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ESTRUTURAÇÃO INTRA-URBANA EM LIMEIRA-SP (1970-2010)

QUADRO 14 Continuação

4.2 A constituição do Acampamento Elizabeth Teixeira

4.2.2 Ótica do Governo Municipal

A Prefeitura Municipal de Limeira (PML) surge no caso que analisamos agora como a principal adversária do Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem-Terra na disputa pela área ocupada no Horto Florestal Tatu. A pressão pela saída das famílias apenas viu dispersar sua intensidade quando o prefeito Silvio Félix da Silva, que liderava a posição política contrária ao movimento social, envolveu-se em escândalo de corrupção que culminou com a cassação de seu mandato no início de 2012.

Logo se deflagrou a ocupação, o poder público municipal ajuizou ação de reintegração de posse do terreno na justiça estadual de São Paulo. Alegava ser o legítimo ocupante da área, tendo em vista documento de intenção de compra e venda de imóvel firmado

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Cf. Romero (2010).

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no ano de 2005 com a inventariança da Rede Ferroviária Federal S. A., no qual esta repassava temporariamente a posse à prefeitura até que o negócio fosse saldado. Com base em cotação realizada pela Caixa Econômica Federal, definiu-se o valor do imóvel em aproximadamente 2,8 milhões de reais, dos quais seriam deduzidos cerca de 320 mil reais referentes débitos da empresa no pagamento de impostos ao município. Escorada nesta tratativa, a liminar de reintegração de posse foi concedida ao município, sendo recolhida após manifestação de interesse do INCRA no pleito, fato que levou o processo à justiça federal, tendo em vista a participação da União na ação. Não obstante o argumento legal apresentado pelo documento de intenção de compra e venda junto a RFFSA, o município destacava, em suas alegações, a forma de ocupação da área como impeditivo da constituição de um assentamento rural. Dentre os equipamentos já implementados na área do Horto Florestal Tatu constavam:

 Uma área de lazer (incluindo lagos para pescaria, mirante, quiosques para churrasco, colônia de moradores funcionários da prefeitura, pista de aeromodelismo, kartódromo, pista para motocross);

 Centro de Ressocialização (unidade prisional do governo do estado de São Paulo);

 Plantação de eucalipto (usado, de acordo com o município, para obras públicas de construção e reparos de pontes e passarelas);

 Aterro Sanitário.

Em relação aos projetos de implementação futura, o poder público municipal anunciava:

 Transferência do zoológico para o local do horto;

 Transferência da Hípica Municipal para o horto;

 Criação de um “jardim dos sentidos”, destinado para portadores de deficiência do tato e olfato;

 Área de “porto seco” (terminal logístico);

 Distrito Industrial.

Especialmente em relação aos dois últimos projetos anunciados pela prefeitura, o “porto seco”, também chamado de “Projeto Terminal Limeira”, é justificado pela facilidade de locomoção decorrente da utilização das linhas férreas já existentes. As premissas da proposta constam em documento preparado pela empresa América Latina Logística (ALL). Trata-se da

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constituição de uma linha de escoamento com origem em Limeira e destino final no “Terminal Cubatão”, também em fase de concepção. A previsão da empresa era atingir um volume de circulação de 3.600 contêineres transportados por mês após dois anos de funcionamento da linha. Em relação aos investimentos, teoricamente seriam compartilhados da seguinte maneira: o “cliente” seria responsável pela construção do terminal e de desvio ferroviário; uma Sociedade de Propósito Específico (SPE) ficaria responsável pela construção de novos vagões e a ALL, pela reforma de vagões antigos53, totalizando um investimento da ordem de 27,7 milhões de reais.

TABELA 19

Investimento Previsto (R$) - "Projeto Terminal Limeira" (2007)

Responsável Valor (R$ milhões)

América Latina Logística 3,23

SPE 23,54

Cliente 0,99

Total 27,76

Fonte: América Latina Logística/ Proc. 2007.61.09.005811-9, vol. 1, fls. 53. Elaboração Própria.

Já em relação ao Distrito Industrial, o município não detalha, na ação de reintegração de posse, a forma e as metas de sua implantação. Há apenas dois recortes de uma publicação não identificada, com duas maquetes computadorizadas de distritos industriais genéricos, cujo título é “Parques e distritos industriais: o fim do improviso” e legenda que diz: “Tudo Planejado: foto,

montada em computador, mostra o conceito de distrito industrial que está nascendo em cidades do interior do Estado”. Entretanto, exalta ser “o mais importante empreendimento do Município”, de modo que “há previsão, para o local, da substituição de plantas nativas para que ocorra uma urbanização mais equilibrada, não prevendo a finalidade agrícola dessa área, mas a

previsão é para que haja expansão industrial” 54.

Mais à frente, o município apresenta projetos de Distrito Industrial formulados na década de 1980, mas que não avançaram. Apesar de dar detalhes quanto ao parcelamento da área, também não são especificadas as medidas de implantação do distrito nestes documentos.

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Há ainda uma complexa operação que envolve a constituição da Sociedade de Propósito Específico, a tomada de financiamento junto ao BNDES e a aquisição da SPE, ao final de todo o processo, pela própria América Latina logística.

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No entanto, a ocupação efetiva que se dava especificamente na gleba em litígio era do plantio de cana-de-açúcar. A produção servia principalmente à Usina Ester, sediada no município de Americana-SP, e detentora de grande quantidade de terras, tanto em Limeira quanto nos demais municípios da região55. Esta ocupação é raramente mencionada nas peças processuais do caso, mas é mais um componente importante da tensão política concentrada no local, desta vez reproduzindo uma forma clássica de disputa agrária no Brasil: camponês contra usineiro56.

O que importa dizer para a sequência do raciocínio é que todos os argumentos utilizados pelo poder público municipal para amparar a forma de ocupação presente e futura da área passam a ser apresentados com base no Plano Diretor do Município, que passa a ser importante instrumento de disputa de forças com a União e o movimento social.