MariaJudite de Carvalho iniciou sua produção literária em 1949 nos periódicos da capital lusitana e até o seu falecimento, que se deu em 1998, publicou mais de mil textos que, em sua maioria, nunca foram extraídos de seu suporte original, o jornal, tornando-os desconhecidos do público atual. Com intuito de resgatar parte desse precioso material literário escolhi como corpus dessa pesquisa as crônicas publicadas no Diário de Lisboa, periódico onde a escritora exibiu o maior número de textos, na seção Rectângulos da Vida que contou com 395 (trezentos e noventa e cinco) crônicas durante cinco anos consecutivos (1968-1972). Analisando esses textos percebi que a escritora inseria em sua narrativa as transformações ocorridas no século XX, em Portugal, capturando o momento de rupturas com alguns modelos tradicionais e introduzindo novos paradigmas impostos pela modernidade. O que ocorre, nesse período, é uma alteração extremamente rápida e profunda de valores e costumes com os quais a sociedade portuguesa se depara e vivencia com certa intranquilidade. Diante desse cenário instável, MariaJudite expressa, através de sua narrativa crítica e irônica, o retrato do povo português e de seu comportamento repleto de angústias e tristezas que se revelam através da melancolia. Após uma leitura exaustiva de seus textos verifiquei que este era o elemento norteador da escrita juditiana. Ela é apresentada nas crônicas sob diversos aspectos que foram privilegiados durante os cinco anos de publicações sendo eles a solidão, o abandono, a morte, o isolamento dos indivíduos que se sentiam cada vez mais impotentes diante das transformações vivenciadas e como consequência desse estado apresentam- se melancólicos o tempo todo. Essa, portanto, é a fotografia de MariaJudite de Carvalho sobre a sociedade portuguesa narrada em suas crônicas como pude verificar nessa pesquisa.
É neste contexto que se movimentam as personagens dos contos de MariaJudite de Carvalho. São figuras dominadas por uma infinita solidão que enfrentam «situações de revés e falência: a falência do amor, a falência da esperança, a falência dos projec- tos» (ibid.: 24), e aparecem dominadas por uma força superior indomável; são vítimas do Destino, da força das circunstâncias, revelando uma total incapacidade de mudar o rumo das suas vidas, de lutar contra as adversidades. Conformadas, estas personagens tendem ao isolamento, acusando uma grave dificuldade em comunicar, quer com a sociedade, quer com a própria família. Tal como afirma Elisabete Tavares, a «solidão é, efectivamente, o fantasma que atormenta estes seres, presos no Mundo adverso, que não as ouve, porque não quer, porque não deseja, porque não vale a pena... reduzindo- as ao silêncio (...) de uma existência vazia e oca, atormentadas pela passagem do tempo, mas sem saber o que fazer com ele» (Tavares, 2001: 103).
O objetivo deste artigo é realizar um estudo comparativo das personagens masculinas protagonistas dos contos “Rolando de nha Concha”, da escritora cabo-verdiana Orlanda Amarílis (1924-2014), “A fuga”, de autoria da brasileira Lygia Fagundes Telles (1923-) e “Câmara ardente”, da escritora portuguesa MariaJudite de Carvalho (1921-1998). Nos dois primeiros contos, verifica-se que Rolando e Rafael morreram e se recusam a aceitar esse fato, enquanto, na última narrativa, sobressai a figura de António, um ser opressor, cuja morte garante a liberdade e a felicidade de seus familiares. Portanto, a leitura comparativa dos textos apontados assinala uma representação negativa das personagens masculinas, que se situa entre a dependência e a infantilidade, de um lado, e, de outro, para a opressão e a tirania da figura masculina oriunda de um contexto patriarcal.
Apesar de haver publicado uma série de obras, entre 1959 e 1998, ano da sua morte, participado de diversas coletâneas e colaborado regularmente em jornais e revistas, a escritora MariaJudite de Carvalho não obteve um reconhecimento a altura. A reunião de artigos MariaJudite de Carvalho: une écriture en liberté surveillé organizada por Maria Graciete Besse, Adelaide Cristóvão e José Manuel da Costa Esteves, em 2012, buscou reparar esse equívoco, oferecendo uma série de estudos sobre a obra da autora, destacando sua sensibilidade em relação à sociedade portuguesa e, ao mesmo tempo, chamando a atenção para a sua atualidade ( 2012, p. 9)
Salientando que as transcrições realizadas não esgotam obviamente os exemplos de ocorrências reformulativas, parece-nos que a sua visível frequência não nos deixa considerá-las como meramente ocasionais ou inconsequentes. Pelo contrário, o registo desses casos e a sua apreciação permite-nos, desde logo, considerar este tipo de estra- tégia linguística e discursiva como uma das marcas mais importantes do estilo de MariaJudite de Carvalho, associada ao uso igualmente insistente de modalizadores como, por exemplo, talvez e talvez talvez com certeza 13 .
Daí a proeminência e relevo concedidos pelos seus textos ao atrito das coisas e dos objectos sobre as pessoas. Por exemplo, o novum da ciência e da tecnologia hegemoniza-se no ‘mundo da vida’, concorrendo muito embora com a pervivência, numa sociedade como a portuguesa, com a superstição e a magia, mas não sem mover uma certa nostalgia por um passado irrecuperável. Onde antes havia corcéis e carroças, agora há automóveis assassinos e dos seus condutores diz-se serem sujeitos com “licença de porte de volante” (Carvalho, 1979: 58-59). Onde antes havia uma mulher destinada à solidão da domus aurea, agora há uma nova solidão feminina acompanhada de “máquinas caseiras” (Carvalho, 1975: 155- 156). Globalmente considerada, a ciência e a tecnologia, segundo MariaJudite de Carvalho, falham como motores de progresso, felicidade ou resistência à dominação. As crónicas arti- culam a noção de um processo de modernização que expulsa tanto os sujeitos individuais como colectivos. é decerto esse o valor alegórico do texto intituldo “Máquinas gritadoras”. Encetado por uma alusão ao romance queirosiano a Cidade e as serras, o texto fala-nos do cronótopo inaugurado pela promessa de uma Modernidade portuguesa que, todavia, “[se foi] complicando”. O destino dessa nova realidade social e existencial, material e simbólica – o presente da escrita –, é descrito nos seguintes termos: “há os que levam horas fora do mundo, já não são totalmente seres humanos entre seres humanos, mas só espectadores na platéia da sua casa” (Carvalho, 1979: 60-61). Os indivíduos virtualizam-se numa ‘sociedade do espectáculo’. Expropriação de uma existência autêntica e descaracterização da cultura ‘étnica’ genuína: daí que a cronística de MariaJudite de Carvalho nos devolva uma escritora especialmente atenta à ‘americanização’ do mundo.
Através de um estudo histórico-social da formação do sujeito feminino, a escritora e ensaísta francesa propõe romper com todo o legado anterior, denunciar séculos de uma vida à margem (fruto da submissão) e propor uma nova posição do feminino que o retire da condição de sombra do sujeito masculino. As colocações feitas por BEAUVOIR (1976) além de, como já dissemos, influenciarem bastante a literatura a partir dos anos 60, também vão refletir-se em muitos dos enredos de Lispector e Carvalho, principalmente no que diz respeito à freqüente presença de protagonistas que vivem em conflitos estabelecidos na dualidade destino/liberdade, como é o caso dos contos que serão analisados a seguir.
suas amarguras, postura que desenhará o retrato das personagens juditianas. O confronto com o passado e a pouca possibilidade de um futuro são aspectos que se estendem pelas narrativas de MariaJudite, ocasionando o choque que se somará aos conflitos pessoais vividos pelas personagens. Em “Seta despedida”, conto que dá título à última publicação em vida da autora, é possível vermos a intensidade da angústia da protagonista e sua luta para fugir de fatos do passado. Porém seu destino está atrelado a uma vida sem realizações, sem um lugar seu no mundo. No presente, de onde lança o reflexivo olhar sobre si mesma, há a tristeza do tempo passado, no qual deixou a condição de filha de um pai que a abandonou, para ser a esposa de um homem simples e sem grandes arroubos românticos. Como conseqüência resta uma fina amargura e a sensação de impotência diante da implacável força do tempo:
Gina de Freitas, a corajosa jornalista, refere a perseguição religiosa e política à professora Maria Almira Medina (1920-), porque assediava meninos no Liceu Nacional de Sintra. A jornalista provou serem manobras políticas contra uma mulher corajosa. Já depois do 25 de Abril. (DL. 17 de Julho. Página 8). Ainda nas denúncias da desigualdade entre homens e mulheres: da escritora MariaJudite de Carvalho. Procurava-se um chefe de escritório com idade não superior a 45 anos, um pracista com 40 anos no máximo e uma secretária correspondente de, insidiosamente 27 anos. A escritora chegou então à procura de um guarda-livros e, veja-se a bondade: procurava-se deficiente físico ou senhora. Grande MariaJudite de Carvalho.
Maria Lúcia Carvalho da Silva (Coord.)** Cristina de Mello Gomide*** Mariangela Belfiore Wanderley **** Rosangela Dias Oliveira da Paz***** Tânia Maria Ramos de Godói Diniz******.. Resum[r]
Ao longo do processo analítico, Sandra foi, pouco a pouco, reconhecendo em si sentimentos que nutria pela mãe, mas que não se considerava capaz de reconhecer e, portanto, de nomear. Ma[r]
Isto ocorre devido a inúmeros fatores que podem influenciar nos resultados dos estudos de infiltração, como a experiência do operador, o período entre a obturação e a imersão[r]
1 – Activity (A) of hepatic peroxisomal enzymes, expressed as s -1 (catalase) or nmol.min -1 (urate oxidase), in estradiol (E2) and estradiol plus ICI (E2 + ICI) exposed fishes against[r]
O presente trabalho está subordinado ao tema “ A avaliação na formação modular certificada: representações e funções na perspetiva dos atores envolvidos, num Centro de Forma[r]
implementation intention interventions (Armitage, 2004; Armitage, 2007a, 2007b; Bermúdez et al, 2004; Carvalho et al, 2008, Experiment 1; Kellar & Abraham, 2005; Kwak et al., 2007; Luszczynska, 2006, Luszczynska, Scholz & Sutton, 2007; Milne et al. 2002; Murgraff et al.,1996; Nooijer et al. 2006; Orbell, et al., 1997; Orbell & Sheeran, 2000; Osch et al., in press; Prestwich et al., 2005; Sheeran & Orbell, 1999; 2000; Steadman & Quine, 2004; Verplanken & Faes,1999; Ziegelmann et al., 2007). However these studies differ from the present study in a number of ways. First, we used a behavioral measure that cannot be feigned in addition to a self report measure. Second, we asked participants to perform a repeated ongoing behavior that needed to be performed daily for 21 days. Asking participants to perform a task at least once in a given period of time is different from asking to establish a routine behavior for an extended period of three weeks, as we did. Consistent with our findings, a number of previous studies have failed to find significant effects of implementation intentions on adherence to various ongoing health-related requests, including taking antibiotics for 14 days (Jackson et al., 2006), increasing fruit and vegetables consumption in a three months period (Jackson et al., 2005) and increasing dental flossing for three weeks (Lavin & Groarke, 2005). Particularly in physical activity requests, implementation intentions have failed to find significant effects on adherence to an exercise plan over a sustained period of time two weeks (Prestwich et al., 2003), three weeks (Carvalho et al., Experiment 2; Hill et al., 2007), five weeks (Brickell et al., 2006), and two months (Sniehotta et al. 2006). Indeed, one study found that forming implementation intentions actually significantly decreased the performance of the intended behavior in comparison with controls (exercise for 7 days, Budden & Sagarin, 2007).Therefore our results seem to confirm that implementation intentions is not an effective strategy to enhance adherence of repeated and ongoing tasks,
António Jorge Guiomar (FCTUC) Maria Carmen Alpoim (FCTUC) Armando Cristovão (FCTUC) Maria Filomena Botelho (FMUC) Carlos Freire de Oliveira (FMUC) Marta Pinto Coelho (FMUC) Isabel Maria Abrantes (FCTUC) Paula Vasconcelos Morais (FCTUC) Isabel Marques Carreira (FMUC)
Reginaldo Carvalho (Guarabira-PB, 1932 – João Pessoa-PB, 2013) estudou no Conservatório Nacional de Canto Orfeônico, no Rio de Janeiro. Por meio do contato com Heitor Villa-Lobos, diretor da instituição àquela época, mudou-se para a Europa, onde estudou com Paul Le Flem, entre 1952 e 1956, em Paris. Em 1964, voltou à França para outra temporada de estudos, ocasião na qual realizou estágio em música eletroacústica no Centre Bourdan, da Organization Radio-Télévision Française, sob a orientação de Pierre Schaeffer. (MARCONDES, 1998) Na mesma época, fez cursos de apreciação de Artes Plásticas e de Cinema. Reginaldo Carvalho compôs cerca de quarenta obras para teatro e cinema, tendo trabalhado com vários diretores. Levantamentos iniciais indicam que ele atuou com diferentes grupos e em muitos estados. Na capital fluminense, trabalhou com Luís de Lima, na Sociedade Teatro de Arte; Maria Clara Machado, no Tablado; Ziebinsky, no Teatro Nacional de Comédia (TNC); Rubens Correia e Ivan Albuquerque, no Teatro do Rio, Teatro Mesbla e Teatro de Ipanema; Gianni Ratto, no Teatro Maison de France; em Curitiba, Paraná, colaborou com Cláudio Correia e Castro, no Teatro Guaíra; em Brasília, Capital Federal, produziu com Mário Brasini, no Teatro Escola Parque; e em Teresina, Piauí, esteve ao lado de Antônio Murilo Eckhardt, no Teatro 4 de Setembro. (CARVALHO, 1995, p. 21) Destaca-se, nesse contexto, a parceria com Maria Clara Machado, provavelmente uma das mais prolíficas em toda a sua carreira. Esta pesquisa pioneira tem como objetivos catalogar, editar e analisar as composições escritas por Reginaldo Carvalho para o grupo Tablado, criado e dirigido por Maria Clara Machado. A meta é definir o perfil estilístico do referido compositor tendo como referência suas obras incidentais, contribuindo assim para a preservação da nossa memória e a divulgação da arte e da cultura brasileiras.
cannibal,” for Oswald de Andrade, led a troubled and intense life, promoting a high degree of scandal and cultural agitation in the still provincial São Paulo of the mid-twentieth century, leaving a multifaceted production. In addition to being recognised in life as an outstanding painter and draftsman, with his own language strongly influenced by the European avant-gardes (especially Fauvism, Dadaism and Surrealism), as a talented architect and dynamic and original thinker (when not rather clumsy in his attempts to be taken seriously by scientific communities), Flávio de Carvalho was also a proposer of experiments [experiências], numbered or not by him, and attitudes and actions that in his time were regarded as strange and with no clear meaning, but today can be easily assimilated by Brazilian art history and understood as the predecessors of a series of movements and strategies of artists who follow one another immediately after neoconcretism until the contemporary era. It would be interesting to clarify the ways of influence of Flávio de Carvalho on Hélio Oiticica, for example, which made it possible, in our opinion, the synthesis between a “constructive will” and a “delirious tradition” in Brazil in the work of the Carioca. For the purposes of this essay, however, articulated to the curatorship of the exhibition Flávio de Carvalho Expedicionário, we consider the written and iconographic production (photography and film) of Flávio de