• Nenhum resultado encontrado

UNIVERSIDADE FEDERAL DO MARANHÃO CENTRO DE CIÊNCIAS HUMANAS PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM CIÊNCIAS SOCIAIS MESTRADO EM CIÊNCIAS SOCIAIS

N/A
N/A
Protected

Academic year: 2019

Share "UNIVERSIDADE FEDERAL DO MARANHÃO CENTRO DE CIÊNCIAS HUMANAS PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM CIÊNCIAS SOCIAIS MESTRADO EM CIÊNCIAS SOCIAIS"

Copied!
134
0
0

Texto

(1)

UNIVERSIDADE FEDERAL DO MARANHÃO

CENTRO DE CIÊNCIAS HUMANAS

PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM CIÊNCIAS SOCIAIS

MESTRADO EM CIÊNCIAS SOCIAIS

JORGE LUIZ FEITOZA MACHADO

AÇÃO POLÍTICA, MISSÃO PASTORAL E INSTÂNCIAS DE INSERÇÃO: engajamento de clérigos no Maranhão (1970-1980)

(2)

JORGE LUIZ FEITOZA MACHADO

AÇÃO POLÍTICA, MISSÃO PASTORAL E INSTÂNCIAS DE INSERÇÃO: engajamento de clérigos no Maranhão (1970-1980)

Dissertação apresentada ao Programa de Pós-Graduação em Ciências Sociais da Universidade Federal do Maranhão para obtenção do Grau de Mestre em Ciências Sociais

Orientadora: Profª. Dra. Eliana Tavares dos Reis

(3)

JORGE LUIZ FEITOZA MACHADO Machado, Jorge Luiz Feitoza.

Ação política, missão pastoral e instâncias de inserção: engajamento de clérigos no Maranhão (1970-1980) / Jorge Luiz Feitoza Machado. – 2012. 133f.

Impresso por computador (Fotocópia). Orientadora: Eliana Tavares dos Reis.

Dissertação (Mestrado) – Universidade Federal do Maranhão, Programa de Pós-Graduação em Ciências Sociais, 2012.

Militantes religiosas – Maranhão – Aspectos sociais 2. Clérigos – Intervenção militante 3. Domínio religioso – Politização I. Título

(4)

AÇÃO POLÍTICA, MISSÃO PASTORAL E INSTÂNCIAS DE INSERÇÃO: engajamento de clérigos no Maranhão (1970-1980)

Dissertação apresentada ao Programa de Pós-Graduação em Ciências Sociais da Universidade Federal do Maranhão para obtenção do grau de mestre em Ciências Sociais

Aprovada em / /

Banca Examinadora

__________________________________________ Profª. Dr.ª Eliana Tavares dos Reis (Orientadora)

PPGCSO/UFMA

__________________________________________ Prof. Dr. Igor Gastal Grill

Cientista Político - PPGCSO/UFMA

__________________________________________ Prof. Dr. Ernesto Seidl

(5)
(6)

AGRADECIMENTOS

Diversas foram as formas de contribuição na empreitada de elaboração deste trabalho e todas elas, neste momento, ensejam os mais sinceros agradecimentos de minha parte. Em caso de alguma omissão, espero que seja relevada, pois a todos aqueles que manifestaram, a seu modo, um apoio ou um incentivo à consecução da presente dissertação, mencionados ou não, o sentimento de gratidão é generalizado.

Diante das ressalvas apresentadas, gostaria de agradecer de imediato à minha mãe, Fátima de Jesus Feitosa e ao meu irmão Jobson, que incentivaram incondicionalmente os meus esforços e que, certamente, estão orgulhosos. Sou grato também à Eurilanda Cristina, companheira que soube compreender as angústias e contratempos da pesquisa, oferecendo as palavras certas nos momentos complicados. Agradeço ainda ao casal Eib, Sebastien e Eurides, pela força importante com o envio de livros em francês e com a ajuda nas traduções.

Agradeço a CAPES por ter viabilizado materialmente as condições de realização desta pesquisa. Estendo esses agradecimentos ao padre Everaldo, atual pároco da Igreja de Santa Terezinha na capital, quem mediou o contato com um dos padres entrevistados, bem como aos demais sacerdotes que contribuíram com seus depoimentos.

Devo agradecer também aos colegas de mestrado pelo companheirismo recíproco necessário diante das oscilações de ânimo a cada dificuldade e também nos momentos de alegria celebrados com bastante expectativa frente ao desafio. Desafio de consecução de uma etapa de nossa qualificação, conduzida de modo competente pelos professores do Programa de Pós-Graduação em Ciências Sociais, aos quais são dirigidos os agradecimentos pela acolhida e pelas experiências partilhadas em sala de aula que, certamente, foram decisivas para o amadurecimento intelectual e crítico de todos nós.

Não poderia esquecer de agradecer a contribuição do LEEPOC – Laboratório de Estudos sobre Elites Políticas e Culturais – espaço de discussões e reflexões aguçadas e incentivadas pelos professores Igor Grill e Eliana Reis. Experiência de construção coletiva de conhecimento sociológico que, sem dúvida, acrescentou, de modo positivo, à pesquisa desenvolvida durante esse mestrado.

(7)

proposta de pesquisa. A conclusão deste ciclo com a produção da dissertação também é creditada aos teus esforços de orientação que apontaram os passos a serem seguidos.

O artesão tem uma imagem do produto

acabado, e mesmo que não o faça inteiro, vê o lugar de sua parte no todo e, por conseguinte, compreende o significado de seu esforço em termos desse todo”.

(8)

RESUMO

Este trabalho se propõe à análise dos condicionantes históricos e sociais que influenciaram objetivamente no processo de constituição de perfis militantes de clérigos que atuaram no Estado do Maranhão, durante as décadas de 1970 e 1980, do século passado. Partindo do exame das propriedades sociais e recursos culturais apresentados pelo conjunto da população recortada, procurou-se cotejar como se constitui a dinâmica de intervenção dos agentes segundo uma lógica de intersecção em diferentes domínios sociais, enfatizando-se as relações existentes entre o domínio político e o religioso. Buscou-se também neste estudo, com base nas características dos sacerdotes investigados, apreender os mecanismos que interferem na emergência de porta-vozes culturalmente favorecidos e dedicados em defender as mais diversas causas sociais e políticas, resultado estas de um trabalho de produção coletiva de agentes sociais. Priorizou-se como foco desta investigação a análise da correspondência entre recursos de origem, investimentos escolares realizados, constituição de competências e habilidades e a tradução desses elementos em posições ocupadas e tomadas de posições apresentadas pelos clérigos no decurso de seu itinerário militante, demonstrado em breves reconstituições de trajetória de alguns sacerdotes do grupo em questão.

Palavras-chave: Intervenção militante de clérigos. Diversificação do engajamento. Constituição de “causas” legítimas. Politização do domínio religioso. Itinerários engajados.

(9)

RÉSUMÉ

Ce travail propose l'analyse des conditions historique et sociales qui influancaient objectivement le processus de constitution de profil militantes des religieux qui agissaient dans l'état du Maranhao, pendant les années 1970 et 1980 du siècle passe. A partir de l'examen des propriétés des ressources sociales et culturelles présente par l'ensemble de la population recoupé, essayé rassembler la dynamique de l'intervention des agents selon une logique d'intersection dans les différents domaines sociaux, soulignant si les relations existant entre la politique et le religieux. Nous avons également dans cette etude, fondée sur les caracteristiques des prétres en enquete, apprendre les mécanismes qui interfèrent avec l'apparition des porte-paroles culturellement favorisés et voué à la défense des plus diverses causes sociales et politiques, Ces suite d'un travail de production collective des agents sociaux. Priorité comme orientation de cette recherche pour l'analyse de la correspondance entre les ressources d'origine, investissements réalisés, constitution des compétences et des aptitudes et de la traduction de ces éléments dans les positions et les positions présentées par les prétres dans leurs parcours de voyage de militants , démontrés en bréf la reconstitution de trajectoire de certains prétres du groupe en question.

(10)

SUMÁRIO

INTRODUÇÃO………...…10

Capítulo 1: Propriedades sociais, recursos culturais e mecanismos de socialização: descrição geral dos clérigos investigados...43

Capítulo 2: Origens, ocupação, pertença religiosa e modalidades de atuação...54

Capítulo 3: Formas de crença ou militância, recursos, investimentos, concepções e experiências sociais...60

Capítulo 4: Funções desempenhadas, instâncias de inserção e ocorrência de vínculos...68

Capítulo 5: Redes de contatos, por uma independência de ação e a consagração do ofício de sacerdote...72

Capítulo 6: “Matriz ética” da ação engajada: concepções, adesões, concorrência e “relevância social das questões”...79

Capítulo 7: Dinâmica da ação engajada: eventos, temas e mobilizações...89

7.1 Uma agenda em comum: a questão da terra em foco e as percepções sobre o “popular”...105

7.2 Estratégias de afirmação “em nome do povo”: engajado pelo direito à moradia...111

7.3 Educação popular e direitos da periferia: disposição para o engajamento social...117

CONSIDERAÇÕES FINAIS...124

FONTES...128

(11)

INTRODUÇÃO

Esta dissertação tem como foco a análise – a partir do exame de dinâmicas de intervenção militante no Maranhão (1970/1980) – das relações existentes entre lógicas religiosas e políticas em diferentes domínios sociais. A proposta é empreender um esforço de investigação no sentido de verificar os condicionantes históricos e sociais que possibilitaram a emergência de “causas” sociais e políticas legítimas e de porta-vozes dedicados a defendê-las, bem como os efeitos que produziram sobre a (re) configuração social no Estado. O presente estudo baseia-se na análise da correspondência entre recursos de origem, investimentos realizados, constituição de competências e habilidades e sua reconversão em posições ocupadas e tomadas de posição dos agentes em espaços de inserção.

Essas diretrizes analíticas que orientam a pesquisa em questão constituem uma pauta comum que remonta uma rede mais ampla de estudos produzidos e debatidos entre discentes e orientadores que integram o Laboratório de Estudos sobre Elites Políticas e Culturais (LEEPOC), espaço vinculado ao Departamento de Sociologia e Antropologia e ao Programa de Pós Graduação em Ciências Sociais da Universidade Federal do Maranhão, desenvolvendo suas atividades sob orientação e coordenação dos professores Eliana Tavares dos Reis e Igor Gastal Grill.

A pesquisa em pauta é desenvolvida através do estudo de itinerários e de carreiras militantes e religiosas. Para isso, são observados: os perfis dos agentes (origens sociais, formação escolar, atividade profissional etc.); as causas em nome das quais falavam; os tipos de vínculos propícios à constituição de redes sociais; os recursos mobilizados (títulos escolares, consagração da profissão etc.); as estratégias com vistas ao engajamento; os domínios de inserção privilegiados; e os repertórios de mobilização, acionados ao longo das trajetórias individuais e coletivas.

(12)

institucional da Igreja Católica e seus efeitos na redefinição das relações dos religiosos com o domínio eclesial e destes com outras esferas sociais.

O evento representativo dessas mudanças é a realização do Concílio Vaticano II (1962/1965), reunião das autoridades eclesiais católicas. A partir do encontro evidenciou-se uma abertura maior da Igreja, fato que produziu efeitos sobre a “reestruturação das relações de força do espaço religioso”, bem como introduziu novas concepções acerca do posicionamento da Igreja inserida numa sociedade secular. Uma perspectiva aberta pela Igreja conciliar está relacionada à “emergência da Teologia da Libertação1 como matriz teológica e ideológica” que exerce influência significativa na redefinição das práticas de seus agentes, sobretudo entre grupos de clérigos que se identificam com esta proposta preenchendo “novos espaços de atuação”, onde se destaca o perfil de “intenso engajamento político e o investimento em movimentos sociais de base – operários, sem-terra, desempregados etc.” (SEIDL, 2009, p. 13-14).

A perspectiva teológica em questão assumida por parte do clero encontrou, num plano mais pragmático, uma recepção entre as chamadas Comunidades Eclesiais de Base que buscaram – a partir do método ver, julgar e agir – associar às suas práticas religiosas e caritativas questões como organização sindical e política. Em diferentes partes do Maranhão as CEB’s teriam representado um ponto de apoio ao trabalho dos clérigos, sobretudo, com relação aos problemas agrários, acentuando o “compromisso social” como uma espécie de bandeira de luta. A proposta de “libertação”, elemento presente no discurso mais “progressista” da Igreja, cotejada por teólogos e assumida por leigos e sacerdotes é justificada por uma revisão de diretrizes, onde a instituição religiosa, sobretudo na América Latina, lança as bases para uma inserção maior de seus agentes nos meios sociais.

O panorama descrito como adverso envolveu também os desdobramentos da política de governo militar, corolária do regime de exceção instalado no Brasil em 1964. O referido contexto, marcado por transformações no âmbito político e institucional, foi propício à entrada de agentes com outros perfis, voltados para a prática de determinadas modalidades de engajamento.

Uma condição a ser considerada, segundo (MAINWARING, 1989, p. 172-173), diz respeito à contribuição da Igreja “para as pressões que conduziram à abertura”

1Um efeito prático na atuação dos leigos, segundo a influência de heterodoxias como a teologia da

(13)

política. Essa contribuição se efetivou com a ajuda das “organizações eclesiais de base aos movimentos populares e da posição da Igreja, junto com os partidos de oposição, como importante defensora dos direitos humanos” (idem). Nesse sentido, a dinâmica de transformações ocorridas2, seja no âmbito da política ou da instituição eclesial católica, oportunizou as condições para a redefinição das estratégias de intervenção de religiosos.

Da confluência de transformações que favoreceram a mobilização de porta-vozes em torno de “causas” constituídas, tem-se no conjunto de práticas dos religiosos a percepção de “lógicas cruzadas” explicitadas em possibilidades abertas de intervenção3. No que se refere à presença de agentes oriundos de outros países, este movimento parece estar relacionado às “tensões existentes nas relações entre centro/periferia”. Mais precisamente, a entrada de novos agentes (com o perfil identificado a heterodoxias, como a teologia da libertação), em arenas de disputa definidas em condições periféricas é resultado de “confrontos entre elites culturais e religiosas” que “atravessam os trajetos sociais” dos próprios agentes. Nesse sentido, sua posição como formuladores ou mesmo difusores de ideologias vinculadas à noção de “terceiro mundo”, aspecto conjugado às ações inscritas na lógica de um “dever missionário” desses agentes, reforça o sentido de sua presença em localidades periféricas, como o Brasil (CORADINI, 2004, p. 3-4).

A noção de “periferia” em oposição às lógicas externas é uma temática abordada em análises de dinâmicas sociais a partir de recortes diversificados, sendo sempre associada a outras dimensões, a exemplo da idéia de circulação internacional dos agentes, eixo fundamental para se compreender os princípios de constituição ou acumulação de recursos sociais e culturais. Tendo como parâmetro os “centros”, países de origem e outros destinos, no que se refere à produção de regras de funcionamento, critérios de hierarquização e princípios de legitimidade de domínios sociais (cultural, político, intelectual, etc.), os agentes ao ingressarem em realidades “periféricas” redefinem suas percepções, ajustam sua visão de mundo, estabelecem vínculos e reivindicam um lugar num dado espaço, a partir de lógicas que não estão circunscritas a mera transposição de modelos tidos como centrais.

2Referência à realização dos Concílios episcopais de Medelín (1968) e Puebla (1979), reunião de Bispos

da América Latina, ocasiões em que a Igreja reafirma a “opção preferencial pelos pobres” acentuando o protagonismo do leigo como elemento primordial. Tais eventos foram significativos e estão inseridos entre “os diferentes impactos da série de transformações trazidas pelo Vaticano II sobre o conjunto de clérigos e religiosos no Brasil” (SEIDL, 2009a, p 15).

3 Desta forma, observa-se nos trabalhos pastorais de agentes de comunidades eclesiais de base um trânsito

(14)

Há um movimento constante de (re) definição de princípios presentes em domínios periféricos que caracteriza uma situação de “baixa autonomia” das esferas sociais, fato que possibilita a maior influência – não transposição direta – de critérios exógenos. A abordagem desses elementos está vinculada a um conjunto de produções sociológicas que partem de referências comuns centrando em temas como os processos de formação de elites e o fenômeno de constituição de “especialistas” em domínios específicos como o cultural, o intelectual e o religioso (CORADINI, 2004:2005; REIS, 2007; SEIDL, 2007b:2008a; NERIS, 2009).

Na condição de “especialistas” legítimos num espaço de inserção tido como periférico, os diversos registros de engajamento associados à participação de clérigos em determinadas causas estão orientados por princípios definidores dessa condição e/ou posição, que mantêm estreita relação com esquemas de percepção assimilados pelos

agentes, ensejando, deste modo, as lógicas que estão na composição do referido perfil. Tais lógicas podem ser detectadas mediante a análise do papel desempenhado

pelos agentes enquanto mediadores de “causas” constituídas em certos domínios sociais. Neste tocante, são observadas as condições objetivas de aquisição, de afirmação, de reconhecimento e uso de habilidades e competências que possibilitam a constituição de um conjunto de capitais, como o capital de notoriedade e de relações, fundamentais ao reconhecimento de um agente como detentor de uma fala autorizada, uma vez que “a eficácia simbólica das palavras se exerce apenas na medida em que a pessoa-alvo reconhece quem a exerce como podendo exercê-la de direito” (BOURDIEU, 1996b, p. 95).

Convém reforçar que o universo da análise não é tomado, por si, enquanto mero instrumento de mobilização social. Este é concebido, para fins de investigação, como um conjunto de eventos inaugurais (ou fundadores), que se apresentam como entradas pertinentes ao exame das propriedades sociais específicas e demais recursos mobilizados em espaços de contestação, engajamento e militantismo segundo lógicas que se intercruzam. Por esse intermédio, os agentes em questão colaboram na construção de questões “sociais” e “políticas” relevantes. Portanto, o caráter da análise sociológica tem foco na dinâmica, sobretudo, política e religiosa, dos agentes que operam sob tais lógicas.

(15)

imprescindível, busca nas formas de mediação que orientam o engajamento, a apreensão de princípios sob os quais se registra a ação efetiva dos agentes. Deste modo, ressalta-se a centralidade em ressalta-se analisar a imbricação desressalta-ses princípios que é produzida na sua intersecção, elemento que dá o sentido às intervenções.

A análise acerca das ações desses agentes procura levar em consideração possíveis efeitos que a conjuntura específica em que atuaram possa ter produzido sobre suas práticas. Essa dimensão apresentada com freqüência em estudos sobre práticas militantes, politização e engajamento de uma forma ampla (SEIDL, 2009a; REIS, 2007; GAXIE, 2002) refere-se às imbricações, precisamente entre as circunstâncias históricas, seus elementos conjunturais, e as gerações que atuam em determinados contextos. De modo mais específico, trata-se de analisar que tipo de conseqüência ou efeitos certos eventos, decorridos em circunstâncias temporais particulares, podem produzir na trajetória individual ou coletiva de agentes militantes – perspectiva enunciada que retoma o aspecto das múltiplas inserções dos agentes e da suscetibilidade a inflexões na trajetória ocasionada por contingências imprevisíveis.

Decorre desses apontamentos mais gerais que a dimensão das transformações de conjunturas, aspecto residual da análise de trajetórias militantes, tem sua importância pela perspectiva diacrônica aberta, por meio da qual, é possível situar os agentes uns em relação aos outros em diferentes momentos de seu percurso biográfico. Entretanto, o estudo em questão baseia-se, sobretudo, na dimensão sociográfica – aspecto central de análise – que prioriza as características singulares dos agentes sociais apresentando um peso relevante na abordagem das práticas de engajamento.

O nível de análise referente à militância dos agentes está inserido, portanto, num quadro mais complexo de mudanças, onde as décadas de 1960, 1970 e 1980 representam um momento particular de transformações de ordem institucional, enfatizando-se aquelas ocorridas nos domínios político e religioso. Nesse sentido, as mudanças sinalizadas – sobretudo em âmbito eclesial – enfatizavam a “missão social da Igreja” e a “importância do laicato” para a instituição religiosa, definições que teriam motivado, na percepção de (MAINWARING, 1989, p. 62), um senso mais aguçado de “responsabilidades” e “co-responsabilidade” no que se refere às relações entre clérigos e leigos.

(16)

quanto à reorientação das ações dos agentes frente às questões de ordem política e social em que se registra o envolvimento da instituição. O posicionamento mais “crítico” da Igreja Católica ou, pelo menos, de seu segmento mais progressista teve, a partir das conclusões das Conferências episcopais de Medelín (1968) e Puebla (1979), o respaldo formal por parte de suas lideranças, os bispos da América Latina, acerca da assimilação de novos valores às práticas de seus agentes. Os registros de intervenção dos clérigos se apoiavam, conforme os relatos, da motivação teológica expressa na “opção preferencial pelos pobres”, síntese das resoluções desses encontros.

Considerando os efeitos dos eventos eclesiais mencionados para a redefinição das bases institucionais do espaço católico, bem como a influência que podem ter representado no percurso biográfico de padres, deve-se enfatizar a necessidade de se estabelecer uma vinculação entre essas redefinições e o peso decorrente das transformações processadas e os estágios de aquisição de disposições para a militância dentro de lógicas especificas que delimitam o processo de engajamento individual (SEIDL, 2008; SAWICK & BERLIVET, 1994).

O efeito imediato deste processo resulta na emergência de uma “Igreja popular”, inspirada por elaborações teológicas que os clérigos relacionam com a questão da “libertação”, da “justiça social” e da “transformação da realidade”. Essas transformações são representativas se pensarmos que, direta ou indiretamente, condicionaram esforços coletivos no sentido da constituição de espaços privilegiados de intervenção. Com relação a isso, outros estudos destacam, especificamente, a importância das Comunidades Eclesiais de Base (CEBs) como ponto de apoio e base social imprescindível à composição de “estruturas auxiliares atreladas à Igreja, como a Comissão Pastoral da Terra”. Nesse sentido, as experiências de (CEBs) que vinculam os agentes da Igreja à militância política e social em instâncias como a (CPT), por exemplo, caracterizam uma “Igreja popular” que prioriza a participação política de seus membros. Em alguns casos, o posicionamento mais crítico incorporado pela Igreja e seus clérigos, inspirados pela perspectiva da doutrina religiosa identificada com o tema da “libertação”, constitui um dos principais recursos ao militantismo voltado para as questões agrárias (DELLA CAVA, 1986; LÖWY, 1996).

(17)

percepções apresentadas, é resultante de uma redefinição de princípios que produzem uma nova ética pautada numa espécie de cultura político-religiosa de engajamento. Convém assinalar, entretanto, que o processo em questão também traduz uma correlação de forças no espaço religioso, uma vez que opõem formas de concepções, definições de princípios e práticas legítimas a esse domínio. Nesse sentido, entende-se que a politização de segmentos específicos da Igreja implica na incorporação de objetivos e preocupações da política na esfera de atividade religiosa, aparentemente não inscrita, legitimamente, nas finalidades, regras e modos de fazer da ordem política (LAGROYE, 2003, p. 365).

Decorre precisamente disso, conforme enfatiza o autor, que as requalificações de princípios de um domínio envolvem transgressões da distinção institucionalizada e vivida entre ordens de atividades diferentes. Nesse sentido, as ações de padres que se dedicam às questões de cunho político ou social podem ser encaradas por outros agentes do domínio religioso como um desvio de finalidades, uma vez que a mobilização de temas ou causas identificadas com o mètier da política pode ser percebida como um perigo ao desempenho de atividades diversas, sobretudo aquelas que envolvem princípios e interesses de demais agentes ligados ao universo religioso.

Nesta perspectiva, as tomadas de posições dos agentes caracterizadas por um viés “politizado” podem estar relacionadas ainda com aspectos de seu percurso biográfico, em suas distintas etapas, onde as experiências eventualmente geradoras de disposições específicas estariam inscritas num processo de “socialização política” a que os agentes são submetidos no decurso de seu itinerário social. A assimilação de certas disposições que podem ser acionadas pelos agentes em registros diferenciados da atividade social, no que diz respeito à diversificação de um engajamento assumido, pode estruturar, a partir de suas concepções, a idéia da politização atrelada não apenas a uma questão de “interesse”, “vontade” ou “voluntarismo”, mas também de alguma “qualificação” em termos ditos “intelectuais” (SEIDL, 2009b, p. 160).

(18)

assumidos pelos agentes estão inseridos num repertório de ações mobilizadas a partir de um duplo registro constituído, simultaneamente, por códigos do domínio religioso e lógicas da arena política. Nesta interface são produzidas as diferentes concepções acerca dos sentidos atribuídos ao engajamento, bem como as definições formuladas pelos clérigos sobre determinadas causas, temas e questões que orientam sua compreensão e forjam suas ações no mundo social.

A diversificação do engajamento, decorrente de amplas possibilidades de inserção, reflete também o estabelecimento de distinções de perfis. Nesse sentido, a militância de padres à frente, sobretudo, de movimentos sociais, mas também inseridos em outros espaços de participação política (como os próprios partidos e estruturas de administração pública), deve ser cotejada enfatizando-se as competências e habilidades adquiridas e mobilizadas pelos agentes numa perspectiva de disputas e afirmação.

Tais aspectos integram uma questão mais ampla que está centrada na apreensão e análise dos mecanismos que favorecem a prática efetiva de uma ação engajada. Com a análise da redefinição do espaço religioso e das atividades tidas como “politizadas” na esfera eclesial, dispõe-se de elementos necessários à (re) constituição de lógicas e princípios que envolvem a participação de clérigos como agentes atuantes em domínios “externos” ao universo religioso.

Nesse sentido, enfatiza-se com um peso maior neste trabalho, o exame de indicadores das origens sociais dos agentes (com base em variáveis como profissão dos pais, nível de instrução de familiares, tipo de crença ou militância na família, país de origem, etc.), dos investimentos escolares realizados (estudos em estabelecimentos religiosos, linha de formação nos seminários, estudos superiores, etc.), dos recursos que podem ser adquiridos e suas formas de aquisição. Em linhas gerais, analisa-se a especificidade de cada perfil com base nos condicionantes sociais implicados em sua constituição.

(19)

Convém ressaltar que a esses estágios mencionados correspondem processos de socialização que perpassam o trajeto social dos agentes, remetendo às experiências familiares, escolares, religiosas (participação em missas, freqüência à catequese, serviço de coroinha), bem como lembranças reatualizadas de outras modalidades de inserção que precederam a experiência propriamente sacerdotal, como a passagem pelo exército, pelo grupo de escoteiros, entre outras. A dimensão da socialização desses agentes é imprescindível, portanto, para a apreensão de disposições sociais diversas.

Cabe ainda a este estudo a verificação de determinadas estratégias que são acionadas consciente ou inconscientemente pelos agentes, enfatizando com uma atenção particular, o mecanismo de articulação de redes de relações que são constituídas pelo fato de que elas favorecem e são favorecidas pela configuração de um espaço social marcado pela inexistência de fronteiras rígidas entre os domínios sociais” (REIS, 2009, p. 88).

Em termos mais precisos, o objetivo aqui é apreender os princípios relativamente determinantes para as múltiplas inserções militantes de clérigos, efetuadas como resultante de vínculos e contatos recíprocos. Nesse sentido, a dimensão de pesquisa que trata das múltiplas inserções caracterizadas pelo trânsito de padres em diversos espaços sociais, mostra-se compatível com outras vertentes de análise que demonstram a inexistência ou fraca objetivação de lógicas e regras próprias de hierarquização para as diferentes esferas sociais (PÉCAUT, 1990; CORADINI, 1998).

Considerando-se as possibilidades múltiplas de inserção dos religiosos (no domínio eclesial, nos movimentos sociais, no domínio acadêmico, etc.), bem como os vínculos que podem ser constituídos, tem-se que os agentes compõem um espaço de concorrência que pressupõe relações interdependentes justificadas no entendimento de que as inserções e disputas entre os agentes definem um “sistema de desvios de níveis diferentes em que, nem os atos ou discursos produzidos por agentes ou instituições, tem sentido senão relacionalmente por meio das oposições e das distinções” (BOURDIEU, 2007, p. 179).

(20)

objetivo em pauta, interessa compreender mais detidamente a capacidade que os agentes detêm e os mecanismos de que se utilizam para efetivar a referida conversão. Cabe ressaltar que esse trabalho de conversão de “causas” empreendido por clérigos no Brasil se estende à militância no domínio político, também por conta do contexto específico de redemocratização.

No que se refere a este momento, é fundamental se pensar a relação entre a Igreja Católica, as classes populares e os movimentos sociais na redefinição do cenário político do país. De acordo com (MAINWARING 1989, p. 232), “entre 1968 e 1976, os setores progressistas da Igreja Católica detinham o monopólio virtual do trabalho político com as classes populares”. Com a abertura essa situação teria se modificado4. Por esse motivo o processo de reabertura política é um evento significativo para os desdobramentos da problemática, uma vez que possibilita a verificação de eventuais registros de atuação, afirmação e concorrência entre os agentes.

Uma dinâmica de concorrência objetivada pelo conjunto das práticas dos agentes implica na observação que se lança sobre “as relações existentes entre a posição social ocupada, mensurada a partir de propriedades sociais apresentadas, e os posicionamentos assumidos pelos agentes” (REIS, 2008a, p. 45). Os domínios privilegiados onde essas relações se objetivam em experiências práticas são as comunidades de base, a união de moradores, sindicatos, universidades, partidos etc. A lógica de disputas também é explícita nas estratégias de intervenção, como manifestações públicas, debates, produção de material escrito, entre outras.

Este expediente possibilita que se verifique a “construção ao longo do tempo, de alguns elementos que influenciaram na configuração de visões de mundo e de um sistema de distinções entre os agentes” durante o processo de redemocratização, bem como em momentos ou movimentos posteriores. Por outro lado, permite igualmente captar alguns alinhamentos que figuram no cenário político, eclesial e cultural do Maranhão, sobretudo no que tange às “alianças e rivalidades entre agentes que atuam em diversos meios sociais. E, finalmente, fornece o suporte para inferências acerca da existência de uma articulação entre domínios, lógicas e práticas sociais que estruturam o espaço social” maranhense (idem).

4 No panorama de redefinição política “os partidos políticos e os movimentos sociais buscavam o apoio

(21)

As causas constituídas e o trabalho de mobilização conduzido pelos agentes em suas inserções (padres, agentes pastorais etc.), bem como seus efeitos sociais e políticos, conduz à reflexão sobre os mecanismos que estruturam a “gênese de um problema social5. A especificidade desta questão sugere o estudo de intermediários culturalmente favorecidos que desempenham a função de porta-vozes” (LENOIR, 1996, p. 86). Os agentes a serem investigados podem, então, ser considerados como mediadores (políticos, culturais, etc.). Assim, a investigação direciona-se ao exame das condições de emergência da figura do mediador, da composição do “especialista”, a partir de características sociais dos agentes e dos trunfos acionados como recursos significativos que garantem o trânsito social graças, sobretudo, ao valor conferido às “competências” detidas.

A noção de mediador define-se como sendo os “indivíduos que estão aptos a atuar em termos de expectativas orientadas para a comunidade e para a nação, que tendem a ser selecionados para a mobilidade” (WOLF, 1971, apud GRILL, 2008, p. 23). Desta forma, entende-se que seu papel é desempenhado no intermédio de âmbitos distintos. O mediador pode ser entendido ainda como um “tipo específico de intermediário que se particulariza pela função crítica e pela exclusividade” (SILVERMAN, 1977, apud GRILL, 2008, p. 23). Nesse sentido, a investigação está direcionada para a percepção – entre uma gama variada de perfis – das lógicas de constituição dos agentes mediadores (críticos pela “capacidade de manipular códigos” e influenciar nos interesses dos diferentes níveis mediados) e, a depender de seu escopo de atuação e nível de influência, exclusivos pelo monopólio da função de mediação6 através do reconhecimento que lhe é atribuído.

No que tange ao exercício da função de mediação, esta mantém relação estreita com os processos que envolvem aspectos sociais e históricos dos quais podem resultar na constituição de um mediador. No estudo em pauta, os mediadores seriam agentes especializados e peça fundamental numa lógica político-religiosa de mediação, “pautada pelo fluxo de recursos materiais e simbólicos entre diferentes níveis, esferas e espaços sociais” (SEIDL, 2007a).

5 “uma das fases essenciais da constituição de um problema em problema social é justamente seu

reconhecimento como tal pelas instâncias estatais” (idem)

6 De acordo com (SEIDL 2007a, p. 78), parte das estratégias de legitimação social de determinados

(22)

Reiterando a questão das “modalidades de intervenção priorizadas pelos agentes, tomando-as ao mesmo tempo como possibilidade de acúmulo e de ativação de capital militante” (REIS, 2008c, p. 109), convém distinguir – quanto à participação de clérigos na posição de mediadores – os níveis de intervenção a partir das noções de “contestação”, “engajamento” e “militantismo”. Tais idéias, de acordo com Reis (2007), contêm sentidos diferenciados atrelados ao grau de envolvimento dos agentes, bem como aos seus perfis sociais e às situações de contingência (históricas, políticas, etc.) que se apresentam no decurso dos trajetos.

***

Como se sabe, considerável parte dos estudos sociológicos dedicados às intervenções militantes, considerando as diferentes modalidades de ação dos agentes, atribuem influência as transformações processadas no curso dos acontecimentos, podendo estas exercer um papel decisivo na redefinição de lógicas e princípios específicos de um domínio social. O contexto no qual se compreende os registros de engajamento de religiosos – de modo amplo – tanto de agentes inseridos no espaço católico pelo vínculo do sacerdócio como o envolvimento de leigos é marcado, em parte, por eventos de cunho institucional que demarcaram certas mudanças no âmbito eclesial. No Brasil, o curso dessa dinâmica pode ser verificado de forma mais aguda na “polarização”, por assim dizer, de tendências no seio da Ação Católica (Organização de leigos promovida pela alta hierarquia da Igreja). Destaca-se neste processo de redefinição, no interior da (AC), a mesma perspectiva de mudança em um dos segmentos a ela vinculado: a JUC (Juventude Universitária Católica).

(23)

O referido quadro remete a uma polarização vivenciada pela Igreja Católica no Brasil, cujos desdobramentos são expressos um pouco mais tarde com a tendência à politização das atividades de segmentos ligados à esfera eclesial, como a JUC. Essas posições divergentes no interior da instituição, entretanto, não se davam no vazio. Havia toda uma matriz de referências elaboradas por agentes vinculados ao espaço religioso, que pautavam as discussões e influenciavam decisivamente na opção por uma prática cristã mais voltada para as questões políticas. Conforme aponta Ridenti (2002), para os militantes da JUC era necessário encontrar soluções cristãs para os problemas sociais, buscando novas linhas de ação com base em um ideal histórico concreto, uma essência

ideal realizável. Nesse sentido, a contribuição teórica de Jacques Maritain tem seu peso

neste processo de redefinição do espaço religioso no Brasil. Sua noção de ideal histórico, por exemplo, baseia-se no princípio do “engajamento cristão eficaz, em sua luta, no interior da Igreja, pela participação política ativa de todos os católicos – e fora dela, em busca de uma sociedade justa e cristã” (RIDENTI, 2002, pg. 218).

Além da influência de Maritain, o processo de redefinição do espaço católico no Brasil, que teria ensejado uma reavaliação da dimensão das esferas de atividade de um setor da Igreja, também foi marcado pelas idéias de intelectuais como Emmanuel Mounier, Lebret, Pierre Teilhard de Chardin e José Cardjin. Compunha-se, desta maneira, um espectro de vertentes do pensamento cristão com sua filosofia específica cuja apropriação de uma delas, representava a sobreposição de uma forma de pensamento a inspirar as diretrizes de uma ação cristã em processo de redefinição de seus objetivos no Brasil.

Convém sublinhar que essas concepções originadas em centros como a França refletem, sobretudo, nas décadas de 1960/70, um panorama de disputas mais amplo em que o pensamento cristão, inspirado numa filosofia de participação ativa e engajamento coletivo de seus membros, coexiste com outras correntes de pensamento gestadas no seio de transformações sociais e culturais que valorizam crescentemente a autonomia do

indivíduo7, cada vez mais inserido numa cultura secular assimilada em diversos

domínios sociais. Resulta deste cenário mais amplo de redefinições, marcado intensamente também pelos debates na arena intelectual (humanismo cristão contra

7 Tendência presente na sociedade francesa desde meados dos anos 1960 e designada pelo sociólogo

(24)

humanismo teórico; história contra estrutura; filosofia do sujeito contra ciências sociais), a tentativa de afirmação da posição da Igreja que sofria freqüentes críticas de posições exógenas às lógicas do universo religioso. Um exemplo ilustrativo disto são as formulações de Emanuel Mounier sobre o “personalismo cristão no momento em que os direitos da consciência são contestados por Lacan e pela arqueologia do saber de Michel Foucault” (PELLETIER, 2002, p. 22).

Considerando-se as condições de produção e, sobretudo, o contexto de emergência dessas concepções ajustadas a uma necessidade de afirmação, infere-se que as vertentes de pensamento cristão, como a filosofia do aggiornamento, de Jacques Maritain, passa a ocupar em determinado momento uma posição marginal no espaço mais abrangente de circulação de idéias não apenas na França, como em outros países da Europa. Nesse sentido, podemos pensar o contexto de redefinição como uma abertura propícia também à circulação de agentes representantes dessas idéias que passam a ser difundidas em outras dinâmicas sociais. É razoável inferir, deste modo, que o curso dos acontecimentos na realidade européia teria despertado o interesse de clérigos estrangeiros em disseminar alguns desses ideais onde houvesse espaço para tal recepção. Ainda que as bases empíricas deste estudo não permitam afirmar se os eventos estão correlacionados, convém pontuar que se verifica neste período de redefinições, na segunda metade do século XX, a entrada de muitos sacerdotes estrangeiros que difundiram um padrão de atuação religiosa no Maranhão.

O sentido das redefinições em processo apontam para a idéia de um “cristianismo engajado” que procurava ser afirmado a partir do trabalho de seus porta-vozes que sinalizavam para uma “revolução na Igreja”. O envolvimento de agentes vinculados ao universo religioso em questões políticas e sociais se traduzia na necessidade da presença de cristãos na “revolução”, fato que, de acordo com Pelletier (2002), sugere a presença da revolução na própria Igreja, no modo de vida de seus membros e em suas formas de pensamento, nas expressões tanto coletivas quanto individuais.

(25)

à entrada de novas tendências teóricas e ideológicas, que orientam as práticas dos agentes receptores.

O processo de redefinição do espaço católico brasileiro, em meados do século XX, mantém interface com essa influência externa que, por sua vez, sofre ajustes e/ou adequações em termos de novas disputas por afirmação numa dinâmica com características diferentes da central, sobretudo no que se refere à baixa ou quase inexistente autonomia das esferas sociais situadas na periferia. Deste modo, as percepções sobre engajamento católico baseadas na revolução personalista de Mounier, na visão histórica, de Teilhard de Chardin, ou no método ver, julgar e agir, de padre Cardjin, por exemplo, seria o produto de concepções de pensamento exteriores que encontram fácil recepção no domínio religioso brasileiro caracterizado por fronteiras mal delimitadas (aspecto peculiar em contextos “periféricos”). A redefinição do espaço religioso brasileiro, nesta perspectiva de apropriação de modelos de pensamento, mantém conexão com a vertente inspirada na idéia de importação de modelos políticos, que destaca a contribuição das estratégias de importação tanto para a produção de formas de poder como de formas de oposição (BADIE e HERMET, 1993).

A implicação mais direta do fato de se importar modelos de pensamento reside na estrutura de poder que é constituída no interior de um espaço, baseada, por sua vez, na morfologia que o referido espaço apresenta a partir das posições distintas de seus agentes. Para além deste aspecto mais evidente, a apropriação de modelos estrangeiros para legitimar um conjunto de práticas e concepções, num âmbito periférico, expõe a dimensão do efeito de hibridação que caracteriza os espaços importadores de lógicas externas. Desta maneira, a ausência de princípios reguladores de funcionamento do espaço católico favorece a penetração de idéias e valores de matizes diferenciados, criando condições para a emergência de uma nova lógica.

(26)

entrada desses agentes. Entretanto, deve-se observar a dinâmica local como possibilidade objetiva para aplicação de preceitos teóricos à margem no contexto europeu.

Deste modo, com base nos indícios colhidos e analisados, é plausível a afirmação de que o conjunto de clérigos estrangeiros, cada um atuando a partir de modalidades específicas de trabalho (professores, formadores populares, dirigindo paróquias, à frente de movimentos sociais, na burocracia política, etc.), trata-se de representantes legítimos de modelos exógenos e que tenham contribuído, de modo significativo, para a transformação e/ou redefinição da dinâmica social maranhense. Decorre disso, a percepção de que a opção da Igreja local por clérigos estrangeiros está relacionada ao grau de qualificação adquirido por esses agentes em seu processo de formação. Em certo sentido, a entrada de agentes com um perfil diferenciado, portadores de uma matriz específica de concepção do mundo social, reflete uma adaptação da Igreja local aos pressupostos de um novo modelo que interferiu consideravelmente na redefinição das tomadas de posições da própria instituição e seu corpo de agentes (religiosos e leigos em geral).

Dentro de uma perspectiva secular face às redefinições processadas no espaço católico brasileiro, verifica-se a tendência a uma revisão das ações de setores da Igreja Católica, pautados numa reavaliação dos propósitos institucionais refletidos objetivamente na resignificação de valores e práticas dos agentes vinculados a esse universo. Nesse sentido, as redefinições processadas no espaço católico exercem considerável influência que auxilia na compreensão do processo de inserção militante de religiosos. Compreende-se, assim, conforme Mainwaring (1989), que a relação entre movimentos diversos, com a presença de clérigos, em geral, mundo social e Igreja, resulta da interação dos agentes com a sociedade e das tendências produzidas por esta, como um todo e, em particular, pelos movimentos sociais dentro do próprio espaço de atuação.

(27)

análise abordadas em outros trabalhos (MAINWARING, 1989; DELLA CAVA, 1986; KRISCHKE, 1986).

A inserção de uma Igreja em contato mais estreito com as “questões seculares” (“desigualdades sociais” geradas pelo modelo político e econômico, por exemplo), pela via da radicalização política de setores como “a esquerda católica”, tornou-se mais evidente pela diversificação de posicionamentos. Tal dinâmica de redefinição, todavia, não transcorreu sem conflitos que expunham divergências políticas e, mesmo, oposição de concepções religiosas entre a hierarquia católica (representada pelo episcopado), detentora da autoridade formal da instituição, e os segmentos tidos como mais “radicais” ou “progressistas” no interior da Igreja. Conseqüência mais direta desta polarização de posições foi a marginalização institucional destes setores relegados à condição de heterodoxias8 do espaço religioso.

No que concerne ao segmento mais heterodoxo, mais precisamente, aos seus agentes componentes, seu perfil de engajamento mantém vinculação com uma forte socialização católica sobre a qual está pautada a visão de mundo desses agentes, sem que se descarte, no entanto, “o interesse pela questão da transformação que o catolicismo desses militantes” pode sofrer no decurso de seu trajeto social (SAWICK & BERLIVET, 1994). Deste modo, registros de intervenção caracterizados por tomadas de posições a partir de posições periféricas relacionam-se diretamente aos recursos de origem e às disposições incorporadas pelos agentes. Nesse sentido, seria legítimo pensar que as tomadas de posições mais radicais, apontando para rupturas sejam manifestadas por agentes ocupantes de posições dominadas dentro do espaço católico (SEIDL, 2009a). Segundo essa lógica, a natureza das inserções e as especificidades das funções executadas conformam critérios definidores da posição dos agentes em relação à

aproximação e ao distanciamento da hierarquia eclesiástica.

Decorre, precisamente, desta relação polarizada no espaço religioso a necessidade de afirmação da posição daqueles agentes que representam o segmento heterodoxo. Esses perfis são influenciados por uma espécie de cultura político-religiosa assimilada e manifestada pelos clérigos em registros objetivos de intervenção, a partir de distintos canais de inserção resultantes de um trabalho coletivo de mobilização

8 Expressão empregada por Coradini (2004) em relação à Teologia da Libertação como efeito do

(28)

desses agentes. Nesse sentido, o expediente legítimo que define a posição assumida por determinados clérigos e, conseqüentemente, sua afirmação e reconhecimento no domínio religioso refere-se às formas de intervenção constituídas como “legítimas”.

Deste modo, o segmento dito mais politizado representado por um corpo clerical diverso em relação à posição de seus agentes (padres e bispos), articulou – como forma de estratégia de intervenções políticas e sociais – as condições para a emergência e estruturação de novos espaços de engajamento, cuja composição de seus quadros expressava a heterogeneidade quanto às bases sociais destes domínios de inserção. Nesse sentido, cabe analisar o papel efetivo desses agentes na constituição desses espaços de disputas que implicam na produção legítima de questões, que, em última instância, garantem sua afirmação enquanto porta-vozes reconhecidos.

Este trabalho de legitimação das causas defendidas e de constituição de espaços privilegiados de inserção ocorre concomitante ao aparecimento de novas organizações civis (sindicatos, partidos políticos, associações de bairro etc.), momento em que a Igreja Católica era reconhecida por seu caráter predominantemente popular, sendo responsável pela reprodução ou influência, notadamente, nas Comunidades Eclesiais de Base, um fenômeno vertiginoso que constituía o alicerce, “através da organização de cerca de 80.000 CEBs espraiadas pelo território, da hierarquia eclesiástica considerada um dos mais importantes porta-vozes das classes subalternas da nação” (DELLA CAVA, 1986, p. 13).

Assumindo-se enquanto “animadores” dessas estruturas – concebidas como comunidades religiosas, porém identificadas com as questões político-sociais de seu interesse – estiveram diversos padres que, reivindicando para si a condição de representantes dos interesses populares, exerceram influência na produção de “demandas” apresentadas como relevantes. Sem essas estratégias, seria mais difícil a esses agentes lograrem sucesso em sua auto-afirmação na condição de sacerdotes mediadores, ou mesmo que extraíssem de suas ações certas retribuições como o prestígio da consagração por representar determinada vertente do espaço religioso.

(29)

estudo sobre a aquisição de retribuições da atividade militante, ajusta-se a outras vertentes de análise empenhadas em demonstrar esta espécie de contrapartida

desinteressada advinda da participação dos agentes sociais em “causas” coletivas com

base na reconstituição de trajetórias, processos anteriores de socialização e engajamento em outros meios sociais como partidos políticos, movimentos sociais e ONGs (AGRIKOLIANSKY, 2001; SIMÉANT, 2001).

Nesse sentido, o papel de mediador colocado em prática pelos sacerdotes, através de uma ação pastoral desenvolvida em meios populares e, sobretudo ancorada nas CEB’s, é uma dimensão imprescindível para compreendermos as lógicas que conferem legitimidade e relevância social a determinadas causas que os próprios agentes constituem. No que tange detidamente a esse processo de constituição – geralmente, de caráter coletivo – enfatiza-se aqui propriamente as características sociais, bem como a detenção de recursos culturais que possibilitam a determinados agentes mobilizá-los, de forma que, uma “demanda” particular possa adquirir amplitude e, por conseqüência, seja reconhecida socialmente.

O conjunto de “causas” alçadas à condição de demanda legítima é resultante, em grande medida, da matriz de percepções que orientam as ações dos agentes no sentido de conferir evidência a temas específicos que são objeto de lutas sociais decorrentes de princípios de visão e divisão do mundo social, que estão na base da mobilização de determinados agrupamentos. A conversão de uma causa em problema social, portanto, deve-se a “princípios de classificação” cuja origem está “associada a um trabalho social de produção” (LENOIR, 1996, p.64).

Tomando a perspectiva da produção coletiva de “demandas” sociais, tem-se no trabalho, precisamente na capacidade de mediação de um conjunto de agentes especializados, a legitimação de causas que dão sentido às práticas de intervenção militante. No caso específico dos sacerdotes com atuação no Maranhão, o processo de constituição de causas como a questão fundiária, as ocupações urbanas, os direitos das populações indígenas e camponesas, por exemplo, expõe a dimensão que situa as experiências de engajamento como produto de uma cultura baseada num duplo registro (político e religioso) envolvido nas ações efetivas dos clérigos.

(30)

que, nada mais são do que artefatos de abstração mobilizados pelos agentes para classificar o mundo social segundo uma disposição de princípios. Decorre precisamente deste ponto, que o estudo das mobilizações sociais, ou melhor, dos processos de engajamento em torno de causas constituídas como relevantes pode ser tanto mais profícuo, na medida em que esta dimensão seja tratada como produto de representações

coletivas, tendo em vista que “uma vez constituídas, tornam-se realidades parcialmente

autônomas” atuando sobre a realidade pela ação da explicação, formulação e informação inerente a qualquer forma de representação (DURKHEIM, apud, LENOIR, 1996, p. 77).

Podemos identificar, portanto, a partir da dinâmica de inserção em instâncias de engajamento e participação política, pelo menos dois aspectos imprescindíveis para a compreensão da emergência de um problema social, em referência às “causas” mobilizadas no curso das intervenções. O primeiro reforça a iniciativa dos agentes no sentido de formulação pública de determinada causa, cujo interesse em sua defesa assume proporções coletivas. Este aspecto remete, em particular, à própria função de mediação desses “porta-vozes culturalmente favorecidos”, que, precisamente, por estarem investidos nesta condição “podem ser considerados como representantes senão de um grupo social, pelo menos de uma causa implicitamente compartilhada” e reconhecida pelos outros agentes (LENOIR, 1996, p. 86).

O segundo elemento deriva necessariamente da atuação desse mediador enfatizando-se, na base de suas intervenções, as representações elaboradas, as aspirações pronunciadas e o vinculo dessas coisas presentes no discurso formulado por esse agente. Cabe salientar sobre este aspecto, a força dos discursos produzidos que, não sendo tomados em si mesmos, devem ser cotejados – de forma indissociável – a partir de sua fonte de enunciação, os próprios agentes sociais, bem como, reconhecer nas instâncias de produção e difusão o lugar de emergência desses discursos, os mecanismos imprescindíveis à constituição de uma “causa” legítima (BOURDIEU, 1996b).

(31)

classificações do mundo social produzidas numa relação de imposição de definições, constituem corpus discursivos específicos que necessitam, além da compreensão, do “reconhecimento enquanto tal para que possa exercer seu efeito próprio”, desde que o agente que pronuncia o discurso seja também “conhecido e reconhecido por sua habilidade e aptidão em produzir uma classe particular de discursos” (BOURDIEU, 1996b, p. 89-91).

Soma-se aos dois aspectos mencionados o fato de que o trabalho de legitimação social de determinada causa será bem sucedido na medida em que todos os esforços de mobilização empreendidos impliquem em seu reconhecimento nos espaços de debate mediados pelos poderes públicos.

Desta maneira, a dimensão das causas constituídas como problemas sociais e que são produto da atividade de um grupo de agentes deve ser apreendida com base na combinação do estudo das características daqueles que enunciam um discurso, cuja “consistência social” seja capaz de produzir certa “demanda” enquanto problema social legítimo, e das formas de consagração que incidem sobre esse discurso por meio do reconhecimento e das modalidades de intervenção por parte das esferas de poder político. A necessidade de imposição de um problema, de forma que o mesmo seja evidenciado publicamente, adquirindo relevância no cenário dos debates públicos, constitui, portanto, o que Lenoir (1996) define como uma das fases essenciais do processo de consagração estatal deste problema.

(32)

Convém ressaltar, no entanto, que o trabalho de “conscientização política”, forma de intervenção mobilizada pelos religiosos nas comunidades e em outros espaços compõe um conjunto de estratégias de reconhecimento a partir do registro religioso, mas “constituem por intercruzamento de lógicas”, Pécaut (1990), o mesmo espaço de concorrência e alianças entre si e com outros agentes.

No que tange às ações dos padres, estas se efetivam com regularidade em espaços de atuação como associações de bairro, sindicatos de categorias profissionais, notadamente de trabalhadores rurais, instâncias voltadas para a educação popular – escolas, oficinas, cursos de formação –, de um público diversificado como lavradores, quilombolas, extrativistas, indígenas etc. O engajamento de caráter político e social praticado por esses agentes também se registra, em casos específicos, no trabalho desenvolvido junto a instâncias oficiais de administração pública (ocupando cargos políticos). As ações se efetuam, ainda, através de organismos e entidades que encontram no perfil específico do clérigo militante, os requisitos necessários para a mediação com determinada dinâmica. Deste quadro diversificado de intervenções enfatiza-se a inserção de religiosos em entidades como a Cáritas, a Sociedade de Defesa dos Direitos Humanos, a Comissão Pastoral da Terra, bem como a participação em movimentos como greves e campanhas, destacando-se a luta do movimento contra a Carestia em São Luis.

(33)

Cabe ressaltar que a fluidez desse trânsito de agentes favorece a constituição de redes de reciprocidade onde os registros se intercruzam mediante estratégias de afirmação em concorrência. Nesse sentido, as causas mobilizadas e apresentadas pelos clérigos encontravam recepção também nos agentes vinculados em outros domínios sociais (políticos iniciantes, advogados etc.).

Podemos pensar essas alianças, enfatizando-se o papel de agentes com vínculos em outros domínios, no sentido de constituição de uma interlocução favorável à função de mediação, exercida também por esses agentes em um trabalho conjugado com os clérigos. Convém observar com base neste ponto que, independente das lógicas ou princípios motivadores do engajamento – no caso dos agentes sem vínculos mais sólidos com a Igreja – podendo se apresentar os mais heterogêneos, todos podem reunir condições para o exercício do papel de mediador. Quanto aos mecanismos empregados para essa mediação, devemos pontuar ainda o papel dos instrumentos midiáticos no processo de constituição de causas em problemas sociais, haja vista que essas causas “reconhecidamente legítimas” tiveram ampla repercussão na mídia, principalmente, a mídia impressa.

Neste tocante, destacam-se os instrumentos de publicização mobilizados pela Arquidiocese de São Luis, como o jornal arquidiocesano, boletins, carta aberta à sociedade (conjunto de documentos coletados em um dossiê da DOPS-MA), sobre as questões que envolviam membros do clero. Algumas paróquias da cidade, como a de São João, situada na rua da paz, centro da capital, também se utilizavam de recursos impressos9 para a difusão de “problemas”. A partir de jornais publicados e, ainda, de programas veiculados por uma rádio local, cuja direção estava sob a responsabilidade do pároco de São João, certas “demandas” como os casos de despejos relacionados à problemática da terra e da falta de moradia, notabilizaram-se nos círculos de debate. Deste modo, a ampla exposição de causas produzidas pelos clérigos para garantia de um escopo privilegiado de intervenção, geralmente é apresentada como uma ação de dever do “compromisso cristão com a justiça”, percepção que engendra uma forma de consagração social tanto da causa defendida, como daquele que promove sua defesa

(PASSERINI, entrevista ao autor, na casa dos padres combonianos, em novembro de

2010).

9 Destaca-se a edição do folheto “voz no deserto” que era veiculado no jornal “25 de março”. Esta

(34)

O conjunto de “demandas” produzidas e veiculadas no jornal da Igreja de São João, “25 de março”, resultou de um trabalho coletivo de agentes alocados em outras esferas de atuação, que apresentavam nas edições do periódico uma pauta comum de mobilizações legítimas. Temas como as condições sociais dos menores abandonados de São Luis, seu envolvimento com a violência, com a criminalidade e a devida responsabilidade das autoridades políticas diante disso, eram refletidos por pessoas vinculadas a domínios diversos, como profissionais da Antropologia e da promotoria de justiça local.

Cabe ressaltar que a publicação de periódicos, folhetos, cartas e outros recursos impressos por iniciativa da Igreja, a exemplo da paróquia de São João e da própria Arquidiocese de São Luis, ensejam tomadas de posições mobilizadas por alianças empreendidas pelos agentes na forma de estratégias de afirmação de posição no espaço mais amplo de debates. Essa forma de intervenção traduz interações e formas de contato entre os agentes, situados relacionalmente em concorrência, porém, explicitam também rivalidades. As percepções produzidas por agentes de outros domínios nem sempre se alinham àquelas que são formuladas pelos agentes do universo religioso. Pelo contrário, são apresentadas como percepções opostas.

O engajamento político e social de uma parcela do clero local distribuído nas diferentes instâncias de inserção ou movimentos redefiniu os padrões de atuação da Igreja frente aos problemas passíveis de intervenção. Nesse sentido, a presença da instituição através de seus membros inseridos em estruturas eclesiais, bem como em outras instâncias de participação, é imprescindível na tentativa de apreensão da (re) redefinição do cenário político maranhense à época em questão (1970-1980).

Tem-se, portanto, em diversos domínios sociais, um fluxo representativo de sacerdotes alocados a partir de uma estrutura de organização definida da Igreja maranhense, que através de um trabalho de base desenvolvido em diversas dioceses, criou condições objetivas ao engajamento desses clérigos. Essa presença da Igreja local se expressava por meio do apoio manifestado pelas autoridades do clero através de posições públicas. Nessa linha de ação política, destaca-se a mediação do Arcebispo de São Luis, Dom Motta, nos episódios relativos à greve da Meia-Passagem10, e, sobretudo, à intervenção de um bispo do interior para a resolução de conflitos

10 Sobre a mediação de Dom Mota com agentes da esfera política à época da Greve da Meia Passagem em

(35)

relacionados à questão fundiária. Tais ocorrências em que a posição ocupada pelos agentes na alta hierarquia11 eclesial, traduzida em tomadas de posições na intersecção com o domínio da política, produziram efeitos no que tange aos desdobramentos das situações.

bO tema relativo à questão fundiária, bem como outras problemáticas da dinâmica social local, estiveram na composição de um repertório comum de causas formuladas e mobilizadas não apenas por clérigos, mas por agentes inseridos no mundo universtário (professores da área das ciências sociais e humanas), eventualmente vinculados a esses religiosos nos mesmos espaços de inserção, desenvolvendo atividades em conjunto (monitoria em instância de formação social e política) e expondo tomadas de posições sobre as mesmas questões. A relação dos religiosos com o espaço universitário se resume a esses contatos que podem gerar ainda retribuições pelo reconhecimento da trajetória, como homenagens recebidas pelo histórico de engajamento social.

Quanto às tomadas de posições dos intelectuais da universidade sobre as mais diversas questões, convém situar que tais percepções produzidas numa lógica de concorrência com aquelas formuladas por religiosos contribuem para a existência e relevância social de uma “causa”, uma vez que podem circular em diferentes espaços de debate, sendo inclusive objeto de apropriação dos agentes sociais em seus registros de intervenções. Esse aspecto remete ainda a uma dimensão relevante dos estudos relativos aos processos de engajamento que diz respeito aos usos militantes dos discursos científicos12.

Isso se deve, por um lado, a relação que é estabelecida entre os agentes que compõem o domínio acadêmico, sobretudo através das disciplinas humanas com o mundo social, onde não se tem uma definição de fronteira entre o mètier exclusivamente cientifico e a atividade militante dedicada a uma causa específica. Essa situação favorece a apropriação direta de saberes especializados mobilizados em intervenções na

11 Em muitos casos, o envolvimento de clérigos em mobilizações e intervenções relacionados à defesa dos

direitos dos lavradores, sobretudo, se seguia de ameaças e, até mesmo, da consumação de atos violentos praticados contra esses padres. Diante dessa situação registra-se, tanto no interior como na capital, a manifestação pública de bispos em defesa e apoio aos padres ameaçados e também seu trabalho de mediação no sentido de resolução das questões (caso de D. Pascásio, em Bacabal, e D. Motta, em São Luis).

12 Reflexão apresentada por (CORADINI, 2004, p. 12), ao expor a contribuição de Siméant (2002) no que

Referências

Documentos relacionados

Partindo desses fatos, o objetivo deste trabalho foi avaliar o efeito do magnésio, boro e manganês na absorção de zinco por raízes destacadas em duas cultivares de arroz (IAC 165 e

Ficou evidente neste trabalho que a polarizabilidade é sensível à presença de resíduos, e que o efeito IP é relacionado à presença de materiais polarizáveis dispostos na cava,

Você tem uma Mãe tremenda, que está nos céus, pronta a te consolar: “Acaso, pode uma mulher esquecer-se do filho que ainda mama, de sorte que não se compadeça do filho

Depois do aceite do anexo 01 pelo coordenador de curso, o estagiário/aluno deverá indicar seu professor supervisor o qual deverá aceitar orientar o aluno (Anexo

24/02/11, às 15hs, na sala de aula do Programa de Pós-Graduação em Ciências Sociais, no Centro de Ciências

27/02/2013, na sala de aula do programa de pós-Graduação em ciências Sociais, no centro de ciências Humanas –

Dissertação apresentada ao Programa de Pós- Graduação em Ciências Sociais da Universidade Federal do Maranhão, para obtenção do título de Mestre em Ciências

“José Serra: Qual pai, qual mãe de família não se sente ameaçado pela violência, pelo tráfico, pela difusão do uso de drogas? As drogas são hoje uma praga nacional. E aqui