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Sofia desenhou a prima. Como a proposta girava em torno do núcleo familiar mãe, pai, filhos e suas variações, e sendo a única criança que desenhou a prima, questionamos sobre seu desenho. Aos poucos ela contou que a prima, na verdade, é irmã dela. É filha de seu pai com outra mulher, mas que é tratada como prima – o que não diminui a importância dela no núcleo familiar desenhado pela menina.

Enquanto as crianças desenham, abrem espaço para o diálogo. Sentada na mesma posição que as crianças, nas pequenas cadeiras das salas da educação infantil, sem ao menos caber as pernas dentro da mesa, busquei estabelecer um vínculo de proximidade com as crianças. Enquanto elas desenham e esperam que eu faça análises e elogios, tento me colocar enquanto aprendiz, mostrando para as crianças que seus desenhos eram importantes para mim, levando as crianças a se sentirem valorizadas e livres pra desenhar. Montando esse cenário interativo, era muito mais fácil conversar com as crianças e perguntar situações rotineiras. Enquanto começavam seus desenhos, questionava-as sobre suas brincadeiras preferidas e sobre a maneira como chegavam até a escola.

Lisa relatou que adora brincar de pega-pega. Néco prefere esconde- esconde. Seu irmão gêmeo Éder gosta de jogar bola. Sofia prefere suas Barbies e Barbie (outra menina) têm afeição pelas bonecas da Monster High. Quando falamos

sobre a ida até a escola, Lisa relatou que vai de bicicleta, os irmãos Néco e Éder disseram que vão de ônibus, Sofia vai de van e Barbie vai de carro. A única criança que faltou nesse dia foi o Fernando, fazendo com que a sala fique mais silenciosa e não nos agraciando com suas histórias fantásticas.

É sempre importante explicar para as crianças a importância que os desenhos delas possuem. Elas se demonstram impressionadas com o fato de que eu preciso dos desenhos deles e que irei estuda-los. Uma das meninas, a Lisa, se deslumbra e comenta: “Desse tamanho tu é aluna.”, vinculando o tamanho ao fato de ser aluna ou não. Demonstram que alunos não são professores, professores são aqueles que passam o conhecimento e ensinam os conteúdos. Quando a situação se inverte e tem uma aluna entre eles, eles se surpreendem com o fato de que os adultos também estudam.

Diariamente se confirma o fato de que as atividades propostas devem ser rápidas, pois as crianças não param por mais de 30 minutos para desenhar. Mas apesar disso, elas desenham muito bem e muito conscientes do que querem mostrar e falam sobre seu desenho o tempo todo, sem contar que ainda discutem, falam de outros colegas, disputam cores, etc. Porém sem perder a sua capacidade simbólica ao desenhar.

Durante os desenhos as crianças transitam por vários assuntos, muitas vezes levando até a pesquisadora a perder o foco. Necessário então, voltar à proposta do dia: o desenho sobre eles mesmos e sobre a família. Todos os alunos relataram morar com o pai e a mãe e terem irmãos, e buscaram se colocar no desenho junto com a família. Sofia justificou: “Vou desenhar todo mundo, porque se eu não fazer eu, eu não faço parte da família.” (DIÁRIO DE CAMPO, 08/10/13).

Um dos alunos, o Éder, desenhou um menino com cabelos pretos e altos. Questionei se era ele e ele disse: “Eu não, não tenho black power.” (DIÁRIO DE CAMPO, 08/10/13). Lisa desenhou seu gato junto com a família. E Néco desenhou o Michael Jackson. Ou seja, a proposta é dada aos alunos não com o intuito de condicionar ou limitar o seu desenho, mas sim de provocar as crianças a desenhar e a falar sobre determinado tema, bem como compreender que seus desenhos

refletem parcelas de suas vidas, possibilitando uma pequena compreensão delas, mas abrindo espaço para uma reflexão sobre a infância em geral.

Também é interessante o fato de que as crianças demonstram necessitar receber elogios o tempo todo. A todo o momento elas me mostravam seus desenhos, mesmo que só houvesse alguns pequenos traços indecifráveis aos olhos do pesquisador, mas pedindo opinião sobre o que eu achava deles. Claro que sempre elogiava, mesmo que não soubesse do que se tratava e buscava questionar e compreender o que a criança estava comunicando ali. Os elogios serviam como um estímulo para que elas aperfeiçoassem seu desenho e criassem sua expressão gráfica. O processo simbólico presente neste momento era incentivado pelos pequenos elogios e pela atenção dada pela pesquisadora às crianças e ao seu desenho.

Alguns pequenos desenhos sobre a família mostraram que as crianças partilham desse sentimento de pertencimento e se caracterizam de acordo com os lugares de onde vem, bem como a construção do núcleo familiar por elas mesmas, demonstrando a estrutura social-familiar a qual pertencem.

5.3. A primavera e alguns estereótipos:

Quando passamos por toda a burocracia necessária para realizar a pesquisa acarretando no atraso da mesma, percebemos que seria necessário refazer o tema da pesquisa. A ideia inicial era um tema geral sobre o inverno, mas como já estávamos na primavera, pensamos que seria melhor focar na primavera. No entanto, desde o primeiro dia ficou claro que não daria certo e que o melhor seria abrir o tema para assuntos mais cotidianos das crianças, pois assim elas se mostravam mais abertas a falar e interagir com a pesquisadora.

Apesar disso, dedicamos um encontro sobre a primavera. O que resultou em interessantes teorias sobre a primavera vindas das crianças. Antes de falar sobre suas ideias, é necessário olhar para seus desenhos:

Desenho 11: por Fernando.

Desenho 13: por Barbie.

Logo que cheguei na escola, as crianças estavam realizando uma atividade de modelar com massinhas coloridas. A professora da turma – que sempre se mostrou muito atenciosa com a pesquisa, logo convocou as crianças do Pré-B (as turmas estavam reunidas durante a atividade da Semana da Criança) para irem para a sala de aula para as atividades da pesquisa.

Ao entrar na sala de aula, as crianças disputam os lugares onde irão sentar. Este diafoi barulhento e houve uma grande dificuldade de traçar um diálogo com as crianças no início, tendo em vista que estavam muito agitadas. Conversamos então, sobre os desenhos feitos anteriormente e sobre a proposta do dia. A ideia era explorar a primavera nos seus desenhos. Todos toparam e partiram logo para as caixas onde estavam o material em cima da mesa, escolhendo cores e planejando o que iriam desenhar.

Eis que eu questiono: mas alguém sabe o que é a primavera? Fernando responde: “eu sei! É quando os ursos dormem... ou quando eles acordam!” (DIÁRIO DE CAMPO, 11/10/13). Ele diz que vai desenhar um urso, e Sofia e Barbie resolvem desenhar ursos também. Apenas Lisa desenha outra coisa que não o urso. Ela diz não saber nada sobre a primavera, e eu me proponho a contar uma história sobre a primavera. Mas antes, Fernando conversa consigo mesmo:

Fernando: Um urso laranja! Eu vou fazer o retorno dele! (com a canetinha laranja na mão).

Depois de alguns segundos, Fernando complementa: um urso laranja não existe!

Pesquisadora: porque não?

Fernando: só se ele for pré-histórico!! (DIÁRIO DE CAMPO, 11/10/13).

Durante as atividades propostas algumas crianças expressam suas representações sobre o mundo e quando percebem que podem estar enganados, buscam resolver de forma criativa. É o caso do Fernando, que ao perceber que nunca tinha visto um urso laranja, justificou que poderia ser pré-histórico. O desenho se mostra não apenas como uma ferramenta de pesquisa ou uma forma de comunicação entre a criança e o adulto, mas também como um propulsor para as ideias das crianças, na medida em que permite o afloramento do simbolismo e das representações.

Seguido ao diálogo anterior, as meninas discutem sobre como iriam desenhar o cabelo do urso, levando Fernando a se revoltar porque elas estariam copiando seu desenho. Ao que Barbie responde: “Não, eu tô desenhando uma ursa!” (DIÁRIO DE CAMPO, 11/10/13). É muito comum entre as crianças, umas se inspirarem no desenho da outra. Não uso o termo copiar, porque ao mesmo tempo em que a criança diz que vai copiar o desenho do colega, ela acaba recriando esse desenho de acordo com sua representação de mundo.

Ainda no meio das conversas, Fernando continuava a falar sobre seu desenho que agora além de ser pré-histórico também possuía uma barriga azul. Quando ele deu uma pausa nas suas explicações, foi possível ouvir outras crianças (Fernando fala alto de mais, o que às vezes atrapalha a compreensão das outras crianças). Resolvi então, perguntar para Lisa como estava indo o desenho dela.

Lisa: eu fiz uma árvore só. Pesquisadora: só uma árvore? Lisa: eu não sei fazer o resto.

Pesquisadora: Não sabe? Que resto tu quer fazer? Lisa: não sei... é que eu não sei nada de primavera. (DIÁRIO DE CAMPO, 11/10/13).

Então, precisei chamar a atenção das crianças e pedir silêncio, pois eu ainda não havia conseguido contar a história da primavera. Fechamos a porta por causa do barulho que vinha da outra sala, e finalmente contei a história:

Quando eu era pequena, eu achava que a primavera era uma pessoa. Eu já tinha a prima Ângela, a prima Flávia, a prima Juliana, então quando falava em primavera eu pensava que era uma prima que se chamava Vera. Então, eu imaginava que a primavera era muito bonita. Quase como se fosse uma fada.

Resolvi então, perguntar a minha avó: afinal, quando é que eu vou conhecer a primavera?

A vó riu e disse que não tinha que esperar muito, porque ela estava mesmo a chegar.

No dia seguinte, fui até lá fora e minha vó disse: olhe bem para tudo (indicando para as crianças olharem para fora da escola), porque a primavera já chegou.

(Mostro as árvores, os passarinhos, etc.)

E eu olhei e estava tudo tão lindo, o sol brilhava, os passarinhos cantavam, os coelhinhos passeavam...

Sofia interrompe: mas o sol não tá aqui... ainda não tá aqui!!

continuo: e as flores estavam mais bonitas do que nunca. As vizinhas estavam na janela, as árvores estavam muito verdinhas, os passarinhos faziam ninhos e havia quem estivesse a plantar flores no jardim.

Foi então que eu percebi, que afinal a primavera não era uma pessoa. Era mesmo uma fada, só podia ser. Porque ela fazia a verdadeira magia na natureza!

Quando a primavera vem, as árvores se transformam, os passarinhos, a borboleta, tudo fica mais bonito. E foi nesse mesmo dia que conheci - aqui está ela: a fada primavera, com suas árvores, suas flores, seus passarinhos, tudo tão bonito. E agora que eu sou grande, eu gosto mais ainda da primavera!

(Inspirada na história “A Prima Vera” de M. Jesus Souza do blog Pré- Histórias http://historiasparapre.blogspot.com.br/)

(DIÁRIO DE CAMPO, 11/10/13).

As crianças se animaram e começaram a desenhar, inclusive Lisa que relatou não saber nada sobre a primavera pega o giz de cera e começa logo a desenhar.

Lisa: o tia, vou fazer uma nuvem! Fernando: uma nuvem de chuva? Lisa: não, uma nuvem de céu.

Barbie: eu fiz umas maçãzinhas.

Pesquisadora: aonde que tu viu árvore com maçãzinhas? Tu já viu? Barbie: Não!

As crianças discutem então sobre o nome das árvores: goiabeira, laranjeira, etc.

Fernando fala que vai desenhar uma morangueira. E pergunta: é essa a árvore de morango?

(DIÁRIO DE CAMPO, 11/10/13).

A partir da história as crianças passaram a desenhar elementos vinculados à primavera e discutir sobre nomes de árvores. O problema de contar uma história para inspirá-los a desenhar é que corremos o risco de condicionar o desenho dessas crianças a partir das nossas percepções manifestas na história. De certa forma isso ocorreu, mas também ampliou seu conhecimento sobre a temática, que também estava sendo explorada na escola, mas que ainda não pareceu ser o suficiente.

Após isso, já ao final de seus desenhos, as crianças começam a falar sobre vários assuntos que não consigo captar devido às várias vozes falando ao mesmo tempo. E um dos assuntos de destaque é o Boitatá7. Resolvi perguntar o que era isso, como se eu nunca tivesse ouvido falar, na esperança de ouvir outra história. Mas seus relatos foram mais centrados na disciplina escolar do que no mito do Boitatá.

Fernando diz: se tu deitar assim ó (com os braços cruzados e o rosto pra baixo, em silêncio, como se estivesse dormindo na classe), ele não come teu olho...

(DIÁRIO DE CAMPO, 11/10/13).

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Boitatá é um termo tupi-guarani utilizado para designar o fenômeno mitológico da cobra-de-fogo, tendo variações na sua mitologia por todo o Brasil, mas sendo basicamente uma cobra que protede os campos contra aqueles que o incendeiam.

A história que eu esperava ouvir não saiu, talvez porque não prestaram atenção na professora enquanto contou, ou porque a história serviu mais como uma medida de controle dos alunos do que de transmissão e troca de conhecimentos. O que as crianças representaram da história é um “grito” da infância. Infância que grita por socorro tendo seus corpos controlados e seus olhos cegados.

Finalizados seus desenhos, as crianças se dispersam pela sala, explorando seus materiais e instrumentos musicais. Findo o encontro satisfeita, pois o planejamento sobre a primavera de alguma forma me conduziu por outros e diferentes caminhos através das representações das crianças.

5.4. “Eu já vi uma pessoa boiola de verdade”: representações de gênero através das cores escolhidas pelas crianças:

Enquanto o encontro passado aconteceu a partir do que foi planejado, o encontro posteriornão foi assim. Planejei em fazermos um desenho sobre a escola, mas assim que entrei na sala de aula, as crianças estavam empolgadas discutindo sobre a novela Chiquititas8, levando nosso trabalho a ser inspirado na novela infanto-juvenil.

Logo que cheguei, as crianças estavam brincando com quebra-cabeça e um jogo de associação de imagens e me convidaram para brincar junto. Entrei na brincadeira, jogando com elas e ajudando no quebra-cabeça. O jogo era de associar imagens em tampinhas de garrafa pet às imagens distribuídas por categorias: metal, plástico, orgânico e papel. E o quebra-cabeça tinha como temática o filme Toy Story. Logo que terminamos a brincadeira, negociei com elas para fazermos um desenho e brincarmos depois. No mesmo instante elas começaram a falar sobre as Chiquititas e o quanto elas gostam da novela. Sugeri então, que fizessem um desenho sobre seus personagens favoritos da novela. Lisa desenhou a Mili e o Rafa, e Sofia

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Chiquititas é uma telenovela argentina criada para o público infantil que ganhou duas versões no Brasil, sendo exibida no canal aberto SBT e sendo sucesso entre as crianças. Gira em torno de crianças órfãs que vivem no orfanato Raio de Luz criado a partir de um drama familiar, onde o avô sequestra neta para que sua filha não seja mãe solteira, criando o orfanato onde coloca a própria neta.

desenhou a Mili e o Mosca. Barbie disse que não assistia a novela e que preferia olhar a Disney, então preferiu desenhar a Minnie e o Mickey.

Mais uma vez a temática combinada com as crianças serve mais como um propulsor de discussões do que uma limitação para suas produções. A seguir, os desenhos:

Desenho 15: por Sofia.

Desenho 16: por Barbie

Desenho 17: por Lisa.

A discussão inicial sobre as Chiquititas foi intensa.

Lisa: ô tia, o teu caderno tem a foto da Mili? A chiquititas?

Pesquisadora: não! meu caderno é assim ó... pobre, feio... tem nada! Sofia: eu vi um caderno que tem a Mili.

Lisa: eu vi a foto da Mili.

Pesquisadora: vocês gostam da chiquititas? Lisa: aham

Sofia: eu adoro olhar! Sabia... o Mosca uma vez fez assim ó.... (se sacode toda)

Pesquisadora: sabiam que as chiquititas era da minha época também? Eu adorava as chiquititas.

Sofia: a minha mãe adora!

Pesquisadora: então... porque a gente não desenha o que a gente gosta na chiquititas?

Todas concordam em coro!!!

Sofia: eu vou desenhar a Mili e o Mosca.

Pesquisadora: eu não lembro mais como era... faz muito tempo!! Lisa: eu vou fazer a Mili e o Rafa.

Barbie: eu não sei fazer... eu não assisto.

Pesquisadora: então desenha outra coisa que tu assiste. O que tu assiste? Barbie: a Disney

Pesquisadora: então desenha alguma coisa da Disney.

Enquanto isso Sofia e Lisa discutem sobre a forma correta de se dizer Rafa. (DIÁRIO DE CAMPO, 14/10/13)

Partindo desse diálogo, iniciaram seus desenhos cantando a música da novela. Conforme dito antes, a discussão que se seguiu não foi centrada nos personagens, mas a partir de seus desenhos surgiram questões importantes. Uma das questões centra-se na construção de gênero pelas crianças.

Sofia: eu não vou fazer a cara do Mosca rosa. Pesquisadora: porque não?

Sofia: ele é menino!

Pesquisadora: e menino não é rosa também? Lisa: não... se não vira boiola!!

Todas as meninas riem.

Pesquisadora: que horror... quem disse isso?

Lisa: eu já vi uma pessoa boiola de verdade na padaria... contando muito dinheiro!

Sofia: que nem guria!!

Lisa: só que era macho... só que tava com roupa de mulher! Todas riem.

Professora interfere e pergunta: quem fala assim Lisa? É lá na tua casa que falam assim?

Júlia apenas ri e não responde... (DIÁRIO DE CAMPO, 14/10/13).

Esse pequeno diálogo nos leva a pensar sobre a representação de gênero feita pelas crianças condicionada socialmente. Afinal de contas, em muitos aspectos percebe-se a influência direta dos adultos sobre as crianças. A transmissão de preconceitos e representações fica claro nesse exemplo. A menina sabia que não era algo a se repetir assim, mas como toda a criança não teve medo de falar, mas depois com a pergunta da professora, ela se sentiu reprimida e não levou o assunto adiante. Estereótipos como a cor dos meninos e meninas são compartilhados através dos desenhos das crianças. E nesse caso, o estereótipo do boiola, como um macho com roupa de mulher, toma corpo na fala das crianças. Cabe ao professor ou ao adulto que esteja com a criança interferir e pensar esses conceitos junto à elas.

Outra questão importante reside na decisão do que irão desenhar. A atividade de hoje é mais um exemplo de que minha proposta não limitava os desenhos das crianças, apenas sugeria um ponto de partida. Lisa demonstra isso quando diz que vai desenhar seu personagem – o Mosca – de patins. Então pergunto se eles usam patins na novela também. Ao que a resposta ressoa na sala: É QUE EU FAÇO PORQUE EU QUERO! As crianças não se deixavam limitar e demonstravam sua capacidade de resistência coletivamente.

A possibilidade de explorar seus desenhos conforme suas vontades empolgava o encontro com as crianças. Quando eu chegava na escola elas já se preparavam para ir para a sala comigo. Nunca fiz exigências quanto ao desenho. Preferi deixar o trabalho fluir mais livremente.

Uma das meninas, a Barbie, até então não costuma pintar seus desenhos. Apenas faz seus contornos com canetinha. Ao invés de interpretar isso, resolvi perguntar por que ela não pintava seus desenhos.

Barbie: o prof.. já acabei!

Pesquisadora: porque tu nunca pinta teus desenhos? Tu não gosta de pintar?

Barbie: não, dá muito trabalho!

Pesquisadora: não acredito!!! (surpresa) Sofia: pôô, mas tu é preguiçosa heim! (DIÁRIO DE CAMPO, 14/10/13).

A decisão coube às crianças: se vão pintariam ou não, o que desenhariam ou não, o que discutiriam ou não. Isso abre espaço para as crianças se expressarem livremente. E possibilita que qualquer temática provoque debates diferenciados, conforme ocorreu na temática acima.

5.5. A árvore menina e as plantas felizes:

A ideia do quinto encontro foi desenhar sobre a escola. Conversamos um pouco sobre os desenhos que já fizemos e lancei a proposta: desenhar sobre a escola, tendo em vista que este é o contexto da pesquisa. Buscando assim, compreender suas representações sobre o lugar onde elas passam todas suas manhãs. E interessante que mesmo dizendo sobre o que elas devem desenhar, mais uma vez elas desenham sobre o que querem. A pesquisa com desenhos infantis, de certa forma, empodera as crianças. Afinal de contas, eu, enquanto adulta, não sei desenhar e perdi a capacidade expressiva gráfica que as crianças possuem. Ou seja, eu queria apreender os desenhos delas e elas sabem disso, o que afirma a importância de seus desenhos e habilita-as a terem influência sobre meu trabalho. É importante evidenciar que, crianças menores encontram meios de se manifestar por si próprias, desenhando o que querem, mesmo que a proposta seja igual para todos. Já crianças mais velhas, estão mais condicionadas à estrutura escolar e se acostumam a desenhar exatamente o que proporam sem explorar outras possibilidades (BORDIN, 2010). Particularmente, revelou-se mais rica possibilidade de trabalho com as crianças menores por trazerem essa alternativa de explorar seu imaginário, seu simbolismo, de forma espontânea.

Tendo em vista que a escola é cercada pela natureza, isto aparecerá em um de seus desenhos.

Desenho 18: por Barbie.

Desenho 19: por Sofia.

A primeira ideia das meninas foi desenhar algo estrutural da escola, como a

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