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Crítica social no conto a nova califórnia, de Lima Barreto: uma leitura sobre a burguesia do século XX

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Academic year: 2021

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(1)UNIVERSIDADE FEDERAL DE ALAGOAS – UFAL CAMPUS DO SERTÃO – DELMIRO GOUVEIA LICENCIATURA EM LETRAS – LÍNGUA PORTUGUESA. GLÓRIA CAMILA ALVES SILVA. CRÍTICA SOCIAL NO CONTO A NOVA CALIFÓRNIA DE LIMA BARRETO: LEITURA SOBRE A BURGUESIA DO SÉCULO XX. Delmiro Gouveia – AL 2019.

(2) GLÓRIA CAMILA ALVES SILVA. CRÍTICA SOCIAL NO CONTO A NOVA CALIFÓRNIA DE LIMA BARRETO: LEITURA SOBRE A BURGUESIA DO SÉCULO XX. Monografia apresentada à Banca Examinadora do Curso de Licenciatura em Letras - Língua Portuguesa, da Universidade Federal de Alagoas, Campus do Sertão, como requisito final para obtenção do título de licenciada em LetrasLíngua Portuguesa. Orientador: Prof. Dr. Marcos Alexandre Morais Cunha.. Delmiro Gouveia – AL 2019.

(3) Catalogação na fonte Universidade Federal de Alagoas Biblioteca do Campus Sertão Sede Delmiro Gouveia Bibliotecária responsável: Renata Oliveira de Souza – CRB-4/2209 S586c. Silva, Glória Camila Alves Crítica social no conto a nova califórnia de Lima Barreto: leitura Sobre a burguesia do século XX / Glória Camila Alves Silva. –. 2019. 49 f. Orientação: Prof. Dr. Marcos Alexandre Morais Cunha. Monografia (Licenciatura em Letras) – Universidade Federal de Alagoas. Curso de Licenciatura em Letras. Delmiro Gouveia, 2019. 1. Literatura brasileira. 2. Contos. 3. Crítica social. 4. Lima, Barreto, 1881-1922. 5. Burguesia. 6. Século XX. I. Título. CDU: 82-34.

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(5) AGRADECIMENTOS. Primeiramente agradeço a Jeová, meu grandioso Deus e a Jesus Cristo por me iluminar nessa doce jornada acadêmica, por livrar do meu coração todos os medos de ser falha e não conseguir alcançar os meus objetivos. Agradeço a minha maior fortaleza na terra, a minha avó/mãe/pai, Valdeci, por ter me criado e estar ao meu lado todos os dias. Aos meus tios que mesmo de longe me ajudam, em especial aos meus tios Kleiton Sandes, a quem eu tenho muita admiração, e Tiago Sandes, mais um guerreiro na vida acadêmica. A minha irmã Adriele Araújo, por sempre ser presente em minha vida. Ao meu orientador, Marcos Alexandre, por estar comigo nessa empreitada de pesquisas e orientações que guiaram os meus passos, fazendo também que ampliasse os meus pensamentos para novas ideias e discussões. Em especial, agradeço a professora iluminada Cristian Sales, a quem eu tenho grandiosa admiração e respeito pelo ser humano que ela é, e por ser uma docente espetacular. A todo o corpo docente, que esteve ao meu lado em toda jornada, fazendome aprender sobre o que é ser professor. Em especial, aos meus amigos: Valéria Campos, Jeferson Teixeira, Rakel Carvalho, Herlane Santana, Eudes Lima, Maria Valéria, Luciana Gomes e Luana Santos, que estiveram presentes nas aulas, nos corredores e a distância, quando eu mais precisava. A Jonhny Ribeiro, meu companheiro, que esteve presente no finalzinho da graduação me ajudando e incentivando, a todas as vezes que precisei e você esteve ao meu lado, até as broncas eu agradeço e a todo seu cuidado..

(6) A desinteligência não tardou a surgir; os mortos eram poucos e não bastavam para satisfazer a fome dos vivos. (LIMA BARRETO, In: A Nova Califórnia, 1979, p. 199).

(7) RESUMO Tendo em vista que, o trabalho de pesquisa parte do interesse pelo estudo da crítica social da condição humana feita por Lima Barreto através da narrativa do conto A nova Califórnia. O nosso objeto de pesquisa procura entender como o autor produz crítica social no conto. Tentaremos mostrar uma leitura sobre a burguesia do século XX. Para tanto, é necessário, compreender fatores históricos e sociais da vida do autor, analisar aspectos capitalistas na obra, refletir como é dada a influência da burguesia do século XX para os dias atuais. Realiza-se então uma pesquisa com metodologia qualitativa de natureza básica, de caráter exploratório, envolvendo como instrumento técnico um levantamento bibliográfico. Quanto ao objeto da pesquisa, esta, será de caráter exploratório, envolvendo como instrumento técnico um levantamento bibliográfico. Diante disso, verifica-se que através de textos e levantamentos acerca das análises de alguns dos principais personagens do conto, o autor pré-modernista L. Barreto, este realizou crítica com maestria aos moldes burgueses do século XX, enfatizando a hipocrisia e ambição da população da cidade fictícia da sátira. Levando em consideração que o escritor traz o seu meio social para o conto, onde é passado na cidade do Rio de Janeiro, o que impõe a constatação de que L. Barreto produzia críticas por meio de suas obras literárias. Palavra-chave: Literatura. Crítica Social. A nova Califórnia..

(8) ABSTRACT Given that, the research work starts from the interest in the study of the social critique of the human condition made by Lima Barreto through the narrative of the tale A nova California. Our research object seeks to understand how the author produces social criticism in the short story. We will try to show a reading about the twentieth century bourgeoisie. Therefore, it is necessary to understand the historical and social factors of the author's life, to analyze capitalist aspects in the work, to reflect on the influence of the bourgeoisie from the twentieth century to the present day. A research with qualitative methodology of basic nature, of exploratory character, is carried through, involving like bibliographic survey as technical instrument. As for the object of the research, this will be exploratory, involving as a technical instrument a bibliographic survey. Given this, it can be seen that through texts and surveys about the analysis of some of the main characters of the tale, the premodernist author L. Barreto, he made a masterful criticism of the bourgeois molds of the twentieth century, emphasizing the hypocrisy and ambition of population of the fictional city of satire. Taking into account that the writer brings his social environment to the tale, where it is spent in the city of Rio de Janeiro, which requires the realization that L. Barreto produced criticism through his literary works. Keywords: Literature. Social criticism. A nova Califórnia..

(9) SUMÁRIO 1 INTRODUÇÃO........................................................................................................09 2 A LITERATURA COMO UM INSTRUMENTO SOCIAL.........................................13 2.1 REFLEXÕES SOBRE CRÍTICA SOCIAL EM OBRAS LITERÁRIAS...................15 2.2 PRÉ-MODERNISMO NO BRASIL: CONTEXTO HISTÓRICO.............................17 2.3 LIMA BARRETO AUTOR PRÉ-MODERNISTA....................................................19 3 LIMA BARRETO: A TRAJÉTORIA DO AUTOR ...................22 3.1 UMA BREVE RECEPÇÃO DAS OBRAS DE LIMA BARRETO NO DECORRER DOS SÉCULOS..........................................................................................................26 4 CONTO BRASILEIRO E ALGUMAS DAS SUAS CARACTÉRICAS....................30 4.1 CONTO A NOVA CALIFÓRNIA E A CRÍTICA A SOCIEDADE BURGUESA DO SÉCULO XX...............................................................................................................31 4.2. OS. PRINCINPAIS. PERSONAGENS. DO. CONTO................................................34 4.3. AMBIÇÃO. E. O. PODER. DO. CAPITAL. NO. CONTO. A. NOVA. CALIFÓRNIA...........39 5 CONSIDERAÇÕES FINAIS ...................................................................................43 6 REFERÊNCIAS.......................................................................................................46.

(10) 9. 1 INTRODUÇÃO. A literatura usada como instrumento social permite ampliar a visão dos leitores. O entrelaçamento entre literatura, o escritor, a sociedade e a história, possibilita o surgimento da interdisciplinaridade, servindo de reflexão sobre as relações culturais na literatura. E por meio dela é expressada visões de mundo e grupos sociais. As mazelas sociais presentes no nosso país perpetuam á muitos anos. E poder pensar como é possível um determinado escritor por meio da sua obra transmitir em dado momento histórico e introduzi-lo partindo do social, porém não fazendo com que sua obra perca o valor literário é bastante significativo. Afonso de Henrique Lima Barreto (1881-1922), autor pré-modernista, um dos escritores mais estudados da nossa atualidade, foi um crítico aguçado da sua época. Porém não obteve valorização em sua trajetória de vida, houve uma insistência do escritor com a sonhada entrada na Academia de Letras, onde foi recusado por três vezes, devido a sua escolha do uso de uma linguagem que se desprendia da pureza gramatical. Lima Barreto trazia em suas obras uma escrita que se aproximava da cultura popular. Assumindo-se escritor e defensor de uma literatura militante, produzia críticas ferozes a sociedade. Criticas relacionadas á condição humana, ao preconceito racial, em (Memórias do Escrivão Isaías Caminha) e a luta de classes em (Triste fim de Poliquarpo Quaresma). Na sua obra, A Nova Califórnia possibilita o leitor pensar na desigualdade social, e nisso ele consegue partir de uma dada realidade e trazer para dentro da obra literária, tanto o contexto do Rio de Janeiro e a produção de riquezas a partir do modo de exploração capitalista ao mesmo tempo a realidade do ser escritor negro, rompendo-se com uma estética padrão do ato de escrita e reflexão sobre a sociedade brasileira. Porém não faz com que sua obra perca o valor literário e passe a ser conteúdo da sociologia. Candido (2010, p. 28) chama atenção para isso: “O primeiro cuidado em nossos dias, é, portanto, delimitar os campos e fazer sentir que a sociologia não passa de uma disciplina auxiliar; não pretende explicar fenômeno literário ou artístico, mas apenas esclarecer alguns de seus aspectos. Enfim, mesmo implicitamente, a obra em estudo deixa rastros de que seu ponto de partida foi o social, ou melhor, a desigualdade social que fazia parte da vida do autor na cidade de Rio de Janeiro. A partir do contexto histórico da vida do escritor, buscaremos entender: como o autor constrói crítica a sociedade burguesa do século XX, através do conto A.

(11) 10. nova Califórnia. Barreto traz na narrativa uma leitura da sociedade burguesa, deixando claro o ridículo e patético comportamento humano. A cidade do Rio de Janeiro, no início do século XX, era a capital Federativa, centro administrativo e econômico do Brasil, vivia o início da modernidade. Botelho (2002) afirma que, para L. Barreto todo o mal residia no capitalismo, na insensibilidade moral da burguesia e na sua ganância sem freio de espécie alguma. As influências sociais eram de importante valor para o escritor, algumas das modernidades que a sociedade vivia não o agradavam. Barreto, critico agudo, fazia por meio de suas obras, belas críticas que levam a grandes reflexões. Para tanto, podemos notar que L. Barreto critica o modelo social padrão da burguesia capitalista e evidencia as pessoas marginalizadas da sociedade. Mais adiante, buscaremos enfatizar como se dava o processo crítico feito por Barreto e a valorização das pessoas “apagadas” da sociedade, por meio de alguns dos seus personagens no conto em estudo. O interesse pelo estudo da crítica social feita pelo autor, através da obra A nova Califórnia, surgi com intuito de entender como o mesmo produziu tal crítica a sociedade burguesa do século XX. L. Barreto sendo pré-modernista e escritor urbano foi um dos críticos da Republica velha, rompendo-se com o nacionalismo, dava ênfase a abordagem mais real sobre a república e seus privilégios. Por meio da crítica literária Barreto exercia o papel de emitir opinião através de suas produções. Desde o título da obra, até os traços da escrita, nota-se o cunho crítico do autor. A narrativa do conto traz uma livre e irônica ridicularizarão a ambição daquela população. Portanto, a grande relevância de se estudar a crítica social é compreender como a classe dominante burguesa do século XX, estava descrita em sua abra por meio de alguns personagens sendo eles: Raimundo Flamel “Químico”, o farmacêutico Bastos, o procurador Carvalhaes e o Coronel Bentes, considerados os poderosos habitantes da cidade de Tubiacanga. E o personagem marginalizado, o “bêbado” Belmiro. Outro aspecto importante em se pesquisar é o intuito de observar como população Burguesa influencia a nossa atualidade, com alguns dos seus costumes e valores e perceber como foi construída tal crítica, levando em consideração todo o contexto da vida do autor. Vejamos que desse modo a contribuição da pesquisa no meio acadêmico e social é de suma importância, pois o levantamento da visão crítica social que L. Barreto fazia em suas obras, valorizava em si, as pessoas sem prestígio social, visto.

(12) 11. que o autor sofreu preconceito. Desse modo, a vantagem de se estudar a crítica social dentro da obra A nova Califórnia, é positiva, pois irá contribuir no âmbito social e acadêmico, pois o estudo do pré-modernista nos leva a pensar como a sociedade dominante, o levou a construir tal crítica, que nos possibilitará a refletir a sociedade daquela época e também a dos dias atuais. Temos como objetivo geral, analisar a crítica social no século XX produzida por Lima Barreto no conto A nova Califórnia. Compreender fatores históricos e sociais da vida do autor, buscando entender como é feita a crítica social no conto, e refletir como é dada as influências da burguesia do século XX, nos dias atuais, analisando os aspectos capitalistas na obra. Por meio dos personagens principais analisaremos a hipocrisia que regia boa parte da população da cidade fictícia. A nossa metodologia será qualitativa. Quanto a objeto pesquisa, será exploratório, envolvendo como instrumento técnico um levantamento bibliográfico. Para tanto será lidos artigos, ensaios, livros e dissertações, entre outros. Nesse sentido, a pesquisa se constituirá de leituras e análises de textos de teóricos voltados a literatura Brasileira e sociedade. Considerando o nosso objeto de estudo e a necessidade de leituras teóricas para fundamentá-los, serão lidos os seguintes autores: Bosi (2006), em Literatura Brasileira, onde focaremos na parte histórica do pré-modernismo e também algumas considerações sobre a vida e obras do escritor Lima Barreto. Candido (2010), em Literatura e Sociedade, onde é discutido sobre a crítica e a sociologia, a literatura e vida social, o escritor e o público. Assis (2017), em A vida de lima Barreto, onde será apresentado. com. detalhes. a. trajetória. do. escritor.. Romero. (1888). em. História/Fatores da Literatura Brasileira, trazendo visões acerca dos fatores que influenciaram a formação e o desenvolvimento de nossa literatura brasileira. Coutinho (2004) em A Literatura no Brasil, onde apresentaremos os pensamentos do escritor sobre a evolução do conto e seu contexto histórico no Brasil. Filho (2007), em A linguagem literária, onde enfatizaremos sobre a arte literária, língua e cultura. Entre outros autores, buscando uma contextualização das obras e críticas feitas pelo crítico urbano, L. Barreto. De início abordaremos sobre a literatura como instrumento social, com o intuito de entender como a literatura pode ser usada para a defesa dos povos marginalizados e crítica social, e também pensar como é possível através da mesma se fazer denúncias de forma literária. Buscaremos refletir sobre crítica social em.

(13) 12. obras literárias do autor L. Barreto e como o escritor construía tais críticas. Ao fazermos reflexões sobre literatura e crítica social, falaremos mais adiante sobre o pré-modernismo e seus aspectos históricos e de como L. Barreto via as novas modernidades que adentrava na cidade do Rio de Janeiro. No terceiro capítulo, apresentaremos a trajetória do escritor, dando ênfase em alguns dos seus problemas pessoais e de como sofreu preconceito durante toda sua trajetória. Iremos perpassar de como foi e é a recepção das obras de Lima no decorrer dos anos. No ultimo capítulo analisaremos aspectos capitalistas do conto, para essa análise, mostraremos o perfil de alguns personagens. Tentaremos apresentar como L. Barreto usava por meio da sua escrita irônica e humor sarcástico, reflexões acerca da ambição e hipocrisia. Evidenciaremos sobre o poder do capital e de como em uma sociedade capitalista, tudo vira uma possível mercadoria. Iremos trazer algumas características do gênero conto e como ele se desenvolveu no Brasil. Consequentemente, apresentamos as considerações finais, possíveis resultados finais, pois em uma obra literária a uma imensidão de possíveis interpretações. Porém, procuraremos verificar se foram atingidos os objetivos propostos na introdução e através das nossas reflexões..

(14) 13. 2 A LITERATURA COMO UM INSTRUMENTO SOCIAL Ao pensarmos qual o significado da palavra “literatura”, instintivamente vem ao nosso consciente que a literatura é “arte”. Mas, além de ser a arte da palavra, ela é um instrumento transformador para uma determinada época e sociedade, sendo ela um conjunto de obras literárias de valores estéticos, pertencentes a um país. A literatura é produto artístico, com as características peculiares da arte, trazendo através de obras literárias demonstrações de uma sociedade, revelando seu foco mais árduo de tensão e mágoa, traduzindo anseios de mudança dos mecanismos da permanência. É, porém, arte enraizada no contexto histórico. A partir da Era Moderna, a literatura passa a ter uma relação mais direta com a ideia de ficção e de criação, afastando-se um pouco da noção clássica de imitação da realidade (OLIVEIRA, 2009 p. 13). Dessa maneira, pensar como de tal forma obras literárias têm o poder de ser um instrumento social transformador de uma determinada sociedade, é bastante animador e curioso. Battistin (2009) em História do Brasil e Literatura Brasileira, afirma que: A literatura diz muito ao historiador sobre a "história que não ocorreu, sobre as possibilidades que não vingaram, sobre os planos que não se concretizaram. Ela é o testemunho triste, porém sublime, dos homens que foram vencidos pelos fatos”. Diz que a história não se resume aos fatos realmente sucedidos (BATTISTIN, 2009, p. 12).. Existem várias lacunas quando o assunto se trata da história da literatura brasileira. “Os primeiros escritos da nossa vida documentam precisamente a instauração do processo: são informações que viajantes e missionários europeus colheram sobre a natureza e homem brasileiro” (BOSI, 2006, p. 13). Embora tais escritos não sejam considerados literatura, devido a estarem presos as crônicas históricas, os mesmos fazem parte da nossa identidade literária e cultural. A literatura brasileira está estreitamente ligada a literatura portuguesa, a indígena e africana sendo elas uma das maiores influenciadoras durante longos anos. Coutinho (2004, p. 299), em A literatura no Brasil, relata que: “Duas teorias se defrontam no que concerne ás origens da literatura brasileira: a dos que defendem a origem precoce, na era romântica, e a dos que propugnam a origem remota, dirigidas pelos escritos barrocos”. Ainda segundo Coutinho (2004), desde o começo do século XIX, sobretudo em meados da década 20, a expressão “literatura.

(15) 14. brasileira” foi sendo empregada por críticos e historiadores. Contudo, na década de 20 vigorava o sistema de considerar pertencentes à literatura portuguesa os escritos nascidos no Brasil. Além disso, a literatura e a língua no Brasil tiveram desenvolvimento paralelo, a partir da formação da sociedade nova, em região nova do globo, com costumes, cultura, produção artística, sensibilidade, diversos dos existentes em Portugal (COUTINHO, 2004, p. 301).. A partir desse fragmento notamos a independência da literatura brasileira, pois, embora com influência da literatura portuguesa, são dois países diferentes com evolução histórica diversificada. Coutinho (2004, p. 302), problematiza sobre o domínio da literatura brasileira e faz a seguinte pergunta: Se denominamos literatura brasileira, por que também não usamos língua brasileira? Fazendo uma ponte com tal problematização, pensamos no ponto de vista defendido pelo escritor L. Barreto, em relação a sua forma de escrever, pois o crítico defendia a escrita sem o emprego do português casto e fazia o uso de uma “linguagem coloquial” e ao mesmo tempo despojada. De fato, não podemos negar que o nosso país sofre grandes falhas no requisito histórico universal relacionado a história escrita por brasileiros. Todo e qualquer problema histórico e literário há de ter no Brasil duas faces principais: uma geral e outra particular, uma influenciada pelo momento europeu e outra pelo meio nacional (ROMERO, 1888 p.4). Segundo Romero (1888) em História/Fatores da Literatura Brasileira, a literatura no Brasil, a literatura em toda a América, tem sido um processo de adaptação de ideias europeias às sociedades do continente. Esta adaptação nos tempos coloniais foi mais ou menos inconsciente; hoje tende a tornar-se compreensiva e deliberadamente feita. Tal é a razão por que todo poeta, todo romancista, todo dramaturgo, todo crítico, todo escritor brasileiro de nossos dias tem a seu cargo um duplo problema e há de preencher uma dupla função: deve saber do que vai pelo mundo culto, isto é, entre aquelas nações européias que imediatamente influenciam a inteligência nacional, e incumbe-lhe também não perder de mira que escreve para um povo que se forma, que tem suas tendências próprias, que pode tomar uma feição, um ascendente original (ROMERO, 1888, p.4).. No. Brasil,. verifica-se. entre. séculos. um. volume. de. movimentos. contestatórios, tecidos a partir de ferozes críticas políticas e econômicas. Estas,.

(16) 15. foram construídas a partir de uma proximidade com um corpo literário que sustentaria as ideológicas de tais insatisfações (PLATT, p. 267). Românticos como Castro Alves, com relação à escravidão, naturalistas como Aluísio de Azevedo, com seus tipos urbanos e regionalistas, como Graciliano Ramos, relatando sobre os retirantes nordestinos, todos foram importantes ao expor as privações a que eram submetidas as classes desfavorecidas da sociedade brasileira. Relacionado à prospectiva da literatura no Brasil, Coutinho (2004, p. 281), relata que: “O percurso da literatura brasileira identifica sempre, em cada manifestação nova ou gesto apenas esboçado, o esforço permanente da constituição nacional”. A partir desse fragmento, constatamos que a presença de aspectos nacionais em obras literárias brasileiras é pertinente. Em Literatura e Sociedade, Candido (2010), enfatiza a relação do escritor com a sociedade e como fatores externos podem influenciar no interno da obra. O externo (no caso, o social) importa, não como causa, nem como significado, mas como elemento que desempenha um certo papel na constituição da estrutura, tornando-se assim, interno (CANDIDO 2010, p. 14). Dessa maneira, ao analisar a obra, observa-se a organização interna, tomando o fator social, determinando se ela oferece (ambientes, costumes, traços grupais, e ideias). A literatura pré-modernista no Brasil contou com um grande autor crítico e aguçado. Lima Barreto, apontava algumas contradições na sua ideologia, no qual o mesmo detestava algumas formas típicas de modernização que a cidade do Rio de Janeiro, na qual ele viveu durante sua vida, conheceu no início do século XX, como o futebol, o cinema e arranha céus, entre outros. Trouxe em suas obras o retrato da população burguesa e como se instaurava a onda de nacionalismo no país. Buscaremos neste capítulo, analisar como a literatura se transforma em um instrumento social, e de que forma o escritor retrata duras críticas a uma determinada população.. 2.1 Reflexões sobre crítica social em obras literárias A autonomia da literatura brasileira partiu através do movimento artístico, o Romantismo, uma literatura própria, que foi tanto no terreno da criação, quanto na crítica, uma literatura com a ideia de ser genuinamente brasileira, pois era preciso mostrar que tínhamos uma literatura, exprimindo características que julgavam.

(17) 16. nacionais, evidenciando nossas belezas, o que havia de especifico do país. Por isso, o Indianismo aparecia como um timbre de suprema brasilidade. Daí a concepção passou à crítica naturalista, e dela aos nossos dias, levando a conceber a literatura como um processo retilíneo de abrasileiramento, por descoberta da realidade da terra ou recuperação de uma posição idealmente pré-portuguesa, quando não antiportuguesa. Resultaria uma espécie de espectrograma que a mesma cor fosse passando das tonalidades esmaecidas para as mais densamente carregadas, até o nacionalismo dos indianistas românticos (CANDIDO, 2010, p. 99).. Os apontamentos feitos sobre os primórdios da autonomia da literatura brasileira, é importante para refletirmos sobre a crítica social encontrada nos nossos escritos, especialmente do autor Lima Barreto, considerado um crítico aguçado da sua época. A função histórica ou social de uma obra depende da sua estrutura literária, e que esta repousa sobre a organização formal de certas representações mentais, condicionadas pela sociedade que a obra foi escrita (CANDIDO, 2010 p. 177).. A partir das palavras de Candido (2010), observamos que, o nível de. realidade e elaboração e a diferença de perspectiva da contemporaneidade do escritor está de certa maneira explicita na obra. O público é a condição que o autor tem de conhecer a si próprio, pois a revelação da obra é a sua revelação. O artista literário numa determinada sociedade não é apenas um indivíduo capaz de exprimir a sua originalidade, mas alguém que desempenha um papel social. A literatura é, pois, um sistema vivo de obras, agindo umas sobre as outras e sobre os leitores; e só vive na medida em que estes a vivem, decifrando-a, aceitando-a, deformando-a. A obra não é um produto fixo, unívoco ente qualquer público, nem este é passivo, homogêneo, registrando uniformemente o seu efeito (CANDIDO, 2010, p. 84).. Candido (2010), defende a literatura como ela é de fato e de como a mesma se configura com a realidade. Se a obra é mediadora entre o autor e o público, este é mediador entre o autor e a obra, na medida que o autor só adquire plena consciência, quando é mostrada a reação de terceiros (CANDIDO, 2010, p. 85). A posição do escritor dependerá dos conceitos sociais, o reconhecimento do coletivo. Platt (2013, p. 223), relata em A literatura como instrumento crítico: a instalação da crise política na ordem institucional brasileira entre os séculos XIX e XX que:.

(18) 17. Conforme Araújo, a orientação crítica da literatura tem seu vetor apontado ao esclarecimento histórico e à tomada de decisão “uma vez que expressam a realidade”. Há um diálogo entre escritor e seus contemporâneos neste sentido: é preciso considerar esse pressuposto uma vez que as decisões políticas são “inseparáveis da difusão das ideias” e sua repercussão (PLATT, 2013, p. 223).. A tradição da literatura enquanto denunciadora de injustiças na população é longa, porém, como afirma SANTOS & ROSA (2015, p.7) em Literatura como instrumento de denúncia social: análise de eles eram muitos cavalos e filhos da pátria, não basta apenas produzir um texto com elementos descritores da marginalização, da violência e miséria nas camadas mais pobres da sociedade. Para que a literatura atue como verdadeiro e eficaz instrumento transformador. O elemento estético é fundamental para a denúncia de mazelas sociais. Por isso a importância da aproximação do escritor com o seu meio social. “A composição de expedientes críticos na literatura surgida no Brasil entre os séculos XIX e XX viriam principalmente através de bacharéis e clérigos, muitos deles oriundos das Cátedras de Portugal e França” PLATT (2013, p. 268). A arte literária acompanha todos esses processos históricos. A arte, o meio social e a posição do artista refletem a sociedade. “A obra depende estreitamente do artista e das condições sociais que determinam a sua posição” (CANDIDO, 2010, p. 40). A partir do fragmento, observamos que as críticas sociais dependem estreitamente do artista. Tantos os valores, as técnicas de comunicação que a sociedade dispõe influenciam na obra e de como irá ser produzida tal crítica.. 2.2 Pré-modernismo no Brasil: contexto histórico Referente ao quadro mundial no período da iniciação do pré-modernismo, que relativamente foi um período tenso devido ao início do neocolonialismo. Segundo Bosi (2006, p. 303), as situações socioculturais marcaram a vida brasileira desde o começo do século XIX. São Paulo foi o irradiador do modernismo; ora com instâncias. nacionalistas,. ora. cosmopolitas,. ambas. faces. ideologicamente. conflitantes. A solidez do regime chamado “café com leite”, fórmula que reconhecia a lavoura cafeeira e também a junção da pecuária, sustentava a hegemonia dos proprietários rurais de São Paulo e Minas Gerais. O sucesso desse regime dependia em grande parte, do equilíbrio entre a produção e exportação de café. Dessa.

(19) 18. maneira, o Brasil foi governado ora por donos de fazendas cafeeiras de São Paulo, ora por fazendeiros de Minas, os dois estados mais ricos do país, na época. Havia, num matizado segundo plano, atuante e válido em termos de opinião: uma burguesia industrial incipiente em São Paulo e no Rio de Janeiro; profissionais liberais; e, fenômeno sul-americano típico, um respeitável grupo intersticial, o Exército, que, embora economicamente preso aos estratos médios, vinha exercendo desde a proclamação da República um papel político de relevo (BOSI, 2006, p. 304).. A sociedade brasileira dos fins do século XIX vai se moldando graças aos processos de modernização e urbanização e a vinda de imigrantes europeus, que se concentravam mais no centro-sul. Engrossa-se as fileiras da pequena classe média e da operária junto ao declínio da cultura canavieira do Nordeste, que não pode competir, nem nas capitais, nem nas mãos de obra com a ascensão do café paulista. Do quadro que emergem ideologias em conflito: o tradicionalismo agrário ajusta-se mal à mente inquieta dos centros urbanos, permeável aos influxos, europeus e norte-americanos na sua faixa burguesa, e rica de fermentos radicais nas suas camadas médias e operária (BOSI, 2006, p. 304).. A partir desse apontamento, observamos conflitos que tal situação comportava, um complexo mental do pequeno-burguês e da classe média oscilante entre o ressentimento e o reformismo. Os intelectuais brasileiros dos anos 20 começavam a ler os futuristas italianos, os dadaístas e os surrealistas franceses. Surgindo uma saudação do irracionalismo, como atitude existencial e estética, formando-se novos grupos ditos modernistas, influindo um tom agressivo, como que se põe em campo para demolir as colunas do parnasianas e o academismo em geral BOSI (2006, p. 305). A problematização da realidade social brasileira, com novos enfoques temáticos, constituiu a principal marca da literatura brasileira do período pré-modernista. Referente ao processo histórico do começo dessa fase, Bosi (2006) aponta que a fase dos irracionalistas que tiveram como escritores: Mario de Andrade, Manuel Bandeira, teórico do “alumbramento”, e Oswald de Andrade. E preso ao decadentismo estetizante, estava os escritores Guilherme de Almeida e Monotti Del Picchia. Dessa maneira, de acordo com Bosi:.

(20) 19. Nessa fase tentou-se, com mais ímpeto que coerência, uma síntese das correntes opostas: a centrípeta, de volta ao Brasil real, que vinha de Euclides da Cunha sertanejo, do Lobato o rural e do Lima Barreto urbano; e a centrífuga, o velho transoceanismo, que continuava selando a nossa condição de país periférico a valorizar fatalmente tudo que chegava da Europa (BOSI, 2006, p. 305).. No país com extração colonial, como o Brasil, a ânsia de se superar o subdesenvolvimento, dão passos largos no sentido da atualização literária. A transição do simbolismo para o pré-modernismo, revelava as tensões que sofria a vida nacional. Tendo como os principais autores: Euclides da Cunha, Monteiro Lobato, Graça Aranha e Lima Barreto. A obra de Lima Barreto significa o desdobramento do Realismo no contexto da primeira guerra mundial e das crises da república velha (BOSI, 2006, p. 324).. 2.3 Lima Barreto: Autor pré-modernista A semana da arte moderna foi como um divisor de águas onde o foco era trazer ideias estéticas em relação as outras correntes literárias. Creio que se pode chamar de pré-modernista (no sentido forte de premonição dos temas vivos de 22) tudo o que, nas primeiras décadas do século, problematiza a nossa realidade social e cultural (BOSI, 2006 p. 327). Foi também um período de transição (política, econômica e social), em que o Brasil conheceu novos artefatos modernos, novos meios de transporte e comunicação, a indústria, o início da publicidade e da imprensa empresarial, a reorganização urbana e social. O pré-modernismo uni os conceitos prevalecentes do Parnasianismo, Simbolismo, Realismo e Naturalismo. Cabendo ao romance de Lima Barreto e de Graça Aranha, Euclides, Alberto Torres, Oliveira Viana e Manuel Bonfim as tensões que sofria a vida nacional. A literatura nesse meio pré-moderno refletiu um caráter transitório, de um lado permanecia uma literatura de linguagem tradicional, acadêmica, repetindo os modelos parnasianos, de outro emergia uma linha progressista, voltada para o presente, que questionava a realidade social do país. Com essas novas mudanças ocorridas a partir do modernismo, houve uma revolução estética para nossa cultura. Bosi (2006, p. 369) aponta que as inovações atingiram os vários estratos da linguagem literária, desde as características materiais da pontuação e do traçado gráfico do texto até as estruturas fonéticas, léxicas e sintáticas do discurso. Assim, vista como “a fase heroica”, o pré-modernismo e o.

(21) 20. modernismo foi vista também como uma rica aventura experimental tanto no terreno poético quanto na ficção. O contexto histórico-cultural da literatura pré-modernista no Brasil, submeteu a vida brasileira da época a um questionamento, os escritores fixarão situações sociais de seu tempo, como a Guerra de Canudos, o problema da adaptação do imigrante, entre outros. Algumas das mensagens do plano temático da semana da arte moderna já estavam prefiguradas na literatura nacionalista de Lima Barreto. O autor prémodernista visava o social, e trazia em suas obras o húmus ideológico da sua origem humilde, a vida penosa de jornalista pobre. Bosi (2006 p. 340), afirma que o ressentimento e o suburbanismo não impediram o escritor de configurar com bastante clareza o patético e ridículo nacionalismo tomado como bandeira isolada e fanatizante. Tendo em seus romances muito de crônica, mostrando os ambientes, cenas quotidianas, tipos de café, de jornal, da vida burocrática da época. Noronha (2009, p. 29), em Lima Barreto entre lutas de representação: Uma análise da modernização da cidade do Rio de Janeiro no início do século XX, aponta que a compreensão das condições encontradas por Barreto para divulgação de seus escritos passa pela análise da situação em que se encontravam os intelectuais no início do século XX. Partindo da perspectiva do papel que o autor desempenhava na sociedade o mesmo propunha uma escrita desafiadora e inovadora para época. Candido (2010), faz observações acerca do escritor e seu público: Frequentemente tendemos a considerar a obra literária como algo incondicionado, que existe em si e por si, agindo sobre nós graça a uma força própria que dispensa explicações. Esta ideia elementar repousa a hipótese de uma virtude criadora do escritor, misteriosamente pessoal; e mesmo quando desfeita pela análise, permanece em todos nós, leituras, na medida em que significa repugnância do afeto as tentativas de definir os seus fatores, isto é, traçar de algum modo os seus limites (CANDIDO, 2010, p. 83).. Portanto, o escritor em uma determinada sociedade é alguém que desempenha um papel social. A matéria e a forma de sua obra dependerão em parte da tensão entre as veleidades profundas e a consciência ao meio, caracterizando um diálogo mais ou menos vivo entre o criador e o público (CANDIDO, 2010, p.84). Pensando na sociedade do Rio de Janeiro, capital do Brasil no século XX, alguns intelectuais da época, segundo Noronha (2009, p.30), vinham se.

(22) 21. decepcionando com o regime republicano que assumia contornos cada vez mais burgueses e não possibilitava a satisfação de seus desejos de reforma social. Barreto destrinchava os bastidores da grande imprensa e revelava o que considerava os “defeitos” de autores renomados da época e seus interesses mesquinhos, buscando nos recursos utilizados pela própria imprensa meios para construir uma linguagem diferente da culta, de forma que aproximasse mais a realidade das mazelas. Porém, esse tipo de inovação e a forma de linguagem diferente que o escritor utilizava, lhe fecharam muitas portas (NORONHA, 2009, p. 44). Dessa maneira, podemos observar que o escritor L. Barreto buscava canais que lhe permitisse travar diálogos no intuito de combater os problemas sociais e culturais que percebia na cidade do Rio de Janeiro, fazendo o uso de uma literatura diferenciada, uma literatura militante. Abordaremos no próximo capítulo mais aguçadamente sobre a vida e obra do autor e alguns dos seus aspectos críticos..

(23) 22. 3 LIMA BARRETO: A TRAJÉTORIA DO AUTOR Ao abordamos sobre a biografia do escritor Lima Barreto, retomamos todo o húmus ideológico presente em suas obras, a vida de um brasileiro negro que conhece durante a sua trajetória as mazelas da sociedade, convivendo desde o meio mais privilegiado até aos subúrbios da cidade do Rio de Janeiro. Afonso Henrique de Lima Barreto (Rio de Janeiro, 1881-1922), era filho de um tipógrafo e de uma professora primária, João Henriques de Lima Barreto e Amália Augusta Pereira de Carvalho. Porém o seu contato com a mãe foi em curto período, ela faleceu quando o autor tinha apenas sete anos de idade, vítima de tuberculose. A mais forte impressão de Lima Barreto nos primeiros anos de vida, foi sem dúvidas a morte da mãe. O seu pai, por conta de sua identificação com os liberais, após a proclamação da República, sofre perseguições e veio a perder o lugar de mestre de composição na Imprensa Nacional. A infância conturbada, a morte prematura da mãe, os eventos relacionados à chegada da República e a perseguição sofrida pelo pai deixaram marcas profundas não só na personalidade de Lima Barreto, como também no conteúdo de sua obra (JUNQUEIRA, 2017, p.1). Segundo Assis (2017, p. 103), um dos seus mais célebres biógrafos, de L. Barreto. Abordará em sua obra A vida de lima Barreto, que nos tempos de colégio, nem no Liceu Popular Niteroiense e nem do Paulo de Freitas não sentia Lima Barreto a diferença de classe, só depois de homem feito se deu conta de sua condição, menosprezado por “olhares vesgos e idiotas”, que não despregavam dele “nos cafés, nas ruas, nos teatros”. Contudo a sua passagem por instituições de ensino possibilitou o contato com sujeitos de camadas mais elevadas da sociedade carioca e o acesso à cultura letrada de sua época, que era extremamente alicerçada na cultura europeia (NORONHA, 2009, p. 22). O preconceito contra o jovem negro se revelou mais diretamente na Escola Politécnica, onde acontece um episódio de descriminação racial contra o escritor. Narrado por Barbosa: O fato é que, ao tomar conhecimento do nome bonito do novo colega - Afonso Henrique de Lima Barreto -, um veterano mal-humorado fizera para o secretário da Escola, Sousa Ferreira o seguinte comentário: “Vejam só, um mulato ter a audácia de usar o nome do rei de Portugal! ” (BARBOSA, 2017 p. 104)..

(24) 23. As reprovações lhe aborreciam e ao seu pai, e cada vez mais lhe dominava o sentimento de injustiça contra todo aquele meio hostil. Porém, seu pai não desistia de o ver o filho formado, ignorando todo o drama que Barreto se debatia. Era o próprio almoxarife quem pagava o estudo do filho, Ouro Preto, que havia costeado os primeiros estudos do afilhado já não ajudava mais o compadre João Henrique (BARBOSA, 2017 p.110). Sendo estudante pobre, mulato e com dificuldades no relacionamento com professores e colegas, a atmosfera estudantil e as exigências do curso de engenharia não combinavam com sua personalidade (NORONHA 2017, p. 2). O escritor, por outro lado, se dedicava mais tempo à leitura de tratados filosóficos e romances do que propriamente aos manuais de topografia e cálculo (NORONHA 2017, p. 2). No ano de 1903, seu pai foi afastado da função que exercia na colônia dos alienados, devido ao fato de acontecer uma série de crises de alucinação e pânico, esses acontecimentos acabaram com o afastamento definitivo e aposentadoria do pai do escritor. Após o diagnóstico da loucura do pai, Lima Barreto foi obrigado a se afastar do curso para poder trabalhar e prover o sustento da família. Ainda em 1903, ingressou por concurso público na Secretaria da Guerra para desempenhar a modesta função de amanuense. Em 1909, o escritor publicou seu primeiro romance, Recordações do escrivão Isaías Caminha, com intuito de causar um escândalo no meio literário. Contendo na obra uma autobiográfica ilhada e exasperada nos primeiros capítulos objetivando descrições de tipos vários: político, jornalístico, o burocrata carioca do começo do século XX. Sustenta a presença de Isaias como personagem polarizadora a própria frustração do autor, que nele se encarna, tornando especialmente doídos os seus encontros preconceituosos de cor e de classe (BOSI, 2006, p. 341). Trazendo um tom sentimental, outra hora uma representação da sociedade classista. Assim, o convívio de objeto e sujeito, de observação social e ressonância afetiva, define com propriedade o estilo realista-memorialista de Lima Barreto (BOSI, 2006, p. 341). Em 1911, Barreto deu início à publicação no Jornal do Comércio, em forma de folhetim, Triste Fim de Policarpo Quaresma, um romance em terceira pessoa, em que se nota um maior esforço para acabamento formal. Bosi (2009, p. 341), relata que nessa obra Lima Barreto conseguiu criar um personagem que não fosse mera projeção de amarguras pessoais, como o amanuense Isaias Caminha, nem um tipo.

(25) 24. pré-formado nos moldes das figuras secundárias que pululam em outras obras de sua autoria. O Major Quaresma, um patriota desajustado e solitário, traz em sua vida uma obsessão ao nacionalismo, e todo esse fanatismo pela pátria o leva a enfrentar consequências. No dizer arguto de Oliveira Lima, tem Policarpo algo de quixotesco, e o romancista soube explorar os efeitos cômicos que todo quixotismo deve fatalmente produzir, ao lado do patético que fatalmente acompanha boa-fé desarmada. Seus requerimentos pedindo ás autoridades que introduzissem o tupi como língua oficial; sua insólita forma de receber as visitas, chorando e gesticulando como um legítimo goitacá; suas baldadas pesquisas folclóricas na tapera de uma negra velha que mal recorda cantigas de ninar: eis alguns dos recursos para ferir a tecla do riso (BOSI, 2006 p. 341).. Todas as desventuras do personagem principal, a onda de nacionalismo, páginas finais de solidão e críticas aguçadas foram produzidas de maneira cômica. Foi por essa época, e coincidindo com sua fase mais criativa e fecunda, que Lima Barreto se entregou ao vício do álcool e à vida desregrada (NORONHA, 2017 p. 5). O uso do álcool de modo imoderado não tardou a manifestar, trazendo graves problemas de saúde. Se alimentando mal a perambular por bares e botequins, a sua vida boêmia lhe trouxeram muitas consequências. Curioso boêmio! Lima Barreto desnorteava quase sempre os companheiros de farra. Não raro, desaparecia do grupo e ia beber sozinho, longe de todos, o seu parati. E que sentia a necessidade de andar, bebericando aqui, ali, acolá, mais adiante, vencendo várias distancias a pé, até mais não poder, tonto de álcool e morto de cansado (BARBOSA, 2017 p. 220). Segundo Noronha (2017, p. 6), no ano 1914, depois de uma série de crises de alucinação e pânico, Lima Barreto foi recolhido ao Hospício Nacional de Alienados e lá permaneceu até outubro. O documento de internação diagnosticou neurastenia e assegurou que o surto de insanidade se devia ao consumo excessivo de bebida alcoólica. Passado esse momento de crise, um ponto importante a se pensar foi a participação mais ativa do autor na imprensa. Após a sua aposentadoria em 1919, Barreto intensifica a sua colaboração, escrevendo na Careta, no A.B.C., em Hoje, no Rio-jornal, n’ A Noticia, n’ O país, na Gazeta de Notícias, desses trabalhos o escritor ganhava seu ganha-pão. Atento a tudo, criticava severamente os costumes brasileiros, sobretudo tinha conhecimento e não deixava de opinar sobre os acontecimentos mais importantes do seu tempo: a Revolução Russa, a Conferência de Versalhes..

(26) 25. Lima Barreto sempre usou do tom da ironia e sempre foi muito sincero. Barbosa (2017, p.281), relata que o escritor achava um absurdo todo aquele sonho de grandeza, em um país arruinado. De fato, as obras de Barreto significam um desdobramento do Realismo no contexto novo da I Guerra Mundial e das primeiras crises da República Velha (BOSSI, 2006, p. 346). O mestre da ficção de escárnio mais uma vez caiu em declínio, no ano de 1919 foi internado devido a uma nova crise de loucura. O hospício nunca foi um hotel de estações de água, para o autor era bastante doloroso o rebaixamento de ser internado sucessivamente. Além da dor que o escritor sentia por estar revivendo todo o sofrimento que viveu com o seu pai, era como se repetisse toda a história, com o roteiro praticamente igual. O álcool que lhe consumira todas as suas energias vitais, estava por consumir a sua obra de devastação (BARBOSA, 2017, p. 330). Para os brasileiros, o ano de 1922 começou cheio de expectativas, pois, foi o ano das eleições presidenciais e do Centenário da Independência e da Exposição Universal, dos movimentos sociais de trabalhadores, que cresciam cada vez mais. O autor pré-modernista não deixa passar em branco o ridículo, o exagero e o descompasso, fundos irremediáveis de nossa personalidade nacional sempre resultado da tentativa de imitar a grandeza alheia (JUNQUEIRA, 2017, p. 9). Lima Barreto tinha apenas 41 anos, quando devido ao um colapso cardíaco, falece. Deixando as seguintes obras publicadas: os romances Clara dos Anjos (1948) e Cemitério dos vivos (1956); as sátiras Aventuras do Dr. Bogóloff (s.d.) e Os bruzundangas (1922); as coletâneas de artigos e crônicas Feiras e mafuás (1953); Marginália (1953) e Vida urbana (1956), e as memórias Diário íntimo (1953). As obras de Lima Barreto, principalmente Triste fim de Policarpo Quaresma (1915), foram traduzidas para vários idiomas, destacando-se o tcheco, o japonês e o húngaro. 3.1 Uma breve recepção das obras de Lima Barreto no decorrer dos séculos. O escritor pré-modernista Lima Barreto é um dos maiores autores do Brasil e também um dos mais procurados e estudados da nossa atualidade, existem várias pesquisas sobre sua biografia e obras literárias, nas áreas da sociologia, da história, da filosofia e do jornalismo. Por ser um crítico literário, por meio da sua narrativa, Barreto, desenvolvia críticas agudas ao estilo de vida da sua época, precisamente.

(27) 26. nos meados do século XX, na capital federativa do Brasil, na cidade do Rio de Janeiro. O autor sofreu muito preconceito, primeiramente por ser negro e também por ser marginalizado e morador de subúrbio. Considerado um visionário, Barreto, trazia por meio da sua escrita irônica e sátira, reflexões sobre assuntos importantes a serem discutido naquela época e que tem grande relevância para serem pesquisados nos dias atuais. Nogueira (2010), em Lima Barreto e a crítica: a publicação de recordações do escrivão Isaias Caminha, relata que com plena consciência do fazer literário, militante, engajado e preocupado em tornar públicas, por meio da literatura, as mazelas políticas e sociais que assolavam o país, principalmente o Rio de Janeiro. Com isso, Lima Barreto se propôs inteiramente à disposição de uma literatura de protesto e inconformismo. A nova face da “República das Letras”, impulsionada pelas reformas urbanas e sociais cariocas, se ampliaria com a fundação da Academia Brasileira de Letras em 1897, reduto de estabilidade e consagração por excelência (NOGUEIRA, 2009, p. 3). Lima Barreto, por meio dos seus romances, crônicas, escritos autobiográfico espantava os mandarins literários da época, detentores do poder cultural instituído, daria voz às ruas, aos excluídos desse campo intelectual predominante e opressor. (NOGUEIRA, 2009, p. 3). “A república de letras” se apresentava no país, com a junção de sujeitos ímpares, originados da classe dominante, com formação europeia pautada principalmente por um estatuto iluminista. A classe social do autor passou a ser uma espécie de escudo, pelo fato dele sempre ter sido estigmatizado pela sua cor, pelo alcoolismo e, principalmente, pela linguagem cáustica, irreverente e irônica. Sendo assim, Barreto passou cada vez mais a optar pela libertação dos moldes literários tradicionais, aceitando a liberdade da linguagem esteticamente revolucionária para os padrões validados da época. Por meio dos jornais e revistas, falava toda a verdade aos poderosos da elite, até ser considerado um intelectual. Diante de todos esses apontamentos é possível se pensar que os escritos narrativos de Lima Barreto, estavam fora do seu tempo? Sua narrativa expõe de forma direta e ferina temas polêmicos. Defensor de uma literatura militante, onde criticava os regimes conservadores da república federativa, Barreto lutava sobre as questões sociais como racismo e as relações entre imprensa e poder público durante a república velha. Apoiador das mazelas sociais, o escritor foi um visionário..

(28) 27. Pensando fora do seu tempo, Lima, não defendia valores ultrapassados, e essa condição de engajamento, explicitada pelo escritor, relaciona-se a aspectos próprios a literatura moderna e a relação desta com as lutas sociais de seu tempo (SOUZA 2017, p. 245). A partir do conhecimento do papel que desempenhavam na sociedade, as suas relações com as esferas do poder estatal e a imprensa que então se modernizava bem como dos espaços de solidariedade que construíam, poderemos vislumbrar o modo como Lima Barreto pôde traçar seu caminho na tentativa de se tornar um grande escritor (NORONHA, 2009, p.30). Impedido de ingressar na Academia Brasileira de Letras, tentou por três vezes a sua candidatura. O próprio escritor viria a reconhecer, o motivo pelo o qual não era aceito, e em carta enviada a Monteiro Lobato e hoje recolhida na sua correspondência, relatava que: “sei bem que não dou para a Academia e a reputação de minha vida urbana não se coaduna com a sua respeitabilidade” (JUNQUEIRA, 2017, p. 5). A Academia era uma espécie de reduto destinado à consagração dos escritores e, uma vez transposta sua porta, os agraciados podiam contar com crédito total em qualquer casa editora do Rio e a tutela do Estado. Além disso, essa instituição se constituía como um salão de bom gosto, reunindo escritores de hábitos sóbrios (NOGUEIRA, 2009, p. 44).. Para o escritor, a sua possível entrada na Academia Brasileira de Letras, era questão de mérito. Em sua primeira tentativa em 1917, havia publicado três romances, sendo que o Triste Fim de Policarpo Quaresma (1911) tinha recebido elogios de críticos reconhecidos, e, além disso, possuía uma grande quantidade de produções avulsas em jornais e revistas (NORONHA, 2009, p. 44). Porém, o que Lima conseguiu na Academia foi a menção honrosa recebida em função do romance Vida e Morte de M.J. Gonzaga de Sá no concurso para o melhor livro do ano de 1919. Segundo Bortoloti (2018) em O beija-mão na Academia Brasileira de Letras, relata sobre possíveis manobras nas eleições da academia. Em relação ao contista em estudo, diante as suas três candidaturas, nem sequer foram acatadas, sob a alegação de que o escritor não cumprira o protocolo da inscrição formal. Apesar de tal reputação a Academia de Letras era objeto do desejo de muitos escritores, entre eles modernistas históricos..

(29) 28. Segundo Noronha (2009, p. 30), no início do século XX, os intelectuais da chamada “geração de 70” já se encontravam alijados de uma participação mais efetiva nos rumos que o regime republicano imprimia à nação bem como o modo de vida boêmio de muitos de seus componentes vinham sendo gradativamente condenados. Esses intelectuais se decepcionavam com o regime republicando que não o satisfaziam o desejo de uma reforma social, mas cada vez tomavam contornos burgueses. A tentativa do regime republicano em moldar a sociedade brasileira a partir do padrão burguês não admitia, obviamente, o comportamento boêmio de muitos desses intelectuais, como os seus encontros em bares, cafés e confeitarias da capital. Dessa maneira, Lima Barreto buscava seu espaço através da imprensa, optando por uma literatura social, construindo uma linguagem diferenciada que abordasse a sua realidade de forma mais profunda. Para o escritor, a literatura, antes de tudo, teria que ser sincera, devendo ter um destaque nos problemas sociais. Para Candido (2010, p. 84), a partir das reflexões sobre o escritor e o público, relata que: A literatura é, pois, um sistema vivo de obras, agindo uma sobre as outras e sobre os leitores; e só vive na medida em que estes a vivem, decifrando-a, aceitando-a, deformando-a. A obra não é produto fixo, unívoco ante qualquer público; nem este é passivo, homogêneo, registrando uniformemente o seu efeito (CANDIDO, 2010, p. 84).. Pensar sobre a condição social e lutar através da arte literária ao favor dos marginalizados foi o que L. Barreto buscou durante sua vida. Os contatos com o cotidiano das camadas populares e as produções e comportamentos da intelectualidade reunida na cidade do Rio de Janeiro foram um verdadeiro campo de observação para Lima Barreto construir o caminho que a sua literatura devia trilhar (NORONHA 2009, p. 46). A escrita de Barreto transpira crítica e revolta contra a sociedade, debatendo sobre ideologias dominantes da época, evidenciando através de suas obras, em especial Memórias do Escrivão Isaías Caminha, o pré-modernista faz crítica diretamente ao racismo. Apesar de todos os apontamentos, devidamente positivos, o escritor era visto em sua época como um “escritor menor”, por desapegar dos moldes conservadores, desconsiderando a “pureza da forma” e a “purismo.

(30) 29. gramatical”. Suas obras mostram a realidade de seu tempo e apontam as práticas que privilegiavam algumas classes sociais..

(31) 30. 4 CONTO BRASILEIRO E ALGUMAS DAS SUAS CARACTÉRICAS As primeiras manifestações de “conto” no Brasil, apareceram na época colonial, junto ao conto, surgia também a literatura de cordel. Romero (1888), cita em História da literatura brasileira, que tanto o conto, quando a novela e o romance, só teriam começado no Brasil, de forma literária, um pouco antes de findar a primeira metade do século XIX. Segundo Coutinho (2004, p.46) em A literatura no Brasil, “Diz Barbosa Lima que o conto se divulgou no Brasil como gênero autônomo, no período de influência romântica”. Os melhores escritores de contos eram os jornalistas de prestígio da época, como Justiniano José da Rocha, Pereira da Silva, Josino Nascimento da Silva, Firmino Rodrigues da Silva, Francisco de Paula Brito, Vicente Pereira de Carvalho Guimarães, Martins Pena, João de Sousa e Silva Rio. Esses foram os, efetivamente os precursores do conto no Brasil (COUTINHO, 2004, p.46). Levando em consideração que a escrita remetia à escrita jornalista com moldes europeus, transportando para o Brasil, uma espécie de ficção, levando aos escritores a obterem êxito. O conto era mais jornalístico do que propriamente literário. O primeiro desses “contos”, realizado em um gênero considerado ainda “intermediário”, que não era bem crônica, e se aproxima do conto, foi “A caixa e o tinteiro”, publicado em 26 de janeiro de 1836, por Justiniano José da Rocha, em seu jornal O cronista. A evolução do conto perpassa por anos. O gênero considerado independente, toma forma em fatores preponderantes, na sua forma, apresentação dos personagens e preparação do clímax. Coutinho (2004, p.49), afirma que a predileção de Machado de Assis pelo conto firma-se, desde os seus inícios literários, e o mesmo dizia que: “É gênero difícil, a despeito da sua aparente facilidade e creio que essa mesma aparência de facilidade lhe faz mal, afastando-se dele os escritores e não lhe dando, penso eu, o público, toda atenção de que muitas vezes é credor”. As palavras do escritor Machado, remete a valorização do gênero, e a importância de saber o valor da obra, que por ser menos vasta, é esteticamente rica. Machado sendo o fixador das principais diretrizes do gênero conto. Os contos da era pré-modernista, tem como autores relevantes, Lima Barreto e João do Rio. Dois escritores substancialmente diversos, pela natureza de suas criações..

(32) 31. Barreto, evocava a vida suburbana do Rio de Janeiro, cinzenta e monocorde, com suas pequenas tragédias da meia burguesa, a sua amarga e sutil anotação da pobreza espesinhada, sua ternura pelos humildes, a sátira agudamente cerebral, de que servem de exemplo algumas histórias do mais alto nível, como “Clo” e “Clara dos Anjos”, “ A biblioteca”, “Nova Califórnia”, “O homem que sabia javanês” (COUTINHO, 2004, p. 54).. Os contos de Lima Barreto, segundo Rosso (2006), em Contos em Lima Barreto, são exemplos de relações entre modos tradicionais de narrar as especificidades do conto moderno. Fugindo dos parâmetros estabelecidos para o gênero, porem mantendo a qualidade literária e amplitude. “Alta qualidade e perfeita coerência que, como se sabe, combinadas, caracterizam todo grande escritor” (ROSSO, 2006, p. 1). Apresentam-se no conjunto de contos de Lima Barreto os mesmos cinco eixos temáticos em torno dos quais desenvolve-se nas obras romanescas e suas obras não-ficcional: a política; a mulher, o cotidiano da cidade e o subúrbio.. 4.1 Conto A nova Califórnia e a crítica a sociedade burguesa do século XX. O conto A nova Califórnia, de Lima Barreto escrito no ano de 1910 e publicado em 1916, faz uma retratação da pequena população de uma cidade fictícia chamada Tubiacanga, Rio de Janeiro. A história é narrada em 3° pessoa, narrador onisciente. A sátira perpassa tanto pelo o âmbito dos explícitos comportamentos desaprovados pelos humanos, e feitos por estes mesmos, como o da comicidade advinda das exagerações e situações inusitadas criadas justamente para trazer inicialmente o riso, mas, em seguida, a reflexão (SILVA & SOUZA, 2012, p.1). Segundo Bastos (2017), em A Nova Califórnia de Lima Barreto e as velhas ambições humanas, o título da sátira ironiza os antigos relatos sobre a Corrida do Ouro nos Estados Unidos do final do século XIX. Raimundo Flamel, o nome dado ao protagonista da trama, parece provir da combinação dos nomes dos alquimistas Raimundo Lúlio (1232-1315) e Nicolau Flamel (1330-1418). A narrativa inicia-se com a chegada do personagem Raimundo Flamel, o “químico”, um misterioso morador. Daí por diante começa toda a trama, aquela cidade que era até então tranquila e calma, tomaria outro rumo. O novo morador apontava saber uma fórmula secreta que transformaria ossos em ouro, porém para.

(33) 32. revelar essa tal descoberta o personagem escolhe os homens mais importantes da cidade, aqueles com poder aquisitivo. Dessa maneira, quando todos descobrem o segredo, Raimundo Flamel, some sem nunca ter revelado qual era a fórmula. Os habitantes da cidade começam a travar uma verdadeira guerra para poder conseguir os ossos dos defuntos, com intuito de transforma-los em ouro. E aquele lugar que a mais de cinco anos não se registrava nenhum furto, onde: “As portas e janelas só eram usadas... porque o Rio as usava”, passou a ser palco de violentas ações (BARRETO, 1979, p. 5). Toda população buscava explicação, para atitudes tão perversas, algumas das pessoas chegavam a pensar que os roubos de ossos estavam relacionados a coisas sobrenaturais. O cemitério que levava o nome de “Sossego”, passava agora a ser um lugar movimentado, para lá se dirigia do mais rico ao mais pobre. No entanto o conto, destaca a selvageria humana, a ambição, uma retratação da sociedade que leva em conta o capital e o individualismo. Levando em consideração que o autor L. Barreto, foi um grande crítico da república velha e enfatizava em suas obras críticas relacionadas ao nacionalismo e as causas sociais, na sátira, A nova Califórnia, o escritor mostra que o único personagem que não participou da selvageria, foi o bêbado Belmiro, considerado por todos uma pessoa sem valor e marginalizada, mas que, no fim foi o único sensato e que não se importou com aquela situação. Trataremos com ênfase sobre os principais personagens, mais adiante. De fato, a obra evidencia a ambição da população, deixando claro o lado negro das pessoas respeitáveis, que acabam perdendo seus valores morais quando o assunto é relacionado a dinheiro e enriquecimento fácil. A partir da trajetória da vida de Lima Barreto, é perceptível que a obra em estudo; A nova Califórnia, parte de uma realidade (externa), na qual o próprio autor se familiariza, pelo fato de ter convivido na cidade de Rio de Janeiro, e por ter acompanhado parte do processo de modernização que estava acontecendo durante o período em que a obra foi escrita. No século XX a cidade de Rio de janeiro estava passando por um processo de reurbanização, com o intuito de embelezamento, e para isso se pretendia expulsar a população marginalizada da região. Nisto, pode-se observar que na narrativa existe uma busca incessante de bens materiais, ao ponto de arrancarem vidas para conseguirem riquezas e igualdade social por meio de “ossos”. Viana (2017), em A força do dinheiro em A nova Califórnia, de Lima Barreto, afirma que na.

(34) 33. sociedade moderna a mercantilização das relações sociais, aos poucos vai paulatinamente se transformando em mercadoria. O dinheiro se torna o principal meio de sobrevivência, mas também o principal meio de ganhar a competição social. O portador de dinheiro tem o “poder aquisitivo” e quanto mais dinheiro, maior poder aquisitivo, e, junto com ele, mais poder, mais status, maior possibilidade de conseguir todo o resto. Isso, junto com outras características da sociedade capitalista, tal como a competição social (VIANA, 2017).. Dessa forma, pode-se perceber a relação existente no dado momento histórico social que o Rio de Janeiro estava passando, com a trama da obra em estudo, na qual na cidade existia uma população minoritária ameaçada de ser expulsa de suas terras, e no conto possui também uma população menos favorecida, ambiciosa, e com o desejo de fazer parte da sociedade Burguesa. Com isso, a realidade (externa) da vida do autor, passa para dentro da obra (interno). Candido (2006, p.14), diz que há a possibilidade de o externo se tornar interno na obra literária: [...] Podemos entender fundido texto e contexto numa interpretação dialeticamente íntegra, em que tanto o velho ponto de vista que explicava pelos fatores externos, quanto o outro, norteado pela convicção de a estrutura é virtualmente independente, se combinam como momentos necessários para do processo interpretativo. Sabemos ainda que o externo (no caso, o social) importa, não como causa, nem como significado, mas como elemento que desempenha um certo papel de constituição da estrutura, tornando-se assim, portanto interno (CANDIDO, 2006 p.14).. Por meio do fragmento, ver-se que a realidade social não é jogada na obra aleatoriamente, mas deve-se torná-la interna ou seja, fazer com que o externo passe a ter um caráter literário dentro da obra, para que não seja apenas um relato social. A obra literária exige que se tenha uma linguagem conotativa, metafórica, complexa, nisso a obra de Barreto apresenta traços artísticos, e uma linguagem que de certa forma se distancia da sua realidade, porém revela condições de vida da população a qual ele convivia. Filho (2007), em A linguagem Literária afirma que: O texto literário realmente significativo ultrapassa os limites do codificador para atingir, por força ainda do mistério da criação em literatura, com mensagens capazes de revelar muito da condição humana. Caracteriza um mergulho na direção do ser individual, do ser social, do ser humano (PROENÇA FILHO, 2007, p.41)..

Referências

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