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1. INTRODUÇÃO

1.1.11 Ácido betulínico: eficácia e segurança

O ácido betulínico representa uma molécula triterpenoide pentacíclica do tipo lupano (Figura 3). Ele é abundante no reino vegetal. Em princípio, tem sido isolado de uma série de espécies, incluindo Zizyphus joazeiro118, Syzigium clariflorum119, entre outras. A molécula do ácido betulínico tem sido testada para uma série de finalidades que podem ser agrupadas em atividades anti-inflamatórias e citoprotetoras e efeitos citotóxicos para bactérias, protozoários, helmintos, fungos e células tumorais, valendo destacar seu potencial antiviral e antitumoral92,120,121.

Primeiro relatando os estudos de atividade anti-inflamatória e citoprotetora, um estudo prévio in vivo testou o ácido betulínico como um composto alternativo para modular a toxicidade induzida pela N-nitrosodimetilamina, presente nos alimentos e água contaminada. Os resultados mostraram que o pré-tratamento de ratos com ácido betulínico (25 mg/kg a cada 24h por gavagem durante 14 dias consecutivos) protegeu contra alterações induzidas pela N-nitrosodimetilamina, sugerindo um efeito protetor através de atividades antioxidantes e antiapoptóticas122. Acésio e colaboradores procuraram avaliar o efeito modulador do ácido betulínico em cultura de células, contra genotoxidade induzida por diferentes agentes mutagênicos (metilmetanosulfonato, doxorrubicina, camptotecina e etoposídeo). Ao final do estudo, os autores concluíram que o ácido betulínico teve efeito antigenotóxico dependente do tipo de substância mutagênica e concentração123, tendo o ácido betulínico sido testado em concentrações não citotóxicas (< 22 µM, determinação dos autores) sobre células de fibroblastos de pulmão de hamsters chineses.

Figura 3. Estrutura química do ácido betulínico. Fonte: Cho & Gottieb, 2001124.

No estudo anterior de Jin e colaboradores125, os autores procuraram esclarecer o mecanismo do ácido betulínico sobre a sintetase do óxido nítrico endotelial (eNOS), principal enzima reguladora do endotélio vascular. Foram examinados efeitos sobre vias intracelulares subjacentes à atividade da eNOS e a produção de óxido nítrico em células endoteliais em cultura. Os resultados indicaram que ácido betulínico em concentrações não citotóxicas em cultura (5-20 µM) ativou a fosforilação de eNOS e a síntese de óxido nítrico através da via Ca2+/ cinase II dependente de Ca2+ e calmodulina, além da via Ca2+/ cinase dependente de cálcio e calmodulina/ proteína cinase ativada pela 5’ adenosina monofosfato. Os achados forneceram informações sobre as vias de sinalização da eNOS envolvidas nos efeitos antiaterosclerose do ácido betulínico.

Em outro estudo desenvolvido por Yi e colaboradores 126, buscou-se investigar mais profundamente os efeitos imunomodulatórios do ácido betulínico. Os autores formularam uma hipótese na qual a administração intraperitoneal de dexametasona (25 mg/kg) em camundongos seria capaz de causar apoptose de timócitos via estresse oxidativo e testaram se o ácido betulínico conseguiria mitigar estes efeitos. O ácido betulínico foi administrado via oral em doses de 0,25; 0,5 e 1,0 mg/kg diariamente por 14 dias. Os resultados desta pesquisa indicaram que a administração de dexametasona diminuiu significativamente as atividades das enzimas antioxidantes, enquanto aumentou significativamente a produção de espécies reativas de oxigênio, a peroxidação lipídica, as disfunções mitocondriais,

ativação da caspase-3 e apoptose celular. Contudo, o pré-tratamento com ácido betulínico diminuiu de forma dependente da dose o dano oxidativo induzido pela dexametasona. Além da atividade de eliminação de espécies reativas de oxigênio nos timócitos, a administração de ácido betulínico diminuiu a peroxidação lipídica, regulou as enzimas antioxidantes, restaurou a função mitocondrial, aumentou a expressão de Bcl-2, reduziu a expressão de Bax, inibiu a ativação de caspase-3 e melhorou a sobrevivência celular.

Um estudo anterior avaliou o efeito antiulcerativo do extrato hidroalcoólico de

Davilla rugosa (Dilleniacea) em ratos Wistar (400 mg/kg intraperitonealmente em

dose única e 15, 30, 60 e 400 mg/kg via oral). As úlceras estomacais foram induzidas com ácido clorídrico e etanol. As lesões foram aliviadas com a dose intraperitoneal e com as doses de 15 e 30 mg/kg por via oral. Ao passo que as doses de 60 e 400 mg/kg, via oral, causaram exacerbação das lesões127. Pouco mais tarde, David e colaboradores128 demonstraram que o extrato apresentou quatro substâncias, todas com atividades biológicas comprovadas, tanto efeito protetor contra o desenvolvimento de úlceras gástricas, assim como efeito estimulante da atividade motora129, sendo destacado o efeito do ácido betulínico encontrado em quantidade considerável no extrato seco (0,4%)128.

Os efeitos anti-inflamatórios do ácido betulínico têm sido extensivamente estudados. Em um estudo anterior, Wang e colaboradores130 procuraram explorar os possíveis efeitos do ácido betulínico sobre a nefropatia diabética, utilizando rins de ratos machos Sprague-Dawley com diabetes induzida pela estreptozotocina e células mesangiais glomerulares em cultura. Os autores concluíram que o ácido betulínico inibiu a ativação de NF-κβ, prevenindo assim a fibrose renal diabética em ratos tratados com 20 mg/kg diariamente por 8 semanas por via intragástrica130.

Outro estudo do mesmo ano é corroborativo fornecendo informações importantes sobre o mecanismo anti-inflamatório do ácido betulínico. Kim e colaboradores131 avaliaram os efeitos anti-flamatórios de um extrato obtido das folhas de Diospyros kaki Thunb, rica em ácido betulínico, além de testar o composto isolado. Este estudo demonstrou um efeito inibitório do ácido betulinico (5 – 80 µM) sobre a produção de mediadores em enzimas pró-inflamatórias de macrófagos RAW 264.7 em cultura estimulados com lipopolissacarídeo. Os resultados deste estudo mostraram que o ácido betulínico induziu translocação do fator nuclear Nrf2, assim

inibindo a ativação do NF-κβ131

. Contudo, os dados demonstraram, ainda, que as concentrações testadas mais altas (40 e 80 µM) causaram redução da viabilidade de macrófagos RAW 246.7 (cerca de 20 e 35%, respectivamente) 131.

Em um estudo anterior, compostos ativos foram isolados da espécie

Alphitonia petriei (Rhamnaceae), nominalmente o ácido emólico, alfitólico e ácido

betulínico. Os autores relataram que, com exceção do ácido emólico, os demais ácidos testados exibiram potente atividade anti-inflamatória, porém também foi demonstrada alguma citotoxicidade sobre macrófagos RAW 264.7 estimulados por lipopolissacarídeo. O ácido betulínico reduziu as concentrações de óxido nítrico em concentração inibitória 50 (CI50) de 8,3 ± 1,0 µM e fator de necrose tumoral alfa (TNFα) em CI50 de 23,5 ± 3,7 µM, ao passo que houve citotoxicidade sobre os macrófagos em CI50 de 29,1 ± 4,4 µM. O índice terapêutico calculado em comparação ao efeito sobre o óxido nítrico foi de 3,5132.

Se, por um lado, vários estudos apontam para um potencial anti-inflamatório e citoprotetor do ácido betulínico, outros estudos indicam mais uma atividade citotóxica, o que sugere que existem diferenças de sensibilidade entre as células e receptores nos tecidos. Certamente a dose é outro fator que tem influência e que pode explicar as divergências. Em 1995, Pisha e colaboradores133 relataram efeitos muito promissores do ácido betulínico identificado como um agente citotóxico específico de melanoma em camundongos. Nos estudos conduzidos com camundongos atímicos portadores de melanomas humanos, o crescimento tumoral foi completamente inibido sem toxicidade para o animal. Infelizmente o artigo não relata a dose de ácido betulínico. A avaliação de uma variedade de respostas celulares foi feita, mas a atividade antitumoral foi por indução de apoptose133. Mais tarde, foi demonstrado que o ácido betulínico apresenta citotoxicidade para algumas linhagens de células tumorais e que este efeito parece ser seletivo, sendo mínimo para as células normais134. O efeito de ácido betulínico sobre linhagens celulares de melanoma foi mais forte do que concentrações de cerca de 5 µg/mL, que foram extremamente citotóxicas para células de melanoma e praticamente inócuas para células de melanócitos normais134. Um estudo de uma combinação de ácido com betulínico com irradiação gama mostrou efeitos claramente aditivos135.

Alguns estudos importantes sobre a atividade antitumoral do ácido betulínico foram publicados recentemente. Luo e colaboradores136, em um artigo de revisão,

relataram que o ácido betulínico induziu apoptose por via mitocondrial e efeito antiangiogênico, inibindo o fator NF-κβ e fator de crescimento endotélio-vascular (VEGF) em células de câncer de mama MCF7 e T47D dependente da concentração, CI50 = 12,3 µg/mL (26,93 µM) e 9,8 µg/mL (21,45 µM), repectivamente137. Os autores ainda relataram um potencial antimetastático, uma vez que o ácido inibiu a expressão de metaloproteases de matriz136. Outra revisão de Zhang e colaboradores foi publicada no mesmo ano, corroborando o estudo de Luo e colaboradores138.

Outro estudo de atividade antitumoral que vale ser citado foi desenvolvido por Das e colaboradores139, no qual os autores examinaram a eficácia do ácido betulínico e sua forma nanoencapsulada em Poli (ácido lático-co-glicólico) (PLGA). Os autores demonstraram que a forma nanoencapsulada induziu citotoxidade significativa em células A549 de câncer de pulmão, no entanto a citotoxicidade foi desconsiderável em células L6 normais139.

O ácido betulínico isolado da árvore de jujuba (Zizyphus jujuba Mill), conhecida por uma ampla gama de propriedades biológicas e medicinais, tais como efeito antibacteriano, antipalúdico, anti-inflamatório, anti-helmíntico, antinociceptivo e anticancerígeno, foi investigado para verificação de atividade antiviral utilizando linhagem celular epitelial de adenocarcinoma de pulmão humano A549 e murinos C57BL/6 infectados com vírus A/PR – 8. O ácido betulínico mostrou uma atividade anti-influenza em uma concentração de 50 μM, sem causar citotoxicidade significativa sobre as células A549 infectadas. Além disto, o ácido betulínico atenuou significativamente a patologia pulmonar, incluindo aumento da necrose, número de células inflamatórias e edema pulmonar induzido pela infecção pelo vírus, sendo seus efeitos comparados com o fármaco oseltamivir in vivo140. A esterificação no carbono 3 do ácido betulínico conduziu à descoberta do Bevirimat (PA - 457), um potente e inovador inibidor da maturação do vírus da imunodeficiência humana (HIV – 1) que foi patenteado pela Rhone-Poulenc (agora Sanofi- Aventis). O desenvolvimento clínico, no entanto, foi interrompido devido às fracas propriedades farmacodinâmicas da droga candidata triterpenoide como antiviral 141.

Um estudo etnofarmacológico realizado com comunidades quilombolas de Oriximiná, no estado do Pará, destacou o valor da planta saracumirá, Ampelozizyphus

amazonicus Ducke, rica em ácido betulínico com vasto uso popular na prevenção e

seria possível supor que as indicações de uso da planta pelos quilombolas como fortificante e contra malária poderiam estar relacionadas a uma possível atividade adaptógena e imunoestimulante, por conta da presença das saponinas e do ácido betulínico. As espécies da família Rhamnaceae têm demonstrado um excelente efeito imunoestimulante, por exemplo, para Zyziphus mauritiana Lam., seus extratos ativos têm sido padronizados em ácido betulínico. Estes extratos causaram aumento da função de imunócitos em camundongos143.

Recentemente, um estudo investigou a atividade anti- Trypanosoma cruzi do ácido betulínico e alguns derivados semissintéticos em cultura de células LLC-MK2 de rins de macacos Rhesus infectadas com parasita. Foi demonstrada citotoxicidade para macrófagos humanos (CI50 = 18,8 ± 0,1 µM) e Trypanosoma cruzi (CI50 = 19,5 ± 0,9 µM)144. O estudo demonstrou que o ácido induz o parasita à morte por necrose e que a associação de ácido betulínico com o fármaco benzinidazol revelou efeitos sinérgicos sobre as formas tripomastigotas e amastigotas de T. cruzi144. Também,

uma atividade anti-Trichomonas vaginalis foi demonstrada para alguns derivados do ácido betulínico em estudos in vitro (parasita em cultura). Os autores concluíram que obtiveram dados suficientes para demonstrar o potencial antitricomonas desta molécula protótipo145.

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