É o trabalhoimaterial que ativa e organiza a relação produção/consumo. A ativação, seja da cooperação produtiva, seja da relação social com o consumidor, é materializada dentro e através do processo comunicativo. É o trabalhoimaterial que inova continuamente as formas e as condições da comunicação (e, portanto, do trabalho e do consumo). Dá forma e materializa as necessidades, o imaginário e os gostos do consumidor. E estes produtos devem, por sua vez, ser potentes produtores de necessidades, do imaginário, de gostos. A particularidade da mercadoria produzida pelo trabalhoimaterial (pois o seu valor de uso consiste essencialmente no seu conteúdo informativo e cultural) está no fato de que a ela não se destrói no ato do consumo, mas alarga, transforma, cria o ambiente ideológico e cultural do consumidor. Ela não reproduz a capacidade física da força de trabalho, mas transforma o seu utilizador (LAZZARATO; NEGRI, 2001, p. 45).
Os bancários configuram uma categoria de trabalhadores cujos modos de trabalhar e de ser refletem muitas das transformações do trabalho contemporâneo e associam-se plenamente à noção de trabalhoimaterial devido a suas atuais formas de estruturar e organizar o trabalho, em especial, via o abandono de rígidos padrões espaciotemporais, a utilização de sutis modos de controle, e a adoção de novas tecnologias da informação e comunicação (Grisci, 2008). Desta forma, toma-se a categoria numa posição de destaque em face das questões associadas ao lazer. Por lazer entende-se, conforme apresenta Dumazedier (2008), o conjunto de ocupações às quais o sujeito pode entregar-se de livre e espontânea vontade, seja para repousar, divertir-se e entreter-se. Uma vez que, por dilema, se entende a vivência de uma situação cujas alternativas de resolução se apresentam insatisfatórias, atingindo todos os campos da vida individual na sociedade líquido-moderna, como ressalta Bauman (2007), estaria o lazer associado aos dilemas pessoais contemporâneos? Perante situações embaraçosas da vida líquida, encontrar-se-iam os bancários, por exemplo, entre o dever e o lazer? Que estratégias de enfrentamento engendrariam quanto a dilemas relativos ao trabalho e ao lazer, caso assim se configurassem? Diante das questões norteadoras expostas, elegeu-se a seguinte questão de pesquisa: como a atual configuração do trabalho, sob a noção de trabalhoimaterial, interfere no lazer de bancários de um banco múltiplo privado? Pode tal interferência constituir-se em dilemas pessoais?
tem tomá-lo sob a noção de trabalhoimaterial (Grisci, 2008). Frente a situações nem sempre prescritas ou conhecidas com antecipação, o exercício do trabalhoimaterial bancário mobiliza dimensões subjetivas por parte dos trabalhadores, em especial no que se refere à experiência de vida adquirida, às capacidades de dis- cernimento, auto-organização, comunicação e relacio- namento, no sentido de oferecer aos consumidores dos serviços bancários sensação de coniança e segurança relativa aos negócios estabelecidos com o banco. O trabalhoimaterial “não se reproduz (e não reproduz a sociedade) na forma de exploração, mas na forma de reprodução da subjetividade” (lazzarato & Negri, 2001, p.30). ao ser demandado na forma de produção, e compreendido como fator de rentabilidade para as em- presas, pode-se airmar juntamente com Pelbart (2000, p.37) que “o trabalho precisa da vida como nunca, e seu produto afeta a vida numa escala sem precedentes”. Nesse sentido, reletir acerca da vivência de dilemas relativos ao trabalho equivale a reletir sobre a vivência de dilemas relativos à vida como um todo.
Assim, Marx dos Grundrisse foi base, ao mesmo tempo, tanto para explicar a transição do capitalismo industrial para um suposto capitalis- mo cognitivo como para demonstrar como a ex- ploração do trabalho não se limitaria à exploração do trabalho na fábrica e, portanto, que a valoriza- ção do capital pode ser realizada tanto sob o signo do trabalho material quanto do trabalhoimaterial. Em linhas gerais, as questões colocadas pela discussão sobre o trabalhoimaterial giraram em tor- no de qual seria o sentido da produção imaterial? O trabalhoimaterial indica um novo padrão de orga- nização de sociabilidade ou aprofunda o padrão capitalista atual? Ele é expressão de uma nova lógi- ca social de sociedades pós-industriais ou recom- põe e conserva a base estrutural das sociedades ca- pitalistas características dos séculos XIX e XX?
Esse devir-Antígona, que traduz diabolicamente tanto o mito quanto a si mesma enquanto mulher-pressuposta, confere à narração um estatuto particular, visto ser o ato de narrar ao mesmo tempo deslocado para outro lugar, a ancestralidade do mito, e radicalmente situado no aqui e agora da clínica, engendrando uma duplicidade entre a mulher ancestral, exemplar, e todas essas mulheres de agora postas em situação de silenciamento e clausura. É na rua, nua, que elas podem fazer contágio, pela tagarelice do trabalhoimaterial que é o próprio romance e a escritura: “jeito é caminhar imaginosa nua pelas ruas desta cidade” (p. 54).
O artigo relaciona trabalhoimaterial e subjetividade a partir de modos de controle vigentes em uma instituição bancária portuguesa. Resulta de um estudo de caso cujos dados foram coletados por meio de entrevistas individuais com empregados bancários e com representantes do setor, além de fontes documentais disponibilizadas pela empresa e por órgãos representantes do setor bancário em Portugal. Analisam-se dois modelos de gestão implementados pela instituição bancária, relacionados à noção de trabalhoimaterial e aos mecanismos do novo paradigma tecnológico organizado em torno das tecnologias de informação. Os modelos de gestão potencializam modos de controle rizomático que produzem a existência individual e coletiva dos trabalhadores por meio de incessante “moldagem de si”. O controle rizomático instala-se pela sutileza, sedução, sofisticação e justificação, uma vez que a gestão do trabalhoimaterial outorga margem de liberdade aos trabalhadores através da gestão de si compreendida como autocontrole. Do controle rizomático advém uma subjetividade padronizada e consentida.
No tocante à transição, Hardt e Negri compreendem o processo de formação de paradigmas (um ensejado pelo momento de crise e outro pelo de onicrise/corrupção) a partir da relação do próprio capital entre limites e barreiras. Contudo, sua caracterização da transformação do trabalho na produção capitalista por diferentes épocas (trabalho que produz produtos naturais, trabalho que produz produtos industriais e trabalho que produz serviços) e sua conceituação de trabalhoimaterial (vinculado ao trabalho que possui bens e utilidades relacionados ao setor de serviços) não seriam suficientes - conforme Prado - para clarear a fase atual do capitalismo, uma vez que sua conceituação de trabalho abstrato não seria a mesma contida em O Capital. Para Hardt e Negri, trabalho humano abstrato tem como qualidade o gasto de energia/força humana, ou seja, é o trabalho em geral, o gênero de muitos trabalhos concretos, ao passo que para Marx - segundo Prado – o trabalho humano abstrato existe em função de trabalhos humanos que se encontram objetivamente comensurados entre si no processo social. Inclusive, a maneira de Hardt e Negri compreenderem a transição capitalismo-comunismo, por meio de “paradigmas,” estaria enviesada, principalmente por rejeitar o trabalho como categoria chave e a teoria do valor. Apesar das críticas a Hardt e Negri, enfatizamos a necessidade de se considerar o contexto a partir do qual esses autores – principalmente Negri – desenvolveram suas formulações, isto é, a trajetória de luta e transformação do movimento operário italiano diante do regime de acumulação flexível. Sem essa compreensão, toda a crítica – ainda que lógica – pode parecer a- histórica, na medida em que só se atém às idéias dos homens, se são corretas ou não. Além disso, uma análise suficiente do conceito de trabalhoimaterial requereria também sua contextualização na discussão em outros autores, como Corsani (2003) e Moulier-Boutang (2003), do que tem sido denominado de “capitalismo cognitivo” 16
[...] podemos conceber o trabalhoimaterial em duas formas fundamentais. A primeira refere-se ao trabalho que é primordialmente intelectual ou linguístico, como a solução de problemas, as tarefas simbólicas e analíticas e as expressões linguísticas. Esse tipo de trabalhoimaterial produz ideias, símbolos, códigos, textos, formas linguísticas, imagens e outros produtos do gênero. Chamamos a outra forma fundamental de trabalhoimaterial de ‘trabalho afetivo’. Ao contrario das emoções, que são fenômenos mentais, os afetos referem-se igualmente ao corpo e à mente. Na realidade os afetos, como a alegria e a tristeza, revelam o atual estado da vida em todo o organismo, expressando um certo estado de corpo paralelamente a uma certa forma de pensamento. O trabalho afetivo, assim, é o trabalho que produz ou manipula afetos como a sensação de bem estar, tranquilidade, satisfação, excitação ou paixão. Podemos identificar o trabalho afetivo, por exemplo, no trabalho de assessores jurídicos, comissários de bordo e atendentes de lanchonetes (serviços com sorriso). Uma indicação da importância crescente do trabalho afetivo [...] é a tendência dos empregadores para enfatizar a educação, a atitude, a personalidade e o comportamento ‘pro-social’ como capacitações primordiais necessárias aos empregados. Trabalhador com uma boa atitude e traquejo social é uma outra maneira de designar um trabalhador hábil no trabalho afetivo (HARDT e NEGRI 2012 p. 149)
A história do design acompanhou a história do desenvolvimento das indústrias, cabendo aos profissionais dessa área projetar objetos, desenvolver peças gráficas e organizar processos que favorecessem a produção e o consumo de mercadorias. Atento a esse contexto, o presente estudo teve por objetivo geral compreender a importância do trabalhoimaterial do designer, bem como as possibilidades de sua vinculação com a sustentabilidade. Para isso, foi realizada uma pesquisa qualitativa, da qual participaram quatro designers vinculados a dois estúdios localizados em uma cidade do norte do Estado do Paraná, que relataram suas experiências profissionais e seus vínculos com o meio ambiente. Os resultados demonstraram que a profissão do designer encontra várias maneiras de se conectar com a preservação da natureza, mas diversas são as dificuldades para expandir esse vínculo. Ao final da pesquisa constatou-se que o trabalho do designer ocorre em meio a uma série de impasses que envolvem as demandas de produção das empresas, mas não se reduz a elas, podendo também trazer para o cotidiano de suas atividades uma preocupação efetiva com a natureza, com o meio ambiente e com os seres humanos.
As novas formas de divisão do trabalho e o processo de trabalho contemporâneo se caracterizam tanto por uma flexibilidade funcional quanto numérica do emprego da força de trabalho. O que existe de catastrófico nisto, do ponto de vista social, é o crescente descarte e a volatilidade das habilidades, funções e postos de trabalho. Assim, a insegurança no emprego, a possibilidade de demissões, a precarização dos contratos e a deterioração salarial e da renda do trabalho tornam-se práticas recorrentes e normais. Por outro lado, o ponto de vista que vê o “trabalhoimaterial” como hegemônico e imediatamente revolucionário na atualidade – apostando que sua criatividade e mobilidade tende a libertá-lo do aprisionamento burocrático-estatal, fabril e empresarial rigidamente hierarquizado e centralizado – é aqui submetido a críticas. Na contramão da eufórica visão em relação ao “trabalho cognitivo”, emergem leituras marxianas que sustentam o seguinte: caso não ocorra simultaneamente uma ultrapassagem da dimensão performativa da democracia formal burguesa e uma superação irreversível das coordenadas sistêmicas do capital, o “trabalhoimaterial” não conseguirá livrar-se da lógica da lei do valor. Por outro lado, no presente trabalho também são abordadas criticamente as “posições pós-políticas” que deixam para trás os velhos combates ideológicos e se centram na administração especializada, com o apoio em “práticas biopolíticas” de gestão social, em circunstâncias econômico-sociais restritivas. Por outro ângulo, no presente texto, a “luta de classes” é visualizada como antagonismo estrutural oculto que funciona como princípio estruturador, ou seja, como “universal concreto” de todo o campo de lutas e diferenças sociais. Por fim, trata-se aqui de apontar para o “ato político” e “educativo” que rompe com a constelação sócio-simbólica do capitalismo global existente. Ou seja, o ato político/pedagógico é incondicional, não no sentido de estar situado fora da história e fora do registro simbólico socialmente ancorado, mas de ser um ato surpreendente que é irredutível ao parâmetro e à moldura das condições opressivas dadas no capitalismo.
Resumo Os últimos anos do século XX imprimiram uma nova configuração à sociedade do trabalho. Assiste-se a mudanças profundas que alteram significativamente o modo produtivo e desorganizam o mundo do trabalho que se conhece. No epicentro do deslocamento, encontra-se a emergência da economia do imaterial e do trabalhoimaterial. Essas características estão modificando o modo produtivo e, mais do que isso, a relação do trabalhador com o seu trabalho. Estamos transitando da sociedade industrial para a sociedade pós-industrial, da sociedade do trabalho da reprodução à sociedade do trabalho da bioprodução. Uma passagem da reprodução da vida à produção da vida. Da sociedade do biopoder à biopolítica. Uma transição que envolve uma ressignificação do conceito força de trabalho. A sociedade industrial, taylorista/fordista, mobilizou massas enormes de trabalhadores e os empurrou para uma divisão técnica do trabalho que lhes reservava tarefas simples e repetitivas. A sociedade industrial cindiu o operário e reduziu-o a uma máquina produtiva. Assiste-se, agora, a uma transformação significativa do sujeito do trabalho na sua relação com a produção. O capitalismo cognitivo, em sua versão pós- industrial, sob a hegemonia qualitativa do trabalhoimaterial, tendo em sua base o conhecimento, a comunicação e a cooperação, faz emergir uma outra subjetividade que, ao mesmo tempo em que é requerida pelo capital, preserva a sua autonomia e é portadora de emancipação.
Lessa (2001) apresenta avaliação detalhada do conceito de trabalhoimaterial sob a luz da teoria marxiana e afirma ser o neo-marxismo de Hardt, Negri, Lazzarato, Cocco e Gorz um equívoco teórico. Segundo ele, as categorias centrais da análise do capitalismo construídas por Marx permanecem úteis à compreensão do desenvolvimento presente. Santos (2001) aponta que o conceito de trabalhoimaterial deriva da má interpretação do conceito de trabalho intelectual ou espiritual. Este seria resultado da dissoci ação empreendida pelo capital entre o trabalho “do cérebro” e o trabalho “das mãos”. No entanto, planejamento e atividade em si, são dimensões ontológicas fundantes do trabalho, por isso, indissociáveis. Apostar num tipo de trabalho somente intelectual é alijar o conceito de trabalho da capacidade de avaliação do caráter hominizante dessa atividade – uma incoerência teórica grave para autores que se remetem à tradição marxiana. O restante das críticas perpassa a discussão aprofundada da teoria de Marx, e estão oportunamente resumidas por Lessa (2001, p. 141):
Quanto a isso, Bauman (2008) articula que em tempos de realizações individuais que não se solidificam, raciocínio que alicerça dois de seus títulos Vida Líquida que opera em consonância com Sociedade Líquida Moderna, em função da transformação contínua de paradigmas, de aprendizagem e de cultura. Todo esse contexto, sem embargos, causa reflexos sociais. Veja, por exemplo, o código dos contratos de trabalhos, sob a ótica pós- fordista, em que os ritos que envolvem as práxis profissionais são flexíveis e imateriais, apresentada sob duas diferentes vieses subjetivas. Por mais despolitizado que pareça o bios midiático, a sua lógica é afeita a propósitos do mercado, o que implica em uma reconfiguração do mundo de acordo com o fascínio técnico (SODRÉ, 2009). Em contrapartida, com uma conectividade ensaiada a partir da Internet podemos articular de forma mais decisiva questões sociais comuns, como destacam Hardt e Negri (2005) ao falarem dos movimentos sociais contemporâneos, que se utilizam das ferramentas digitais para uma efervescência política. Ainda para os últimos autores, muito disso deve-se às possibilidades do trabalhoimaterial que possibilitam a emancipação do individuo, mesmo que as relações de trabalho sejam consideradas efêmeras.
instituição, o docente em questão realiza atividades de trabalho de modo ininterrupto; trabalho aparentemente facilitado pela tecnologia da informação e comunicação. Sem levar em conta o contrato relativo ao tempo de trabalho estabelecido, trabalha por transbordamento (ROSENFIELD e ALVES, 2011). “As demandas que eu recebo por e-mail tomam um pouquinho de tempo, mas aí eu utilizo o horário de almoço ou ch ego um pouquinho antes, ou fico um pouquinho depois; a gente consegue conciliar” (D9). Cabe ressaltar que o uso que faz do tempo de não trabalho para trabalhar é descrito no diminutivo – um pouquinho de tempo, um pouquinho antes, um pouquinho depois. A concessão observada apresenta característica inofensiva ao ser narrada. Trata-se, contudo, de algo que principia com a apresentação de um sujeito flexível e conciliador, comprometido em exaltar e valorizar as competências relacionais requeridas no exercício do trabalhoimaterial, mas que se desdobra como cilada quando incorporado às práticas rotinizadas do estilo de vida ou modos de existência (DELEUZE, 1998; GIDDENS, 2002). Ao assegurar que “final de semana preservo para o descanso, a não ser que tenha uma de manda muito urgente, que tenha prazo”, D7 também denota o uso do tempo de não trabalho.
Neste trabalho são revistos, organizados e discutidos conceitos e estratégias em torno das formas colaborativas de produção na sociedade da informação, particularmente aqueles relacionados com o trabalhoimaterial e o compartilhamento de informação. O capitalismo no seu modo de desenvolvimento informacional produz mudanças nas relações entre as formas sociais de produção e as tecnologias de informação e comunicação. A produção capitalista atual centraliza os bens imateriais – a informação em primeiro lugar. O compartilhamento de informação é parte de processo de produção e, ao mesmo tempo, o seu principal produto. O compartilhamento possibilita a construção de modos de organização inteligentes e solidários, e modos de produção “não-capitalistas”. O compartilhamento produz o comum, em comum. Cria-se uma densa esfera do comum, base para uma recriação incessante. Conclui-se que as formas colaborativas de produção são particularmente importantes para que se singularizem as subjetividades e se produzam modos autônomos de vida.
A teoria do valor foi até hoje lida com base em três recortes analíticos amplos. Um recorte anterior a Marx, o de Marx e dos marxistas e o dos neoclássicos. O anterior a Marx tem como elementos centrais a ideia de que o valor é uma categoria central das sociedades de economia mercantil ou de troca, que nas sociedades capitalistas ganharia sua expressão mais avançada no processo de criação da riqueza. Em Marx, o valor é considerado como a categoria econômica mercantil fundamental. No entanto, esse tipo de economia é apreciado como transitório, isto é, há uma determinação histórica da economia mercantil que se vincula diretamente à existência do valor. Já para os neoclássicos, o valor é uma categoria da atividade econômica em geral, sendo, portanto, a atividade econômica capitalista uma forma particular dessa atividade econômica geral. Sua preocupação central está, nesses termos, voltada para o equilíbrio geral apoiado na análise marginalista do valor. No entanto, o debate em torno do valor hoje parece ir além dessas classificações. Sua recuperação se sintetiza na seguinte pergunta: as teses sobre as novas tecnologias da informação e sobre o trabalhoimaterial convergiriam para uma nova forma da teoria do valor-trabalho ou para a superação dessa teoria? O objetivo central deste artigo é caracterizar introdutoriamente as principais teses do debate na teoria social, que incorporam, atualizam ou negam a teoria do valor-trabalho no processo de análise do trabalhoimaterial. P ALAVRAS - CHAVE : teoria do valor-trabalho, trabalho material e imaterial, Marx, sociologia contemporânea.
Considerando-se a denominação Amigos de Aluguel como mais uma oferta voltada a responder aos apelos por novidade que abundam na sociedade contemporânea, propõe-se aqui pensar sua atuação atrelada a dois aspectos complementares: a solidão que emerge com as demandas por melhores desempenhos no trabalho, e a necessidade de inovação para a inclusão no mercado de trabalho em uma sociedade que prima pela competitividade. Esses aspectos são vistos como facilitadores do surgimento de ofertas integradas à lógica gerencialista (Gaulejac, 2007), sob a noção de trabalhoimaterial (Lazzarato & Negri, 2001) que coloca o indivíduo no centro da produção de bens e serviços e em consonância com a vida líquida (Bauman, 2007a), como sugere ser o caso Amigos de Aluguel. Vida líquida, conforme Bauman (2007a, p. 19), “significa constante autoexame, autocrítica e autocensura”, tendo como consequência a insatisfação do indivíduo ao sentir-se pressionado a obter a todo o instante melhores resultados.
Entendemos que o procedimento estratégico das teorias fundadas na noção de trabalhoimaterial está relacionado com a maneira como estas anali- sam o trabalhador (individualizado) e projetam, com base nessa análise, um tipo ideal de classe revolucionária. Por um lado, esse trabalhador re- presentado tipicamente é relacionado diretamente ao seu posto de trabalho; suas qualificações téc- nicas informam as possibilidades de sua prática e consciência políticas. Há uma correspondência, portanto, entre as formas de apropriação concre- ta dos saberes empíricos e das potencialidades revolucionárias da classe trabalhadora, ou do su- jeito lá indicado. Por outro, a liberação do traba- lhador do tempo de trabalho necessário à produ- ção de mercadorias é caracterizada como elemento central das contradições sociais que poderiam implodir a estrutura desta produção. O conjunto das forças produtivas é, por fim, indicado como um elemento positivo e libertador frente às amar- ras das relações de produção capitalistas.
Como deve acontece de tempos em tempo, uma nova categoria “socioló- gico-filosófica” fez sua entrada na cena acadêmica: a do “trabalhoimaterial”. Tal como ocorre na maioria das vezes, por ser uma novidade, a nova catego- ria foi saudada e alguns espaços lhe foram abertos na mídia e nas editoras do país. Apresentando-se como uma tese radical de esquerda, e tendo por trás a figura de Antonio Negri a lhe conferir alguma visibilidade, o conceito de trabalhoimaterial acabou sendo acriticamente empregado até mesmo por setores da esquerda brasileira. É, por isso, necessário que a examinemos mais de perto, mesmo que estejamos convencidos que suas debilidades são tantas que a nova categoria do trabalhoimaterial não deverá permanecer sequer por alguns poucos anos no debate em curso. Nos parece que seu destino não será muito diferente do que ocorreu com o “marxismo analíti- co”, que tanto furor fez na década de 1990 e que, hoje, poucos sequer recor- dam do que se tratava.
Este artigo apresenta resultados de uma pesquisa fundamentada na Psicodinâmi- ca do Trabalho, realizada em um hospital do Rio Grande do Sul entre 2006 e 2007. Investigou-se a psicodinâmica no contexto de trabalhoimaterial da enfermagem, efetuando uma análise das vivências coletivas dos trabalhadores diante das de- mandas contemporâneas. A partir do estudo, foi possível constatar os efeitos da maximização do trabalhoimaterial na contemporaneidade, identificando traços do sofrimento vivenciado pelos trabalhadores e as dificuldades relacionadas às exigências da profissão de enfermeiro na atualidade. Isso leva os profissionais ao individualismo e limita a expressão do reconhecimento e a visibilidade de suas contribuições no trabalho, restringindo as possibilidades de transformação do sofrimento vivenciado no meio profissional em prazer e realização. Além disso, verificou-se que há doação intensa ao trabalho, busca pela perfeição, restrição de tempo e espaço para interação e cuidado, limitação nos espaços de discussão, de convivência, de elaboração compartilhada de sentimentos e falta de relaciona- mento efetivo da equipe com predominância da técnica e das prescrições. Com os resultados obtidos, entende-se que se faz fundamental a potencialização dos es- paços de discussão e de convivência rumo à construção coletiva de emancipação profissional e de novos sentidos para o trabalho na enfermagem.