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AÇÃO CIVIL PÚBLICA COMO MECANISMO DE RESOLUÇÃO DE

2. AÇÃO CIVIL PÚBLICA EM MATÉRIA EDUCACIONAL

2.4 AÇÃO CIVIL PÚBLICA COMO MECANISMO DE RESOLUÇÃO DE

O processo moderno muda seu enfoque, e para cumprir seu novo desiderato, deixa de lado a postura autonomista - pois ele não é um fim em si mesmo -, em favor de uma concepção instrumentalista, cuja ideia principal é do processo a serviço da realização do direito material pleiteado45.

Essa necessidade obriga o processualista a tomar em consideração elementos que transcendem à mera disciplina formal do sistema jurisdicional e do campo tradicional do saber jurídico, obrigando-o a lançar mão de outras áreas do conhecimento científico, em um enfoque necessariamente multidisciplinar. (SALLES, 2017, p. 200)

No processo judicial tradicional, a atuação judicial é bipolar (se organiza em torno duas partes ou interesses, minimamente unitários), a litigância é retrospectiva (os eventos discutidos são completos e passados), o direito e a ação judicial são interdependentes (a violação do direito deve ser compensada) e a ação judicial está contida nos limites expressos da demanda.

Já a nova perspectiva de atuação judicial, guarda consonância com a essência da proteção dos direitos difusos e coletivos, em especial dos direitos sociais, que demandam a implementação de políticas públicas, naturalmente complexas e que exigem dos operadores jurídicos, uma ampliação de competências e habilidades para atuar nesta nova concepção de processo. Neste contexto a efetividade da tutela jurisdicional é a preocupação central da teoria processual contemporânea:

A efetividade da tutela jurisdicional, portanto, há de ser aferida levando em conta, também, outros elementos, como a capacidade do órgão jurisdicional em conhecer

ENUME%2E%29+OU+%28ARE%2EACMS%2E+ADJ2+639337%2EACMS%2E%29&base=baseAcordaos& url=http://tinyurl.com/dxww8nv>. Acessado em 01 fev. 2019.

45 Vale a leitura de Souza (2010, p. 132) que fala acerca da necessidade de adequação do processo civil para dirimir

corretamente os fatos apresentados, de mediar e conciliar posições conflitantes, de perceber a verdadeira necessidade das partes e responder às suas expectativas pessoais, de considerar todo o conjunto de argumentos aduzidos, de incentivar condutas positivas das partes (em relação à instrução probatória e à execução do julgado), e de considerar as repercussões finais da decisão produzida (em relação aos sujeitos diretamente envolvidos e também à sociedade), entre outros fatores que dimensionam a totalidade dos resultados a serem produzidos pela prestação jurisdicional. (SALLES, 2017, p. 204)

As medidas processuais, existentes até então, não serviriam para proteger os conflitos desta magnitude, daí o surgimento da ação civil pública, instrumento processual vocacionado para a tutela dos direitos fundamentais sociais e difusos (interesses públicos).

Vale dizer, no tratamento de interesses difusos e coletivos, a atividade jurisdicional deixa de ser voltada a litígios exclusivamente individuais, para impactar um âmbito predominantemente público. Esse espaço público, que passa a ser objeto de intervenção judicial, é, de sua feita, decorrente da crescente atividade legislativa e regulamentar do Estado, dirigida à modificação e disciplina de fatores básicos da organização social e econômica. Sob pressupostos estritamente liberais, a função do direito está em salvaguardar as autonomias individuais. Sob essas premissas, os objetivos da sociedade surgem da soma das vontades individuais. Com o advento do Estado social, o próprio direito passa a incorporar objetivos sociais, os quais não são mais simples soma das autonomias individuais, mas metas e valores definidos a priori pelos vários processos decisórios da sociedade. (SALLES, 2017, p. 204)

Mais do que isso, a medida que a decisão incide sobre bens coletivos, realiza opções associadas com a alocação e apropriação de recursos comuns (atividade distributiva), interferindo, desta forma, nas políticas públicas.

No processo de interesse público o Judiciário decide acerca de políticas públicas, que estão expressas em normas jurídicas, regulamentos ou outro instrumento, produzidos pela administração pública com objetivo de promover uma educação de qualidade. A atuação judicial incide para limitar ou excluir a discrionariedade administrativa, através da imposição

de procedimentos ou da fixação de obrigações legais de fazer ou não-fazer (SALLES, 2017, p.

213).

Outro aspecto importante, destes processos, é da possibilidade de participação social no processo de interesse público. Pode-se afirmar que o instrumento da ação civil pública está

marcado pela participação política da sociedade na gestão das coisas públicas (WATANABE, 2017, p. 230).

Formulação processual do interesse público coloca em evidência a necessidade de que qualquer decisão estatal seja adotada a partir de técnicas aptas a permitirem incorporar o que a sociedade entende por relevante com respeito às regras de uma divisão justa do produto social e conducente aos resultados finais preferidos pela maioria e afastando, ao mesmo tempo, o perigo de decisões incoerentes. Sem dúvida, essa concepção tem o mérito de evidenciar o processo como um elemento fundamental em qualquer decisão estatal – incluindo as produzidas pelo Judiciário. (SALLES, 2017, p. 214)

A participação social, nestes processos, ocorre, especialmente, pelo uso das audiências públicas e do amicus curiae.

As audiências públicas permitem e estimulam a participação social no debate judicial, pois abrem um canal para que indivíduos e grupos sociais manifestem-se sobre questões jurídicas controvertidas, em especial, aquelas envolvendo conflitos entre interesses públicos

legítimos.46 As audiências públicas são práticas essencialmente democráticas e estimulam o exercício da cidadania. (COSTA, 2017, p. 418)

Já a participação do amicus curiae que é o terceiro que ingressa no processo civil

objetivando a tutela de um interesse institucional objeto da demanda (COSTA, 2017, p. 419).

Pode ingressar no processo, de ofício ou a requerimento das partes, objetivando manifestar-se acerca a relevância da matéria, a especificidade do tema objeto da demanda ou a repercussão social da controvérsia.47

Ambos instrumentos de manifestação da sociedade no processo, democratizam o processo, pois permitem a participação de grupos interessados, representativos da luta político-

46 O Código de Processo Civil autoriza o relator a designar audiências públicas nos processos que versem sobre

demandas que versem sobre incidentes de resolução de demandas repetitivas, porém isto não é impeditivo para que o juiz ou relator possa usar este instrumento em demandas que versem sobre interesses públicos, já que ele pode determinar, de ofício ou a requerimento das partes, as provas necessárias ao julgamento do mérito (art. 370,

caput, do CPC).

47 A figura do amicus curiae ganhou capítulo específico no Código de Processo Civil:

Art. 138. O juiz ou o relator, considerando a relevância da matéria, a especificidade do tema objeto da demanda ou a repercussão social da controvérsia, poderá, por decisão irrecorrível, de ofício ou a requerimento das partes ou de quem pretenda manifestar-se, solicitar ou admitir a participação de pessoa natural ou jurídica, órgão ou entidade especializada, com representatividade adequada, no prazo de 15 (quinze) dias de sua intimação.

§ 1o A intervenção de que trata o caput não implica alteração de competência nem autoriza a interposição de recursos, ressalvadas a oposição de embargos de declaração e a hipótese do § 3o.

§ 2o Caberá ao juiz ou ao relator, na decisão que solicitar ou admitir a intervenção, definir os poderes do amicus curiae.

social, que são internalizados no processo. A decisão, embora não tenha que necessariamente

optar pela solução representativa do interesse majoritário, será politicamente mais legítima e, qualitativamente melhor, pois levará em conta toda a complexidade envolvida na demanda. (COSTA, 2017, p. 419)

Na seara da atuação jurisdicional, os conflitos de interesse público, permitem pensar em sentenças que muitas vezes são verdadeiros mecanismos de acompanhamento ou monitoramento da uma relação. Observe que isto não é novidade no direito que já tem nos ramos do direito de família, falência ou mesmo do direito do trabalho que permitem a prolação de sentenças sem caráter definitivo de mérito.

Ainda nesse sentido a própria sentença deveria passar a ser vista não como fim do processo, mas como um remédio que deve atender de forma mais flexível possível às necessidades do paciente. O objetivo não deve ser terminar o processo, mas sim contribuir para que os problemas sejam resolvidos. No caso específico, para que o Direito à Educação, nas suas múltiplas dimensões, seja realizado. (VIEIRA e ALMEIDA, 2013, p. 15)

Desta forma, é possível dizer que o Poder Judiciário expandiu a sua atuação, para ingressar na discussão de demandas sociais, antes delegadas a outros centros decisórios. O Poder Judiciário é instado a manifestar-se acerca da operação de determinada política pública.

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