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Ações judiciais e administrativas de repressão ao trabalho análogo ao de

4 TRABALHO ESCRAVO NA BAHIA

4.2 DETALHAMENTO DA ATUAÇÃO DO ESTADO NO COMBATE AO

4.2.1 Ações judiciais e administrativas de repressão ao trabalho análogo ao de

Conforme Reis (2012), as medidas jurídicas tomadas pelo Ministério Público têm alcançado resultados eficazes. O Coordenador afirma que, das fiscalizações na Bahia, praticamente todas as ações encaminhadas pela SRTE/BA ao Ministério Público, tem prosperado, o que significa que ao retorno da fiscalização aos locais flagrados com irregularidades, têm sido encontradas situações mais dignas de trabalho. A própria notícia da atuação contra determinado empregador é disseminada na região gerando efeito cascata positivo de relações com o trabalhador no campo.

33 Entrevista realizada em 12.01.12, no MPT-BA com os Procuradores do Trabalho Luiz Alberto Lima Teles e Jairo Lins de Albuquerque Sento Sé.

As punições não se restringem às medidas administrativas, porém tem sido diminuto no estado da Bahia os casos de punições mais rigorosas como prisão (conforme previsto no Código Penal Brasileiro). Isto, pois, entrar com ação penal não é algo automático, passa pela discricionariedade do Judiciário na análise dos relatórios, além da possibilidade dos inúmeros recursos que o acusado pode recorrer que possibilitam a prescrição do crime.

Um recente caso de penalização criminal na Bahia se deu em 2011, quando a Justiça Federal condenou empresário identificado pelas iniciais B. R. P.F a quatro anos de reclusão, mais o pagamento de multas, pelas condições desumanas a que sujeitava 30 pessoas em sua fazenda localizada em Barreiras34. Porém, a Justiça substituiu a pena privativa de liberdade por prestação de serviços gratuitos à comunidade ou entidades públicas durante o prazo de quatro anos. Além disso, o empresário recorreu ao Tribunal Regional Federal da 1ª Região (TRF-1) da sentença.

Há, portanto, mecanismos extrajudiciais, ou seja, utilizados em caráter administrativo; e mecanismos judiciais. A ação da fiscalização rural garante, portanto, além do resgate das vítimas, o início dos procedimentos necessários à punição dos empregadores.

A ação do GEFM constitui o primeiro mecanismo efetivo de combate ao trabalho análogo ao de escravo, representando a atuação administrativa do Estado com vistas à cessação da prática do ato criminoso, à reparação e ao resgate dos trabalhadores, assim como à colheita de provas para punição dos responsáveis pela conduta delituosa, podendo dar ensejo a desdobramentos futuros, como a instauração de inquérito civil e a propositura de ação civil pública por parte do MPT, a instauração de inquérito policial pela Polícia Federal e o oferecimento de denúncia pelo MPF. (SILVA, 2010, p.168). Á título de esclarecimento, o Ministério Público do Trabalho (MPT) é um ramo específico do Ministério Público da União (MPU), que juntamente com os Ministérios Públicos Estaduais compõem o Ministério Publico Federal (MPF). A finalidade do Inquérito Civil a ser instaurado pelo MPT é a investigação para colheita de provas que permitem ao MPF propor, ou não, Ação Civil Pública. Neste sentido, os Procuradores do Trabalho do Ministério Público, tem prerrogativas legais de entrarem nas fazendas para investigar, e também o direito e o dever de comporem o GEFM.

34 O flagrante nesta fazenda, de empresário identificado pelas iniciais B. R. P.F, se deu em julho de 2006, mas a condenação veio em Abril/2011 por manter trabalhadores alojados em barracos de plásticos, sem instalações sanitárias ou água potável,em condições sub-humanas além de aprisionados por dívidas contraídas em supermercado da cidade para alimentação entre outros itens básicos. Notícia Disponível em: <http://www.correio24horas.com.br/noticias/detalhes/detalhes-1/artigo/apos-denuncia-do-mpfba-empresario-e- condenado-por-pratica-de-trabalho-escravo-em-barreiras/> .

Conforme Sento Sé (2012), todo procurador atuante, ativo, na operação de fiscalização circula para formar provas, fotografa, colhe depoimentos de trabalhadores, grava, reduz a termo para as pessoas assinarem, formula as provas do inquérito. Neste caso, além do relatório de fiscalização que será encaminhado ao MPT pelo auditor fiscal (do MTE) que coordena a ação, o procurador já vivenciou a situação e colheu as suas próprias provas para ajuizar a ação, que cabe a este órgão.

O encaminhamento do relatório de fiscalização pelo auditor fiscal aos órgãos competentes só ocorre depois de estabelecidos todos os procedimentos administrativos iniciais, tais como assinatura das carteiras de trabalho; combinação da data de pagamento das multas e rescisões; acertos dos custos de hospedagem dos trabalhadores resgatados, por conta da empresa, até o deslocamento para cidade de origem, também sob responsabilidade do empregador. Ressalta Sento Sé (2012) que, ainda que a empresa cumpra todos os pagamentos iniciais (multas, indenizações, rescisões) foram gerados danos, prejuízos aos trabalhadores, e por isto, MPT entra com a ação por Danos Morais Coletivos (DMC) contra a empresa, que é uma multa que acompanhará o Termo de Ajustamento de Conduta (TAC) ou a Ação Civil Pública. A ação por danos morais coletivos se destina a indenizar a sociedade como um todo, que considera a prática deprimente, mesquinha e que merece reprimenda. O DMC tem caráter repressor e pedagógico, para que não se repita a prática do crime.

O dano moral coletivo postulado pelo MPT não impede que o trabalhador entre com o pedido por dano moral individual, pois o DMC não se destina diretamente para o mesmo ou para o grupo, e sim para a sociedade, tendo como destino o Fundo de Amparo ao Trabalhador (FAT).

A Ação Civil Pública (ACP) e o Termo de Ajuste de Conduta (TAC) são os principais mecanismos propostos em caso de trabalho análogo ao de escravo no país. O primeiro é no âmbito judicial e o segundo, no administrativo. O Ministério Público decide em propor uma das duas medidas diante da gravidade das provas de trabalho análogo ao de escravo encontradas. Ambos impõem multas aos infratores, sendo que as multas da ACP são em valores muito maiores, impostas, portanto, diante de fatos ainda mais graves de violações aos direitos humanos. Entretanto, TAC, com suas obrigações de fazer e/ou não fazer, é firmado de

maneira mais célere que a ACP, pois esta ocorre mediante processo judicial, enquanto o TAC dispensa sanção do juiz, ocorre no âmbito administrativo.

Obrigações típicas do TAC são: registro do trabalhador; pagamento de salários até o quinto dia útil do mês subseqüente ao vencido; depósito mensal do percentual referente ao Fundo de Garantia do Tempo de Serviço (FGTS); concessão de intervalo mínimo para repouso ou alimentação em qualquer trabalho de duração superior a 6 (seis) horas; férias; décimo terceiro salário; descanso semanal remunerado. Além de compromissos “de fazer” como: fornecimento de alojamentos; de refeições e água potável, conforme NR-31, e de maneira gratuita, além de equipamentos de proteção individuais adequados; disponibilização de ferramentas adequadas ao trabalho; manutenção, nas frentes de trabalho, de material necessário à prestação de primeiros socorros, entre outras obrigações. Dentre as obrigações de “não fazer” podem ser citadas: não contratar trabalhadores através de “gatos”; não aliciar trabalhadores mediante falsas promessas; não cobrar pelo transporte fornecido aos empregados, não proibir deslocamento, não ameaçar, não instituir servidão por dívida, entre outros.

O Procurador tem a prerrogativa, portanto, de antes de iniciar a sentença judicial, propor, em audiência administrativa, o TAC. Este que é o reconhecimento da empresa de que a mesma descumpriu a lei e de que vai cumprir os compromissos de fazer e/ou não fazer. Apesar da possibilidade de ganhar tempo caso entre-se com ação judicial, a empresa prefere firmar um TAC ante as provas incontestáveis dos agentes do GEFM, todas debatidas com o infrator. Isto porque a ação judicial, geralmente, gera indenizações por DMC muito mais elevadas, como citado. Ressalta Sento Sé, entretanto, que o TAC não é uma transação, um acordo de diminuição das multas caso a empresa firme de imediato o Termo. É um compromisso de cumprimento das normas.

Há possibilidade, de que em caso de TAC, o valor referente ao DMC seja revertido para um problema local, tal como construção de banheiros, alojamentos para o trabalhador, equipamentos de uma escola, apoio a grupos que atuem no combate ao trabalho escravo etc. O que impacta de maneira mais justa na região, já que, quando destinado ao FAT, o valor se pulveriza por todo o país. O procurador tem então certa autonomia no caso do TAC para estabelecer a destinação, porque não está restrito a normativa que impõe os recurso ao FAT na ACP.

Em caso de descumprimento do TAC, este pode ser executado perante a Justiça do Trabalho, apesar de não ter sido emitido por juiz, por ser título extrajudicial. Ou seja, pode-se propor ação perante o juiz para dar efetividade ao Termo, como a penhora ou bloqueio dos bens do proprietário. Conforme Sento Sé informou, isto passou a ser possível com alteração da CLT, em 2002.

Relatório da OIT (2009) ressalta que um dos maiores avanços do Brasil está relacionado à aplicação do dano moral coletivo, e a atuação do GEFM em geral. Conforme já ressaltado acima, pelo relato de Reis (2012), estas penalizações tem resultado positivamente em melhoria das condições de trabalho na Bahia ao retorno das fiscalizações das fiscalizações de rotina. Apesar de, entretanto, o registro de condenações criminais e pena de reclusão, como previstos no Código Penal, ser baixo no país. Na verdade, único caso de condenação penal no estado da Bahia, se deu apenas em primeiro grau e foi objeto de recurso (TELES35, 2012).