APRESENTAÇÃO DE UM
ESTUDO DE CASO I
SERVIÇO DE PEDOPSIQUIATRIA DO HFF
2º Ano do Mestrado em Reabilitação Psicomotora Núcleo de Estágio em Saúde Mental
Orientador académico Prof. Doutor Rui Martins Sara Isabel Ferreira Duarte
saraduarte06@gmail.com
Conteúdos
Identificação
História Pessoal (história de doença atual e desenvolvimento psicomotor) História Clínica
Motivo de Encaminhamento para a Psicomotricidade Avaliação e Resultados da Avaliação
Elementos Critério
Hipóteses Explicativas Perfil Intraindividual Objetivos
Plano de Intervenção
História pessoal
(a)
Identificação
•
Nuno, 10 anos (D.N. 10/08/2004)
•
5ºano de escolaridade
•
Vive num Centro de Acolhimento Temporário (desde Maio de
2014)
História da doença atual
•
Pai toxicodependente (desconhecido)
•
Mãe toxicodependente com consumo de opiáceos durante a
gravidez; descrita como “
também era agitada em criança
” –
síndrome de abstinência do bebé
História da doença atual
•
Aos 6 meses o Nuno é entregue ao avô materno e à
“avó”,
encontrando-se muito negligenciado
•
Avô pouco presente e com atitudes de ameaça e elevada
agressividade
• “Avó”
pouco securizante que ameaçava o Nuno e o irmão de
institucionalização; não acredita no efeito das terapias
•
Nuno dormia com
“avó”
(grande proximidade/contacto) e o
irmão dormia (e dorme) com o avô
•
Aos 6 anos de idade viu a mãe que lhe fez muitas promessas,
criando muitas expectativas no Nuno
História pessoal
(c)
História da doença atual
•
Entrou aos 2 anos na pré-primária com
boa adaptação
, mas
descrito como uma criança
inquieta
,
agressiva
e que
desafiava
regras
e
limites
•
Na escola primária iniciou
comportamentos desadequados
, com
heteroagressividade
, incapaz de se manter concentrado e parado
na sala de aula, mas com
boa capacidade cognitiva
e
evolução da
aprendizagem
•
Retirado à família em Maio de 2014, contudo o irmão continua a
viver com os avós
História pessoal
(d)
Desenvolvimento Psicomotor
•
Aquisição da marcha: 18 meses
•
Linguagem: 1ª palavra com quase 2 anos
História clínica
•
Referenciado
para a
Pedopsiquiatria,
pela psicóloga
do CS
• Introduzida medicação• Articulação com escola (psicologia) e CPCJ • Encaminhamento para Psicomotricidade
2011
(6anos)•
Seguido apenas
pela
Motivo de encaminhamento para
Psicomotricidade
Alterações do
comportamento
Agitação
psicomotora
Comportamentos
agressivos
Comportamentos
impulsivos
Comportamentos
de oposição e
Avaliação
Bateria Psicomotora
(Tonicidade; Equilibração - imobilidade,equilíbrio estático e alguns itens do equilíbrio dinâmico; Noção de Corpo - sentido cinestésico, autoimagem e desenho do corpo; Praxia Global –
coordenação oculopedal e oculomanual; agilidade)
Grelha de Observação Comportamental
(inicial e intermédia)Observação Psicomotora
(nomeadamente: tipo de jogo, comportamentos, atitude postural, controlo do corpo, estratégias na• Imobilidade – 3 (após repetição; com postura controlada e ligeiras oscilações e sorrisos)
• Equilíbrio estático – Não se manteve de olhos fechados (“não sou capaz;
posso cair de olhos fechados”); por breves momentos que fechou os olhos
evidenciou dificuldade no controlo postural com oscilações e ajustamentos posturais
• Equilíbrio dinâmico – Desmotivação, desistência, oposição, choro apelativo
• Bom controlo tónico
• Não revela resistência na manipulação dos membros superiores e inferiores
• Extensibilidade adequada dos membros inferiores e superiores, com alguma resistência na extensão do polegar
Resultados dos itens da BPM
Tonicidade
–
4
• Coordenação oculopedal e oculomanual – 3. Adequado planeamento motor e controlo visuomotor; Controlo postural adequado
• Agilidade
• Sentido Cinestésico – Manteve olhos fechados enquanto era tocado nos diferentes segmentos, porém abria-os olhando para o local onde foi tocado para nomear esse local. Quando nomeava cada segmento olhava para a terapeuta em busca de aprovação.
• Desenho do Corpo – 2
- Durante a realização do desenho a criança manteve um sorriso provocador; - O desenho apresenta pobreza de pormenores anatómicos, pouca
proporção das formas, figura rígida e geométrica, ausência de pés, uso apenas da cor vermelha.
Resultados dos itens da BPM
Noção do Corpo
Inicial
04/12/2014
Intermédia
12/03/2015
• Jogo simbólico (pobre) – guerra;
• Motivante e colaborante na tarefa
• Toma iniciativa, com preferência por brincadeiras livres;
• Transferência de alguns
acontecimentos do quotidiano;
• Respeita parcialmente as regras do espaço (inicia comportamentos de provocação, e.g. atirar bolas ao espelho ou candeeiros);
• Atitude cordial com o adulto;
• Noção da duração da sessão.
• Alternância entre jogo simbólico e jogo mais funcional;
• Quando sente que não está no
controlo desiste da tarefa e coloca-se
na posição de “ser cuidado”;
• Transferência de muitos
acontecimentos do seu quotidiano e da sua infância;
• Em frustração alterna de sorriso para fácies mais sério;
• Demora mais tempo a sair da sala no fim da sessão (estratégia do relógio).
Resultados da Observação
Psicomotora
Criança inteligente; capaz de encontrar estratégias no jogo; boas
competências de aprendizagem
Postura eutónica; capacidade de descontração voluntária com facilidade
no acesso à passividade
Procura contenção no fim da sessão, pedindo “massagens” (relaxação)
Nas primeiras sessões: necessidade de realizar pelo menos um jogo igual
ao realizado na sessão anterior
(consistência, segurança, previsibilidade da ação e do espaço da sessão)Elementos Critério
• Capacidade de aprendizagem
• Resolução de problemas
• Ambiente mais estruturado da instituição em relação ao ambiente familiar
Fatores de Proteção
•
Indisponibilidade afetiva (*mecanismo de defesa)
•
Heteroagressividade com pares e adultos
•
Atitude manipuladora
•
Atitude de vitimização
•
Angustia em relação à permanência na instituição/sentimento de
abandono
•
Perda de interesse escolar
Hipóteses Explicativas
(a)
FATORES CONTEXTUAIS
Fatores
biológicos/genéticos
materna na gestação
Toxicodependência
Falhas na
Hipóteses Explicativas
(b)
Fatores biológicos/genéticos
• “A mãe do Nuno também era muito agitada em criança” – “Avó”
• Segundo autores pode existir influência genética da agitação dos
progenitores com a agitação e as perturbações do comportamento da criança.
Burke, J., Loeber, R. & Birmaher, B. (2004); Berger, M. (1999)
Toxicodependência materna na gestação
• Consumo de opiáceos associado a SAF; (consumo de maconha*)
• Redução no tamanho do pallidum, putâmen e ventrículo lateral inferior
(redução do tamanho da amígdala, hipocampo e parte do núcleo caudado
Hiperatividade e défice de atenção)
(Barbosa, Miranda, Nunes, Schutte, Santos, & Monteiro, 2011)
• Influência dos fatores ambientais na modificação dos efeitos da exposição pré-natal (estudo com crianças expostas a opiáceos)
Hipóteses Explicativas
(c)
Falhas na vinculação/Modelos Internos Dinâmicos
• O Self constrói-se na relação com figuras de vinculação precoce: experiência de segurança afetiva
• Progressiva autonomia do bebé: confiança no Outro Confiança no Self na presença do Outro Autoconfiança; Evolução da Co-regulação para Autorregulação
• Mentalização e Modelos Internos Dinâmicos (MID)
• Impacto negativo da desorganização da vinculação no desenvolvimento socioemocional e na regulação emocional
• Crianças institucionalizadas: menor segurança e consistência dos MID, associado a comportamento agressivo, a representações mentais
negativas em relação ao adulto que é indisponível/rejeitante – Self desvalorizado e ambivalente
Perfil Intraindividual
Domínio Psicomotor Domínio Cognitivo Domínio Socioemocional
Áreas Fortes • Tonicidade (controlo tónico) • Coordenação motora global • Planeamento motor
• Memória a curto
e longo prazo
• Planeamento da
ação
• Compreensão
de instruções
• Interação espontânea
• Comunicação
• Motivação
Áreas Fracas
• Equilíbrio*
• Praxia fina*
• Atenção** • Autorregulação emocional
(agressividade e impulsividade)
• Segurança e confiança no outro
(e no seu contexto)
• Tolerância à
frustração/crítica/sugestão do outro
• Respeito pelas regras
*com manifestações emocionais que podem ter comprometido a realização das tarefas.
Objetivos
Tendo em conta a história de vida e o contexto do Nuno, e o conteúdo
de jogo que traz para as sessões, os objetivos estabelecidos para esta
fase da terapia focam-se no Domínio Socioemocional, essencialmente na
relação terapêutica, na confiança, segurança e consistência do espaço
da sessão
Domínio Socioemocional
•
Aumentar espaço de segurança intra e interpessoal
•
Diminuir agressividade
•
Diminuir impulsividade
Plano de Intervenção
Estratégias
•
Abordagem relacional
–
contenção e confiança na relação com o
outro
•
Aumentar progressivamente a diretividade/sugestibilidade nas
atividades
Atividades
•
Jogo simbólico (contenção, segurança, previsibilidade) e jogo
funcional (regras, limites, confiança)
•
Relaxação
Recursos
•
Tempo
- Nº total de sessões previstas: 25 (1x/semana) - Tempo de sessão: 45 minutos
Percurso na Intervenção Psicomotora
•
Jogo espontâneo com atribuições simbólicas (jogo de bastões
evoluiu para um treino de combate
–
inicialmente companheiros,
depois inimigos
–
e a guerra propriamente dita)
–
observou-se a
tendência para se colocar à defesa obrigando o outro a ir ao seu
encontro
•
Verbalizações que projetam o seu quotidiano (possivelmente o que
dizem na instituição ou na escola)
Percurso na Intervenção Psicomotora
•
Maior agitação, comportamento e voz infantilizados, surge a postura
de “ser cuidado”
•
Mais referências à família e ao irmão, atribuição de personagens a
duas bolas (Dirpy pai e Dirpy filha) com
•
Construção de caravana onde Nuno e terapeuta vivem; rotinas;
•
Por vezes, a sessão inicia com a construção da caravana e passa
para um jogo mais funcional, regressando à caravana
•
Maior recusa em sair da sala no fim da sessão
•
Mudança do cumprimento inicial (igual ao que tem com irmão)
•
Mais comportamentos de oposição quando sente que pode perder o
controlo do ação
Referências Bibliográficas
Barbosa, T., Miranda, M., Nunes, G., Schutte, T., Santos, K., & Monteiro, D.
(2011). Outcomes of marijuana and opioids use during pregnancy. FEMINA,
pp. 403-407.
Berger, M. (1999). A criança instável. Paris: Climepsi Editores.
Braconnier, A. (2007). Manual de Psicopatologia. Climepsi Editores.
Burke, J., Loeber, R., & Birmaher, B. (2004). Oppositional Defiant Disorder and
Conduct Disorder: A review of the past 10 years, Part II. FOCUS: The Journal of
Lifelong Learning in Psychiatry, II, pp. 558-576.
Gatinho, A. R. (2012). O Modelo Interno Dinâmico do Self e a Qualidade das
Representações de Vinculação em Crianças de Idade Pré-Escolar. ISPA, Lisboa: Tese de Mestrado de Psicologia.
Pinhel, J., Torres, N., & Maia, J. (2009). Crianças institucionalizadas e crianças
em meio familiar de vida: Representações de vinculação e problemas de
comportamento associado. Análise Psicológica, pp. 509-521.
Xavier, M. R. (2006). Crianças expostas ao alcool e a substâncias ilícitas durante