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A Ação Civil Pública no contexto do meio ambiente – conceitos e antecedentes

ANEXO I – Regimento Interno do Conselho Consultivo do Corredor Ecológico Urbano do

4 INTERFERÊNCIAS EXTERNAS RELACIONADAS AO POSSÍVEL RISCO DE

4.4 A AÇÃO CIVIL PÚBLICA INTENTADA EM DEFESA DO MEIO AMBIENTE POR

4.4.2 A Ação Civil Pública no contexto do meio ambiente – conceitos e antecedentes

A ação civil pública consiste numa ação judicial sujeita ao preenchimento dos

pressupostos e requisitos estabelecidos no ordenamento processual vigente. As suas

finalidades se consolidam na obrigação de fazer, na obrigação de não fazer e/ou na

condenação em dinheiro. O seu objeto é a proteção dos interesses difusos, coletivos e

individuais homogêneos, sendo que o meio ambiente encontra-se no âmbito dos interesses

difusos.

Segundo Machado (2004, p. 356):

A ação civil pública foi elaborada pela Lei 7.347, de 24.7.1985. A ação judicial é denominada “civil” porque tramita perante um juízo civil e não criminal. Acentue-se que no Brasil não existem tribunais administrativos. A ação também é chamada “pública” porque defende bens que compõem o patrimônio social e público, assim como os interesses difusos e coletivos, como se vê no artigo 129, III, da CF/88.

Para a compreensão preliminar da ação civil pública enquanto relevante instituto

protetivo do meio ambiente torna-se necessário o retorno às sendas da história jurídica

brasileira. Verifica-se que, em termos de defesa dos interesses metaindividuais, o Brasil, já na

década de 60, dispunha da ação popular

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como referencial. Entretanto, mesmo que

revolucionária no âmbito do ordenamento jurídico, sendo considerada um avanço para a

época, e até para a atualidade, este instituto, no campo instrumental, se mostrou insuficiente

para a tutela dos direitos difusos, visto legitimar o cidadão no campo ativo de sua propositura,

bem como comportar o seu cabimento somente contra anulação de atos lesivos praticados

pelo Poder Público.

Logo, em obediência ao Artigo 6º do Código de Processo Civil

90

, no que concerne à

regra de legitimidade extraordinária, inútil seria a busca de ação condenatória de

ressarcimento ou de prevenção de dano aos bens e direitos, de uso comum do povo,

acometidos de violação, posto não ser o cidadão parte legítima na busca de um direito que

transcende a sua pessoa.

89A ação popular, prevista no Artigo 5º, LXXIII da CF/88, é regulada pela Lei nº 4.717, de 29 de junho de 1965 e consiste na ação judicial à disposição de qualquer cidadão com objetivo de anulação de ato lesivo ao patrimônio público ou de entidade de que o Estado participe, à moralidade administrativa, ao meio ambiente e ao patrimônio histórico e cultural, ficando o autor, salvo comprovada má-fé, isento de custas judiciais e do ônus da sucumbência.

90O CPC no artigo 6º preceitua: Ninguém poderá pleitear, em nome próprio, direito alheio, salvo quando autorizado por lei.

Na década de 70, mais especificamente, inspirados em movimentos de clamor

internacional, os doutrinadores brasileiros se mobilizaram nos debates voltados à tutela

jurisdicional dos interesses difusos e coletivos o que inicialmente redundou na edição da Lei

de Política Nacional do meio Ambiente,

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a qual vislumbrava no seu Artigo 14, § 1º, a

possibilidade de o Ministério Público ajuizar ação civil de reparação de danos causados ao

meio ambiente, porém, parando por aí, ressentindo-se o Ministério Público da falta de regras

específicas para tramitação processual pertinente à responsabilidade civil por danos

ambientais.

Sob o ponto de vista da defesa do meio ambiente enquanto direito material tutelado,

a lei representou um marco definitivo na ciência ambiental, que até então se encontrava

fragmentada e sem um tratamento digno da importância que o tema merecia.

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Contudo,

faltava a edição de lei que dispusesse especificamente da ação civil pública.

93

Na busca de solução para essa lacuna, por ocasião do 1º Congresso Nacional de

Direito Processual, foi elaborado um anteprojeto de lei para a tutela jurisdicional dos

interesses difusos no Brasil por iniciativa de Ada Pellegrini Grinover, Cândido Rangel

Dinamarco, Kazuo Watanabe e Waldemar Mariz de Oliveira Júnior. O projeto foi apresentado

no Congresso Nacional pelo Deputado Flávio Bierrembach, porém não chegou a ser votado

nas Casas Legislativas.

Na mesma época os Promotores de Justiça de São Paulo Antônio Augusto Mello de

Camargo Ferraz, Édis Milaré e Nelson Nery Júnior, durante o XI Seminário Jurídico de

Grupos de Estudos, discutiram o primeiro projeto (Bierrembach) e apresentaram um novo

anteprojeto que foi apresentado diretamente ao Ministério da Justiça e encampado pela

Presidência da República, convertendo-se no Projeto de Lei que deu origem à Lei nº 7.347 de

24 de julho de 1985 (Lei de Ação Civil Pública).

A referida Lei, como menciona Milaré (2002, p. 171), incorporou definitivamente a

terminologia no ordenamento jurídico brasileiro, estabelecendo a ação civil pública como

instrumento de defesa de alguns interesses transindividuais, entre os quais o meio ambiente. E

o instituto foi consagrado na ordem constitucional por ocasião da Carta Magna de 1988.

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91Lei nº 6.938, de 31 de agosto de 1981.

92

ABELHA, (2003, p. 15 e 16).

93

Embora inexistisse lei específica de ação civil pública, alguns diplomas legais já faziam referência expressa a esse instituto, como é o caso da Lei Complementar nº 040, de 14 de dezembro de 1981, que estabelece normas gerais para a organização do Ministério Público nos Estados.

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A CF/88 no seu Artigo 129 preceitua: São funções institucionais do Ministério Público: ...III - promover o inquérito civil e a ação civil pública, para a proteção do patrimônio público e social, do meio ambiente e de outros interesses difusos e coletivos. BRASIL. Constituição da República Federativa do Brasil. Brasília: Senado Federal, 1988.

No ordenamento jurídico pátrio, a ação civil pública pode ser conceituada como o

exercício do direito à jurisdição com titularidade legalmente determinada ao Ministério

Público, à Defensoria Pública e à entidade ou pessoa jurídica prevista em lei, com a finalidade

de preservar o patrimônio público ou social, o meio ambiente, os direitos do consumidor e o

patrimônio cultural, a ordem econômica e a economia popular, ou de definir a

responsabilização por danos que lhes tenham sido causados, isto é, consiste no instrumento

processual adequado para reprimir ou impedir tais danos.

Mirra (2004, p. 121), ao tratar do assunto, pontua:

No direito brasileiro, após a verificação de insuficiência dos institutos tradicionais da ação e do processo civil clássicos para a tutela dos denominados interesses ou direitos difusos – entre os quais se inclui o direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado –, optou-se pela criação, por via legislativa, de um instrumento processual específico – a denominada ação civil pública da Lei nº 7.347/85 – que trouxe uma série de inovações às concepções tradicionais até então prevalecentes. Essa nova regulamentação da garantia constitucional da ação inscreve-se no movimento mundial de acesso à justiça, por meio do qual se busca tornar mais efetivos os mais diversos direitos – individuais e coletivos – formalmente reconhecidos.

Na atualidade, a busca da função jurisdicional, no que concerne à proteção do

interesse coletivo, no campo do Direito Ambiental, se traduz no instrumento da ação civil

pública, uma vez que o meio ambiente constitui um bem pertencente ao grupo dos interesses

transindividuais, sendo de uso comum de todos, conforme os ditames constitucionais do

artigo 225.

Consoante Alvarenga (2001, p. 105):

Hoje, no Brasil, como grande mecanismo de defesa judicial do meio ambiente, dentre outros interesses difusos ou coletivos, aparece sublimada a ação civil pública que é o direito de se invocar a função jurisdicional na esfera civil, em nome do interesse público. É denominada pública porque tem sempre por objeto a tutela do interesse público, difuso, impessoal, meta, supra ou transindividual, e dentro dessa categoria de interesses difusos é que é incluído o meio ambiente, o que é dado claramente extrair do disposto no artigo 225 da Constituição Federal, no que se lê que todos têm direito ao meio ambiente, bem de uso comum do povo.

Entretanto, para se compreender a importância da ação civil pública na defesa do

meio ambiente é importante antes de tudo, compreender qual, no ordenamento jurídico pátrio,

o conceito de meio ambiente enquanto bem ambiental.

De acordo com o que preceitua a Constituição Federal de 1988, o meio ambiente se

traduz em bem de uso comum do povo, podendo ser desfrutado por toda e qualquer pessoa no

âmbito da legalidade constitucional, sendo, portanto, essencial à qualidade de vida.

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Silva (2004, p. 24), em sua concepção ressalta:

A qualidade do meio ambiente transforma-se, assim, num bem ou patrimônio, cuja preservação, recuperação ou revitalização se tornaram um imperativo do poder público, para assegurar uma boa qualidade de vida, que implica em boas condições de trabalho, lazer, educação, saúde, segurança – enfim, boas condições de bem-estar do Homem e de seu desenvolvimento.

O conceito de bem ambiental comporta uma amplitude que vai além de seus

elementos formadores, tais como ar, água e terra, devendo ser definido como o conjunto das

condições de existência humana de modo a integrar e influenciar os homens, sua saúde e seu

desenvolvimento. Logo, os seres humanos integram o ambiente, bem como o conceito e a

proteção do meio ambiente só podem ser viabilizados a partir do desenvolvimento da relação

ser humano-natureza.

O bem ambiental então, não pode ser considerado bem público ou privado, posto

que, no campo constitucional, a todos cabe a titularidade do seu direito, não se concebendo

individualmente, mas sob o aspecto da coletividade de pessoas indefinidas, indeterminadas no

exercício desse direito transindividual. Consistindo assim, no meio ambiente ecologicamente

equilibrado, sendo compreendido pelo patrimônio, conjunto de objetos materiais e imateriais,

indispensáveis à construção orgânica do ambiente juridicamente protegido.

Nesse contexto, surge o instituto da ação civil pública na condição de instrumento

processual à disposição da coletividade para proposição de defesa do bem ambiental.

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4.4.3 A Ação Civil Pública e o dano ambiental

Com a compreensão do conceito jurídico de meio ambiente e bem ambiental,

passa-se, por inferência, a verificar o que vem a ser dano ambiental e como sua ocorrência enseja a

possibilidade de tutela por meio da ação civil pública.

95A Constituição Federal/88 no artigo 225 estabelece: Todos têm direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado bem de uso comum do povo e essencial à sadia qualidade de vida, impondo-se ao Poder Público e à coletividade o dever de defendê-lo e preservá-lo para as presentes e futuras gerações.

Na opinião de Milaré (2002, p. 145), dano ambiental é a lesão aos recursos

ambientais, com consequente degradação – alteração adversa ou in pejus - do equilíbrio

ecológico e da qualidade de vida.

Tendo em vista que a Política Nacional do Meio Ambiente não define expressamente

dano ambiental, Leite (2003, p. 94) afirma que:

O dano ambiental, por sua vez, constitui uma expressão ambivalente, que designa, certas vezes, alterações nocivas ao meio ambiente e outras, ainda, os efeitos que tal alteração provoca na saúde das pessoas e em seus interesses. Dano ambiental significa, em uma primeira acepção, uma alteração indesejável ao conjunto de elementos chamados meio ambiente, como por exemplo, a poluição atmosférica; seria, assim, a lesão ao direito fundamental que todos têm de gozar e aproveitar do meio ambiente apropriado. Contudo, em sua segunda acepção, dano ambiental engloba os efeitos que esta modificação gera na saúde das pessoas e em seus interesses.

Para Prieur apud Mirra (2004, p. 89), o dano ambiental consiste no prejuízo sofrido

pelo meio natural nos seus elementos não apropriados e inapropriáveis e que afeta o equilíbrio

ecológico enquanto patrimônio coletivo.

Por outro lado, a Política Nacional do Meio Ambiente apesar de não definir

expressamente dano ambiental, estabelece a responsabilidade objetiva, isto é, a

responsabilização independente da comprovação de culpa do agente,

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sendo necessária a

existência efetiva do prejuízo ao meio ambiente e o nexo causal, fundada na simples atividade

implicadora de risco.

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Assim, faz-se necessária a internalização dessas conseqüências e nesse contexto, para

que haja a responsabilidade do causador, bastando existir o dano e o nexo causal, isto é, a

relação de causa e efeito entre a atividade e o resultado danoso.

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Portanto, aquele que obtém o lucro e causa dano ambiental por sua atividade,

responderá pelos riscos ou pela desvantagem dela resultante, por via da ação civil pública

ambiental.

97A Lei nº 6.938/81 estabelece no Artigo 14, § 1º - Sem obstar a aplicação das penalidades previstas neste artigo, é o poluidor obrigado, independentemente da existência de culpa, a indenizar ou reparar os danos causados ao meio ambiente e a terceiros, afetados por sua atividade. O Ministério Público da União e dos Estados terá legitimidade para propor ação de responsabilidade civil e criminal, por danos causados ao meio ambiente.

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De acordo com LEITE e AYALA (2004, p. 39), o risco se refere ao perigo produzido pelos efeitos nocivos da atividade perigosa e pelo perigo da própria atividade desenvolvida.