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A Aliança Bolivariana para os Povos da Nossa América (ALBA)

AS PROPOSTAS CONTEMPORÂNEAS DE INTEGRAÇÃO DA AMÉRICA LATINA

4.3 O regionalismo pós-hegemônico na América Latina: ALBA, UNASUL E CELAC

4.3.1 A Aliança Bolivariana para os Povos da Nossa América (ALBA)

Criada em 2004, a Aliança Bolivariana para os Povos da Nossa América (ALBA) foi uma das iniciativas mais emblemáticas do regionalismo pós-hegemônico.

Resultado da aproximação entre Hugo Chávez e Fidel Castro, ocorrida logo após o primeiro ter sofrido uma tentativa de golpe de Estado, em 2002, a ALBA sur-giu como uma proposta ambiciosa de desenvolvimento econômico regional inclusivo, baseada na cooperação e na solidariedade internacional (BATISTA, 2016). Para atingir o seu fim, o bloco está organizado de maneira a reunir em conselhos específicos os chefes e ministros de Estado e representantes de movimentos sociais.

Composta inicialmente por Venezuela e Cuba, a ALBA logo depois receberia a adesão da Bolívia (2006-2019), Nicarágua (2007), Equador (2009-2018), Domi-nica (2008), São Vicente e Granadinas (2009) e Antígua e Barbuda (2009). Em oposição à Área de Livre Comér-cio das Américas (ALCA)16, a ALBA se apresenta como um projeto alternativo e endógeno, que visa à constru-ção de um bloco de poder capaz de garantir a defesa dos interesses geoestratégicos dos povos latino-americanos, de modo a possibilitar o enfrentamento da influência política e econômica dos Estados Unidos.

16  A ALCA foi uma proposta realizada pelo então presidente dos  EUA, George Bush, em 1994, e que visava à construção de uma área de livre comércio que integrasse aos 34 países do continente ame-ricano, exceto Cuba. As negociações se estenderam até 2005, data limite prevista para a votação do acordo e ocasião em que a maioria dos países latino-americanos recusaram o projeto da ALCA.

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A ALCA e o NAFTA: monroísmo do século XXI O sistema capitalista, quando visto desde a sua perspectiva econômica, é multipolar, o que significa que não existe um  único centro econômico no mundo. Isso é facilmente per-cebido quando recordamos que, ao lado dos Estados Uni-dos, também despontam a China, a União Europeia, a Índia, o Brasil e o Japão, por exemplo, como algumas das mais importantes economias globais.

Esta multipolaridade leva as grandes potências a estarem em constante busca pela conquista e manutenção de novos mercados. É nesse contexto que os EUA firmaram, em 1994,  o Tratado Norte-Americano de Livre Comércio (NAFTA, na sigla em inglês), associando ao seu desenvolvimento as economias do Canadá e México.

As pretensões estadunidenses eram, no entanto, ainda maiores e já em 1990 o presidente do país George Bush anunciou a proposta de criação da ALCA. A ideia era a de estabelecer no continente americano uma área de livre comércio que se estendesse do Canadá à Argentina. Na prática, a iniciativa tinha como objetivo o de consolidar a influência política e econômica dos Estados Unidos sobre  toda a região, ressuscitando a Doutrina Monroe e a ideia de

“América para os americanos”.

A ALCA foi rejeitada pelas nações latino-americanas em 2005, na cúpula de Mar del Plata, quando muitos dos paí-ses da região estavam representados por lideranças pro-gressistas que haviam chegado ao poder logo após a crise neoliberal que assolou toda a região no fim dos anos 1990.

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Financiada principalmente com os recursos obti-dos pela Venezuela a partir da exportação de petróleo, a ALBA apresentou importantes resultados em seus pri-meiros anos de funcionamento. Entre eles, foi criado, em 2009, o Banco da ALBA, cuja função seria a de financiar os projetos prioritários do bloco, especial-mente os voltados para a promoção do bem-estar. O Banco da ALBA também é responsável pela gestão do Sistema Unitário de Compensação Regional, o SUCRE, moeda virtual utilizada especificamente para facilitar as trocas comerciais entre os países membros do bloco.

As Missões Sociais são outra ação importante da ALBA por expressarem mais claramente a proposta solidária do bloco. Elas consistem em um modelo de política pública específico implementado na Venezuela pelo governo Chávez a partir de 2004 que operava paralelamente à institucionalidade convencional, com o fim de fundar um novo Estado Social no país (BRI-CEÑO & HURTADO, 2016). As Misiones venezuelanas resultavam de uma importante articulação entre a Força Armada Nacional Bolivariana (FANB) e a estatal Petró-leos de Venezuela S.A. (PDVSA) e terminaram por se transformar em uma importante ferramenta de inserção internacional da Venezuela. Entre as Misiones que mais se destacaram, encontra-se a Misión Barrio Adentro, acordo bilateral entre Cuba e Venezuela através da qual médicos cubanos atendem à população vulnerável de bairros urbanos e municípios rurais venezuelanos. Da mesma forma, os acordos de segurança alimentar assi-nados pela Venezuela, Honduras, Nicarágua, Bolívia, Equador e República Dominicana criaram uma

com-62 panhia transnacional de produção de alimentos para distribuição através de programas nacionais de combate à fome e à desnutrição infantil.

Como lembra Batista (2016), os altos preços do petróleo registrados até o ano de 2013 eram fundamen-tais para o funcionamento da ALBA. Essa commodity não apenas era utilizada pela Venezuela para financiar a integração como também era oferecida para cerca de 30 países do Caribe a preços que podiam ser até 40%

menores que os praticados no mercado internacional.

Em algumas situações, o petróleo venezuelano era dire-tamente trocado por serviços de saúde oferecidos por médicos cubanos, por soja argentina ou por algodão boli-viano. Essas trocas eram facilitadas pela Petroamérica, modelo de cooperação energética da ALBA que inclui alianças como a Petrocaribe, a Petroandina e a Petrosul.

Nos últimos anos, no entanto, a ALBA tem mos-trado claros sinais de esgotamento. Isso se deve, dentre outras razões, à grande dependência que o bloco possuía com respeito à liderança de Hugo Chávez, morto em 2013. A ascensão de Nicolás Maduro ao poder, as con-trovérsias produzidas por sua administração e a reorien-tação da América Latina em direção a governos mais à direita têm resultado em um isolamento diplomático sem precedentes na história da Venezuela. Ademais, a desorganização do setor petroquímico venezuelano, espinha dorsal da sua economia, em razão da queda drástica dos preços internacionais do petróleo e das san-ções impostas pelos EUA contra a Venezuela, empurra-ram o país para uma profunda crise humanitária.

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A mudança do cenário político latino-americano também alcançou importantes sócios do projeto boliva-riano. No Equador, Lenin Moreno, que chegou ao poder com o apoio do ex-presidente Rafael Correa para, logo depois das eleições, romper com o seu até então aliado e orientar o seu governo à direita do espectro político, anunciou que o país abandonaria a ALBA em agosto de 2018. Moreno justificou sua decisão afirmando que o Equador queria ser independente de organizações que buscavam impor “uma visão específica” sobre os temas sociais e políticos da América Latina (ASSOCIATED PRESS, 2018).

O mesmo ocorreu com a Bolívia, tão logo o então presidente Evo Morales renunciou ao cargo sob a acusa-ção de tentar fraudar as eleições presidenciais de outu-bro de 2019. O governo interino e autoproclamado de Jeanine Áñez não foi reconhecido pela ALBA, uma vez que a organização denunciava que se havia consumado um golpe de Estado contra Morales por parte do Exér-cito e da oposição boliviana. Áñez, então, anunciou a ruptura das relações diplomáticas entre Bolívia e Vene-zuela e a retirada de seu país da ALBA.

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