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DISSERTAÇÃO_Gestão Social na Bacia do Alto Rio Grande/MG: Um Estudo na Unidade de Planejamento e Gestão de Recursos Hídricos GD1

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GIORDANO BRUNO RIBEIRO DA SILVA

GESTÃO SOCIAL NA BACIA DO ALTO RIO GRANDE/MG:

UM ESTUDO NA UNIDADE DE PLANEJAMENTO E GESTÃO

DE RECURSOS HÍDRICOS GD1

LAVRAS –MG

2017

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GIORDANO BRUNO RIBEIRO DA SILVA

GESTÃO SOCIAL NA BACIA DO ALTO RIO GRANDE/MG: UM ESTUDO NA UNIDADE DE PLANEJAMENTO E GESTÃO DE RECURSOS HÍDRICOS GD1

Dissertação apresentada à Universidade Federal de Lavras como parte das exigências do curso de Pós-Graduação Stricto Sensu de Mestrado Profissional em Administração Pública, na área de concentração em Gestão de Organizações Públicas, para a obtenção do título de Mestre.

Dr. José de Arimatéia Dias Valadão Orientador

LAVRAS - MG 2017

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Ficha catalográfica elaborada pelo Sistema de Geração de Ficha Catalográfica da Biblioteca Universitária da UFLA, com dados informados pelo(a) próprio(a) autor(a).

Silva, Giordano Bruno Ribeiro da.

Gestão social na bacia do Alto Rio Grande/MG: um estudo na unidade de planejamento e gestão de recursos hídricos GDI. / Giordano Bruno Ribeiro da Silva. - 2017.

87 p. : il.

Orientador(a): José de Arimatéia Dias Valadão. .

Dissertação (mestrado profissional) - Universidade Federal de Lavras, 2017.

Bibliografia.

1. Gestão. 2. Cidadania Deliberativa. 3. Bacia Hidrográfica. I. Valadão, José de Arimatéia Dias. . II. Título.

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GIORDANO BRUNO RIBEIRO DA SILVA

GESTÃO SOCIAL NA BACIA DO ALTO RIO GRANDE/MG: UM ESTUDO NA UNIDADE DE PLANEJAMENTO E GESTÃO DE RECURSOS HÍDRICOS GD1

Dissertação apresentada à Universidade Federal de Lavras como parte das exigências do curso de Pós-Graduação Stricto Sensu de Mestrado Profissional em Administração Pública, na área de concentração em Gestão de Organizações Públicas, para a obtenção do título de Mestre.

APROVADA EM: 26 de junho de 2017 Dr. Airton Cardoso Cançado UFT Dra. Daniela Meirelles Andrade UFLA Dr. José Roberto Pereira UFLA

Dr. José de Arimatéia Dias Valadão Orientador

LAVRAS - MG 2017

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À minha esposa, Roberta, e aos meus filhos, André Gustavo e Gabriel. DEDICO!

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AGRADECIMENTOS

A Deus, por iluminar meus caminhos e minha vida.

Aos meus pais, João Ribeiro e Sônia Regina, pelos ensinamentos nos caminhos cristãos, de amor e solidariedade.

À minha irmã Gilmara Regina, companheira de todas horas tristes e alegres.

Ao professor e orientador, Dr. José Arimatéia, pelos ensinamentos e dedicação para realização desse estudo.

Aos integrantes da banca examinadora, professores: Dr. Airton Cardoso Cançado, Dr. José Roberto Pereira e Dra. Daniella Meirelles Andrade, pela presença e contribuições, especialmente, as que permitiram as mudanças significativas na minha dissertação.

Aos colegas da COPASA, pelo convívio diário, amizade e companheirismo.

Aos amigos da turma, especialmente, a colega Karine Tinoco, sempre atenciosa, companheira e incentivadora. Ao Valderí de Castro Alcântara e André Spuri Garcia, sempre amigos e incentivadores para o êxito deste estudo. Suas contribuições, nessa nova etapa da dissertação, foram muito importantes.

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A água potável limpa, segura e adequada é vital para a sobrevivência de todos os organismos vivos e para o funcionamento dos ecossistemas, comunidades e economias. Mas a qualidade da água em todo o mundo é cada vez mais ameaçada à medida que as populações humanas crescem, atividades agrícolas e industriais se expandem e as mudanças climáticas ameaçam alterar o ciclo hidrológico global.

Há uma necessidade urgente para a comunidade global – setores público e privado – de unir-se para assumir o desafio de proteger e melhorar a qualidade da água nos nossos rios, lagos, aquíferos e torneiras.

(Declaração da “ONU Água” para o Dia Mundial da Água 2010).

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RESUMO

O objetivo do presente trabalho foi compreender como ocorre a gestão da água na Bacia Hidrográfica do Alto Rio Grande – GD1, Minas Gerais. Especificamente: (1) reconstituir a trajetória histórica da Bacia Hidrográfica do Alto Rio Grande – GD1, Minas Gerais; e (2) com base nos critérios de cidadania deliberativa a gestão da Bacia Hidrográfica do Alto Rio Grande – GD1, Minas Gerais. Na fundamentação teórica, foram utilizados estudos sobre gestão social, cidadania deliberativa e suas categorias. A coleta dos dados foi de natureza qualitativa por meio de pesquisa documental e entrevistas semiestruturadas. As entrevistas foram realizadas com 12 conselheiros abrangendo Poder Público, Usuários e Sociedade Civil. A interpretação foi baseada nas categorias e critérios de avaliação da cidadania deliberativa desenvolvidos por Tenório et al. (2008). Constatamos que no CBH-GD1 ainda existem poucos avanços no que se refere a um processo realmente participativo, inclusivo, igualitário, deliberativo e que busca o bem comum, portanto, pouco avanço no sentido da cidadania deliberativa. Percebemos ainda presença assimétrica de interesses econômicos e do interesse estatal que ainda assumem uma relação de “cima para baixo”. Ao final do estudo, foi possível compreender, a partir dos atores estudados no CBH-DG1, que a gestão dos recursos hídricos ocorre com a predominância de elementos da gestão estratégica.

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ABSTRACT

The objective of this work was to understand how water management occurs in the Upper Rio Grande Hidrografic Basin - GD1, Minas Gerais. Specifically: (1) to reconstruct the historical trajectory of the Upper Rio Grande Hidrografic Basin - GD1, Minas Gerais; And (2) based on the deliberative citizenship criteria for the management of the Upper Rio Grande Hidrografic Basin- GD1, Minas Gerais. In the theoretical basis, studies on social management, deliberative citizenship and their categories were used. The data collection was qualitative in nature through documentary research and semi-structured interviews. The interviews were carried out with 12 advisers covering Public Power, Users and Civil Society. The interpretation was based on the categories and criteria of evaluation of deliberative citizenship developed by Tenório et al. (2008). We note that there are still few advances in CBH-GD1 regarding a truly participative, including egalitarian, deliberative process that seeks the common good, and therefore little progress towards deliberative citizenship. We also perceive an asymmetric presence of economic interests and state interest that still assume a top-down relationship. At the end of the study, it was possible to understand, from the actors studied in CBH-DG, that the management of water resources occurs with the predominance of elements of strategic management.

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LISTA DE FIGURAS

Figura 1 - Matriz institucional do SINGREH. ... 26

Figura 2 - Evolução da criação de comitês de bacias hidrográficas no Brasil no período de 1988 a 2010. ... 27

Figura 3 - Relações entre Estado, Sociedade e Mercado ... 34

Figura 4 - Categorias da cidadania deliberativa. ... 42

Figura 5 - Bacia do Alto Rio Grande. ... 44

Figura 6 - Atores e órgãos envolvidos. ... 57

Figura 7 - Fotos de reunião pública (Madre Deus de Minas). ... 61

(11)

LISTA DE QUADROS

Quadro 1 - Evolução da criação dos comitês de bacia hidrográfica. ... 25

Quadro 2 - Critérios de análise da cidadania deliberativa. ... 37

Quadro 3 - destaca os atores incialmente identificados ... 45

Quadro 4 - Atores entrevistados. ... 46

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LISTA DE SIGLAS E ABREVIATURAS

ANA Agência Nacional de Águas APPS Áreas de preservação permanentes ARPA Agência Regional de Proteção Ambiental BHRG Bacia Hidrográfica do Rio Grande CBH Comitê de Bacia Hidrográfica

CEMIG Companhia Energética de Minas Gerais CERH Conselho Estadual de Recursos Hídricos

COPASA Companhia de Saneamento de Água de Minas Gerais

FHIDRO Fundo de Recuperação, Proteção e Desenvolvimento Sustentável das Bacias Hidrográficas do Estado de Minas Gerais

GS Gestão Social

IGAM Instituto Mineiro de Gestão das Águas

InfoHidro Sistema Estadual de Informações sobre Recursos Hídricos ONG Organização não governamental

ONU Organização das Nações Unidas PMMG Polícia Militar de Minas Gerais PNRH Plano Nacional de Recursos Hídricos

SEGRH Sistema de Gerenciamento de Recursos Hídricos

SEMAD Secretaria de Estado de Meio Ambiente e Desenvolvimento Sustentável SINGREH Sistema Nacional de Gerenciamento de Recursos Hídricos

UFLA Universidade Federal de Lavras

UGRH Unidade de Gerenciamento de Recursos Hídricos

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SUMÁRIO 1 INTRODUÇÃO ... 15 1.1 Objetivos ... 18 1.1.1 Objetivo geral ... 18 1.1.2 Objetivos específicos ... 18 1.2 Justificativa e relevância ... 18 1.3 Estrutura do estudo ... 22

2 O CONTEXTO DAS BACIAS HIDROGRÁFICAS ... 23

2.1 Bacias hidrográficas e gestão dos recursos hídricos em bacias hidrográficas ... 23

2.2 Comitês de Bacias Hidrográficas no Brasil na gestão das águas ... 25

2.3 A Bacia Hidrográfica do Alto Rio Grande (BHRG) ... 28

2.3.1 Bacia Hidrográfica do GD1 ... 29

3 GESTÃO SOCIAL ... 31

3.1 Gestão social ... 31

3.2 Cidadania deliberativa ... 35

3.2.1 Categorias e critérios da cidadania deliberativa ... 38

4 PROCEDIMENTOS METODOLÓGICOS ... 43

4.1 Natureza da Pesquisa ... 43

4.2 Locus de estudo ... 43

4.3 Coleta de Dados ... 44

4.4 Interpretação dos dados... 47

5 RESULTADOS E DISCUSSÃO ... 49

5.1 Estudo da Cidadania Deliberativa no CBH-GD1 ... 49

5.1.1 Categoria 1: Processo de discussão ... 49

5.1.2 Categoria 2: Inclusão ... 60

5.1.3 Categoria 3: Pluralismo ... 63

5.1.4 Categoria 4: Igualdade participativa ... 66

5.1.5 Categoria 5: Autonomia... 69

5.1.6 Categoria 6: Bem Comum ... 72

6 CONSIDERAÇÕES FINAIS ... 76

REFERÊNCIAS ... 81

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1 INTRODUÇÃO

A água é uma necessidade humana e direito de todo cidadão (BRASIL, 1988; 1997). Porém, as reservas mundiais de água vêm se deparando, cada vez mais, com contínuas demandas crescentes em razão da expansão populacional, das atividades econômicas, entre outros. Aliada, tanto à falta de conscientização quanto ao uso desse bem comum, o Brasil passou por uma crise hídrica causada pela escassez de água, ausência de chuvas em várias regiões e distribuição inadequada em reservatórios das cidades. As mudanças climáticas têm interferido negativamente no ciclo hidrológico, principalmente pela redução da infiltração das águas no solo, causando a seca de nascentes (CORREA-MACANA; COMIM, 2013).

A necessidade de disponibilizar água tornou-se uma preocupação, bem como cresceu o valor e a necessidade de conscientização quanto ao consumo adequado desse bem comum: “A ampla repercussão da crise de abastecimento de água no Sudeste brasileiro, ocorrida no verão de 2014-2015, expressa muitas questões subjacentes à gestão de águas” (RIO; DRUMMOND; RIBEIRO, 2016, p. 105). Das diversas formas que existem para planejar e gerir o acesso dos cidadãos às águas, uma delas são as bacias hidrográficas. Para Belli Filho et al. (2014, p. 15) “[...] compreender as águas de uma bacia hidrográfica como um bem público e escasso vem se constituindo o grande desafio para os atores sociais envolvidos no processo de gestão, sejam eles técnicos, governantes, usuários ou sociedade civil organizada”.

A chamada para a multiplicidade de atores envolvidos nas bacias hidrográficas, suas relações e a necessidade de coordenação democrática destes indica, inicialmente, a importância que será estabelecida nessa dissertação da gestão social de recursos hídricos (com ênfase na gestão social de bacias hidrográficas), e, de forma mais ampla, de uma gestão social das águas, como coloca Cruz (2017) ao tratar, em outro contexto, de águas minerais.

A necessidade de uma gestão social de recursos hídricos é coerente com o entendimento da gestão social a partir de elementos como gestão dialógica, busca do bem comum e do interesse público não estatal (TENÓRIO, 1998; 2005; CANÇADO; PEREIRA; TENÓRIO, 2013; GARCIA, 2016).

A realidade vivida, nesta crise hídrica, também se evidencia em relação aos impactos negativos na microrregião de Lavras, Minas Gerais, alimentada pela Bacia do Alto Rio Grande (GD1). Entre as atividades que causam impactos ressaltam-se, conforme Côrtes, Torrente e Pinto (2015), o crescimento populacional e do agronegócio, destruindo áreas de preservação permanentes (APPs), desmatamento e aumento do uso insustentável das águas.

(15)

Dentre as preocupações com a regulação do uso da água, nessa microrregião, estão as ações voltadas para a Bacia Hidrográfica do Rio Grande. Criado pelo Decreto nº. 44.432, de 04 de janeiro de 2007, o Comitê da Bacia Hidrográfica dos Afluentes Mineiros do Alto Rio Grande estabeleceu, em seu artigo 1, que deverá ser promovida a “gestão dos recursos hídricos e as ações de sua competência, em consonância com a gestão ambiental, considerando a totalidade da unidade de planejamento e gestão do GD1” (BRASIL, 2007).

De forma geral, a gestão dos recursos hídricos, em Minas Gerais, é administrada pela Política Estadual de Recursos Hídricos (Lei 13.199/199), a qual objetiva garantir o controle, pelos presentes e futuros usuários, da utilização da água e de consumo em volume, qualidade e regras adequadas. Para sustentar e guiar a atuação do Sistema de Gerenciamento de Recursos Hídricos, há diversos instrumentos de gestão que se classificam em: o Plano Estadual de Recursos Hídricos; os Planos Diretores de Recursos Hídricos de Bacias Hidrográficas; o Sistema Estadual de Informações sobre Recursos Hídricos (InfoHidro); a integração dos corpos de água em classes, conforme sua utilização predominantes; o cadastro de usos e usuários de recursos hídricos, a fiscalização da água, a concessão dos direitos de uso de recursos hídricos; a arrecadação pela utilização de recursos hídricos, entre outros.

O Sistema de Gerenciamento de Recursos Hídricos (SEGRH) foi determinado pela Lei nº. 13.199, de 29 de janeiro de 1999. Em sua composição, encontra-se a Secretaria de Estado de Meio Ambiente e Desenvolvimento Sustentável (SEMAD), o Conselho Estadual de Recursos Hídricos (CERH-MG), o Instituto Mineiro de Gestão das Águas (IGAM), os comitês de bacia hidrográfica, os órgãos e as associações dos poderes estadual e municipal (cujas funções estejam associadas à administração de recursos hídricos) e as agências de bacias hidrográficas.

Um dos integrantes do SEGRH, os Comitês de Bacias Hidrográficas (CBHs), são o alicerce da gestão participativa e descentralizada dos recursos hídricos brasileiros. Nesses comitês, o Poder Público (municipal e estadual), os usuários de água (indústria, mineração, entre outros) e a sociedade civil debatem, negociam e tomam decisões quanto à gestão regional das águas, usando instrumentos técnicos de gestão, de negociação de conflitos e da promoção dos diversos usos da água (IGAM, 2016). Portanto, as Bacias Hidrográficas (CBHs) apresentam em sua constituição elementos defendidos pela gestão social, tais como: envolvimento e participação de atores do Estado, empresas e sociedade civil (TENÓRIO, 1998; 2005; CANÇADO; PEREIRA; TENÓRIO, 2013; GARCIA, 2016). Cabe nota que as denominações usuários (incluindo as empresas), Poder Público e sociedade civil são usadas pelos textos oficiais do Instituto Mineiro de Gestão das Águas (IGAM, 2016).

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O contexto específico deste estudo é a Bacia Hidrográfica do Rio Grande GD1 que abrange 33 municípios e compreende cerca de 9.000 km2, área que compreende, desde o estado do Rio de Janeiro, até o Triângulo Mineiro (COMITÊ DA BACIA HIDROGRÁFICA DO RIO GRANDE, 2017).

Apesar da relevância dessa bacia hidrográfica e de sua gestão participativa, este estudo busca desenvolver um estudo sob a ótica da gestão social. Anteriormente, em outro escopo, alguns obstáculos para uma gestão participativa foram destacados por Magalhães Junior (2014, p. 139), tais como: carência de participação na implementação dos Comitês de Bacias Hidrográficas; falta de capacitação dos agentes na condução de uma gestão eficiente e participativa dos recursos hídricos; imperfeições no cadastro de usuários; além da falta de articulação entre os atores da Bacia Hidrográfica para a discussão de conflitos locais e regionais.

A ótica da gestão social indica a importância de caminhos democráticos, participativos e deliberativos das relações entre Poder Público, Usuários e Sociedade civil, tendo em vista a sua ênfase no bem comum. Tenório (1998; 2005) estabeleceu para gestão social, a importância da decisão compartilhada, do diálogo, da ausência de coerção, entre outros. Posteriormente, Cançado (2011) definiu Gestão Social como “[...] a tomada de decisão coletiva, sem coerção, baseada na inteligibilidade da linguagem, na dialogicidade e entendimento esclarecido como processo, na transparência como pressuposto e na emancipação enquanto fim” (CANÇADO, 2011, p. 99).

Neste estudo, nos guiamos pelo conceito de Cidadania Deliberativa que, para Tenório (2005, p.105), “significa que a legitimidade das decisões políticas deve ter origem em processos de discussão, orientados pelos princípios da inclusão, do pluralismo, da igualdade participativa, da autonomia e do bem comum”. Tais princípios serão as categorias de interpretação dos dados empíricos deste estudo. Cabe mencionar que esta pesquisa é pioneira, no que se refere a um estudo que foca a gestão social de recursos hídricos, a partir dos critérios da cidadania deliberativa desenvolvidos por Tenório et al. (2008; 2010).

Assim, partindo do (a) contexto recente de “crise hídrica”, (b) da importância dos Comitês de Bacias Hidrográficas para a gestão das águas de forma participativa, (c) das limitações encontradas na literatura desses arranjos, e, (d) da necessidade de superar tais limites em prol de uma gestão social e da cidadania deliberativa esta dissertação questiona: como ocorre a gestão da água na Bacia Hidrográfica GD1 do Rio Grande no Sul de Minas Gerais?

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1.1 Objetivos

Neste tópico, apresentamos o objetivo geral e os objetivos específicos dessa dissertação. Esses objetivos servem como norte de pesquisa e foram elaborados no intuito de trilhar um caminho coerente para se responder ao problema de pesquisa.

1.1.1 Objetivo geral

Compreender como ocorre a gestão da água na Bacia Hidrográfica do Alto Rio Grande – GD1, Minas Gerais.

1.1.2 Objetivos específicos

1) Reconstituir a trajetória histórica da gestão da Bacia Hidrográfica do Alto Rio Grande – GD1, Minas Gerais;

2) Investigar, com base nos critérios de cidadania deliberativa, a gestão da Bacia Hidrográfica do Alto Rio Grande – GD1, Minas Gerais.

1.2 Justificativa e relevância

Este estudo partiu do interesse do pesquisador em conhecer a importância da gestão social em razão de ter tido a oportunidade de participar como conselheiro do Conselho Municipal de Defesa e Conservação do Meio Ambiente (CODEMA), na cidade de Lavras Minas Gerais. Foi possível verificar que, no Brasil, existem várias maneiras da sociedade civil participar das decisões que conduzem o país e que essas práticas participativas precisam ser estudadas tendo em vista identificar suas possibilidades e dificuldades – conforme Garcia (2016) destaca: levantar tanto os potenciais democráticos e emancipatórios como identificar os elementos que restringem tais potenciais. Ainda, conforme Alcântara (2015), é importante se ater à diversidade de contextos em que a gestão social se desenvolve ou pode se desenvolver.

Dessa forma, escolheu-se o tema gestão social voltado para a gestão de recursos hídricos em razão da relevância de ambos, sobretudo por ser a água um bem comum, este estudo pode demonstrar que a responsabilidade é de todos os cidadãos em contribuir para sua preservação. Essa noção permeia a perspectiva da gestão social de autores como Tenório (1988; 2005) e Cançado, Pereira e Tenório (2013), tendo em vista que entendem a mesma como “[...] um gerenciamento mais participativo, dialógico, no qual o processo decisório é exercido por meio de diferentes sujeitos sociais” (TENÓRIO, 1998, p.16) e, mais recentemente, como “[...] ação gerencial dialógica própria da sociedade, do interesse público

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não estatal e voltado para o bem comum” (CANÇADO; PEREIRA; TENÓRIO, 2013, p.17). Sobre essa concepção, recentemente Cruz (2017), focando no estudo das águas minerais, afirmou:

[...] deriva também a relevância de considerar os direcionamentos da gestão social dado o entendimento dela como ação gerencial dialógica voltada para o bem comum e o interesse público não estatal (CANÇADO; PEREIRA; TENÓRIO, 2013). No caso da gestão da água, o processo democrático pode ser compreendido inicialmente pelas relações como igualdade, equidade, reciprocidade e de troca de papéis (HABERMAS, 1997a; 1997b), e, dessa forma, se relaciona com a possibilidade de argumentação sobre o ponto de vista de todos os envolvidos (HABERMAS, 1989). Nesse sentido, as normas para serem legítimas no que tange ao uso dos recursos/bens hídricos deve retirar sua validez da aceitação por todos os envolvidos. (CRUZ, 2017, p. 11-11).

Essa colocação é pertinente ao contexto das águas (recursos hídricos), em que a própria Lei das Águas (Lei nº 9.433 de 8 de janeiro de 1997) chama para uma gestão compartilhada, participativa, responsável e sustentável (BRASIL, 1997) – que deve necessariamente passar pelas demandas da sociedade.

A Lei n. 9.433/97 iniciou a implantação da gestão integrada das águas no Brasil. Esse conceito, apesar de amplamente aceito, é de alta complexidade e encontra inúmeras dificuldades para sua implantação. O conceito de descentralização da gestão para o nível local e as necessidades de articulação que a gestão por bacias hidrográficas exige estão ainda dependentes de uma enorme evolução institucional do país. A contribuição essencial dessa lei para o país é sua contribuição para um novo paradigma de gestão de um bem de uso comum, cuja má administração pode trazer efeitos bastante perversos para toda a sociedade brasileira (PORTO; PORTO, 2008, p. 58).

No Brasil, existe grande estoque de recursos hídricos, o que o coloca em posição superior a muitos outros países. Rosa (2014, p. 1) destaca que: “Segundo dados da FAO (Organização das Nações Unidas para Alimentação e Agricultura), o Brasil é o país com maior volume de água disponível; incluindo precipitação (chuva), água de superfície (rios e lagos) e água de subsolo (aquíferos)”. Entretanto, o consumo de água, no país, também é grande, sendo o setor agropecuário o maior consumidor. Além disso, há o diagnóstico histórico, com destaque para a região Sudeste, de desperdício de águas (REBOUÇAS, 1997; AGÊNCIA NACIONAL DAS ÁGUAS, 2017).

Além disso, mesmo com os avanços, ainda existem desafios na gestão das águas por meio das bacias hidrográficas: “Entre essas dificuldades, estão a efetiva descentralização para o nível local da bacia hidrográfica (gestão compartilhada) e necessidade de articulação entre

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os dois níveis de dominialidade previstos na Constituição Federal de 1988” (PORTO; PORTO, 2008, p. 58)

É elemento fundamental que somente um trabalho conjunto é capaz de solucionar problemas que surgem e, além disso, a preservação é também necessária para evitar danos futuros maiores. Esses problemas causam efeitos que envolvem a questão da sustentabilidade, visto que os mananciais de onde a água é extraída são diretamente afetados, seja pela seca ou pela falta de conscientização, que leva ao consumo e uso inapropriado desse bem imprescindível para a vida. Daí, surge a necessidade da participação social na gestão das águas, que em Minas Gerais, dentre outros meios, encontra-se com experiência como o Comitê de Bacias, foco deste estudo na Bacia Hidrográfica do Rio Grande (GD1). Afinal, não é democrático um bem comum ser gerido por poucos, de forma centralizada e com o predomínio de interesses privados. A indicação de Cruz (2017), para o contexto das águas minerais, é também possível aqui no contexto dos recursos hídricos: a questão da “justiça das águas” demanda uma gestão social (CRUZ, 2017).

Importante salientar que, conforme o CBH (2016, p. 1), a Bacia Hidrográfica integra o Sistema Nacional de Gerenciamento de Recursos Hídricos (SINGREH) e tem como objetivo “promover o debate sobre questões relacionadas aos recursos hídricos, dentre outras atribuições”. Essas questões são discutidas, coletivamente, com a participação de todos aqueles que compõem o Comitê de Bacias, pois se entende que a busca das soluções que emergem do cotidiano das populações, deve ser também feita por aqueles mais próximos que vivem e convivem com a realidade local. Portanto, este trabalho busca sistematizar saberes como uma das tarefas da gestão social (PEREIRA, 2012) e não oferecer soluções técnicas construídas sem a participação dos envolvidos. Ao final, oferecemos possíveis “caminhos” que podem ser aceitos ou não pelo Comitê de Bacias Hidrográficas.

Nesse sentido, é possível observar as possibilidades e demandas por uma gestão social, caracterizada por Tenório (1998) como um gerenciamento mais dialógico, o que a diferencia do que o autor denomina de gestão estratégica: “[...] Gestão social contrapõe-se à gestão estratégica à medida que tenta substituir a gestão tecnoburocrática, monológica, por um gerenciamento participativo, dialógico, no qual o processo decisório é exercido por meio de diferentes sujeitos sociais” (TENÓRIO et al., 2008, p. 9).

Nota-se que Tenório (1998; 2005) apresenta duas formas de gestão: gestão social e gestão estratégica. É pressuposto dessa dissertação que a gestão dos recursos hídricos deva ser gerido por meio da gestão social. Ainda, nesse sentido, este trabalho contribui para investigar

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elementos de gestão social no âmbito da gestão dos recursos hídricos, tendo delimitado para tanto o conceito de cidadania deliberativa:

A cidadania deliberativa consiste assim, em levar em consideração a pluralidade de formas de comunicação – morais, éticas, pragmáticas e de negociação – em que todas são formas de deliberação. O marco que possibilita essas formas de comunicação é a Justiça, entendida como a garantia processual da participação em igualdade de condições. [...]. Ela tem como base, portanto, as condições de comunicação, que permitem pressupor que decisões racionais podem ser tomadas no processo político. (TENÓRIO et al., 2008, p. 5).

Além disso, é uma forma de contribuir para o conceito de gestão social. Conforme Cançado, Pereira e Tenório (2013, 2015), o conceito de gestão social ainda necessita de aprofundamento teórico e estudos empíricos, como indicado também por Alcântara (2015) e Garcia (2016). Isto é destacado também por autores que seguem outras visões, como Dowbor (1999) que traz a necessidade de estudar outras formas de gestão.

Entender que as águas de uma bacia hidrográfica são um bem público que vem se tornando escasso e que requer gestão descentralizada, integrada e participativa, tem se tornado o maior desafio dos atores sociais implicados no regime de gestão, independente da função exercida por estes atores, os quais podem ser técnicos, governantes, usuários ou sociedade civil (BELLI FILHO et al., 2014).

No encadeamento dos estudos e das concepções sobre recursos hídricos e sua possível gestão social, este estudo não irá procurar esgotar o tema diante de sua dimensão, mas dar uma breve contribuição para mantê-lo em discussão nos meios acadêmicos e instigar a busca de novos conhecimentos para que se somem aos pontos evidenciados neste estudo – papel também destacado por Garcia (2016) no contexto da discussão sobre esferas públicas. Dessa forma, tornam-se relevantes pesquisas sobre o tema gestão social, especialmente quando o objeto de estudo é um bem comum, para que suas teorias e práticas se mantenham presentes nas discussões acadêmicas (e de não acadêmicos também), contribuindo para consolidar relações democráticas entre Poder Público, usuário e sociedade civil na gestão dos recursos hídricos.

A idéia central, nesse caso, é permitir que cada um dos participantes avalie as conseqüências da implementação de suas idéias com o auxílio de modelos aceitos por todos, a partir de uma base comum de informações. Começam a surgir, a partir daí, as oportunidades de soluções negociadas que tendem a contar com o apoio e o comprometimento de todo o grupo, ressaltando que o sistema de gestão de recursos hídricos brasileiro foi construído com o propósito de ser descentralizado, integrado e, especialmente, participativo. Para tanto, foram criados os comitês de bacia hidrográfica com a presença

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dos setores de governo, dos técnicos, dos usuários e da sociedade civil. (PORTO; PORTO, 2008, p. 57).

Além disso, diante da riqueza e exuberância da natureza proporcionada pelo manancial hídrico brasileiro, e de sua potencialidade de manutenção da vida, coloca-se diante de todos os brasileiros a obrigação de preservar, de cuidar das águas. Para isso, foram criadas leis federais e estaduais de proteção aos nossos mananciais comprovando que existem meios legais de participar desse cenário, todavia, não são suficientes sem a gestão que seja efetivamente social destes recursos.

1.3 Estrutura do estudo

Esse estudo foi estruturado em seções que se iniciam com esta introdução, seguida pela seção dois que aborda o contexto das bacias hidrográficas. A seção três apresenta o conceito de gestão social, assim como as categorias de uma cidadania deliberativa. Na seção três, foram destacados os procedimentos metodológicos. A seção quatro apresenta os resultados encontrados e a interpretação dos mesmos. Por fim, na seção cinco, foram descritas as conclusões encontradas, limitações e possibilidades de pesquisas futuras.

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2 O CONTEXTO DAS BACIAS HIDROGRÁFICAS

Este tópico apresenta o contexto das bacias hidrográficas no Brasil. Além disso, discorre sobre os comitês de bacias hidrográficas, sobre a bacia hidrográfica do Alto Rio Grande e, por fim, sobre a bacia hidrográfica GD1.

2.1 Bacias hidrográficas e gestão dos recursos hídricos em bacias hidrográficas Primeiramente é importante destacar a importância das águas:

A água é um recurso natural indispensável à sobrevivência do homem e demais seres vivos do Planeta. É uma substância fundamental para os ecossistemas da natureza, solvente universal e importante para a absorção de nutrientes do solo pelas plantas, e sua elevada tensão superficial possibilita a formação de franja capilar no solo, além de imprescindível às formações hídricas atmosféricas, influenciando o clima das regiões; no ser humano, é responsável por aproximadamente três quartos de sua constituição. Infelizmente, este recurso natural encontra-se cada vez mais limitado e exaurido pelas ações impactantes do homem nas bacias hidrográficas, degradando a sua qualidade e prejudicando os ecossistemas. (PAZ; TEODORO; MENDONÇA, 2000, p. 466).

A bacia hidrográfica engloba o território que, devido às suas peculiaridades topográficas, geológicas, de solo e vegetação, recolhe e direciona todas as águas que são lançadas em sua superfície para uma fonte. Devido ao desenvolvimento populacional, as bacias hidrográficas vêm passando por transformações em sua estrutura física. As mudanças e o modelo espacial da utilização e cobertura do solo interferem relevantemente na geração e condução de subsídios (VANACKER et al., 2005).

A bacia hidrográfica é uma área de captação natural da água de precipitação que faz convergir o escoamento para um único ponto de saída. A bacia hidrográfica compõe-se de um conjunto de superfícies vertentes e de uma rede de drenagem formada por cursos de água que confluem até resultar em um leito único no seu exutório (PORTO; PORTO, 2008, p. 45).

A definição de “bacia hidrográfica” é uma das correspondências espaciais mais tradicionais, o que se deve não apenas em razão de suas peculiaridades naturais, mas também porque a mesma se encontra na redação da legislação em vigor no que se refere ao meio ambiente, compondo, dessa maneira, o planejamento territorial e ambiental no Brasil (RODRIGUES; ADADI, 2005). O conceito de bacia hidrográfica aparece, por exemplo, na Lei nº 9.433, de 8 de janeiro de 1997, que a define como “a unidade territorial para implementação da Política Nacional de Recursos Hídricos e atuação do Sistema Nacional de Gerenciamento de Recursos Hídricos” (BRASIL, 1997).

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Historicamente, a gestão de recursos hídricos baseada no recorte territorial das bacias hidrográficas ganhou força no início dos anos 1990 quando os Princípios de Dublin foram acordados na reunião preparatória à Rio-92. Diz o Princípio n.1 que a gestão dos recursos hídricos, para ser efetiva, deve ser integrada e considerar todos os aspectos, físicos, sociais e econômicos. Para que essa integração tenha o foco adequado, sugere-se que a gestão esteja baseada nas bacias hidrográficas (WMO, 1992). (PORTO; PORTO, 2008, p. 42).

Conforme Porto e Porto (2008), a bacia hidrográfica pode ser então considerada uma associação sistemática, na qual são executados os estudos derivados da chuva e saída de água, favorecendo o planejamento de bacias e sub-bacias, cuja interrelação ocorre pelos sistemas hídricos. Para Antonelli e Thomaz (2007), a junção das inúmeras informações sobre as águas e outros fatores, nessas localidades, proporciona a distinção de áreas semelhantes. Tais padrões podem ser considerados como medidas físicas exclusivas para uma determinada região, de maneira a conceituar as mudanças ambientais.

Além disso, sobre o território definido como bacia hidrográfica é que se desenvolvem as atividades humanas. Todas as áreas urbanas, industriais, agrícolas ou de preservação fazem parte de alguma bacia hidrográfica. Pode-se dizer que, no Pode-seu exutório, estarão reprePode-sentados todos os processos que fazem parte do seu sistema. O que ali ocorre é consequência das formas de ocupação do território e da utilização das águas que para ali convergem. (PORTO; PORTO, 2008, p. 45).

A deterioração mundial dos mananciais vem provocando um rápido aumento dos custos do tratamento de água. A utilização múltipla e a demanda pela quantidade de água estão causando a redução das reservas superficiais e subterrâneas e diversos impactos na qualidade dessas águas. Rebouças, Braga e Tundisi (2006) destacam como principais consequências dos impactos dos usos múltiplos da água a eutrofização, a redução dos volumes, a poluição orgânica, a sedimentação de rios, lagos e represas, a perda de capacidade tampão por redução de áreas alagadas, poluição agroindustrial, poluição industrial, hidroeletricidade (construção de represas e interferências no ciclo hidrológico), pesca extensiva e excessiva, introdução de espécies exóticas, remoção de espécies críticas, remoção de florestas ripárias, poluição urbana (despejo de efluentes de esgotos não tratados), deterioração dos mananciais, aumento do custo do tratamento das águas e redução dos aquíferos subterrâneos.

As águas subterrâneas estão disponíveis em todas as regiões do planeta e são usadas frequentemente para o abastecimento doméstico, para irrigação em áreas rurais e na indústria. Se essas águas forem contaminadas, as diversas consequências em sua qualidade interferem na saúde humana. Dentre as principais fontes de contaminação destas águas estão, conforme

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Tundisi (2005): contaminação por resíduos de aterros sanitários; acidentes em tanques de reservas de combustíveis; descargas a partir de fossas; fertilizantes tóxicos usados na irrigação; tanques que reservam resíduos industriais, fezes de animais ou para reservas de ração; esgotos não tratados; e resíduos de construção, entre outros.

Devido a isso, muitos países podem entrar em guerra por causa dos recursos [hídricos], pois estudos indicam que o consumo mundial de água dobra a cada 20 anos. A água tem sido considerada, no final deste século, um recurso escasso e estratégico, por questão de segurança nacional e por seus valores social, econômico e ecológico (PAZ; TEODORO; MENDONÇA, 2000, p. 467).

Conforme evidenciado, as bacias hidrográficas e sua gestão são formas de tentar contornar as situações de escassez e desperdícios das águas. Nas bacias, são importantes como forma de gestão e controle social, os Comitês de Bacias Hidrográficas.

2.2 Comitês de Bacias Hidrográficas no Brasil na gestão das águas

A implementação dos comitês, como possibilidade de gestão de recursos hídricos de uma bacia hidrográfica, ocorreu em cenário de transformações estruturais do Estado, no período entre 1980 e 1990. Foi uma consequência, dentre outros importantes aspectos, do processo de mobilização social enriquecido pela redemocratização do País (ANA, 2011).

Até os anos 1970, as questões voltadas para a utilização da água eram consideradas sob o ponto de vista da demanda dos grandes usuários, ou dos problemas relativos às inundações e às secas. Era responsabilidade do governo tomar decisões, sendo que as bacias hidrográficas não eram as unidades predominantes de planejamento (ANA, 2011). A partir daí, surgiram novos acontecimentos levando ao surgimento das bacias, como no Quadro 1.

Quadro 1 - Evolução da criação dos comitês de bacia hidrográfica.

Ano Evento

1976 Acordo para a melhoria das condições sanitárias das Bacias do Alto Tietê e Cubatão 1978 Surgimento do Comitê de Estudos Integrados de Bacias Hidrográficas

1985 Aumento da fiscalização e o controle dos lançamentos nos corpos d’água da bacia 1987 Criação do Comitê de Preservação, Gerenciamento e Pesquisa da Bacia do Rio dos Sinos 1988 Sistema Nacional de Gerenciamento de Recursos Hídricos

1988 Carta de Salvador 1991 Lei nº 7.663

1992 Aprovação à lei que instituiu a sua Política de Recursos Hídricos 1993 Aprovação à lei que instituiu a sua Política de Recursos Hídricos 1994 Aprovação à lei que instituiu a sua Política de Recursos Hídricos 1995 Aprovação à lei que instituiu a sua Política de Recursos Hídricos

1993 Criação dos Comitês das Bacias Hidrográficas dos Rios Piracicaba, Capivari e Jundiaí. 1996 Projeto de Lei Política Nacional de Recursos Hídricos

1997 Promulgada a Lei nº 9.433

2000 Criação Agência Nacional de Águas (ANA)

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A Agência Nacional de Águas foi a instituição responsável pela implementação do Plano Nacional de Recursos Hídricos (PNRH) e de coordenação do Sistema Nacional de Gerenciamento de Recursos Hídricos (SINGREH). A Figura 1 representa, sinteticamente, a base do SINGREH da forma como este sistema se integra.

Figura 1 - Matriz institucional do SINGREH.

Fonte: Agência Nacional das Águas (2011).

A Figura 1 mostra que existem diversos níveis e instituições envolvidas no SINGREH. O Sistema Nacional de Recursos Hídricos objetiva coordenar uma gestão integrada de diversos atores, a saber: Conselho Nacional de Recursos Hídricos - CNRH; Agência Nacional de Águas - ANA; Conselhos de Recursos Hídricos dos Estados e do Distrito Federal - CERHs; Comitês de Bacia Hidrográfica - CBHs; Órgãos dos poderes públicos federal, estaduais e municipais, cujas competências se relacionem com a gestão de recursos hídricos; e Agências de Água ou Agências de Bacia.

A Figura 2 demonstra a criação das leis que regulamentam o Comitê de Bacias, assim como o número de comitês e seu crescimento ao longo dos anos. Em 1996, existia apenas um comitê interestadual, sendo que esse número cresceu para nove em 2010.

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Figura 2 - Evolução da criação de comitês de bacias hidrográficas no Brasil no período de 1988 a 2010.

Fonte: Agência Nacional das Águas (2011).

Observamos que até 2000 eram apenas 55 comitês e que esse valor passou para 164 em 2010. Importante destacar a Constituição Federal de 1988 na institucionalização dos comitês. Percebemos também que o aumento no número de comitês se deve a criação da Agência Nacional das Águas. Conforme a Constituição Federal de 1988, em seu art. 26, são bens do Estado “I - as águas superficiais ou subterrâneas, fluentes, emergentes e em depósito, ressalvadas, neste caso, na forma da lei, as decorrentes de obras da União”. Portanto,

A Constituição de 1988 teve um importante papel para a gestão dos recursos hídricos. Definiu as águas como bens de uso comum e alterou a dominialidade das águas do território nacional, anteriormente definida pelo Código de Águas de 1934 (Decreto n.24.63, de 10.7.1934). O art. 20, inciso III, da Constituição Federal de 1988 indica, entre os bens da União, “os lagos, rios e quaisquer correntes de água em terrenos do seu domínio, ou que banhem mais de um Estado, sirvam de limites com outros países, se estendam a território estrangeiro, ou dele provenham, bem como terrenos marginais e as praias fluviais”. (PORTO; PORTO, 2008, p. 46)

A Lei no 9.433/97, conhecida como Lei das Águas, também realizou significativas transformações:

[...] substituindo práticas profundamente arraigadas de planejamento tecnocrático e autoritário, devolvendo o poder para as instituições descentralizadas de bacia, o que demanda um processo de negociação entre os diversos agentes públicos, usuários e sociedade civil organizada. (JACOBI, 2010, p. 73).

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Portanto, este foi um marco no processo de descentralização e democratização dos recursos hídricos no Brasil.

2.3 A Bacia Hidrográfica do Alto Rio Grande (BHRG)

Conforme o Comitê de Bacia Hidrográfica (CBH), a Bacia Hidrográfica do Rio Grande (BHRG) é uma bacia hidrográfica de significativa extensão territorial, com mais de 143 mil km2 de área de drenagem e atende a uma população de nove milhões de habitantes.

A Bacia Hidrográfica do Rio Grande (BHRG) está situada na Região Sudeste do Brasil, na Região Hidrográfica Paraná que, em conjunto com as Regiões Hidrográficas Paraguai e Uruguai, compõe a Bacia do Prata. É uma bacia hidrográfica de expressiva área territorial, com mais de 143 mil Km2 de área de drenagem. [...]. Com população de nove milhões de habitantes, a Bacia Hidrográfica do Rio Grande é formada por 393 municípios, dos quais 325 têm área totalmente incluída na BHRG, o que comprova sua grandeza como bacia hidrográfica que inclui dois importantes estados brasileiros: Minas Gerais, a norte, com 60,2% da área de drenagem da bacia, e São Paulo, ao sul, com 39,8% da área. [...]. A abrangência da bacia hidrográfica garante a ela uma diversidade de ambientes, desde os típicos da Região Centro-Oeste, como os cobertos por vegetação de cerrado, até áreas montanhosas e típicas da costa Sudeste do Brasil, com perímetros de Mata Atlântica. (COMITÊ DE BACIA HIDROGRÁFICA, 2017).

A contemplação da bacia hidrográfica confere a ela uma pluralidade de ambientes, desde aqueles pertencentes à Região Centro-Oeste, como os revestidos por vegetação de cerrado, até áreas montanhosas e próprias da costa Sudeste do Brasil, com ambientes de Mata Atlântica. Existe uma capacidade estratégica da região e também a demanda por uma administração integrada, participativa e compartilhada dos recursos hídricos, para gestão de incoerências devido à utilização da água geralmente causadas por implantação e atuação de unidades que fornecem energia hidrelétrica (CBH, 2016).

Quanto à administração dos subsídios hídricos, já foram implantados Comitês de Bacias Hidrográficas em todas as bacias afluentes. O Estado de São Paulo conta com seis comitês e Minas Gerais com oito. Referente às contendas originárias da utilização da água da BHRG, 35 situações conflitantes foram relatadas ao longo da I Oficina de Integração dos Comitês do Rio Grande, realizada de 24 a 26/11/2006, em Poços de Caldas (MG). Desse total, 12 casos ocorreram em Minas Gerais e 23 no Estado de São Paulo e fazem alusão a poluição de corpos d’água provocados pela produção de esgotos sanitários; poluição generalizada pela agricultura e pecuária; significativa apreensão para irrigação; exploração demasiadas de águas subterrâneas em regiões urbanas; entre outras (CBH, 2016). Adiante, notamos que “A dominialidade dos cursos d’água da Bacia Hidrográfica do Rio Grande está dividida entre a

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União (12,37%) e os Estados de Minas Gerais (51,40%) e São Paulo (36,23%), razão pela qual a gestão dos recursos hídricos da bacia deve ser feita de forma descentralizada, compartilhada e participativa” (COMITÊ DE BACIA HIDROGRÁFICA, 2017).

Mesmo com a busca pela descentralização, compartilhamento e participação ainda existem vários conflitos na bacia:

No que tange aos conflitos pelo uso dos recursos hídricos da Bacia Hidrográfica do Rio Grande foram identificadas e relatadas 35 situações de conflito, durante a I Oficina de Integração dos Comitês do Rio Grande, realizada de 24 a 26/11/2006, em Poços de Caldas (MG). Desse total, 12 casos se concentraram em Minas Gerais e 23 no Estado de São Paulo e dizem respeito à: poluição de corpos d’água pelo lançamento de esgotos sanitários; poluição difusa pela agricultura e pecuária; elevada captação para irrigação; superexploração de águas subterrâneas em áreas urbanas; entre outras.

A seguir apresentamos o foco de nosso estudo, a Bacia Hidrográfica do GD1.

2.3.1 Bacia Hidrográfica do GD1

Criado em 2007, pelo Decreto nº 44432 -04/01/2007, o Comitê da Bacia Hidrográfica dos Afluentes Mineiros do Alto Rio Grande possui 48 conselheiros, dentre titulares e suplentes. A Bacia Hidrográfica do Alto Rio Grande está situada no sul de Minas Gerais e é composta por 32 municípios compreendendo cerca de 9.000 km2. A área de drenagem é de 240 km de extensão, com uma população de aproximadamente 365.000 habitantes. A bacia hidrográfica do Alto Rio Grande é formada pelas sub-bacias do Rio Grande, do Rio Aiuruoca, do Rio Turvo Grande e do Rio Ingaí, que nascem na Serra da Mantiqueira e pela sub-bacia do Rio Capivari (CBH, 2016).

Compõem a bacia os municípios de Aiuruoca; Alagoa; Andrelândia; Arantina; Baependi; Bocaina de Minas; Bom Jardim de Minas; Carrancas; Carvalhos; Cruzília; Ibertioga; Ibituruna; Ijaci; Ingaí; Itamonte; Itumirim; Itutinga; Lavras; Liberdade; Lima Duarte; Luminárias; Madre de Deus de Minas; Minduri; Nazareno; Piedade do Rio Grande; Santa Rita de Ibitipoca; Santana do Garambéu; São João del Rei; São Tomé das Letras; São Vicente de Minas; Seritinga e Serranos. (CBH, 2016). Alguns indicadores destes municípios estão na Tabela 1.

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Tabela 1 - Municípios e situação na Bacia do Alto Rio Grande

Fonte: Plano Diretor de Recursos Hídricos da Bacia Hidrográfica do Alto Rio Grande (2014, p. 4)

A região de abrangência da bacia é formada por serras com relevo ondulado, altitudes variando entre 900 e 1.100 metros, clima tropical, invernos frios e verões quentes e úmidos, com vegetação predominante de campo cerrado e rupestre. As populações tradicionais ainda se dedicam à lavoura de subsistência, associada à extração vegetal. É uma região onde predominam as propriedades de tamanho médio (CBH, 2016).

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3 GESTÃO SOCIAL

Nessa parte apresentamos o conceito de gestão social e a discussão sobre cidadania deliberativa e os critérios de análise apresentados por Tenório et al. (2008) e Tenório (2012).

3.1 Gestão social

Bordin (2013), Alcântara (2015), Cançado, Pereira e Tenório (2015), entre outros, destacam que a definição de gestão social ainda não foi totalmente formada, no entanto, já conta com produções, interpretações e entendimentos comuns (especialmente no que tange à relevância da participação). De forma geral, a gestão social “é uma temática que vem ganhando espaço na agenda de diversos pesquisadores e até mesmo de profissionais dedicados à área social. Além disso, parece haver uma busca, pelos pesquisadores, por um caminho teórico mais sólido e robusto” (IIZUKA; JUNQUEIRA, 2013, p. 72).

Nesse sentido, a gestão social é um campo de conhecimento científico em processo de construção (PERES JR.; PEREIRA, 2014). Nesse contexto, Cançado, Pereira e Tenório (2015, p. 194) chamam atenção para o necessário aprofundamento teórico e metodológico da gestão social: “por se constituir em um campo ainda em construção, a Gestão Social necessita de mais aportes teóricos e metodológicos para sua construção”.

Peres Junior e Pereira (2014) buscaram analisar “possíveis vertentes teóricas que, apesar da ‘juventude’ do campo da Gestão Social, começam a se destacar no cenário do conhecimento científico produzido no Brasil” (PERES JÚNIOR; PEREIRA, 2014, p. 222). Para tanto, os autores utilizaram uma bibliometria com análise de citações e encontraram “quatro grupos de trabalhos (e autores) que, aparentemente, podem ser apontados como as principais ‘escolas de pensamento’ do campo da Gestão Social” (PERES JÚNIOR, PEREIRA, 2014, p. 226), a saber: abordagem crítica frankfurtiana; abordagem baseada na noção de gestão do desenvolvimento social; abordagem baseada no conceito de administração pública societal; e abordagem puquiana.

1. corrente derivada da teoria crítica frankfurtiana, na qual se destacam os trabalhos de Fernando Guilherme Tenório, da EBAPE/FGV e de Genauto Carvalho de França Filho, da Universidade Federal da Bahia (UFBA); 2. aquela baseada na noção de gestão do desenvolvimento social conduzido por interorganizações, desenvolvida pela Prof.ª Tânia Maria Diederichs Fischer, coordenadora do Centro Interdisciplinar de Desenvolvimento e Gestão Social (CIAGS), da Universidade Federal da Bahia (UFBA);

3. abordagem centrada nos conceitos de administração pública societal, de Ana Paula Paes de Paula (UFMG);

4. abordagem puquiana, que recebe esse nome tendo em vista a origem e/ou local de atuação de seus autores – a Pontifícia Universidade Católica de São

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Paulo (PUC/SP) –, na qual se destacam os textos de Ladislau Dowbor e os livros Gestão social: uma questão em debate (RICO e RAICHELLIS, 1999) e Gestão social, estratégias e parcerias: redescobrindo a essência da administração brasileira de comunidades para o Terceiro Setor (CAVALCANTI; NOGUEIRA, 2006) (PERES JÚNIOR; PEREIRA, 2014, p. 226).

Essas quatro abordagens mostram como a gestão social pode ser considerada um conceito com diferentes significados e abordagens. Não é nosso interesse aqui discutir todas as abordagens. Focaremos nossa atenção na abordagem crítica frankfurtiana, pois é a mais consistente com o nosso trabalho e com as categorias que serão utilizadas para a análise dos resultados. Entretanto, é importante destacar que estas diferentes abordagens possuem “várias conexões e pontos de partida comuns em suas formulações” (PERES JÚNIOR; PEREIRA, 2014, p. 227).

Diante disso, discutiremos aqui os textos de Tenório (1998), Tenório et al. (2008; 2010) e Cançado, Pereira e Tenório (2015). Nessa abordagem frankfurtiana:

O conceito de gestão social encontra fundamento na teoria da ação comunicativa de Jürgen Habermas, pois é entendida como um processo dialógico, no qual todos os participantes da ação admitem sua validade, ou seja, a verdade é um acordo alcançado por meio da discussão crítica, da apreciação intersubjetiva. Sob a atuação da ação comunicativa, nesse tipo de ação o indivíduo busca motivar o outro para que esse concorde com o seu argumento, sendo a linguagem utilizada como fonte de integração social. (TENÓRIO; KRONEMBERGER; LAVINAS, 2014, p. 230).

O trabalho de Tenório (1998) “Gestão Social: uma perspectiva conceitual” pode ser considerado o texto seminal sobre gestão social, principalmente quando se trata da abordagem frankfurtiana. Tenório (1998) apresenta a gestão social como um novo conceito, uma nova possibilidade de gestão, que muitas vezes tem sido utilizado de forma equivocada, somente para acentuar a importância da participação social na esfera governamental – critica que ele faz também em Tenório (2005). Isso fica claro em outra passagem:

[...] gestão social tem sido objeto de estudo e prática muito mais associado à gestão de políticas sociais, de organizações do terceiro setor, de combate à pobreza e até ambiental, do que à discussão e possibilidade de uma gestão democrática, participativa, quer na formulação de políticas públicas, quer naquelas relações de caráter produtivo (TENÓRIO, 2005, p. 102).

O autor também evidencia a descrição epistemológica da gestão social em contraposto à gestão estratégica e complementa descrevendo os conceitos de gestão estratégica e gestão social. Para tanto, é importante entender que o autor inverteu os pares de palavras ‘Estado-sociedade’ e ‘capital-trabalho’ para ‘sociedade-Estado’ e ‘trabalho-capital’. Ao fazer isso, a

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intenção foi mostrar quem deve ser o protagonista dessas relações: sociedade e trabalho (TENÓRIO, 1998). Dito isto, o autor apresenta os conceitos de gestão social e gestão estratégica, buscando evidenciar a distinção entre as duas formas.

Gestão estratégica é um tipo de ação social utilitarista, fundada no cálculo de meios e fins e implementada através da interação de duas ou mais pessoas, na qual uma delas tem autoridade formal sobre a(s) outra(s). Por extensão, neste tipo de ação gerencial o sistema-empresa determina suas condições de funcionamento e o Estado se impõe sobre a sociedade. É uma combinação de competência técnica com atribuição hierárquica, o que produz a substância do comportamento tecnocrático. Por comportamento tecnocrático, entendemos toda ação social implementada sob a hegemonia do poder técnico ou tecnoburocrático, que se manifesta tanto no setor público quanto no privado, fenômeno comum às sociedades contemporâneas. (TENÓRIO, 1998, p. 14)

Por outro lado, Tenório (1998) define a gestão social como uma forma de gestão mais participativa, dialógica e democrática. Enquanto a razão instrumental é a forma de razão que predomina na gestão estratégica, na gestão social o que predomina é a razão comunicativa (busca do entendimento mútuo sem coerção). Isso fica claro na seguinte passagem:

A gestão social contrapõe-se à gestão estratégica na medida em que tenta substituir a gestão tecnoburocrática, monológica, por um gerenciamento mais participativo, dialógico, no qual o processo decisório é exercido por meio de diferentes sujeitos sociais. E uma ação dialógica desenvolve-se segundo os pressupostos do agir comunicativo [...]. Portanto, no contexto da gestão social orientada pela racionalidade comunicativa, os atores, ao fazerem suas propostas, não podem impor suas pretensões de validade sem que haja um acordo alcançado comunicativamente no qual todos os participantes exponham suas argumentações. Existe argumento quando os requisitos de validade se tomam explícitos em termos de até que ponto podem ser oferecidas boas razões para eles em lugar da coação ou força. Estes argumentos são expostos através da razão, do conhecimento; portanto, discursivamente. Quem fala expõe suas idéias de maneira racional e quem ouve reage tomando posições motivadas também pela razão. (TENÓRIO, 1998, p. 16).

Por isso, para o autor, a gestão social é:

[...] o processo gerencial dialógico no qual a autoridade decisória é compartilhada entre os participantes da ação (ação que possa ocorrer em qualquer tipo de sistema social – público, privado ou de organizações não-governamentais). O adjetivo social qualificando o substantivo gestão será entendido como o espaço privilegiado de relações sociais em que todos têm o direito à fala, sem nenhum tipo de coação. (TENÓRIO, 2005, p. 102).

Assim, a gestão social é construída em um processo dialógico em que predomina a ação comunicativa e o protagonismo é da sociedade civil (ALCÂNTARA; PEREIRA;

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SILVA, 2015). Mais recentemente, Cançado, Pereira e Tenório (2013; 2015) propõem que a gestão social deve se situar (locus) em um espaço compartilhado entre Estado, mercado e sociedade civil (Figura 3).

Figura 3 - Relações entre Estado, Sociedade e Mercado

.

Fonte: Cançado, Pereira e Tenório (2013, p. 102).

Conforme pode ser observado na Figura 3, a gestão social se localiza no espaço central compartilhado pelo Estado, mercado e sociedade.

[...] a gestão social se situa no espaço de interseção das relações entre Estado, Mercado e Sociedade e torna-se capaz de converter os fluxos comunicacionais das esferas públicas em ações e decisões políticas a partir de sua organização na sociedade civil. Sendo assim, a gestão social é uma ação gerencial dialógica voltada para o interesse público não estatal, tendo como tarefas na sociedade civil sistematizar os saberes alternativos, estruturar avaliações técnicas especializadas voltadas para o bem comum, fortalecer a esfera pública municiando-a de informações de qualidade, dentre outras. (PEREIRA, 2012, p. 13).

A gestão social para esses autores se associa também diretamente com a esfera pública, pois se trata de “um processo dialético de organização social próprio da esfera pública” (CANÇADO; PEREIRA; TENÓRIO, 2013, p. 187). Assim, apesar das distintas abordagens, Cançado, Pereira e Tenório (2011; 2013; 2015) destacam que é possível elencar algumas características básicas da gestão social:

Em síntese, tem-se uma primeira aproximação da delimitação do campo: a Gestão Social é a tomada de decisão coletiva, sem coerção, baseada na intelegibilidade da linguagem, na dialogicidade e entendimento esclarecido como processo, a transparência como pressuposto e na emancipação na condição de fim último. (CANÇADO; PEREIRA; TENÓRIO, 2013, p. 132).

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Essas características, conforme colocam os autores, são características que devem ser buscadas. Não significa, necessariamente, que elas se apresentarão na prática. Nesse sentido, os autores destacam que estas características são vistas como tipo ideal weberiano (CANÇADO; PEREIRA; TENÓRIO, 2015). Enquanto processo de aprendizado e que tem como finalidade a emancipação, o processo tende a se aproximar mais do ideal na medida em que vai se construindo pela e na gestão social, por isso, uma das noções mais atual de gestão social é: “[...] ação gerencial dialógica própria da sociedade, do interesse público não estatal e voltado para o bem comum” (CANÇADO; PEREIRA; TENÓRIO, 2013, p. 17).

Apesar de existirem várias abordagens (PERES JUNIOR; PEREIRA, 2014), propostas conceituais mais recentes (CANÇADO; PEREIRA; TENÓRIO, 2015), com ênfase nas relações Estado, mercado e sociedade civil (ALCÂNTARA, 2015) e nas esferas públicas (GARCIA, 2016; CRUZ, 2017), essa dissertação enfatiza a noção de cidadania deliberativa, suas categorias e critérios de análise.

3.2 Cidadania deliberativa

Para Tenório (1998), a cidadania deliberativa é diferente da cidadania liberal e republicana. Segundo Tenório (1998, p. 17), para entender o conceito de cidadania deliberativa “será necessário entender, através de uma análise comparativa, os conceitos antinômicos de cidadania liberal e cidadania republicana.” Assim sendo, Tenório (1998) apresenta a concepção liberal e republicana, e depois as diferencia da concepção deliberativa.

Segundo a concepção liberal o processo democrático cumpre a tarefa de programar o Estado no interesse da sociedade, entendendo-se o Estado como o aparato de administração pública e a sociedade como o sistema, estruturado em termos de uma economia de mercado, de relações entre pessoas privadas e do seu trabalho social. A política (no sentido da formação política da vontade dos cidadãos) tem a função de agregar e impor os interesses sociais privados perante um aparato estatal especializado no emprego administrativo do poder político para garantir fins coletivos. Segundo a concepção republicana a política não se esgota nessa função de mediação. Ela é um elemento constitutivo do processo de formação da sociedade como um todo. A política é entendida como uma forma de reflexão de um complexo de vida ético (no sentido de Hegel). Ela constitui o meio em que os membros de comunidades solidárias, de caráter mais ou menos natural, se dão conta de sua dependência recíproca, e, com vontade e consciência, levam adiante essas relações de reconhecimento recíproco em que se encontram, transformando-as em uma associação de portadores de direitos livres e iguais. (HABERMAS, 1995, p. 39-40 apud TENÓRIO, 1998, p. 17-18)

A cidadania deliberativa deve mediar relação entre Estado-sociedade, sendo que para Cançado, Tenório e Pereira (2011, p. 688), a cidadania deliberativa quer dizer, de modo geral,

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“que a legitimidade das decisões deve ter origem em processos de discussão orientados pelos princípios da inclusão, do pluralismo, da igualdade participativa, da autonomia e do bem comum”. Então, a concepção deliberativa é diferente da tradição liberal e também da republicana, buscando uma terceira alternativa (ALCÂNTARA, 2015). Essa terceira alternativa (deliberativa) está fortemente atrelada a racionalidade comunicativa proposta por Habermas.

Na relação sociedade-Estado, a ação gerencial dialógica -gestão social -, a cidadania deliberativa sugere que a pessoa, ao tomar ciência de sua função como sujeito social e não adjunto, ou seja, tendo conhecimento da substância social de seu papel na organização da sociedade, deve atuar não somente como contribuinte, eleitor, mas com uma presença ativa e solidária nos destinos de sua comunidade. (TENÓRIO, 1998, p. 19).

Para Tenório et al (2008, P. 5), “o âmago da cidadania deliberativa consiste precisamente numa rede de debates e de negociações, a qual deve possibilitar a solução racional de questões pragmáticas, éticas e morais” (TENÓRIO et al, 2008, p. 5). Portanto, a cidadania deliberativa implica, dentre outros elementos,

[...] na participação cidadã em espaços públicos democraticamente compostos pelos poderes executivo, legislativo e judiciário (também pode estar presente) conselhos municipais, movimentos sociais, associações de bairro, sindicatos, instituições religiosas e outras, dessa forma, constituindo um espaço compartilhado por diversos atores sociais, onde não deve haver privilégios (igualdade participativa). (ALCÂNTARA, 2015, p. 378).

Segundo Garcia (2016), as esferas públicas comunicativamente e discursivamente constituídas também se tornam “espaços” ou “locus” (ALCÂNTARA, 2015) importantes do desenvolvimento da cidadania deliberativa. Importante na discussão de cidadania deliberativa são os conceitos habermasianos de esfera pública e sociedade civil. A esfera pública seria o espaço adequado para a cidadania deliberativa. Segundo Tenório (2005, p. 113), “o procedimento da prática da cidadania deliberativa na esfera pública é a participação” dos mais diversos atores da sociedade civil.

A cidadania deliberativa consiste assim, em levar em consideração a pluralidade de formas de comunicação – morais, éticas, pragmáticas e de negociação – em que todas são formas de deliberação. O marco que possibilita essas formas de comunicação é a Justiça, entendida como a garantia processual da participação em igualdade de condições. Desta forma, Habermas procura a formação da opinião e da vontade comum não só pelo caminho do autoentendimento ético, mas também por ajuste de interesse por justificação moral. Sob a cidadania deliberativa tanto formas de deliberação dialógicas quanto instrumentais, são institucionalizadas e válidas (legítimas) na formação da opinião e da vontade política. Transferem-se as condições de

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