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4 O caso Light

4.1 A área de concessão da Light

A concessionária Light Rio atua no fornecimento de energia elétrica para cerca de 4,4 milhões de clientes em 31 municípios do estado do Rio de Janeiro (LIGHT, 2017). A concessionária possuía 3.829 funcionários no terceiro trimestre de 2017, que trabalham nas 5 regiões da área de concessão da empresa: Centro Sul, Oeste, Leste, Vale do Paraíba e Baixada. A Figura 20 abaixo apresenta a subdivisão da área de concessão da empresa.

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Figura 20 - Área de Concessão da Light Fonte: FERNANDES, 2017

A região Centro- Sul abrange os bairros da Zona Sul, Centro, Barra da Tijuca e uma pequena parte da Zona Norte (sobretudo Tijuca), todos pertencentes ao município do Rio de Janeiro. É uma área que engloba uma alta densidade populacional, com a predominância de grandes condomínios verticais e horizontais, boa organização urbanística e rede subterrânea. Nela, vive a população de maior renda per capita e índice de desenvolvimento humano (IDH) do município, embora haja muitas comunidades de grande porte, especialmente na Zona Sul, como a Rocinha (LIGHT, 2013a).

Já a região Leste engloba quase toda a Zona Norte, exceto a parte da grande Tijuca, e possui a maior densidade da área de concessão. Caracteriza-se por residências horizontais, vilas e comércio de médio porte, com a predominância da rede aérea, embora haja pequenos trechos de rede subterrânea. A região engloba uma grande quantidade de comunidades, e algumas muito grandes, como o Complexo do Alemão e a Maré (LIGHT, 2013a).

A região Oeste abrange a Zona Oeste da cidade do Rio de Janeiro, além dos municípios de Seropédica e Itaguaí. Na área prevalecem residências horizontais e muitos loteamentos irregulares, havendo grande proporção de domicílios subnormais e precários (LIGHT, 2013a).

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A Baixada, por sua vez, compreende os municípios de São João de Meriti, Nilópolis, Belford Roxo, Mesquita, Japeri, Nova Iguaçu, Paracambi, Queimados e parte de Duque de Caxias (a outra parte é de concessão da Enel Rio). A região é caracterizada pela predominância da rede aérea com pequenos trechos subterrâneos. A Baixada está localizada na periferia do município do Rio de Janeiro, e por isso concentra possui baixos índices de desenvolvimento. Há forte atuação das milícias, por conta dos altos índices de violência, o que influi na prestação de serviços da Light (LIGHT, 2013a).

Por fim, a região do Vale do Paraíba engloba os municípios de Barra Mansa, Volta Redonda, Quatis, Pinheiral, Rio Claro, Piraí, Barra do Piraí, Vassouras, Mendes, Paulo de Frontin, Valença, Rio das Flores, Três Rios, Miguel Pereira, Carmo, Sapucaia, Paty de Alferes, Levy Gasparian e Paraíba do Sul. As principais características são o sistema aéreo aberto, com grandes cargas industriais e tem baixa quantidade de domicílios subnormais e precários (LIGHT, 2013a).

No que concerne ao aspecto socioeconômico, o PIB e o PIB per capita da área de atuação da Light para o ano de 2014 foram de R$ 407 bilhões e R$37.414,37, respectivamente. Esse valor equivale ao quarto maior PIB do Brasil. Os dados do Censo de 2010 do IBGE para o IDH dos municípios da área de concessão da Light indicam índices entre 0,66 e 0,80. Essa variação de 0,14 representa a mesma diferença entre o IDH de África do Sul e Montenegro. Observando apenas a cidade do Rio de Janeiro, os bairros de Gávea e Leblon possuem o IDH de 0,97, enquanto na região do Complexo do Alemão o índice é de 0,70 (IBGE, 2011).

É possível observar que a área de concessão da Light é muito heterogênea. Esta heterogeneidade pode ser vista nas perdas não técnicas, que variam substancialmente em cada uma das cinco regiões atendidas pela empresa.

Em relação aos níveis de violência, o Rio de Janeiro possui uma situação de segurança pública incerta, volátil e complexa. Para Muggah (2017), o Rio de Janeiro é particularmente vulnerável a surtos de violência criminal devido a falhas na governança e corrupção sistêmica, à desigualdade socioeconômica presente na cidade e no estado e à presença de facções criminosas com elevado controle de território. A conjunção desses fatores possibilita a ocorrência e permanência da chamada violência latente.

Ainda segundo o autor, houve uma dramática deterioração da segurança, que está associada à falência do Estado (MUGGAH, 2017). Segundo a Firjan (2017), a Polícia

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Rodoviária Federal sofreu redução de 36% do efetivo nos últimos anos, enquanto a delegacia especializada no combate ao furto e roubo de cargas diminuiu 54,7% do seu quadro de funcionários entre 2006 e 2017. A Polícia Civil, por sua vez, possui atualmente um efetivo 28,6% menor do que o verificado em 2002. Por fim, a Polícia Militar, reduziu de 46.135 para 45.865 policiais entre dezembro de 2013 e fevereiro de 2017, sendo que no mesmo período houve um aumento da violência. Dessa forma, o efetivo não é suficiente para combater a criminalidade que assola a região metropolitana do Rio de Janeiro.

O estado do Rio de Janeiro possui níveis de letalidade violenta28 similares aos de conflitos civis armados na África. A Figura 21 abaixo mostra ainda que os altos níveis de violência permanecem altos por muitos anos, tendo decrescido a partir de 2007, com a criação das UPPs, e voltando a retomar o crescimento a partir de 201329.

Figura 21: Taxa de Letalidade Violenta por 100 mil habitantes no estado do Rio de Janeiro

Fonte: ISP, 201830

Um dos maiores problemas da segurança pública do estado do Rio de Janeiro é o roubo a carga. De acordo com dados apresentados pela Firjan (2017), 44% de todas as ocorrências registradas no Brasil no ano de 2016 ocorreram dentro do estado, representando um prejuízo de R$ 619 milhões para os agentes afetados. Este problema se

28 Letalidade Violenta é um dos indicadores estratégicos de criminalidade que compõem o Sistema

Integrado de Metas e Acompanhamento de Resultados (SIM) desenvolvido pela Secretaria de Estado de Segurança Pública (SESEG). São quatro os títulos que compõem o indicador de letalidade violenta: 1) homicídio doloso; 2) homicídio decorrente de oposição à intervenção policial; 3) latrocínio (roubo seguido de morte); 4) lesão corporal seguida de morte

29 Dados finais de 2017 com retificações até setembro de 2017.

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revela ainda mais grave quando se observa que o número de ocorrências só cresceu nos últimos anos. Conforme apresentado na Tabela 18, entre 2013 e 2017 a quantidade de registros praticamente triplicou.

Tabela 18 – Número de ocorrências de roubo de carga no Rio de Janeiro – 2013 a 2017

Fonte: O Globo, 2018

Além disso, entre 2010 e 2015, 3.442 pessoas foram mortas no estado por resistência à ação policial, estatística nomeada de autos de resistência (O GLOBO, 2017b).

A explicação mais conveniente para esse recrudescimento da violência deve-se à crise econômica e fiscal do estado do Rio de Janeiro, que diminuiu os recursos para a Polícia e programas, como as UPPs (FERNANDES, 2017). A partir da Figura 22, é possível perceber que a taxa de crescimento econômico do Rio de Janeiro vem apresentando uma redução desde 2010.

2013 2014 2015 2016 2017

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Figura 22: Crescimento Econômico do Rio de Janeiro Fonte: Elaboração própria baseado em IBGE, 201731.

Comparando-se os últimos dados apresentados, é possível constatar uma forte correlação entre a redução da taxa de crescimento econômico do Rio de Janeiro e o aumento da criminalidade (roubo de carga e letalidade violenta) desde 2013, ano de início da crise econômica do estado e da queda dos investimentos nas UPPs.

A violência está presente até mesmo na educação. O estudo da FGV/ DAPP (2017) constatou que, das 1.809 instituições de ensino fundamental e médio e das 461 creches e serviços de educação infantil que atuam no município, 381 instituições foram fechadas por pelo menos um dia durante o primeiro semestre de 2017 em virtude de tiroteios ou em consequências destes (O GLOBO, 2017a). Além disso, entre julho de 2016 e julho de 2017, a cidade do Rio de Janeiro registrou 3.827 tiroteios. A análise aponta ainda que, em 2016, dos 200 dias do ano letivo, 157 tiveram escolas e creches fechadas (78,50%). A Figura 23 mostra as escolas públicas, municipais e estaduais, que comunicaram suspensão ou interrupção de dias letivos devido a episódios de violência urbana externa a unidade, sobreposto ao registro de tiroteios e disparos de armas de fogo no estado do Rio de Janeiro.

31 Disponível em: <https://seriesestatisticas.ibge.gov.br/>. Acessado em 18/10/2017

8,96% 8,60% 8,47% 5,50% 3,04% 0,00% 1,00% 2,00% 3,00% 4,00% 5,00% 6,00% 7,00% 8,00% 9,00% 10,00% 2010 2011 2012 2013 2014

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Figura 23- Escolas Públicas com Comunicação Oficial de Interrupções e Suspensões de Dias Letivos/ Registro de Tiroteios e Disparos de Armas de Fogo no estado do Rio de Janeiro (2016/2017)

Fonte: MPRJ em mapas, 2017, baseado em Fogo Cruzado , 2017, e FGV/ DAPP (2017).

Nesse contexto, os dados de violência apresentados no estado do Rio de Janeiro mostram o panorama em que se encontra a área de concessão da Light. A queda no crescimento econômico e os altos índices relacionados à violência estão diretamente relacionados ao aumento do índice de perdas não técnicas das ASRO, que será abordado na próxima seção.

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