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Serviços ecossistêmicos da bacia do rio Ratones e o papel de uma unidade de conservação, na perspectiva dos pescadores artesanais

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Marília Medina Pupo

Serviços ecossistêmicos da bacia do rio Ratones e o

papel de uma unidade de conservação, na

perspectiva dos pescadores artesanais

Florianópolis 2018

Dissertação apresentada ao Programa de Pós-Graduação em Ecologia da

Universidade Federal de Santa Catarina, para obtenção de título de Mestre em Ecologia. Orientadora: Prof.ª Dr.ª Natalia Hanazaki.

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Dedico este trabalho à todos que sonham e lutam, aos que sentem, aos que ajudam, aos que acreditam, e principalmente, aos que fazem tudo isso com amor.

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Que dirá a seu filho, o pai? Que dirá para a filha, a mãe?

Que virá dessa escuridão? Será bem, será maldição? Será Deus ou será mortal? Nos trará arma ou missal? O punhal fere o coração O veneno morde a canção Quero saber, mas sem matar

O que já existe em mim Quero conhecer seu mundo sim Se não for perder o meu mundo nu

O meu mundo de fogo ou cru Ou assim, ou me deixe em paz

Minha casa sem solidão Minha mesa de peixe e pão

Minha tribo, irmã, irmão Na aventura que sei viver Com segredos que não contarei

Pra você

Letra da música de Milton Nascimento Que Virá Dessa Escuridão?

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Agradecimentos

Agradeço primeiramente a minha mãe, pelos cuidados, pelo amor incondicional que me trouxeram até aqui.

Ao programa de pós graduação em Ecologia e seu corpo docente, que sempre esteve acessível e solícito às minhas dúvidas neste caminho. Especialmente a minha orientadora Natalia Hanazaki, pela excelência na orientação, sempre incentivando o processo de busca e aprendizagem, com clareza e surpreendente tranquilidade.

À Marinez Scherer, Michele Dechoum e Bárbara Segal pelas valiosas considerações e sugestões no trabalho final.

Ao Apoena Figueirôa pela concepção inicial deste trabalho e motivação para a entrada no mestrado e a todos os gestores da Estação Ecológica de Carijós pelo cuidado de um local tão especial.

À Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (CAPES) pela bolsa de mestrado e apoio financeiro ao trabalho de campo.

À equipe do Laboratório de Ecologia Humana e Etnobotânica (ECOHE) pelo apoio em todos os momentos nesses anos de aprendizado. À todos os amigos de mestrado que estiveram de alguma forma envolvidos neste processo de aprendizagem múltipla, como ecóloga, mãe e principalmente como ser humano solidário e cooperativo. Com vocês o caminho foi mais fácil e divertido! Agradecimentos especiais à Lorena Pinheiro e Alexandre Marcel da Silva Machado, pelas conversas e horas de estatística. A Maristela, Rafaela, Aline, Sofia, Alexandre, Nina e Clarissa pelo valioso apoio neste trabalho, na ajuda de campo, no lar oferecido e nas boas palavras em horas de dúvida e cansaço.

A todos os pescadores artesanais da Bacia do Rio Ratones, que motivaram e inspiraram este trabalho. Um agradecimento especial ao Orlando Domingos da Silva, por toda a ajuda na coleta de dados de campo e pelo exemplo de conservacionista e lutador incansável pelo Rio Ratones e pesca artesanal.

E, por fim, um agradecimento especial ao meu companheiro Christopher, que tornou este trabalho possível, cuidando com amor de mim e da nossa pequena Helena, dando a tranquilidade necessária para a minha imersão na ecologia. E claro, a esta estrela que compartilha nossos caminhos há 3 anos e dá fôlego para seguir adiante com nossos sonhos, além de fazer brotar tantos outros! Sempre em frente!

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RESUMO

A abordagem de Serviços Ecossistêmicos (SE) é promissora na solução de problemas socioecológicos por facilitar a compreensão transversal e interdisciplinar entre diferentes setores da sociedade. A gestão de base ecossistêmica é uma estratégia de conservação inerentemente antropocêntrica, a qual assume que o conhecimento do valor e os argumentos de valor são necessários para governar os SE. Para tanto, considerar adequadamente os valores de todas as partes interessadas é condição essencial para gerar a empatia e boas respostas às propostas de conservação. O objetivo desta pesquisa foi investigar e caracterizar as percepções sobre os serviços ecossistêmicos por pescadores artesanais, usuários da bacia Hidrográfica do Rio Ratones, que é parcialmente protegida pela Estação Ecológica de Carijós (ESEC) em seu baixo curso. Especificamente, objetivamos identificar e caracterizar os SE percebidos pelos pescadores nessa bacia hidrográfica e o papel da área protegida na provisão dos serviços ecossistêmicos percebidos. Realizamos 52 entrevistas semi-estruturadas com pescadores de 7 localidades pertencentes ou adjacentes à bacia. Identificamos 28 serviços ecossistêmicos provenientes de 7 fontes provedoras de serviços. A categoria de serviços culturais foi destaque com o maior frequência de citação e número de serviços relacionados. A presença da ESEC foi percebida de forma positiva principalmente como provedora de alimento e hábitat para a vida silvestre e de forma negativa por suprimir o modo de vida tradicional, principalmente pelo caráter regulatório sobre a pesca artesanal. A atual gestão da unidade baseada no comando e controle, com foco na fiscalização compromete a efetividade da ESEC no provimento de alguns SE, especialmente os da categoria cultural. Investir em uma melhor relação Unidade de Conservação/comunidade, através de uma gestão mais inclusiva e descentralizada, trará maior efetividade para a unidade na promoção do desenvolvimento socioambiental e na proteção do patrimônio natural para além de seus limites.

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ABSTRACT

The Ecosystem services (ES) approach is promising for finding solutions in social ecology by facilitating stakeholder and interdisciplinary understanding across different sectors of society. Ecosystem-based management is a conservation strategy inherently anthropocentric, which assumes that the understanding of the value and the value criteria are necessary for ecosystem service management. Therefore, it is essential to consider the values of all stakeholders in order to generate empathetic and good responses to conservation proposals. The objective of this research was to investigate and characterize the perceptions of artisanal fishers about ecosystem services of the Ratones River basin, which is partially protected by Carijós ecological station (ESEC) in its lower reaches. Specifically, we aimed to identify and characterize the ecosystem services perceived by fishers in this river basin and the role of the protected area in the provision of the perceived ecosystem services. We conducted semi-structured interviews with 52 fishers from 7 localities within or adjacent to the basin. We identified 28 ecosystem services from seven service provider sources. The category of cultural services was the most cited and had highest number of related services. The presence of the ESEC was perceived positively, primarily as a provider of food and habitat for wildlife, and negatively because it restricted traditional ways of living, especially due to the regulatory conditions imposed on artisanal fishing. The current management of the ESEC, based on command and control and high level of focus on regulation enforcement, compromises its effectiveness in the provision of ecosystem services. Investing in a better relationship between the community and the conservation reserve, through a more inclusive and decentralized management, will bring greater effectiveness for the unit by promoting social and environmental development and natural heritage protection beyond the reserve limits.

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LISTA DE FIGURAS

Figura 1: Relação entre o bem-estar humano e os Serviços Ecossistêmicos ...28 Figura 2: Quadro conceitual da Avaliação Ecossistêmica do Milênio ...29 Figura 3: Localização da Bacia Hidrográfica do Rio Ratones. Linha vermelha: delimitação da bacia do Rio Ratones. Área verde: Estação Ecológica de Carijós gleba Ratones. Linhas azuis: rede hidrográfica da Bacia do Rio Ratones. ...41 Figura 4: Serviços ecossistêmicos citados por mais de 10% dos pescadores (N=52). Barra vermelha indica serviços de provisão, barra preta serviços de suporte, barra branca serviços culturais e barra cinza serviços de regulação...50 Figura 5: Número de serviços ecossistêmicos pelas Fontes provedoras (n=28 SE, a partir de 52 entrevistas com pescadores)...51 Figura 6: Representação de uma rede bipartida dos serviços ecossistêmicos citados por mais de 5 entrevistados por fonte, conectados às respectivas fontes provedoras (n=558 citações de 28 SE, a partir de 52 entrevistas com pescadores). ESEC=Estação Ecológica de Carijós... 52 Figura 7: Percepções positivas e negativas da ESEC Carijós pelos pescadores do interior e litoral da Bacia Hidrográfica do Rio Ratones (N=52) ...56

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LISTA DE TABELAS

Tabela 1: Sumário do questionário utilizado nas entrevistas realizadas com os pescadores da Bacia Hidrográfica do Rio Ratones...44 Tabela 2: Identificação e caracterização de 28 serviços ecossistêmicos providos pela Bacia Hidrográfica do Rio Ratones ...48 Tabela 3: Resultado do GLM para diferenças na quantidade de serviços ecossistêmicos percebidos por pescadores em função do local de moradia, idade e renda (n-1 = graus de liberdade; ∆AIC = diferença entre o AIC dos modelos) ...54 Tabela 4: Resultado do GLM multivariado binomial para diferenças na composição dos serviços ecossistêmicos percebidos pelos pescadores em função do local de moradia, idade e renda (ns = não significativo; n-1 = graus de liberdade; LR = teste de verossimilhança; ∑AIC = somatório do AIC; ∆AIC = diferença entre o AIC dos modelos) ...55

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MATERIAL SUPLEMENTAR DO ARTIGO: ANEXOS A: Tabela resultado do GLM multivariado binomial para diferenças na composição dos serviços ecossistêmicos percebidos entre pescadores que moram no litoral e no interior. (SE = Serviços ecossistêmicos; Cult = Serviço cultural; Sup = Serviço de suporte; Reg = Serviço de regulação; Prov = Serviço de provisão; Cult_1 = Lazer; Cult_2 = Valor estético; Cult_4 = Modo de vida tradicional; Cult _5 = Herança intrínseca e de existência; Cult_6 = Bem estar; Cult_7 = Senso de localização; Cult_9 = Relação social; Cult_10 = Herança cultural; Sup_1 = Produção de oxigênio; Sup_2 = Provisão de hábitats; Sup_4 = Dispersão de sementes; Reg_1 = Regulação da qualidade do ar; Reg_3 = Regulação da água; Reg_5 = Purificação da água e controle da poluição; Reg_6 = Retenção de sedimentos e transporte; Reg_9 = Controle biológico; Prov_1 = Alimentos; Prov_5 = Fonte e/ou complemento de renda, * = significativo)... 56

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LISTA DE ABREVIATURAS E SIGLAS AIC - Critério de Informação de Akaike

DNOS - Departamento Nacional de Obras de Saneamento ECOHE - Laboratório de Ecologia Humana e Etnobotânica ESEC - Estação Ecológica de Carijós

GLM - Modelo generalizado linear

IBAMA - Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis

ICMBio - Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade MEA - Millennium Ecosystem Assessment

MMA - Ministério do Meio Ambiente SE - Serviços Ecossistêmicos

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SUMÁRIO

1 INTRODUÇÃO GERAL...25 2 REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS...31 3 SERVIÇOS ECOSSISTÊMICOS DA BACIA DO RIO RATONES E O PAPEL DE UMA UNIDADE DE

CONSERVAÇÃO, NA PERSPECTIVA DOS PESCADORES ARTESANAIS...35

3.1 INTRODUÇÃO...37 3.2 MATERIAIS E MÉTODOS...41 3.2.1 Área de estudo...41 3.2.2 Coleta de dados ... 43 3.2.3 Análise dos dados ... 45

3.3 RESULTADOS...47 3.3.1 Os pescadores ... 47 3.3.2 Serviços ecossistêmicos percebidos ... 48 3.3.3 Fontes provedoras de serviços ... 50 3.3.4 O que interfere na percepção dos pescadores sobre SE? ...53 3.3.5 O papel da área protegida no provimento de SE . 55

3.4 DISCUSSÃO...59 3.4.1 A percepção na voz dos pescadores ... 59 3.4.2 O que afeta a percepção ... 62 3.4.3 O efeito ESEC ... 63 3.4.4 Conclusão ... 67 3.5 REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS...69

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3.6 MATERIAL SUPLEMENTAR DO ARTIGO – ANEXO A ...77 4 CONSIDERAÇÕES FINAIS...79

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1 INTRODUÇÃO GERAL

Os sistemas socioambientais são desafiados por problemas ecológicos e socioeconômicos em todo o mundo. Estes desafios nos colocam diante de uma nova ética em prol da saúde planetária, na qual todos estão conectados e cada ação individual reverbera no sistema. Da mesma forma, os sistemas naturais são considerados cada vez mais vinculados ao sistema socioeconômico, pela evidente influência antrópica nos processos globais de clima, circulação de nutrientes, translocação de espécies, dentre outros aspectos (Vitousek et al. 1997). O conceito de sistemas socioecológicos está sendo usado para integrar os processos e componentes desses sistemas (Berkes et al. 1998; Ostrom 2009), destacando a importância de conciliar a gestão dos recursos naturais com as pessoas (Buschbacher 2014).

Os sistemas socioecológicos, segundo Berkes e colaboradores (1998), devem ser entendidos como sistemas complexos que possuem atributos como não-linearidade, incerteza, variabilidade, escala e auto-organização. A característica-chave desse sistema é a resiliência geral ou capacidade adaptativa para lidar com esses atributos por meio de adaptação, experimentação e aprendizagem e auto-organização (Buschbacher 2014). Neste contexto, aumentar a robustez de sistemas socioecológicos, reverter o distanciamento do ser humano em relação à natureza e fortalecer o envolvimento das sociedades com os ecossistemas locais são passos importantes para reduzir a deterioração dos ecossistemas e a perda de biodiversidade (Berkes 2003; Anderies et al. 2004; Janssen et al. 2007). Porém, mesmo com o desenvolvimento de várias ferramentas participativas para o diagnóstico, avaliação e propostas de manejo, ainda falhamos na comunicação entre as diferentes áreas do conhecimento e no engajamento das pessoas nas causas ambientais (Raymond et al. 2009). No âmago desta falha está a nossa dificuldade de reconhecer outras formas igualmente racionais de se perceber a biodiversidade entre as sociedades tradicionais (Diegues et al. 1999).

O conhecimento local ou tradicional é definido como corpo cumulativo de conhecimentos, práticas e crenças, evoluído por processos adaptativos e transmitidos através de gerações pela transmissão cultural (Pascual et al. 2017). Neste conhecimento existe uma interligação orgânica entre o mundo natural, o sobrenatural e a organização social (Diegues et al. 1999). Ele se baseia em habilidades perceptivas que emergem, para cada ser, através de um processo de

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desenvolvimento em um ambiente historicamente específico (Ingold et al. 2002). Isto se reflete no conceito de práticas, pois saber é algo mais do que informação, no sentido de que envolve mais do que cognição, incluindo outras dimensões da existência – algo que se pratica com o intelecto e com as demais faculdades humanas (Ingold et al. 2002; Taddei 2015). Esse conhecimento utiliza a oralidade na sua comunicação e somente pode ser interpretado dentro do contexto da cultura em que ele é gerado (Balée, 1993).

Para muitas populações tradicionais a diversidade da vida não é vista apenas como um "recurso natural", mas sim como um conjunto de seres vivos que tem um valor de uso e um valor simbólico. Nesse sentido, os seres vivos pertencem a um lugar, um território enquanto

lócus em que se produzem as relações sociais e simbólicas (Diegues et

al. 1999). Já para a ciência ocidental, a biodiversidade é usualmente fruto exclusivo da natureza, não pertence a lugar nenhum senão a uma teia teórica de inter-relações e funções, como propõe a teoria dos ecossistemas (Diegues et al. 1999). Isto explica porque em geral a perspectiva da ciência ocidental não tem força prática ou motivadora (Ingold et al. 2002), pois para grande parte da sociedade, as coisas só têm sentido dentro de contextos reais, e a mensagem científica em geral não carrega consigo os elementos que auxiliam as pessoas a contextualizarem a informação (Taddei 2015).

Na década de 90, o Millennium Ecosystem Assessment (MEA) despontou com uma proposta promissora na melhoria da comunicação e integração entre os diferentes conhecimentos e setores da sociedade: avaliar como as mudanças nos ecossistemas afetariam o bem-estar humano (MEA 2003; MEA 2005). Esta avaliação sintetizou informações de literatura científica e incorporou conhecimentos do setor privado, de profissionais, de comunidades locais e de povos nativos, comunicando essas informações de forma útil para ser aplicada pelos tomadores de decisão (MEA 2005). Ainda, propõe incitar o engajamento público contínuo, usando a ciência para informar diálogos e conversas sociais através de uma linguagem em comum entre os diferentes setores da sociedade (Costanza et al. 2017). Dessa maneira cria espaços para a inserção dos diferentes atores sociais nas propostas de conservação, também pelo entendimento que o conhecimento tradicional desempenha um papel fundamental na manutenção do uso dos serviços ecossistêmicos (SE) (Berkes et al. 2009).

O termo "serviços ecossistêmicos" popularizado pelo MEA foi cunhado em 1981 por Paul e Anne Ehrlich (Fisher et al. 2009) como uma metáfora para comunicar a importância e assim o valor natural que

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seus componentes têm para as sociedades humanas (Mooney & Ehrlich, 1997). No entanto, idéias relacionadas vinham surgindo na literatura acadêmica há décadas (Costanza et al. 2017). No ano de 1997, Gretchen Daily define os SE como “as condições e os processos através dos quais os ecossistemas naturais e suas espécies sustentam e satisfazem a vida humana”. Neste mesmo ano, Costanza e colegas definiram os SE como as características, funções ou processos ecológicos que direta ou indiretamente contribuem para o bem-estar humano: isto é, os benefícios que as pessoas obtêm dos ecossistemas funcionais (Costanza et al. 1997). Essa definição posteriormente seria utilizada pelo MEA, o qual também definiu quatro categorias de serviços ecossistêmicos baseados nas características de funcionalidade dos ecossistemas: regulação, provisão e cultural, que diretamente afetam as pessoas e suporte, necessário para manter os outros serviços.

A base conceitual do MEA é fundamentada na inter-relação entre três aspectos: as forças motrizes ou fatores de mudança; os ecossistemas e respectivos serviços; e o bem-estar humano (Figura 1). Segundo MEA (2003) o bem-estar é um conceito multidimensional que depende dos seguintes aspectos: acesso a materiais básicos para uma vida boa, segurança, saúde, relações sociais e liberdade de escolha (Figura 2). Uma força motriz, ou vetor de mudança, é qualquer fator que muda um aspecto do ecossistema. Uma força motriz direta influencia inequivocamente os processos de ecossistemas e assim pode ser identificada e medida em vários graus de precisão. Uma força motriz indireta opera de modo mais difuso, frequentemente alterando uma ou mais forças motrizes diretas, e a sua influência é determinada quando se compreende o seu efeito em uma força direta (MEA 2005). Essas interações podem ocorrer em mais de uma escala, podendo também atravessar escalas. De forma semelhante, as interações podem ocorrer ao longo de diferentes escalas de tempo. Diferentes estratégias e intervenções podem ser aplicadas em muitos pontos dessa estrutura, a fim de assegurar o bem-estar humano e conservar os ecossistemas (MEA 2005).

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Figura 1. Relação entre o bem-estar humano e os Serviços Ecossistêmicos.

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Figura 2. Quadro conceitual da Avaliação Ecossistêmica do Milênio.

Fonte: Traduzido do MEA (2005) por Munk (2015)

Em uma época em que a perda de serviços já pode ser sentida, a abordagem dos serviços ecossistêmicos pode motivar a participação da sociedade nos processos de tomada de decisão, melhorando a respostas às políticas de conservação (Raymond et al. 2009; Fisher et al. 2009; Asah et al. 2014).

A etnoecologia, abordagem teórica e metodológica multidisciplinar, estuda a percepção, usos e manejos da natureza e seus recursos pelos grupos humanos (Toledo 1992), expressos pelo conhecimento local. Esta abordagem tem sido integrada com a abordagem ecossistêmica, vinculando sistemas sociais com sistemas naturais (Berkes 2003) e constitui uma poderosa ferramenta para o

ESCALAS Curto

prazo Longo prazo

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sucesso das estratégias de conservação melhor adaptadas às condições locais (Berkes et al. 1998; Hanazaki 2003).

Este trabalho se propõe a investigar e caracterizar as percepções sobre os serviços ecossistêmicos por pescadores, usuários de uma bacia hidrográfica que é parcialmente protegida por uma unidade de conservação em seu baixo curso, e está organizado na forma de um artigo científico. Para tal pretende-se utilizar embasamento teórico sobre serviços ecossistêmicos (Costanza et al. 1997; Groot et al. 2002; MEA 2005; Fisher et al. 2009; Fish et al. 2016b) e também o referencial teórico e metodológico da Etnoecologia (Berkes et al. 1998; Diegues 2000; Hanazaki 2003; Viana 2008), reconhecendo a importância do conhecimento local como elemento fundamental e potencialmente norteador nos processos de gestão. Nosso intuito é gerar subsídios para uma gestão mais participativa do ecossistema e consoante com os interesses da comunidade local.

O estudo foi desenvolvido na bacia do Rio Ratones, sul do Brasil, que há três décadas é parcialmente protegida pela Estação Ecológica de Carijós (ESEC). As duas perguntas norteadoras deste trabalho são: Quais são os serviços ecossistêmicos percebidos pelos pescadores da bacia do Rio Ratones? Qual é o papel da ESEC Carijós na provisão destes serviços percebidos? Além de identificar e caracterizar os serviços ecossistêmicos percebidos pelos pescadores locais, pretendemos analisar se o local de moradia, idade e fonte de renda dos pescadores afetam a percepção dos mesmos sobre os serviços ecossistêmicos. Esta compreensão das percepções também poderá facilitar a comunicação e o entendimento entre os administradores da ESEC Carijós e a comunidade local, historicamente conflituosa, especialmente com a comunidade de pescadores locais.

A dissertação está organizada na forma de um artigo científico (com introdução, materiais e métodos, resultados, discussão, conclusão e referências bibliográficas), precedido desta introdução geral e seguido de considerações finais.

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2 REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

Anderies, J.M., Janssen, M.A. & Ostrom, E., 2004. A Framework to Analyze the Robustness of Social-ecological Systems from an Institutional Perspective. Ecology & Society, 9(1), p.18. Available at: http://dlc.dlib.indiana.edu/archive/00002402/.

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3 SERVIÇOS ECOSSISTÊMICOS DA BACIA DO RIO RATONES E O PAPEL DE UMA UNIDADE DE CONSERVAÇÃO, NA PERSPECTIVA DOS PESCADORES ARTESANAIS1

Marília Medina Pupo*, Natalia Hanazaki

Programa de Pós-graduação em Ecologia, Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC), Florianópolis, SC, Brasil.

*E-mail de contato: mariliamedina1@gmail.com

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Este artigo está redigido e formatado para ser submetido à revista Ocean and Coastal Management

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3.1 INTRODUÇÃO

O histórico de falências em programas para a conservação da natureza expõe a nossa dificuldade em compreender a complexidade das ligações em evolução entre os sistemas naturais e sociais (Berkes 2003; Fischer et al. 2015; Virapongse et al. 2016). Como resultado, abordagens holísticas e integradas estão ganhando destaque nas propostas de conservação. Estas abordagens estão cada vez mais focadas nas complexas interações socioecológicas e nos múltiplos benefícios que o ecossistema provém aos humanos, através dos chamados serviços ecossistêmicos (SE).

O conceito de SE foi popularizado pela Avaliação Ecossistêmica do Milênio (MEA), uma iniciativa global criada em 1999 para avaliar como as mudanças nos ecossistemas afetariam o bem-estar humano (MEA 2003), a partir da compreensão dos processos que ligam biodiversidade com funções e serviços dos ecossistemas. Os SE, definidos como os benefícios que as pessoas obtêm dos ecossistemas (MEA 2005) são divididos em pelo menos quatro categorias, baseados nas características de funcionalidade dos ecossistemas (MEA 2005): Serviços de suporte, como formação de solo e ciclagem de nutrientes; serviços de provisão como alimento, madeira e água potável; serviços de regulação, como a regulação do clima, de doenças e enchentes; e serviços culturais, como senso de localização e bem-estar.

Alguns autores propuseram outras classificações (ver Costanza et al. 2017) que diferem do MEA (2005), alegando que esta é inapropriada no contexto de valoração de serviços. O motivo é a mistura dos produtos finais, que são os benefícios que as pessoas realmente usufruem, com os intermediários, que são os mecanismos que dão origem a esses serviços. A falta desta distinção pode causar o efeito de contagem dupla (Wallace 2007). Porém, se o objetivo não está na valoração monetária, como no caso deste estudo, a classificação do MEA é adequada pelo uso de linguagem simples e abrangente, a qual otimiza a apropriação do conceito nos diferentes setores da sociedade (Fisher 2009), respeitando as singularidades dos atores envolvidos.

O Manejo com Base Ecossistêmica é definido como uma abordagem para a gestão de recursos naturais que visa à sustentabilidade do ecossistema para atender as necessidades ecológicas e humanas no futuro (MEA 2005). É uma estratégia de conservação inerentemente antropocêntrica, a qual assume que o conhecimento do valor e os argumentos de valor são necessários para governar os SE (Groot et al.

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2002; Primmer et al. 2015). Tais conhecimentos são diversas vezes construídos através da interação entre pessoas e seus ambientes, por processos sociais que moldam decisões de manejo de recursos, impactam os SE providos e atribuem importância para potenciais serviços finais (Fisher et al. 2009).

Neste contexto o domínio sociocultural, expresso através dos serviços culturais e as preferências socioculturais (Chan & Goldstein 2012), tem um papel central no planejamento de base ecossistêmica (Martín-López et al. 2012; Díaz et al. 2018). Apesar disso, 95% dos estudos de SE marinhos e costeiros realizados até 2013 se concentraram apenas nos aspectos biofísicos ou econômicos dos SE (Liquete et al. 2013). Estes estudos, utilizados como base para aumentar o investimento em gestão ambiental (Daily et al. 2009) falham em não considerar adequadamente os valores de todas as partes interessadas, desencadeando ou mesmo intensificando conflitos que afetam negativamente a empatia pelas propostas de conservação (Jacobs et al. 2016).

Apesar de incipientemente, a comunidade internacional tem explorado caminhos para reconciliar a conservação com o modo de vida de comunidades locais, como forma de criar suporte para a conservaçãoda natureza (Berkes 2009; Plieninger & Bieling 2013) e permitir um reenquadramento conceitual do lugar das pessoas na natureza (Fisher et al. 2014). Diversos trabalhos caminham para múltiplas valorações dos serviços ecossistêmicos (ver Jacobs et al. 2016) e para metodologias além da monetária (Raymond et al. 2009; Klain et al. 2014; Asah et al. 2014; Oteros-rozas 2015; Fish et al. 2016b) com o intuito de capturar a diversidade de sentimentos e percepções de mundo, inerentes às outras formas de conhecimento, entre estas o conhecimento tradicional (Díaz et al. 2018). Neste processo, as áreas naturais protegidas tem papel fundamental na manutenção das conexões entre as pessoas e os ambientes, assim como restaurar e cultivar novas conexões (Berkes 2009).

As unidades de conservação são consideradas um dos pilares para a conservação da biodiversidade dos remanescentes de florestas tropicais (Defries et al. 2005). Porém, muitas dessas áreas ainda carregam a herança do modelo de conservação adotado, baseado no antagonismo sociedade/natureza. Como consequência sofrem, na sua maioria, com conflitos e disputas pelo uso e posse dos recursos naturais a elas associados (Teixeira et al. 2006), pois não foram agregadas aos processos de desenvolvimento local e regional. A falta da participação social em sua definição dificulta o sentido de pertencimento e a criação

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de um espaço de tomada de decisões (Quadros & Giraldi-Costa 2015), prejudicando ainda mais a necessária incorporação da conservação ao modo de vida dos atores locais (Diegues & Viana 2004; Furlan 2004).

A dificuldade histórica na implantação das áreas protegidas está flexibilizando a postura frente à presença humana, buscando o apoio e o envolvimento das próprias populações como estratégia para dirimir os conflitos, melhorar a compreensão e suporte às normas estabelecidas (Adams et al. 2003; Berkes 2009; Donoso et al. 2014). No Brasil, desde 2000, a política de criação e gestão de áreas protegidas, como unidades de conservação, procura assegurar uma maior e efetiva participação da sociedade nesses processos (MMA 2004). Desde então foram incentivadas uma série de medidas visando à descentralização da gestão dos recursos naturais e institucionalizando as iniciativas de manejo comunitário, com destaque para o norte do país (Benatti 2003). Uma dessas inovações é a garantia da participação da sociedade na gestão das unidades de conservação através dos conselhos gestores, que podem ser consultivos ou deliberativos, conforme a categoria da unidade. Essas modificações introduzidas traduzem a convicção de que a participação da sociedade é essencial para o sucesso a longo prazo da estratégia de conservação baseada em unidades de conservação (MMA 2004).

Neste contexto, as áreas protegidas adquirem um novo sentido e constituem um poderoso instrumento para o alcance das Metas de Aichi, estabelecidas em 2010, durante a 10ª Conferência das Partes da Convenção sobre Diversidade Biológica, as quais buscam estabelecer ações concretas para deter a perda da biodiversidade planetária.Nesta visão, as propostas de conservação da natureza adquirem um caráter mais amplo ao reconhecer o papel central e profundo que a cultura tem em definir todas as ligações entre pessoas e natureza (Díaz et al. 2018). Para tanto, compreender as percepções, valores, atitudes e crenças em relação aos benefícios derivados do ecossistema é parte indispensável deste processo (Cárcamo et al. 2014; Asah et al. 2014; de Juan et al. 2017). Estas informações podem ser mais significativas sobre as contribuições dos serviços ecossistêmicos para o bem-estar humano do que as avaliações puramente biofísicas (Martín-López et al. 2012). O objetivo desta pesquisa foi investigar e caracterizar as percepções sobre os serviços ecossistêmicos de pescadores usuários de uma bacia hidrográfica que é parcialmente protegida por uma unidade de conservação em seu baixo curso. Especificamente, objetivamos identificar e caracterizar os serviços ecossistêmicos percebidos pelos pescadores nessa bacia hidrográfica, analisar se o local de moradia,

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idade e fonte de renda dos pescadores afetam a percepção dos mesmos sobre os serviços ecossistêmicos e avaliar o papel da área protegida na provisão dos SE percebidos.

As preferências sociais sobre os SE podem variar entre atores sociais devido ao recurso de interesse, idade, necessidades individuais, tradições culturais, acesso aos SE, fontes de renda, entre outros (Fisher et al. 2009; Martín-López et al. 2012; Maestre-Andrés et al. 2016). Essas preferências tendem a refletir nas categorias de serviços propostas neste trabalho. Por exemplo, é esperado em comunidades rurais e tradicionais, com alta dependência dos recursos locais, uma maior percepção de serviços da categoria de provisão (Martin-lopez et al 2012; Alarcon 2014) e cultural (Fish et al. 2016a), principalmente aqueles ligados ao entendimento afirmativo do lugar e dos modelos de vida. Em meio urbano há uma predominância de serviços culturais, principalmente lazer e bem-estar (Casado-Arzuaga et al. 2013; Maestre-Andrés et al. 2016; Dou et al. 2017) pela carência desses espaços nesses ambientes. De modo geral os benefícios indiretos tendem a passar despercebidos, no caso das categorias de suporte (Raymond et al. 2009) e regulação (Groot et al. 2002), porém dependendo do local de moradia, atividades, entre outros, essa relação pode ser diferente (Maestre-Andrés et al. 2016). Esta variação de percepção e preferências sobre os SE reforça a importância de trabalhos desse tema in situ, especialmente se o objetivo da pesquisa é fornecer subsídios para a uma gestão a qual contemple todos os atores envolvidos.

Neste estudo é esperado uma maior percepção dos SE das categorias de provisão e cultural, pela natureza do trabalho dos entrevistados na pesca artesanal (voltado para a obtenção de alimento) e pelo vínculo com o ambiente, característico de populações tradicionais. É esperado também uma influência positiva da ESEC no provimento de SE, pela preservação de uma área de manguezal e seus recursos associados. Nosso intuito é gerar subsídios para uma gestão mais participativa do ecossistema e consoante com os interesses da comunidade local. A identificação da percepção dos SE pode constituir a primeira etapa da construção de um processo de planejamento participativo.

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3.2 MATERIAIS E MÉTODOS 3.2.1 Área de estudo

A Bacia Hidrográfica do Rio Ratones (27° 26’ 04” e 27° 32’ 35” de latitude sul e 48° 25’ 04” e 48° 31’ 49” longitude oeste) está localizada à noroeste da Ilha de Santa Catarina (Figura 3). Ocupa uma área de aproximadamente 61 km2, a mais extensa bacia da Ilha de Santa Catarina, formada entre os morros da Barra do Sambaqui, o Morro do Forte, o Morro de Jurerê-Canasvieiras e os morros da Dorsal Norte da Ilha (Fusverk 2002). Abrange parcialmente ou integralmente os distritos de Cachoeira do Bom Jesus, Canasvieiras, Santo Antônio de Lisboa e Ratones, os quais juntos comportam aproximadamente 78.000 habitantes (Figueirôa & Scherer 2016).

Figura 3. Localização da Bacia Hidrográfica do Rio Ratones. Linha vermelha: delimitação da bacia do Rio Ratones. Área verde: Estação Ecológica de Carijós gleba Ratones. Linhas azuis: rede hidrográfica da Bacia do Rio Ratones.

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A área possui uma grande heterogeneidade de ambientes composta de balneários, manguezais, restingas, área urbana e uma considerável área rural, contribuindo para uma diversidade econômica e social desta região (Fusverk 2002). Seu principal curso fluvial, o rio Ratones, possui cerca de 10 km de extensão e 3m de largura em média (Silva 2005). Na desembocadura deste rio se localiza a Estação Ecológica de Carijós (ESEC), gleba Ratones.

A ESEC, criada pelo Decreto Federal 94.656 de 20/07/1987, tem como objetivo a preservação de importantes remanescentes de manguezal e ecossistemas associados na Ilha de Santa Catarina. Abrange duas áreas de manguezais à margem leste da Baía Norte, separadas geograficamente, o manguezal do Saco Grande e o de Ratones, com 0,93 km² e 6,25 km² respectivamente, totalizando 7,15 km² (IBAMA 2003). A ESEC é uma unidade de conservação federal, de proteção integral, gerenciada pelo Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade (ICMBIO). As duas áreas que deram origem a ESEC eram tradicionalmente utilizadas como pontos de pesca e principalmente como uma importante via de acesso ao mar para os pescadores das comunidades adjacentes. Até meados da década de 1950, o rio Ratones era utilizado para o escoamento agrícola, entrada de pescados e de outros produtos (David 2004). Após a implementação das restrições advindas da criação da ESEC, os pescadores da região sofreram privações de uso dos recursos do rio, como a proibição de pescar. Sem entenderem ao certo o motivo das proibições, diversos conflitos com a fiscalização (ICMBIO, Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais-IBAMA e Polícia Ambiental) e questionamentos sobre a efetividade da unidade de conservação surgiram nos anos que seguiram à sua criação (Instituto Carijós & IBAMA 2008). A histórica relação conflituosa da ESEC com a comunidade de pescadores reduziu sua aceitação e vem limitando a atuação da Unidade no desenvolvimento sustentável da região (Instituto Carijós & IBAMA 2008).

Esta Bacia possui um histórico de intervenções antrópicas: além das alterações sofridas com os desmatamentos e o despejo de efluentes domésticos e agrícolas, a planície foi intensamente modificada pelas obras de drenagem realizadas pelo extinto Departamento Nacional de Obras de Saneamento (DNOS), na década de 1950. Estas obras contemplaram a construção de diversos canais de drenagem e comportas para impedir o avanço da maré.

Todo este processo modificou não só esse ambiente, mas o modo de vida de todos que interagiam e dependiam dele, em especial a

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comunidade de pescadores locais (Fidélis 1998). Atualmente os pescadores que utilizam a Bacia residem em bairros com diferentes graus de urbanização e de possibilidades de acesso ao ambiente marinho. Muitos deles possuem outras fontes de renda além da pesca artesanal, no entanto ainda são os principais usuários diretos dos recursos naturais fornecidos pela Bacia.

3.2.2 Coleta de dados

Nossa pesquisa combinou métodos qualitativos e quantitativos, partindo de uma revisão bibliográfica sobre serviços ecossistêmicos, para então efetuar entrevistas semi-estruturadas com pescadores artesanais locais. Esta pesquisa foi aprovada pelo Comitê de Ética em Pesquisa com seres Humanos da Universidade Federal de Santa Catarina (52308116.9.0000.0121 de 20/06/2016). A participação dos informantes foi condicional às suas anuências prévias.

A revisão bibliográfica foi utilizada como fase preparatóriaparaas entrevistas, quando levantamos uma gama de SE potenciais providos pela área através de bibliografia especializada (Costanza et al. 1997; MEA 2005; Raymond et al. 2009; Fisher et al. 2009; Fish 2016b). Desenvolvemos o questionário utilizado nas entrevistas de forma a possibilitar a expressão desses serviços através de perguntas envolvendo as fontes potencialmente provedoras de SE (Tabela 1).

Realizamos 52 entrevistas semi-estruturadas com pescadores provenientes de sete localidades pertencentes ou adjacentes à bacia hidrográfica do rio Ratones. Dividimos a área de estudo em localidades do interior: Ratones, Vargem Pequena e Barra do Sambaqui; e localidades do litoral: Sambaqui, Jurerê, Forte e Daniela. Os pescadores foram identificados pela técnica bola de neve (Albuquerque et al. 2010), iniciada nas comunidades de Ratones e Sambaqui. Os requisitos para a participação na pesquisa eram ser pescador ativo e ter no mínimo 20 anos de pesca local. Estes critérios foram definidos com o intuito de selecionar pescadores que potencialmente possuem conhecimentos ecológicos sobre a região.

Ao todo foram 51 homens e uma mulher entrevistados individualmente e cada entrevista teve duração de uma a duas horas. Houve três recusas às entrevistas e dois pescadores que não puderam ser encontrados. Os entrevistados foram subdivididos pela localidade de moradia, como descrito acima e também em relação a pesca: como estritamente dependente ou não da atividade pesqueira.

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Para o registro da percepção dos serviços ecossistêmicos pelos pescadores, as questões da entrevista foram divididas por tópicos pré definidos: bairro, pesca, manguezal, rio Ratones, mata de encosta, fauna nativa e ESEC (tabela 1). Neste trabalho chamamos estes tópicos de Fonte, em alusão à ideia de fontes provedoras de serviços e benefícios do ecossistema.

Tabela 1: Sumário do questionário utilizado nas entrevistas realizadas

com os pescadores da Bacia Hidrográfica do Rio Ratones.

Categorias Questões Caracterização do

entrevistado

Nome, local e tempo de moradia, idade, tempo de pesca, locais de pesca, fonte de renda

Percepção de serviços

ecossistêmicos

Gosta de viver no seu bairro, gosta que sua família more aqui? Por quê?

O que a pesca significa / qual a importância para você e para a sua vida?

Para você qual a importância / para que serve / quais são os benefícios do:

 manguezal,  rio Ratones,  mata de encosta  fauna nativa

O que você pesca / coleta/utiliza / da natureza aqui na área da bacia do rio Ratones?

A ESEC afeta a oferta desses recursos utilizados?

Percepções sobre a ESEC

Em sua opinião, qual a importância / para que serve a ESEC?

Acha que a ESEC está cumprindo com sua finalidade? Por quê?

Se não existisse a ESEC, como você acha que seria esse lugar?

Fonte: Elaboração própria

O questionário focou na livre expressão dos entrevistados através de perguntas abertas. Intencionalmente não adotamos os termos que se referem aos nomes dos serviços e às suas categorias e inicialmente evitamos a metáfora de produção de serviços pela natureza. A intenção desta abordagem foi dar voz a atores cuja linguagem pode não ser

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capturada por ferramentas específicas (Klain et al. 2014; Asah et al. 2014; Jacobs et al. 2016). A mesma pergunta, dependendo da necessidade, era reformulada. Por exemplo, a pergunta: “Para você qual é a importância do manguezal?” poderia ser reformulada para: “Qual é a função ou para que serve o manguezal?”. Também perguntávamos o que mudaria na ausência daquela fonte: “Sem o manguezal, o que mudaria?” Muitas vezes a falta de uma fonte provedora de serviços facilitou a cognição do serviço percebido associado a ela. A coleta de dados foi realizada entre os meses de fevereiro e maio de 2017.

3.2.3 Análise dos dados

Para identificar e caracterizar os serviços ecossistêmicos percebidos na bacia do rio Ratones pelos pescadores utilizamos análise descritiva e frequência de resposta dos serviços percebidos obtidos. Para tal, foi feita uma matriz de presença e ausência dos serviços por entrevistado, desconsiderando os SE repetidos na mesma entrevista. A lista de serviços ecossistêmicos compilada na revisão bibliográfica serviu de guia para a análise de conteúdo das entrevistas (Bernard & Ryan 2010), na identificação e caracterização dos serviços ecossistêmicos percebidos pelos entrevistados. Na ausência de serviço correspondente na literatura, uma nova categoria de serviço foi criada.

Para a análise da relação entre “Fonte” e “Serviço Ecossistêmico” foram consideradas as citações de serviço repetidas pelo mesmo entrevistado nas diferentes fontes. Por exemplo, o mesmo entrevistado citou provisão de hábitat nas fontes manguezal e rio Ratones. Na análise da frequência de serviços citados, este serviço foi contabilizado como presente para aquele entrevistado (uma presença). Para a análise de serviços por fonte, este serviço foi contabilizado como presente em ambas as fontes (duas presenças). Para ilustrar as ligações dos SE com as fontes provedoras, fizemos uma análise de redes ecológicas, utilizando o pacote “Alluvial”. Restringimos esta análise aos SE percebidos por pelo menos 6 pescadores por fonte (n=52). Esta análise foi executada no ambiente de programação R (R Core Team 2015).

Investigamos também se as características individuais como local de moradia, idade e fonte de renda (estritamente da pesca ou não) afetavam a percepção dos pescadores sobre os serviços ecossistêmicos (SE). Para testar a colinearidade entre as variáveis explanatórias foi utilizado a função “vif” do pacote “car”. Para tal fizemos duas análises: (1) um modelo generalizado linear (GLM) com distribuição binomial

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(função de ligação “logit”) para entender se variáveis individuais afetavam a capacidade do pescador perceber mais ou menos SE, dentro do total de serviços percebidos (dados de proporção), e (2) um GLM multivariado com distribuição binomial (função de ligação “cloglog”) para entender se as variáveis individuais afetavam a composição desses SE percebidos pelos pescadores. A seleção de modelos foi feita utilizando o Critério de Informação de Akaike (AIC) mais parcimonioso através da função “model.sel” do pacote “MuMIn”. A validação do modelo multivariado foi feita a partir da análise gráfica dos desvios do resíduo do modelo pelos valores preditos e do gráfico Normal Q-Q. Restringimos estas análises aos SE percebidos por pelo menos 10 pescadores (n=52). Todas as análises foram executadas no ambiente de programação R (R Core Team 2015). Após encontrar modelos com os valores mais baixos de AIC, foram consideradas etapas adicionais de simplificação do modelo considerando ΔAIC < 4 (Bolker 2008).

Para investigar o papel da ESEC na provisão dos serviços ecossistêmicos inicialmente efetuamos uma análise descritiva da frequência dos serviços ecossistêmicos citados diretamente e indiretamente como providos pela ESEC. A seguir, efetuamos uma análise descritiva e frequência das respostas de percepção da ESEC, divididas em percepções positivas e negativas potencialmente provedoras ou supressoras de serviços, respectivamente.

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3.3 RESULTADOS

Apresentamos os resultados desta pesquisa divididos em tópicos, iniciando com uma breve explanação da condição atual de ofício dos pescadores entrevistados. A seguir apresentamos os SE percebidos e as principais características atribuídas a estes serviços e às fontes provedoras desses serviços. São exploradas as características individuais dos entrevistados como fator de mudança na quantidade e composição dos serviços percebidos e, por fim, as percepções do papel da ESEC no provimento de serviços.

3.3.1 Os pescadores

O conceito pescador artesanal não foi o mesmo entre as localidades, diferenciando aqueles dos bairros sem litoral (Ratones, Barra do Sambaqui e Vargem Pequena) dos bairros com litoral, às margens da Baia Norte (Jurerê, Forte, Daniela e Sambaqui). No caso dos bairros sem litoral, de pesca predominantemente estuarina, os pescadores têm na pesca um complemento de renda e/ou uma atividade praticada no tempo livre. Já nos bairros com litoral, pescador é aquele que realiza a pesca assiduamente e, em muitos casos, os que dependem prioritariamente dessa atividade como fonte de renda.

Foram entrevistados 26 pescadores nos bairros sem litoral e 26 nos bairros com litoral. Apenas quatro vivem estritamente da pesca nos bairros sem litoral e 15 nos bairros com litoral. A idade média dos pescadores do interior foi de 57 anos (± 8 anos) e o tempo de pesca médio foi de 44 anos (± 12 anos). A idade média dos pescadores do litoral foi de 52 anos (± 14 anos) e o tempo de pesca médio foi de 42 anos (± 14 anos).

O acesso ao mar do bairros sem litoral se dá pelo rio Ratones e pelo rio Veríssimo, e tem no seu caminho a ESEC Carijós. Todos os rios da Bacia se encontram assoreados, com pouca profundidade para a navegação, sendo que alguns trechos ficam impossibilitados de navegação na maré baixa, principalmente nos meandros do leito original. No caso da comunidade de Ratones e Vargem Pequena esta dificuldade é agravada pela parte restante de uma comporta localizada na área limítrofe com a ESEC Carijós, que impossibilita a passagem de embarcações maiores (por exemplo, barcos de pesca maiores do que canoas). Os poucos entrevistados que tem a pesca como sustento nessas

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localidades, guardam suas embarcações fora do seu bairro de moradia, nas praias.

3.3.2 Serviços ecossistêmicos percebidos

Através da análise de conteúdoforam identificados 28 serviços ecossistêmicos através de 421 citações, divididos em quatro categorias de acordo com MEA (2005): dez serviços culturais; seis de provisão; três de suporte e nove de regulação (tabela 2). A média de SE percebidos por entrevistado foi de 8,10 (±2,75).

Tabela 2: Identificação e caracterização de 28 serviços ecossistêmicos providos pela Bacia Hidrográfica do Rio Ratones, de acordo com a percepção de 52 pescadores locais.

Serviços ecossistêmicos

Caracterização geral segundo os entrevistados com exemplos de trechos de entrevistas (entre aspas, com os assuntos aos quais se referiam entre parênteses)

Serviços culturais

Lazer

Passear; observar; “é uma maneira de desestressar do mundo de hoje” (pesca) Valor estético

Ver a beleza da natureza; beleza do rio; a beleza da mata

Valor espiritual e religioso

A mata como lugar para meditar; “é onde me conecto com Deus” (mata)

Modo de vida tradicional

A pesca é a vida; “está enraizado em mim” (pesca)

Herança intrínseca e de existência

“É importante porque é da natureza, é um ser vivo” (fauna);

Bem-estar, inspiração

“É o que me deixa feliz, é uma alegria amanhecer o dia pescando”

Senso de localização

O bairro é a minha comunidade; o bairro é o meu lar"

Sistemas de conhecimento

“Ele fala para nós o que vai acontecer durante o ano” (mangue)

Relação social

“Aqui tenho meus amigos, paz e trabalho” (bairro)

Herança cultural

“Minha comunidade continua na tradição” (bairro)

Serviços de provisão

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Medicina, fármacos Ervas medicinais;chá Combustíveis Lenha para o fogão

Água pura Água da cachoeira para beber Fonte de renda Pesca é o sustento; ajuda na renda Ar puro

“É fresco, tem um ar diferente do que na cidade” (mata)

Serviços de suporte

Produção de oxigênio

O manguezal e a mata são produtores de oxigênio; “a mata faz o ar”

Provisão de hábitats

O mangue e as matas são a casa dos bichos; o mangue é o criadouro de todos os peixes Dispersão de

sementes “Eles que plantam a mata” (fauna)

Serviços de regulação

Controle biológico

“Um come o outro e mantém o equilíbrio da mata” (fauna)

Regulação da qualidade do ar

A mata mantém o ar limpo; a mata purifica o ar

Regulação da qualidade do solo

A mata protege o solo; “o solo fica bom com as árvores”

Regulação da água

A mata faz a manutenção da água do morro; a mata mantém a água da nascente

Regulação climática

O mangue e a mata controlam o calor; sem a mata esquenta o ambiente

Purificação da água, controle de poluição

O mangue é o filtro; “é a esponja filtradora que impede do esgoto chegar in natura no rio” (mangue)

Retenção de sedimentos e transporte

A mata mantém o leito do rio (mata); “segura a terra para não desbarrancar” (mata)

Regulação de

enchentes O rio serve para dar vazão às águas do morro Mitigação de danos

naturais

As árvores da mata seguram o vento;o mangue ameniza os impactos das ondas Fonte: Elaboração própria

A categoria mais citada foi a de serviços culturais com 39% das citações, seguido de serviços de regulação com 28%, serviços de suporte com 19% e serviços de provisão com 14% das citações. Os serviços de

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provisão de hábitats, provisão de alimentos e bem-estar foram citados por mais de 60% dos entrevistados (Figura 4).

Figura 4. Serviços ecossistêmicos citados por mais de 10% dos pescadores (N=52). Barra vermelha indica serviços de provisão, barra preta serviços de suporte, barra branca serviços culturais e barra cinza serviços de regulação.

Fonte: Elaboração própria

3.3.3 Fontes provedoras de serviços

Para esta análise consideramos 558 citações dos 28 SE percebidos nas diferentes fontes provedoras. Os SE percebidos nas fontes bairro de moradia e pesca foram restritos as categorias de SE culturais e de provisão (Figura 5). O bairro foi relacionado a sete SE culturais e quatro SE de provisão. Os serviços de senso de localização e relação social foram os mais citados (Figura 6): “Minha comunidade ainda tem paz, costumes antigos preservados. Mantém a família unida” (entrevistado 3, 55 anos). A idéia do bairro como lugar calmo e bom de

0% 20% 40% 60% 80% 100%

regulação de enchentes mitigação de danos naturais herença intrínseca e de existência produção de oxigênio regulação da qualidade do ar lazer herança cultural purificação da agua e controle de …

dispersão de sementes da mata fonte e/ou complemento de renda senso de localização valor estético relação social regulação da agua retenção de sedimentos e transporte modo de vida tradicional controle biológico bem estar, inspiração alimentos provisão de habitats 39 % 28 % 19 % 14 % cultural regulação suporte provisão

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viver foi unânime nas entrevistas, considerada como uma condição temporária, que irá passar: “Ainda é bom de viver” (entrevistado 11, 66 anos).

A pesca foi relacionada a sete SE culturais e dois SE de provisão, principalmente pelos serviços de bem-estar e modo de vida tradicional, e secundariamente aos serviços de provisão de alimento e fonte de renda. O serviço modo de vida tradicional refere-se principalmente à dependência da atividade de pesca para a felicidade e ânimo de vida, descrito com mais profundidade do que o serviço de bem-estar e inspiração: “O dia que não vou para o mar fico doente, fico nervoso, enlouqueço longe dele” (entrevistado 47, 67 anos).

Figura 5: Número de serviços ecossistêmicos pelas fontes provedoras (n=28 SE, a partir de 52 entrevistas com pescadores)

A fauna nativa foi relacionada a seis SE, sendo o serviço de controle biológico, da categoria de regulação, o mais frequente (Figura 6). Também foi considerada como parte da mata em uma relação de dependência recíproca: “Sem bicho não tem mata, um precisa do outro para continuar a natureza” (entrevistado 41, 73 anos). A fauna foi a principal fonte provedora do serviço cultural herança intrínseca e de existência: “Cada bicho tem a sua função, plantar o arvoredo. Todos têm, a gente é que não sabe” (entrevistado 37, 63 anos).

0 5 10 15 20 25 n ° ser vi ço s e co ssi stê m ic o s suporte provisão regulação culturais

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Figura 6: Representação de uma rede bipartida dos serviços ecossistêmicos citados por mais de 5 entrevistados por fonte, conectados as respectivas fontes provedoras (n=558 citações de 28 SE, a partir de 52 entrevistas com pescadores). ESEC = Estação Ecológica de Carijós

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A mata de encosta, o manguezal, o rio Ratones e a ESEC foram relacionados às quatro categorias de SE. A mata de encosta foi percebida como provedora de 21SE, a fonte provedora com mais SE associados, principalmente de regulação (nove SE), como regulação de água e retenção de sedimentos e transporte. Secundariamente foram mencionados serviços de suporte, principalmente pela provisão de hábitats e produção de oxigênio. A mata de encosta também foi considerada como a responsável pela manutenção de outras fontes, como o rio Ratones, a fauna nativa e o bairro como um bom lugar de se morar.

O manguezal, relacionado a 13 SE, o rio Ratones, relacionado a 12 SE, e a ESEC, relacionada a cinco SE, foram percebidos como provedores de hábitats, principalmente. O manguezal foi a fonte mais relacionada a este serviço, representado 41% do total de citações deste serviço (n=114). “É oberçário de tudo, vida marinha e outros animais” (entrevistado 5, 52 anos). A segunda categoria mais expressiva para o manguezal foi a de serviços de regulação, enquanto que para o rio Ratones foi a de serviços culturais, sendo relacionado a sete SE dessa categoria, como lazer e senso de localização.

A ESEC foi percebida provedora de hábitat, principalmente e de alimento. Outros serviços foram purificação de água, controle de poluição, regulação da qualidade do ar e valor estético. Apesar da ESEC contemplar grande parte do manguezal da Bacia Hidrográfica do rio Ratones e o baixo curso do rio Ratones, esta foi a fonte com o menor número de SE relacionado e também com o menor número de citações de serviços (36).

3.3.4 O que interfere na percepção dos pescadores sobre SE?

Exploramos se as variáveis individuais de idade, local de moradia e fonte de renda afetam a capacidade dos pescadores perceberem mais serviços ecossistêmicos providos pela Bacia Hidrográfica do rio Ratones. O modelo binomial de proporção mostra que não existe relação entre variáveis individuais e a quantidade de serviços ecossistêmicos percebidos (Tabela 3).

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Tabela 3: Resultado do GLM para diferenças na quantidade de serviços ecossistêmicos percebidos por pescadores em função do local de moradia, idade e renda (n-1 = graus de liberdade; ∆AIC = diferença entre o AIC dos modelos)

Modelo Idade Local Renda n-1 AIC ∆AIC R2 Percepção ~ Idade + Local + Renda -0.007 0.11 -0.01 4 217.7 3.76 4.95 Percepção ~ Idade+ Local -0.007 0.11 - 3 215.7 1.77 4.28 Percepção ~ Idade -0.005 - - 2 214.6 0.65 7.08 Percepção ~ 1 - - - 1 214.0 0 -

Fonte: Elaboração própria

Quanto à composição dos serviços ecossistêmicos percebidos, exploramos se as variáveis individuais de idade, local de moradia e fonte de renda dos pescadores exerceram influência no resultado encontrado. O modelo multivariado binomial mostra que existe relação entre a variável individual local de moradia e a composição dos serviços ecossistêmicos percebidos. O modelo selecionado foi o 3 (Tabela 4; Composição ~ Local) de acordo com o baixo valor de AIC apresentado pelo modelo. Dessa forma, podemos afirmar que há diferença na composição dos serviços ecossistêmicos percebidos entre pescadores que moram no litoral e no interior.

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Tabela 4: Resultado do GLM multivariado binomial para diferenças na composição dos serviços ecossistêmicos percebidos pelos pescadores em função do local de moradia, idade e renda (ns = não significativo; n-1 = graus de liberdade; LR = teste de verossimilhança; ∑AIC = somatório do AIC; ∆AIC = diferença entre o AIC dos modelos)

Modelo Local Rend

a Idade n-1 LR p-valor ∑AIC ∆AIC Composição ~ Local + Renda + Idade 27.81 21.56 20.92 4 75.83 ns 1199.09 15.07 Composição ~ Local + Renda 26.94 21.97 - 3 54.9 0.05 1184.02 14.03 Composição ~ Local 32.92 - - 2 32.93 0.037 1169.99 3.07 Composição ~ 1 - - - 1 - - 1166.92 0

Fonte: Elaboração própria

Esta diferença está nos serviços culturais de valor estético (F=2.475; p-valor =0.012), modo de vida tradicional (F=2.444; p-valor =0.02) e no serviço de suporte de provisão de hábitat (F=0.063; p-valor < 0.001); ou seja, pescadores que moram no litoral apresentam uma percepção desses serviços diferente dos moradores que moram no interior (Anexo A). Os moradores que residem no litoral percebem mais serviços de modo de vida tradicional e provisão de hábitat e menos serviço cultural de valor estético do que os moradores do interior. Pescadores do interior citaram o valor estético em todas as fontes, com exceção da pesca. Para os pescadores do litoral, este serviço foi percebido apenas nas fontes mata de encosta, rio Ratones e fauna. O modo de vida tradicional, mais percebido pelos pescadores do litoral, foi fortemente relacionado à pesca, mas também pelas fontes bairro e mangue. Para os pescadores do interior, além dessas fontes esse serviço também foi percebido na mata de encosta e no rio Ratones.

3.3.5 O papel da área protegida no provimento de SE

As perguntas referentes aos serviços providos pela ESEC resultaram em percepções sobre a unidade que não puderam ser

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