatível com o atual espectro de virtualidade da condição das relações jurídico-sociais de nosso tempo.

(13)

Nessa altura, para aqueles casos em que não localizados quaisquer bens do devedor, difundiu-se, no meio forense, a possibilidade de se ordenar, por meio de ofício, ao Banco Central do Brasil, operador central do SISBACEN, plataforma de comunicação interbancária de todo o sistema financeiro, que repassasse ordem de bloqueio de ativos em nome do devedor, onde quer que se encontrassem, pelo menos até o limite do valor exeqüendo.

Essa providência, demonstração exponencial da atuação inquisitória do Juiz do Trabalho na fase de execução (hoje cumprimento da sentença), tal como preconiza o art. 878 da CLT, começou a surtir bons resultados.

Por essa razão, e em vista da quantidade de solicitações12, especialmente de Juízes do trabalho, o próprio Banco Central do Brasil tomou a iniciativa de desenvolver um sistema eletrônico que o absolvesse (bem como as demais instituições financeiras) do enorme volume de trabalho decorrente da manipulação de ofícios e alimentação (input) do SISBACEN.13

Foi aí que surgiu o BACENJUD - Sistema para envio de ordens judiciais ao

Sistema Financeiro Nacional via Internet, atualmente na sua versão 2.0.14

12

Para que o leitor tenha uma idéia da rápida evolução dessas solicitações, basta notar que, em 1998 foram recebidos pelo Banco Central 6.384 ofícios. No ano seguinte, esse número saltou para impressionantes 54.515, sendo a maior parte dos ofícios destinada a bloqueio e a pedido de informações ao sistema.

13

Essa realidade foi muito bem percebida pelo Congresso Nacional, quando do exame do já referido Projeto de Lei n. 2.597/2003, cujo relatório consignou: “[...] Com efeito, o sistema BacenJud surgiu pelas

dificuldades que o Banco Central estava enfrentando para responder às indagações judiciais sobre contas bancárias que pudessem ser passíveis de penhora. E a Justiça do Trabalho era apenas uma das fontes de ofícios endereçadas ao Bacen, pois eles vinham de todos os ramos do Poder Judiciário brasileiro. Aquele Banco obrigou-se a montar um setor muito grande de atividades, com mobilização de grande número de servidores apenas para ler, verificar e responder aos ofícios judiciais. Foi tal realidade que norteou a criação de um software capaz de substituir todo esse trabalho manual e humano de resposta ao Judiciário. Nasceu, portanto, o sistema BacenJud, que foi oferecido ao Poder Judiciário, mediante convênios a serem celebrados com os diferentes ramos daquele Poder. O Tribunal Superior do Trabalho foi o último a firmar o convênio para adoção de tal sistema, que somente foi assumido pela Justiça do Trabalho em março de 2002”.

14

Em 19.02.2008, através de circular, a Corregedoria-Geral informou a todos os órgãos da Justiça do Trabalho a entrada em vigor, no dia 29.02.2008, de uma nova versão do BACENJUD 2.0. Essa nova versão permitirá aos Juízes do Trabalho, dentre outros aspectos: a) requisitar informações às instituições financeiras relativamente a saldos, extratos, agência e conta-corrente; e b) gerar o ‘ID’ (identificador de depósito) pelo próprio sistema, no momento da transferência dos valores bloqueados. Ambas as alterações são importantes. A possibilidade de obter informações sobre a posição financeira do devedor, antes de ordenar bloqueios, é uma ferramenta adicional, não disponível na versão até então em operação, que cuidava apenas de ordens de bloqueio. Ela deverá, contudo, ser utilizada com muita cautela, de modo a não comprometer, com uma prévia sondagem sobre o montante de ativos do executado, o êxito de um futuro bloqueio. Por outro lado, a identificação automática do depósito é uma medida de extrema utilidade para a celeridade do processo. Não raro, perde-se muito tempo na localização do depósito junto à agencia da instituição financeira para a qual o Juiz determinou a transferência dos valores bloqueados.

(14)

Através de convênios firmados com os tribunais (o Tribunal Superior do Trabalho firmou o convênio15 com atos formais de adesão dos demais Tribunais Regionais do Trabalho), foi disponibilizado aos Juízes do Trabalho (o mesmo sucede na Justiça Comum Federal e Estadual) o uso de senhas previamente cadastradas pelo Fiel ou Master do sistema (um ou mais magistrados credenciados pelo próprio Banco Central), através do qual a ordem de bloqueio pode ser enviada eletronicamente ao SISBACEN, e deste para todas as instituições financeiras do país.

Não existe a possibilidade, portanto, de acesso direto do Poder Judiciário aos dados bancários (extratos de conta corrente, por exemplo) da pessoa executada16. A ordem é expedida, na versão atual, para bloqueio de valores especificados, desde que disponíveis no dia da expedição da ordem.

Noutras palavras: “não é uma janela para acesso aos dados bancários do

devedor, em sentido amplo. É apenas um meio facilitador das ordens de bloqueio de crédito, que sempre existiram, só que de forma tradicional (em papel, mediante ofício) e com uma extensão menor, posto que dirigido a uma ou mais instituições; mas, dificilmente a todas” (CHAVES, 2007a, p. 233)

O BACENJUD 2.0 apresenta um avanço, ao permitir que as respostas das instituições financeiras quanto à ordem de bloqueio retornem ao Juízo que a expediu também por meio eletrônico, o que agiliza sobremaneira a finalização do procedimento, com a expedição de uma nova ordem, também na forma eletrônica, para a transferência dos valores bloqueados, ou o seu desbloqueio, no todo ou em parte.

O BACENJUD, enquanto ferramenta eletrônica afinada com as novas tecnologias da informação, apenas deslocou para o meio telemático aquilo que os Juízes já faziam por meio de ofício, sendo que diretamente ao Banco Central.

Assim, o que, para o Banco Central, representou uma redução enorme de custos em relação à situação anterior – em que manejava pilhas e pilhas de ofícios de Juízes de todo o Brasil17 -, traduziu-se, ao mesmo tempo, num ganho enorme de efetividade para a Justiça

15

O Convênio em vigor se refere à versão 2.0 do sistema e foi firmado em setembro de 2005 entre o Tribunal Superior do Trabalho, então presidido pelo Ministro Vantuil Abdala, e o Banco Central.

16

Mesmo com a nova versão do BACENJUD 2.0, essa possibilidade ainda não haverá, já que a nova ferramenta se constitui numa ordem de envio de informações pelo sistema financeiro, e não de acesso direto no banco de dados do banco onde o executado mantém seus ativos.

17

As estatísticas do Banco Central mostram que, apesar da larga difusão do BACENJUD, ainda chegam lhe muitos ofícios em papel, 75.838 somente em 2007, sendo 46.134 com pedidos de bloqueio. Contudo, se

(15)

brasileira, especialmente a do Trabalho, que responde pela larga maioria dos acessos ao sistema.

Os números do Bancejud relativos ao ano de 200718 indicam que a Justiça Trabalho foi responsável por 52% das solicitações (44% pela Justiça Estadual e apenas 4% pela Justiça Federal). Essa participação da Justiça trabalhista já foi muito maior. No BACENJUD 1.0, que vigorou isoladamente de 2001 até 2005, a participação da Justiça do Trabalho no acionamento do sistema apresentou um percentual consolidado (2001-2007) da ordem de 86%.

Esses números mostram a dimensão que vem tomando o uso dessa ferramenta eletrônica no Processo do Trabalho. Em sinergia com as demais ferramentas disponíveis ao Juiz da Execução, a constrição eletrônica de ativos tem trazido resultados muito positivos para a jurisdição trabalhista, contribuindo decisivamente para a efetividade processual, postulado de máxima aspiração no ambiente contemporâneo da atividade do Estado-Juiz.

E, dentre outras ferramentas disponíveis aos Juízes, cumpre destacar aquelas operacionalizadas em plataformas informacionais. Refiro-me, por exemplo, ao acesso ao banco de dados das juntas comerciais, já disponíveis em algumas regiões trabalhistas. Também o acesso ao banco de dados do SERPRO é outra valiosa ferramenta para obter informações cadastrais das empresas.

Realidade já experimentada em algumas unidades da Federação, a interface entre a Justiça do Trabalho e os departamentos de trânsito tem mostrado grandes e positivos resultados no registro das penhoras sobre veículos. Trata-se de experiência tão importante que, recentemente, o Conselho Nacional de Justiça decidiu instituí-la em âmbito nacional, firmando acordo de cooperação técnica com o Ministério das Cidades e o Ministério da Justiça, para a implementação do RENAJUD – Sistema de Restrição Judicial, integrado ao Registro Nacional de Veículos Automotores (RENAVAN), visando “o acesso às

determinações e respostas judiciais por meio eletrônico”.

Como pode observar o leitor, o BACENJUD não é uma ferramenta isolada, posto que integra um conjunto de outros instrumentos eletrônicos a serviço da efetividade do processo. E, como todo recurso informacional, tem sido alvo de constantes atualizações. Já anotei que, a partir de fevereiro de 2008, o BACENJUD 2.0 recebeu diversas modificações compararmos com o ano anterior, houve expressiva redução. Em 2006, foram 134.114 ofícios em papel, sendo 51.269 com pedidos de bloqueio.

18

(16)

e melhorias, indicadas como a fase II do sistema, que foram divulgadas no respectivo portal na internet, consistentes nos seguintes aspectos:

a) requisição de informações: consulta a relação de agências e contas existentes, saldo consolidado, endereços e extratos bancários de clientes de instituições financeiras;

b) automação do processo de transferência de valores para conta de depósito judicial, com geração automática de número do "ID - Identificação de Depósito" pelo próprio sistema;

c) inserção dos campos tributário e previdenciário na tela de transferência de valores para conta de depósito judicial, na hipótese da Lei n. 9.703/98 (que trata dos depósitos envolvendo litígios tributários);

d) indicação na tela do sistema da data em que a transferência de valores será efetivada, quando da resposta pelas instituições financeiras a uma ordem de transferência;

e) informação do saldo bloqueado remanescente na resposta das instituições financeiras aos bloqueios, para evitar duplicidade de requisições de desbloqueios e transferências;

f) atualização pelas instituições financeiras da relação de contatos de seus representantes com o Poder Judiciário, que poderão ser visualizados pelos magistrados por intermédio da própria tela de resposta das ordens judiciais;

g) melhorias visuais para o magistrado no detalhamento das minutas e ordens judiciais;

h) melhoria para os magistrados na pesquisa de varas, que poderão ser selecionadas a partir de seu município/comarca ou de seu código numérico.

Essas melhorias certamente tornam o BACENJUD um sistema informacional ainda mais complexo e útil. Contudo, quero crer que nada se mostra mais importante hoje do que a disposição de todos os atores sociais que atuam no processo judicial trabalhista, especialmente advogados, servidores e Juízes, uma tomada de posição pelo prestígio na utilização desses novos mecanismos. Sabe-se que muitos profissionais em atividade se mostram refratários às inovações tecnológicas, o que é compreensível. Parte significativa das novas tecnologias da informação teve lugar em momento bem recente. No entanto, é fundamental um esforço na direção da incorporação definitiva dessas ferramentas, de modo que o ambiente judiciário não se movimente de forma heterogênea no caminho que levará

(17)

a todos à completa transformação do processo em papel em processo eletrônico, o que, no ritmo das mudanças e em face da nova legislação a respeito do tema, não tardará muito tempo.

2.2. DAS LIÇÕES DO DIREITO COMPARADO. A PENHORA DE DEPÓSITOS BANCÁRIOS NO

DIREITO PROCESSUAL PORTUGUÊS

O recurso ao Direito Comparado é um método muito interessante para medir o grau de desenvolvimento de um sistema jurídico, tendo como pano de fundo um universo maior que os limites de um dado ordenamento normativo.

No caso do Direito Processual, o exame comparativo das características de sistemas processuais pertencentes a países diversos pode representar um elemento de grande valia para o estudo do potencial estático de eficácia de certos institutos processuais, isto é, do grau de eficácia das ferramentas processuais em vigor. Por outro lado, pode o Direito Comparado apontar tendências que, não raro, incorporam-se, observadas as peculiaridades de cada país, a outros sistemas.

Se utilizarmos esse método, veremos que o sistema BACENJUD não representa uma inovação exclusivamente brasileira. Pelo contrário, nota-se uma tendência no Direito Processual Comparado de incorporação das tecnologias da informação na práxis processual, mercê do grau de permeabilidade desses recursos nas nossas vidas.

Exemplo dessa tendência está no reformado Código de Processo Civil de Portugal. O Processo Civil português, do qual se utiliza a jurisdição trabalhista de Portugal, notadamente na execução, por expressa previsão do art. 91º, número 7 do Código de Processo do Trabalho daquele país (Decreto-Lei n. 480/89), sofreu ampla reforma em 2003, através do Decreto-Lei n. 38, de 8 de março, especialmente no que toca ao processo de execução.

Segundo Ivan Alemão, autor de um interessante diagnóstico sobre essa reforma processual, “a reforma da ação executiva de 2003 teve como ponto central reduzir a

atuação do juiz e da administração pública da Justiça (em especial a atuação do oficial de justiça), criando a figura do solicitador de execução”. E prossegue sua análise, afirmando:

“trata-se de aplicar em Portugal um sistema semelhante ao da França, onde o ‘huisser de

(18)

desjudicialização ou privatização? Disponível em <www.jus2.uol.com.br/doutrina/texto.asp?id=1000. Acesso em 20 fev. 2008).19

De fato, entre as diversas inovações que foram introduzidas no Código, uma das mais polêmicas certamente é a previsão da prática de muitos atos judiciais por um auxiliar da Justiça, sem vínculo estatutário, indicado pelo exeqüente ou pela secretaria, dentre profissionais cadastrados. Trata-se do agente de execução, previsto no art. 808 do CPC português.20

Para os objetivos deste Capítulo, contudo, importa revelar o conteúdo do art. 861º-A do Código de Portugal, que expressamente anota a possibilidade de penhora de depósitos bancários por meio eletrônico. Eis o conteúdo dos pontos mais importantes da regra, que é dividida em vários itens (números), de acordo com a tradição legislativa daquele país:

1. A penhora que incida sobre depósito existente em instituição legalmente autorizada a recebê-lo é feita, preferencialmente, por comunicação eletrónica e mediante despacho judicial, que poderá integrar-se no despacho liminar, quando o houver, aplicando-se as regras referente à penhora de crédito, com as especialidades constantes nos números seguintes.

... 5. A notificação é feita directamente às instituições de crédito, com a menção expressa de que o saldo existente, ou a quota-parte do executado nesse saldo, fica cativo desde a data da notificação e, sem prejuízo do disposto no n. 8, só é

19

O estudo feito por esse autor sobre a reforma não deixou de assinalar a crítica ao seu transporte para o universo processual do trabalho: “embora não tivesse previsto inicialmente na Reforma, nos anos seguintes

ela atingiu os tribunais do trabalho. E com distorção, já que se passou a exigir que o trabalhador pague honorários. Houve, neste caso, uma extensão das medidas reformistas implantadas sem o mesmo estudo havido para os demais tribunais. Restou aos tribunais trabalhistas atenuar os efeitos danosos com uma jurisprudência a favor do trabalhador, procurando estender-lhes os benefícios da justiça gratuita. A cobrança de pagamento de honorários aos pequenos exeqüentes, que, por vezes, reclamam créditos alimentares, vai contra a proposta do próprio Observatório da Justiça de Portugal, que, na época, advertiu que ‘a reforma não deve, por isso, agravar os custos de litigância, sobretudo para os cidadãos’”

(ALEMÃO, 2008).

20

A mudança na feição da ação executiva no Direito Processual português é muito recente, e tem despertado naquele país um debate muito intenso sobre a efetividade do novo modelo. Segundo Fernando Amâncio Ferreira, o caminho da privatização não melhorou os respectivos serviços judiciais, não diminuiu os custos em produziu o alargamento entre os ricos e pobres. De outro lado, o texto legal reformar apresentaria uma série de falhas, obscuridades e ambigüidades. Por fim, a falta de meios informáticos e eletrônicos à disposição dos tribunais e a inexistência de Juízos de execução completariam um rol de problemas expostos com a reforma da ação executiva (FERREIRA, Fernando Amâncio. Curso de processo de execução. Coimbra: Almedina, 9ª edição, 2006, p. 7-8). O Observatório Permanente do Poder Judiciário (OPJ), vinculado à Faculdade de Economia da Universidade de Coimbra, em relatório de abril de 2005, apresenta uma visão mais otimista dessas mudanças. Autor de um estudo que influenciou a reforma de 2003, o OPJ apresenta no mencionado relatório (disponível em www.opj.ces.uc.pt) números que demonstrariam a tendência de otimização da ação executiva, embora reconheça alguns problemas que precisam ser superados, dentre os quais a instalação de mais Juízos de execução, responsáveis pelo controle da atividade dos agentes de execução. Essa divergência de avaliação revela, de certa forma, o pouco tempo de amadurecimento do novo sistema e aponta para a necessidade de um debate e um monitoramento constante do desenrolar do modelo implementado pela reforma de 2003.

(19)

movimentável pelo agente de execução, até o limite estabelecido no n. 3 do art. 821º.

... 7. As entidades notificadas devem, no prazo de 15 dias, comunicar ao agente de execução o montante dos saldos existentes, ou da inexistência de conta ou saldo; seguidamente, comunicam ao executado a penhora efectuada.

... 9. Sem prejuízo do disposto no número anterior, a instituição é responsável pelos saldos bancários nela existentes à data da notificação e fornecerá ao tribunal extracto onde constem todas as operações que afectem os depósitos penhorados após a realização da penhora.

... Nota-se, de pronto, que o sistema português, apesar de cometer atos de execução ao agente, exige que a ordem de penhora sobre créditos bancários seja lavrada pelo Juiz, que, em geral, somente exerce a atividade de controle sobre a atividade do agente de execução (art. 808º, n. 1). Tal circunstância revela uma preocupação do processo lusitano com a necessária intervenção do Estado-Juiz quando se trata de atos de expropriação sobre créditos em circulação no sistema financeiro. É de lembrar ao leitor que a quebra de sigilo bancário no Brasil também carece de ato judicial.

Por outro lado, vê-se do dispositivo legal transcrito que o modelo descrito no código português eleva o meio eletrônico como o preferencial para a transmissão da ordem de penhora de ativos bancários. Isso não elimina a sua emissão pela forma tradicional, em papel, mas projeta um comando dirigente ao sistema judiciário para que desenvolva plataformas informacionais que permitam a plena transição do modo tradicional para o eletrônico.

Por derradeiro, tenho que o caráter aberto da regra em exame permite o pleno desenvolvimento de ferramentas tal como as que estão incorporadas atualmente no BACENJUD 2.0, consistentes não somente na transmissão da ordem, mas também na sua resposta.

A propósito, também em Portugal foi desenvolvida uma espécie de instrumento semelhante ao convênio que deu vida ao BACENJUD brasileiro. Cuida-se de um protocolo firmado entre o Ministério da Justiça, Câmara dos Solicitadores e Associação Portuguesa dos Bancos, tudo com o fito de viabilizar a penhora pelos meios eletrônicos. Todavia, relatório publicado pelo Observatório Permanente do Poder Judiciário noticia que, pelo menos até abril de 2007, o sistema autorizado pelo protocolo ainda não se encontrava em vigor.

(20)

A experiência portuguesa – pelo menos no plano normativo, já que não disponho de dados exatos do grau de desenvolvimento dos sistemas previstos em lei – revela, portanto, que o uso das novas tecnologias no processo judicial é tema de outras reformas processuais disponíveis para análise no Direito Comparado.

O caso brasileiro, contudo, merece um destaque, que reside precisamente no alto grau de desenvolvimento e organicidade do seu sistema financeiro, extremamente informatizado e capilarizado. Corolário dessa realidade é a característica, já assinalada, das relações sócio-econônicas brasileiras, umbilicalmente ligadas aos serviços bancários.

Por fim, anoto que as altas taxas de juros e o forte desempenho dos negócios com ações e títulos públicos no Brasil atraem um número expansivamente maior de interessados em seus ganhos, o que geralmente não é possível sem a titularização de uma conta bancária ou registro no sistema financeiro nacional. Essas características aumentam exponencialmente as possibilidades de sucesso do uso da ordem judicial eletrônica.

2.3. DA PREFERÊNCIA DO SISTEMA PROCESSUAL PELA PENHORA DE CRÉDITOS PELO MEIO ELETRÔNICO, DA INTRODUÇÃO DO TEMA NO CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL PELA LEI N. 11.382/2006 E DA POSSIBILIDADE DE PENHORA DE CRÉDITO EM EXECUÇÃO PROVISÓRIA DA SENTENÇA

Numa das poucas manifestações da cláusula da subsidiariedade expressa do processo comum no Processo do Trabalho, dispõe o art. 882 da Consolidação das Leis do Trabalho sobre a ordem preferencial da constrição patrimonial judicial, indicando, por supletividade, aquela disposta no art. 655 do Código de Processo Civil.

Até o advento da Lei n. 11.382/2006, o primeiro item no rol preferencial era simplesmente denominado “dinheiro”. Ora, isso já era bastante para se considerar como prioritária a constrição judicial sobre esse bem, o mais intercambiável de todos. E mais, o correr do tempo fez com que esse bem tivesse expressões das mais diversas, pois não somente se restringia a sua versão em papel moeda, como também na versão de créditos em conta corrente, aplicações financeiras, etc.

O período inflacionário levou a sociedade brasileira a uma aproximação muito grande com os serviços financeiros, como já assinalei, criando um ambiente fértil para a constrição de ativos junto à rede bancária. Por isso o BACENJUD foi e é instrumento tão eficaz.

(21)

Não faltaram, porém, leituras conservadoras em relação a esse projetado desenvolvimento da atuação do processo em face das novas tecnologias.

Amparadas numa interpretação distorcida do art. 620 do CPC (“quando por vários

meios o credor puder promover a execução, o juiz mandará que se faça pelo modo menos gravoso para o devedor”), alguns pronunciamentos judiciais restringiam essa possibilidade

de bloqueio eletrônico de ativos, por entenderem excessivamente gravosos ao devedor. Em alguns casos, assentou-se que o caminho era o da penhora sobre móveis ou imóveis, mas não sobre dinheiro.

No entanto, a preferência legal de constrição é sobre dinheiro, cuja forma atual é multifacetada, e assim deveria convergir a interpretação legal.

Tratava-se de uma aplicação, como disse, distorcida da lei, pois o princípio da execução menos gravosa somente pode ter lugar quando o Juiz se defronta com dois ou mais meios igualmente líquidos para promover a constrição e expropriação patrimoniais. A liquidez é, portanto, o parâmetro. Logo, entre a penhora de dinheiro e a de um imóvel, de mais difícil alienação judicial, não há equivalência de liquidez.

Não se olvida que, em determinados casos, o cumprimento integral da penhora sobre ativos pode resultar num quadro de dificuldades para a parte executada (como, por exemplo, falta de capital para honrar folha de salários de uma empresa), causando transtornos socialmente desproporcionais. Nesses casos, até mesmo em observância ao preceito contido no art. 8º da CLT – que recomenda que, na aplicação da lei, “nenhum

interesse particular prevaleça sobre o interesse público”-, é prudente que haja uma

contenção na medida, constritando-se os valores possíveis, ainda que não atenda, num só golpe, à satisfação integral do credor.

Esses aspectos devem ser examinados tipicamente, diante de cada caso submetido ao Juiz, mas não servem de justificativa para abrandar a regra preferencial pela penhora de dinheiro.

Na Justiça do Trabalho, houve nos últimos anos uma grande evolução. O próprio Tribunal Superior do Trabalho passou a defender o manejo do BACENJUD de forma ativa, inclusive em relação às diversas críticas assacadas contra o sistema.

Em 2003, a Corregedoria-Geral da Justiça do Trabalho publica o Provimento n. 01/2003, de 25 de julho, afirmando em seu art. 1º estabelece: “Tratando-se de execução

(22)

definitiva, o sistema BACENJUD deve ser utilizado com prioridade sobre outras modalidades de constrição judicial”.

A medida, que atualmente está reproduzida no art. 53 da Consolidação dos Provimentos da Corregedoria-Geral da Justiça do Trabalho, representa um simbólico avanço na direção da efetividade processual, espraiando-se por toda a estrutura da Justiça do Trabalho, de modo a reafirmar a estratégica importância da penhora eletrônica no Processo do Trabalho.

À orientação da Corregedoria, faço apenas um pequeno reparo. É que, mercê da nova regulamentação dada pelo art. 475-O, de aplicação supletiva ao processo do trabalho, penso que a execução provisória comporta atualmente a constrição de dinheiro, na medida em que permite a sua liberação ao credor antes do trânsito em julgado da sentença (conf. CHAVES, 2007a, p. 46-52). Nesse sentido, já temos diversos pronunciamentos dos Tribunais Regionais:

PENHORA. BLOQUEIO “ON-LINE”. EXECUÇÃO PROVISÓRIA. Ausência de ilegalidade na r. decisão judicial que determina a constrição sobre numerário de conta corrente, pois encontra respaldo no art. 655 do CPC, o qual fixa a ordem de nomeação de bens à penhora pelo devedor, elencando primeiramente o dinheiro. O fato de se tratar de execução provisória não obsta a penhora em conta corrente, haja vista o disposto na nova redação do art. 475-O, § 2º, I do CPC, introduzida pela Lei n. 11.232/2005, de aplicação subsidiária ao processo trabalhista (CLT, art. 769), permitindo, inclusive, o levantamento de depósito em dinheiro. De fato, a teor do referido preceito legal, é autorizada a liberação imediata de parte do crédito de natureza alimentar, independentemente até de caução. A meu ver a hipótese seria de denegação da ordem de segurança, porém, diante do posicionamento majoritário desta E. Seção Especializada em Dissídios Individuais n. 3, há que se considerar a incidência do óbice previsto no art. 5º, II, da Lei n. 1.533/51 e da Orientação Jurisprudencial 92 da SDI-2/TST, pois, na linha desse entendimento, a discussão pretendida pela impetrante comporta reexame mediante recurso previsto na legislação processual, atraindo o disposto no art. 267, IV, do CPC. Extinção sem resolução do mérito (CPC, artigo 267, inciso IV). (TRT 2ª Região, MS n. 14280-2005-000-02-00-5, Juíza Wilma Nogueira, 31.10.2006).

EXECUÇÃO PROVISÓRIA. PENHORA ON-LINE. Por força do art. 475-O, do CPC, com a redação dada pela Lei n. 11.232, de 22.12.2005, que adotou idêntico critério antes previsto no art. 588, do CPC, com a redação preconizada pela Lei n. 10.444, de 07.05.2002, a penhora sobre dinheiro, em sede de execução provisória, não viola direito líquido e certo quando não implementados atos de alienação de domínio, além de que a pretensão de substituir a penhora de dinheiro por outros bens contraria a ordem de gradação prevista no art. 655 do CPC, conforme art. 822, da CLT. Esse entendimento não viola o princípio da execução menos gravosa, de que trata o art. 620 do

(23)

CPC, ou o item III da Súmula n. 417, do Colendo TST. Segurança denegada (TRT 8ª Região, MS 00353-2006-000-08-00-0, Juiz Vicente Malheiros, 18.05.2006).

SISTEMA BACENJUD. PENHORA ON-LINE. EXECUÇÃO PROVISÓRIA - POSSIBILIDADE. Em respeito ao direito fundamental à ordem jurídica justa e efetiva, não há como se aplicar o disposto na Súmula nº 417, II, do Colendo TST, quando a causa, na fase cognitiva, tramitou pelo rito sumaríssimo e o recurso de revista interposto, que impede o efetivo trânsito em julgado da decisão, tem ínfimas chances de ser provido naquele Tribunal Superior. Cabível, assim, o imediato bloqueio on-line das contas da executada, se nomeia bens à penhora sem observar a gradação preferencial do artigo 655 do CPC (TRT, AP 00225-2005-011-08-00-9, Desembargador Márcio Leite Soares, 27.03.2007).

Espero que o Tribunal Superior do Trabalho reexamine o disposto no verbete sumular n. 417, item II, de sua jurisprudência, de modo a permitir uma maior efetividade processual, já que, agora, a processualística aponta para uma nova configuração na divisão do ônus da demora do processo, de modo a pesar ao réu já condenado em Primeira Instância uma maior carga pelo prolongamento da tramitação processual causado pela interposição de recursos.

Se na Justiça do Trabalho houve avanços significativos nos últimos anos na direção do preferencial manejo da penhora eletrônica, o mesmo não se pode dizer da Justiça Comum, mercê da jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça, que se consolidou no sentido da restrição do uso da constrição eletrônica, como relevam os seguintes pronunciamentos:

O contribuinte ou o titular de conta bancária tem direito à privacidade em relação aos seus dados pessoais, além do que não cabe ao Judiciário substituir a parte autora nas diligências que lhe são cabíveis para demandar em juízo (REsp 306.570, Min. Eliana Calmon, 18.02.2002).

PROCESSUAL CIVIL. RECURSO ESPECIAL. EXECUÇÃO FISCAL. ART. 557, CAPUT, DO CPC. AUSÊNCIA DE PREQUESTIONAMENTO. SÚMULA 211/STJ. BACEN - JUD. QUEBRA DE SIGILO BANCÁRIO. NÃO-ESGOTAMENTO DE TODOS OS MEIOS PARA LOCALIZAR BENS PASSÍVEIS DE PENHORA. PRECEDENTES. SÚMULA 07/STJ. MATÉRIA PROBATÓRIA.

1. Recurso especial interposto pelo INSS contra acórdão proferido pelo TRF da 4ª Região que negou provimento a agravo de instrumento por entender que (fls. 74/78) para que seja deferida a utilização do convênio BACEN - JUD deve o exeqüente comprovar que exauriu todos os meios à sua disposição para localizar patrimônio do devedor para promover a penhora. Aponta como fundamentos para o seu recurso: a) a discussão travada nos autos não poderia receber a aplicação do art. 557, caput, do CPC, uma vez que não possui tratamento isonômico na Corte a quo e neste Tribunal; b) no âmbito, a jurisprudência do STJ, embora reconheça de forma excepcional, é no sentido de que se restarem esgotadas as vias ordinárias de localização dos

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