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2.4 Considerações metodológicas sobre a categoria “atividade”

2.4.2 A atividade humana numa perspectiva transformadora

Ao se referir a categoria atividade Gutiérrez nos chama a atenção sobre o fato de que o trabalho como atividade não abarca todas as dimensões da categoria “atividade transformadora”; esta é mais ampla porque compreende todas as formas da atividade humana que são passíveis de mudanças reais ou imaginárias (GUTIÉRREZ, 2002).

sendo” “aquilo que num objeto ou fenômeno se descobre num sistema de ligações, de interações e de relações. É refletida e fixada na linguagem, o que lhe confere a sua estabilidade” (ibid:52).

De acordo com o caráter do objeto a atividade transformadora pode ser compreendida, num primeiro momento, como a transformação da natureza a partir da atividade trabalho na qual o homem se modifica ao modificar a natureza, como afirmou Marx. Assim, este conceito pode ser generalizado para todos os tipos de atividade: científica, ideológica, intelectual, braçal, etc (ibid).

Entretanto a atividade numa perspectiva transformadora pode ser concebida como a transformação da sociedade, que se apresenta mediante a criação e a utilização dos objetos socialmente produzidos, onde estaria a relação social, a instituição, bem como as regras de convívio individual e coletivo. Ainda há outras dimensões: uma delas é a transformação do próprio homem, onde são considerados tanto os aspectos físicos como também os espirituais (ibid).

Na perspectiva marxista, já assinalada, produz-se um caso particular de atividade transformadora que é exclusivamente humana, onde é orientada a atividade transformadora para si, ainda que possua o objetivo de auto-aperfeiçoar-se tanto físico como espiritualmente (ibid).

Assim, a atividade transformadora faz parte do ativismo humano, e pode ser realizada em dois níveis: real ou ideal. No primeiro caso as mudanças ocorrem no plano objetivo, onde estão presentes as dimensões: natural, social e, humana; são, sobretudo, objetivas e práticas (ibid).

Já no segundo caso o objeto é transformado a partir das representações do sujeito da atividade. Marx denominou essa atividade de prático-espiritual, ou seja, a transformação é produzida a partir do que já existe, e a criação do que ainda não existia, ficando esta transformação no nível do pensamento. “Esta é a atividade projetiva ou modeladora, pois sua função básica é elaborar programas de ação futura para a atividade prático-material real (ibid:48)”.

A produção e o consumo da atividade criam um movimento dialético, que Gutiérrez identifica: o de produção como implícito na atividade e o de consumo

que poderá aparecer em alguns momentos como desintegrado da atividade. Nesta perspectiva o mesmo autor enfatiza que todo e qualquer ato de consumo implica numa transformação e nesta relação ambos se transformam, dando forma a algo novo algo que só existia nas partes. O sujeito se apodera do objeto numa relação dialética, ou seja, não tem sentido conceber um sem o outro (ibid).

2.4.3 Os processos cognitivos na atividade

Como já discutido, a estrutura da atividade tem como ponto de partida o sujeito e o objeto. Na abordagem cognitiva, segundo Gutiérrez (ibid:49) a “atividade do sujeito não se dirige ao ser aparente do objeto, e se o modifica de maneira ideal é só para depois reter mentalmente seu verdadeiro ser, penetrar na sua profundeza e compreender sua essência”.

Para este autor os mecanismos e as características do processo cognitivo presentes numa atividade levam o sujeito a refletir sobre o objeto; e essa reflexão retorna ao sujeito no nível das funções superiores, e o leva a criar um novo objeto.

Essas características podem apresentar-se nas relações que são estabelecidas a partir de processos mediados entre o sujeito e o objeto, facilitando os processos cognitivos a partir de uma atividade. Tais reflexões possibilitam ulteriores transformações no objeto (ibid).

Os processos cognitivos na atividade atingem um conhecimento mais elaborado, científico, que se desviou da cognição prática oriunda da divisão social do trabalho e se tornou conhecimento elaborado. A partir de processos cognitivos da atividade concreta e independente transformam-se em conhecimentos científicos (ibid).

Por outro lado o conhecimento científico e elaborado possui níveis empíricos e teóricos e, em geral, representa amplas situações de atividades cognitivas. Entretanto possui relação com diversos objetos que exercem influências sobre os processos cognitivos da atividade. Quando estes processos dirigem-se ao sujeito cognoscente iniciam-se os processos de autoconhecimento, permanecendo no nível do conhecimento prático (ibid).

A tipologia dos processos cognitivos de uma atividade individual e, dependendo de quem realiza tal função, tais processos são mais frequentemente identificados,não só como autoconhecimento, mas, fundamentalmente, nos distintos ramos da ciência. Neste sentido os processos cognitivos na atividade apresentam variedades identificadas na perspectiva da atividade transformadora (ibid).

Essas características, como afirmou Marx, são dialéticas, pois transformam o sujeito da atividade na medida em que são transformadas. E as ações-operações são instrumentalmente mediadas a partir de concepções transformadoras.

2.5 Discussão

O ser humano se destaca da natureza por sua capacidade de transformá-la, e é obrigado a produzir sua própria existência. Nessa produção ele se constitui como sujeito. Diferente dos animais, que se adaptam à natureza, o sujeito adapta esta a si.

Trabalho e atividade são categorias que se complementam, entretanto a discussão teórica parte da compreensão da categoria atividade como forma de relação, interação e mediação semiótica entre homem e objeto. Esse movimento, ou essa transformação, é o que se conhece por trabalho.

Entender os mecanismos de uma atividade, a partir dos pressupostos do materialismo histórico aparece como possibilidade de se aproximar da realidade objetiva, uma vez que a atividade é planejada, organizada e executada pelo homem num contexto sócio-histórico.

As concepções teóricas discutidas e apresentadas neste estudo pressupõem que a formação dos conceitos e sua internalização pelo sujeito ocorrem a partir das mediações semióticas. Estas ocorrem a partir da atividade do sujeito, que se torna em dado objetivo.

Na abordagem sócio-histórica a construção de conceitos científicos, ou elaborados passa pela mediação semiótica e pela internalização. Nesta relação o que se tem de concreto é o objeto cognoscível que dentro deste enfoque se constitui em celeiro à formação dos Processos Psicológicos Superiores, os PPS - Assim o processo de desenvolvimento de conceitos científicos e generalizações que são resultados das mediações semióticas estão condicionados ao processo sócio- histórico. As informações são criadas e organizadas seguindo uma lógica dialética da ação-reflexão-ação.

Nessa abordagem a educação é diretiva, contrapondo-se às concepções que defendiam a não diretividade ou a neutralidade no processo de ensino- aprendizagem, que é interativo e dinâmico. Neste contexto, segundo os preceitos da Teoria Sócio-Histórica, as funções psicológicas superiores aparecem primeiramente no plano social para depois se tornarem funções internalizadas ou individualizadas.

No processo de transformação das categorias de motivos-fins, as ações- operações são internalizadas a partir das mediações que ajudam a formar os Processos Psicológicos Superiores. Em última análise, essas transformações são os processos cognitivos existentes numa atividade, que ao se refletir sobre o

objeto as reflexões voltam para o sujeito alterando seus conceitos e suas impressões objetivas.

Assim o processo de internalização de conceitos científicos não é mera transferência de um plano a outro, mas de uma interiorização de ações e operações que foram organizadas e produzidas no plano social.

Leontiev defendia que a atividade é determinada pelos motivos-fins, ações- operações e meios. E que não há atividade que não seja movida por um motivo seja numa atividade física ou intelectual, interna ou externa. Assim o conceito de atividade está intimamente ligado ao conceito de motivo.

As ações devem ser integradas com as operações para que os fins sejam atingidos. Nestas ações-operações a atividade humana é incentivada por motivos, objetivos e metas, que estão relacionados diretamente com as ações-operações, os objetivos, os sentidos ou quaisquer outros mediadores semióticos utilizados na realização de uma atividade.

Para que os fins sejam alcançados é necessário que as ações e as operações sejam igualmente observadas e executadas.

Portanto uma ação pode ser também uma operação. Essa transformação ocorre quando é posto um novo fim onde a ação considerada passa a ser um meio para a execução de uma nova ação que requererá várias operações; e assim, sucessivamente. Independente de onde venha a ocorrer uma atividade, o sujeito sempre será o protagonista da sua atividade.

Essas conjecturas apresentam a atividade num primeiro momento como uma categoria ligada à práxis humana. Aqui o sujeito não reflete sobre sua atividade, simplesmente a desenvolve.

O nível de consciência tido pelo sujeito acerca da organização e das dimensões que compõem a atmosfera da atividade que ele desenvolve pode interferir ou não no nível de motivação e no desenvolvimento da atividade. A realidade objetiva, as condições sócio-históricas que foram organizadas, as atividades que são postas para que ele as desenvolva, bem como o nível de consciência tido por ele acerca da organização e da dinâmica da atividade podem interferir nos motivos-fim desta.

Entretanto entende-se que Teoria da Atividade não se restringe apenas às categorias citadas. Uma operacionalização dos preceitos básicos da TA sem relação teórica com os seus preceitos gerais, dos quais as dimensões transformadora, cognitiva, valorativa, etc., são dimensões integrantes, pode conduzir a uma construção de princípios teóricos com um enfoque formulista, que é contrária os preceitos gerais da teoria.

Em síntese, ao discutir a elaboração de princípios teóricos a serem utilizados em processos de ensino-aprendizagem em ambiente virtual de apoio à aprendizagem fundamentados na Teoria da Atividade, se fazem necessárias discussões teóricas tanto das suas categorias como também da base teórica da Educação a Distância.

Neste sentido, o próximo capítulo mostra o processo de consolidação das bases teórico-metodológicas da Educação a Distância no mundo, e em especial no Brasil.

3 FUNDAMENTO DA EDUCAÇÃO A DISTÂNCIA

[...] os filósofos têm apenas interpretado o mundo de maneiras diferentes, a questão é transformá-lo (MARX, 1979:111).

3.1 Introdução

Discute-se que a EaD vem se utilizando cada vez mais das tecnologias digitais, que por sua capacidade de transmitir arquivos pesados, incluindo imagens, sons e recursos de hipermídia adaptativa, expandem cada vez mais as possibilidades de interação, comunicação, apresentação e condução de cursos a distância (MOORE e KEARSLEY, 1996).

As Tecnologias de Informação e Comunicação chamadas também de terceira geração14 surgem como alternativa para uma real democratização de informações para pessoas que se encontram geograficamente distantes. Estas tecnologias hospedam comunidades virtuais de aprendizagem e viabilizam discussões e debates entre usuários de um AVAA, constituindo-se em novos espaços educativos.

Neste sentido a aprendizagem colaborativa emerge como uma categoria presente na utilização de AVAA. Landin (1997:23) defende que a utilização destas tecnologias constituem-se em “ [...] solução inquestionável para os tempos atuais, sobretudo porque seria insensato não utilizar, para seus propósitos de tão alta relevância, o que a tecnologia oferece”.

14

É caracterizada pela capacidade do indivíduo, através das tecnologias de informação e comunicação, comunicar-se entre si de forma síncrona ou assíncrona, através das ferramentas que as hipermídias e os ambientes informatizados de apoio à aprendizagem oferecem, transmitindo e visualizando arquivos pesados. A seção 3.1.3 apresenta e discute especificamente este tema.

Vários autores descrevem que os primeiros ensaios concretos em se tratando de EaD, inicialmente partiram de iniciativas de alguns professores. Landim (ibid) postula que somente na segunda metade do século XIX é que a EaD se institucionalizou como uma modalidade de ensino. No final deste mesmo século começaram a surgir instituições particulares, principalmente estadunidenses e européias, que ofereciam cursos a distância por correspondência, com base no material impresso e com temas ligados à formação profissional.

Inicialmente as ofertas de cursos a distância destinavam-se à formação profissional, que, por suas características próprias, é distinta do mundo acadêmico. Talvez esse possa ter sido, durante décadas, um dos motivos pelos quais a EaD tenha sido considerada educação de segunda categoria (LITWIN, 2001).

Somou-se a isso o fato de que a EaD passou a ser destinada para acelerar o processo de escolarização daqueles indivíduos que haviam desistido ou abandonado seus estudos, ou seja, a Educação a Distância era oferecida para pessoas que tiveram seu processo de escolarização tolhido ou incompleto (ibid).

Segundo a mesma autora, transcorreram várias décadas até que a Educação a Distância pudesse ser respeitada como uma modalidade de ensino.

Em 1892, a Universidade de Chicago (http://www.csu.edu/) lançou o seu primeiro curso na modalidade a distância por correspondência ao mesmo tempo em que incorporou a respectiva modalidade na instituição. É a partir de ações concretas em EaD que no século XX se iniciou um crescente movimento da consolidação e expansão das suas mais variadas formas. Logo, em 1930, já havia 39 (trinta e nove, ou mais) universidades norte-americanas que ofereciam estes cursos (LITWIN, 2001).

Do ponto de vista quantitativo, ampliou-se o número de países, de instituições, de cursos, de alunos e de estudos com objetivo de compreender e de sistematizar os processos de ensino-aprendizagem, bem como a avaliação de aprendizagem feita a partir da utilização de mediadores semióticos nesses processos (ibid).

A qualidade dos cursos se expressava nos resultados obtidos, os quais mostraram que a EaD não era apenas um modismo e sim a abertura do leque de possibilidades viáveis para flexibilizar e dinamizar os processos de ensino- aprendizagem.

Uma instituição que marcou uma posição importante na consolidação das bases teórico-metodológicas da Educação a Distância foi a Universidade de Wisconsin/EUA (http://www.wisc.edu), criada exclusivamente para a EaD.

Outra que ajudou a solidificar as bases teóricas da EaD foi a Universidade Aberta

da Grã-bretanha, popularmente conhecida como Open University

(www.open.ac.uk). Esta instituição mostrou ao mundo, a partir da utilização de várias mídias, que era e que é possível oferecer um ensino a distância de qualidade.

As experiências de EaD na Open University se deram de início em cursos oferecidos em período de férias dos cursos presenciais. A partir dos resultados obtidos nas avaliações dos alunos desses cursos, e com a qualidade que a modalidade assegurou, a instituiução investiu em EaD e se transformou em modelo e referência (LITWIN, 2001).

Novos cursos foram desenvolvidos e novos horizontes se abriram para e pela EaD. Na Europa foi criada a Fern Universitat (www.fernuni-hagen.de), na Alemanha, de Educação a Distância. Entretanto é na Espanha, com a criação de universidades, dentre as quais se destaca a Universidade Nacional de Educación a Distancia (http://www.uned.es/webuned/home.htm), que a EaD deslancha.

Essas instituições surgiram com propostas sedutoras e ousadas, onde os cursos eram oferecidos para alunos localizados em diferentes países, tanto para cursos de graduação como também na pós-graduação (LITWIN, 2001).

As concepções de EaD e as diretrizes metodológicas dessas universidades exerceram fortes influências nas concepções das que foram criadas posteriormente na América Latina, como a Universidade Aberta da Venezuela, (http://www.una.edu.ve/) ou como a Universidade Estatal a Distância da Costa Rica (http://www.uned.ac.cr/). Essas universidades foram criadas com base nas experiências que já tinham se consolidado.

A partir desse movimento começaram a surgir diferentes programas de Educação a Distância, os quais levavam em consideração as idiossincrasias dos alunos e recursos que os mesmos tinham disponíveis. A partir desse movimento mudou substancialmente o conceito que até então se tinha acerca da Educação a Distância.

É o caso da Universidade Autônoma do México (http://www.unam.mx/), do Sistema de Educação a Distância da Universidade de Brasília (http://www.unb.br), da Universidade de Honduras (http://www.unah.hn/) ou mesmo da Universidad Abierta Interamericana de Buenos Aires (http://www.vaneduc.edu.ar/uai/).

Hoje, o crescente número de cursos de graduação e principalmente de pós- graduação a distância mediados por computador nas universidades corporativas que se iniciam demonstra as potencialidades dessas tecnologias para os processos de ensino-aprendizagem e, conseqüentemente, para a formação continuada (LITWIN, 2001).

A geração atual de sistemas de EaD surgiu com a popularização dos computadores pessoais e foi fortemente influenciada pelos aspectos interativos de

Niskier (1999) apresenta uma classificação do processo evolutivo da EaD. Segundo esta, a Educação a Distância pode ser estudada e compreendida do ponto de vista histórico a partir de três gerações.