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CAPÍTULO II ESTUDOS EMPÍRICOS

2.4. A aprendizagem e o contexto de aprendizagem no ensino técnico brasileiro

Relativamente à aprendizagem no ensino técnico brasileiro, em termos de objetivos, Amaral (2012) explica que no ensino técnico desde a sua implantação no Brasil, houve uma dualidade relacionada a um tipo de aprendizagem direcionada para uma formação para o trabalho (aprendizagem da técnica em si) ou para uma formação para a vida (aprendizagem no sentido de ética e cidadania). Diversas leis foram criadas com tentativa de suprimir tal dualidade, mas não tiveram sucesso. Somente em 2008, o governo federal promulgou a lei 11892/2008 que cria 38 Institutos Federais de Educação, Ciência e Tecnologia, mantidos com recursos públicos, de forma a ampliar o número de vagas para estudantes e de escolas, e com o objetivo de buscar uma educação direcionada para a construção de uma sociedade ética e igualitária que alcance diferentes grupos sociais com

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o objetivo de universalizar o conhecimento e a cidadania, e simultaneamente, incluir a aprendizagem da técnica (Amaral, 2012; Ministério da Educação, 2007). Ou seja, uma das opções para os cursos técnicos em termos de aprendizagem foi o de ocorrerem concomitantemente ao Ensino Médio (ensino secundário) para que se cumpra estes dois principais objetivos, ou seja, universalizar o conhecimento e a cidadania em conjunto com a aprendizagem da técnica (Amaral, 2012; Ministério da Educação, 2007). A ideia de unir os dois objetivos é explicada por Ciavatta (2005), que define “formação integrada”:

“A ideia de formação integrada sugere superar o ser humano dividido historicamente pela divisão social do trabalho entre a ação de executar e a ação de pensar, dirigir ou planejar (…). Como formação humana, o que se busca é garantir ao adolescente, ao jovem e ao adulto trabalhador o direito a uma formação completa para a leitura do mundo e para a atuação como cidadão pertencente a um país, integrado dignamente à sua sociedade política. Formação que, nesse sentido, supõe a compreensão das relações sociais subjacentes a todos os fenômenos” (Ciavatta, 2005, p. 85).

Em termos da legislação vigente, os objetivos estabelecidos para o ensino técnico são a formação integral do educando, possibilitando o desenvolvimento do seu potencial intelectual e do seu conhecimento técnico-científico, assim como a sua formação para o exercício da cidadania (Ministério da Educação, 2015). Segundo o Documento Base da Educação Profissional e Tecnológica (Ministério da Educação, 2007) a conceção de formação humana dentro do ensino técnico é de integração das dimensões da vida no processo educativo (i.e., trabalho, ciência e cultura). O trabalho é definido como realização humana inerente ao ser (sentido ontológico) e como prática econômica (sentido histórico associado ao modo de produção); a ciência é compreendida como os conhecimentos produzidos pela humanidade; e a cultura é entendida como correspondendo aos valores éticos e estéticos que orientam as normas de conduta de uma sociedade (Ministério da Educação, 2007).

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2.4.1.O currículo no ensino técnico brasileiro

A legislação brasileira diz que o currículo no ensino técnico deve ser uma construção coletiva e deve contemplar a formação integral do estudante no sentido de articular o saber teórico com o saber prático, assegurando o processo de ensino- aprendizagem dinâmico e as relações político-pedagógicas (Ministério da Educação, 2015). O currículo dito integrado “organiza o conhecimento e desenvolve o processo de ensino-aprendizagem de forma que os conceitos sejam apreendidos como sistema de relações de uma totalidade concreta que se pretende explicar/compreender” (Ministério da Educação, 2007, p. 42).

Além das disciplinas teóricas e práticas, o currículo prevê o estágio supervisionado (objetivando a integração do educando com o mundo do trabalho, conforme a legislação em vigor e regulamento específico), atividades pedagógicas extensivas (i.e., visitas técnicas e culturais, trabalhos de campo e microestágios) e investigação. A organização curricular dos cursos procura articular os conteúdos de formação geral e os conteúdos de formação profissional, de modo a contribuir para a formação integral do estudante “como cidadão consciente, atuante e criativo e como profissional responsável e competente para desempenhar de forma plena seu papel social, político e econômico na sociedade” (Ministério da Educação, 2015, p. 4).

O currículo possui princípios norteadores das práticas e das relações pedagógicas desenvolvidas na instituição: o compromisso social do ensino com a perspetiva da formação integral do aluno; a garantia de relações democráticas entre os indivíduos da instituição; o incentivo à autonomia e à preservação da subjetividade; valorização das responsabilidades individuais e coletivas; a unidade do processo educativo; o respeito às

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diferenças e o compromisso com a inclusão do educando no processo educativo (Ministério da Educação, 2015).

2.4.2.O método de ensino no ensino técnico brasileiro

Em consonância ao currículo integrado que visa a formação integral do estudante, o método de ensino no ensino técnico deve restabelecer as relações dinâmicas e dialéticas entre os conceitos, reconstituindo as relações que configuram a totalidade concreta da qual se originaram, de modo que o objeto de conhecimento seja compreendido gradativamente em suas particularidades (Ministério da Educação, 2007). O método de ensino deve possibilitar aqui que o processo de ensino-aprendizagem ocorra de forma que os conceitos sejam apreendidos de forma a relacionar com situações concretas e com a intenção de explicar e compreender (Ministério da Educação, 2007).

Numa investigação com estudantes do curso de Agropecuária dos institutos técnicos federais do estado de Goiás, Figueiredo, Noronha e Neto (2008) concluem que estes estudantes aprendem melhor quando há um equilíbrio entre a forma de ensino e o modo como os estudantes preferem aprender e o modo que não gostam de aprender, e quando possuem consciência sobre o modo como aprendem, visto que assim passam a ter perspetivas para melhorarem seu rendimento escolar.

Segundo Scacchetti et al. (2014), o tipo de ensino que ocorre no ensino técnico, como o de utilização de atividades práticas e de laboratórios que proporcionam maior interação entre o que é ensinado na teoria com a prática, além de aumentar a atenção e interesse dos alunos contribui para uma interação entre estudantes e instituição de ensino e favorece a satisfação e a aprendizagem significativa. Estes autores concluem ainda que

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o ensino técnico brasileiro é responsável por promover um ambiente escolar no qual a curiosidade, a autonomia e o sentimento de pertencimento são estimulados.

No mesmo sentido, Silva (2012, 2017) em seu estudo sobre o papel do professor na formação do profissional do ensino técnico, revela que a aprendizagem do aluno dos institutos federais de ensino técnico brasileiro ocorre em outras frentes além da sala de aula e dos laboratórios: no âmbito de estágios e de atividade de investigação e extensão (e.g., Feira Brasileira de Ciências e Engenharia). Silva (2012, 2017) também enfatiza que a aprendizagem dos estudantes de ensino técnico deve ser proporcionada por meio do seu envolvimento com os conteúdos investigados, de forma a torná-los futuros profissionais seguros, preparados para atuarem no mercado de trabalho e satisfeitos.

2.4.3.A avaliação no ensino técnico brasileiro

A avaliação da aprendizagem no ensino técnico deverá ser contínua, cumulativa e articulada ao projeto pedagógico da Instituição, levando-se em conta as competências gerais e específicas a serem desenvolvidas dentro dos cursos oferecidos. Esta avaliação pode ser considerada quantitativa, no sentido de que o aluno é avaliado numa escala de 0 a 10, precisando obter no mínimo grau 6.0 de média para ser aprovado (Ministério da Educação, 2015).

Os instrumentos de avaliação utilizados na instituição são múltiplos de forma que o professor tenha variadas formas de acompanhar o processo de aprendizagem dos estudantes, procurando sempre diagnosticar os aspetos cognitivos, afetivos e psicomotores da aprendizagem (Ministério da Educação, 2015).

Os estudantes têm direito de receber explicações a respeito do motivo do professor ter dado o determinado grau na avaliação através da revisão de prova. A avaliação ainda

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conta com um conselho de classe (i.e., órgão colegiado responsável com funcionamento e competências próprios estabelecidos em regulamento próprio) (Ministério da Educação, 2015).

Para os alunos que não conseguem aprovação, há a recuperação ao final do semestre letivo, de forma que possam ter mais uma chance de obter a média para serem aprovados.

2.4.4.Resultados escolares no ensino técnico brasileiro

Alguns estudos têm-se debruçado sobre os resultados escolares no ensino técnico brasileiro, em termos das classificações dos estudantes que o frequentam.

Até o ano de 2016, os relatórios do Exame Nacional do Ensino Médio (ENEM) não incluíam os resultados dos estudantes do ensino técnico (Institutos Federais) (Saldaña, Takahashi, & Gamba, 2018). No relatório de 2016, os Institutos Federais apresentaram as melhores classificações em catorze estados brasileiros, quando comparados com o ensino secundário normal. No entanto, quando os Institutos Federais foram comparados somente com as escolas particulares de ensino secundário normal, apresentaram médias de classificações escolares 3% abaixo delas (Saldaña et al., 2018). Antes de 2016, somente 10% das escolas públicas apresentavam as melhores médias de classificações, mas com a inclusão do ensino técnico (Institutos Federais) no relatório, estes valores subiram para 12% (Saldaña et al., 2018).

Segundo Cavalcante e Santos Júnior (2013), que realizaram um estudo sobre os factores que influenciam o desempenho escolar dos estudantes de um curso do ensino técnico brasileiro, em Contabilidade, tanto os melhores como os piores desempenhos daqueles estudantes estão relacionados ao professor. Ou seja, os resultados insatisfatórios dos estudantes estão relacionados aos professores que explicam deficitariamente o

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conteúdo, que não possuem domínio do assunto lecionado, e que apresentam reduzida qualidade de relacionamento com os alunos. Por outro lado, os resultados satisfatórios estão relacionados aos professores que explicam de forma apropriada o conteúdo a ser ensinado e possuem domínio deste conhecimento.

Por seu lado, Lutz e Jacobi (2007) investigaram a influência, nas classificações dos estudantes de ensino técnico, do seu sexo, das disciplinas e da sua origem educacional (i.e., ensino público ou particular previamente ao ingresso no ensino técnico). Estes investigadores observaram: uma ausência de diferenças significativas nas classificações em função da origem educacional; que as meninas tiveram classificações mais altas que os meninos em todas as disciplinas; e que as classificações mais elevadas foram para o grupo das disciplinas de Educação Artística, Projetos, Educação Física e Língua Portuguesa, seguido do grupo de Biologia, Língua Inglesa e Literatura Brasileira, e finalmente do grupo de Física, Matemática e Química.

Paralelamente aos estudos anteriores, outros têm-se debruçado sobre o fenómeno da evasão no ensino técnico brasileiro.

Segundo Araújo (2013), em seu estudo comparativo entre evasão em diferentes modalidades de ensino técnico, a taxa de abandono no ensino técnico é alta quando se considera os cursos concomitantes e subsequentes, mas não o ensino técnico integrado. Nos primeiros casos o motivo apontado pelo autor é a urgência do aluno para conseguir um emprego. Já no segundo caso, os alunos costumam ser adolescentes e entendem o ensino técnico como uma certificação a mais ou intermediária, antes de alcançar o ensino superior para posteriormente conseguir uma boa posição no mercado de trabalho.

Em relação à evasão dos estudantes do ensino técnico brasileiro, Ferreira (2013) considera que existem várias causas: 1. “escola” (e.g., não atrativa, autoritária, professores despreparados, insuficiente, ausência de motivação); 2. “aluno” (e.g,

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desinteressado, indisciplinado, com problema de saúde, gravidez); 3. “pais ou responsáveis (encarregados de educação)” (e.g., não cumprimento com suas obrigações em relação aos filhos, desinteresse em relação ao destino dos filhos); 4. “social” (e.g., trabalho com incompatibilidade de horário para os estudos, hostilidade entre os alunos).

Ainda sobre evasão no ensino técnico brasileiro, Bastos e Gomes (2014) relatam, em um estudo sobre o ensino técnico no Rio de Janeiro, as principais causas do abandono dos estudantes entre os anos de 2009 e 2011. Estes autores concluem que a desmotivação é a principal causa de evasão apontada pelos estudantes, seguida da necessidade de trabalhar, da dificuldade de conciliar estudo e trabalho, das longas distâncias entre a escola, lar e trabalho, da falta de base teórica, da insatisfação com o curso, com os professores e com a política pedagógica, da reduzida atratividade da escola, da hostilidade entre os alunos, da falta de conhecimento sobre a área escolhida e o interesse por parte destes estudantes de ingressar no ensino superior.

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CAPÍTULO II – Estudos Empíricos