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A autoestima e o comportamento socioemocional na criança disléxica

Capítulo I – Enquadramento Teórico do Estudo

5. A autoestima e o comportamento socioemocional na criança disléxica

A autoestima é a avaliação subjetiva que uma pessoa faz de si mesma como sendo intrinsecamente positiva ou negativa em algum grau. Para Vasconcelos (2019), a autoestima é a soma da autoconfiança com autorrespeito. Reflete o julgamento implícito da nossa capacidade de lidar com os desafios da vida (entender e dominar os problemas) e o direito de ser feliz (respeitar e defender os próprios interesses e necessidades). Nesta perspectiva, a autoestima é a chave para o sucesso ou para o fracasso. É também a chave para nos entendermos a nós mesmos e aos outros.

Vários são os sentimentos que as crianças com dislexia experimentam, dos quais destacamos sentimentos de insegurança, de desapontamento, de fúria, que segundo Cohen (2019,p.7) se transformam na “síndrome de incompetência” fazendo com que as crianças evitem as situações de ameaça e se sintam com baixa autoestima.

A autoestima é construída, segundo Stenhouse (1994), pelas nossas experiências e começa a ser moldada nos primeiros anos da nossa vida. Para Cowie & Pecherek (1994), a autoestima é composta por dois componentes: o "eu" como capacidade de ver as suas habilidades, características pessoais, qualidades e bens materiais; e o "eu" como consciência de si próprio, como uma entidade separada dos outros.

Assim, a autoestima é o processo, para Sako (2016), de construção de identidade individual e cultural, de entender o seu papel na sociedade, associado a uma experiência autorreflexiva sob um comportamento subjetivo. No seu processo de crescimento a criança entende, valoriza e toma consciência dos padrões que envolvem a sociedade, com base nestes padrões cria e modela os seus próprios objetivos. Neste âmbito para Sako (2016), quanto maior for o número de pessoas envolventes no mundo socio económico da criança, mais possibilidade ela tem de ser bem-sucedida e aceite pela sociedade.

Lawrence (1981,p.264) definiu a autoestima como a “avaliação afetiva da criança da soma total de suas características, tanto mentais quanto físicas (…) e tendem a preocupar-se com as opiniões dos colegas, professores e pais.” Neste sentido, e, segundo White (2006), quanto mais as crianças se sentem bem consigo mesmas, mais facilmente aprendem e retêm informações, tendo uma imagem positiva do seu “eu”.

De uma forma geral, qualquer criança tenta cumprir os padrões socialmente impostos, os quais as crianças com dislexia têm dificuldade em atingir. O problema acentua-se pelo facto de que a Dislexia, enquanto dificuldade de aprendizagem específica da leitura, indica, por definição, que esta criança cometerá erros e será constantemente confrontada com o seu fracasso.

Uma criança com Dislexia está vulnerável às reações negativas das pessoas que a rodeiam, e à incapacidade de atingir as metas que traçou para si mesma. Na opinião de Sako (2016), estas crianças podem ter problemas para encontrar as palavras

certas, fazer uma pausa antes de responder a perguntas diretas, colocando-as em desvantagem quando entram na adolescência, altura em que a linguagem se torna mais central no relacionamento com os pares.

Para Cohen (2019), a chave para a redução dos sintomas emocionais da criança com Dislexia reside no fornecimento do apoio apropriado, permitindo-lhe experiências tão positivas quanto possível. É necessário contrariar a abordagem baseada no erro e avançar com a verificação de capacidades e progressos que a criança revela. Só deste modo, poderá reverter-se o ciclo de fracasso numa espiral de sucesso, edificando sentimentos de crescente autoestima e motivação, como motor de sucesso.

No contexto escolar a autoestima compreende as repercussões negativas ou positivas da vivência da criança na escola. Corroborando Nannis (1988), defendemos o paralelismo entre o desenvolvimento cognitivo e emocional, em que a criança tem de estar emocionalmente motivada para a aprendizagem. Neste sentido, torna-se imprescindível conhecer a Dislexia e perceber que os problemas emocionais surgem como uma reação secundária aos problemas de rendimento escolar.

Na maior parte dos casos, a Dislexia é detetada em idade escolar, sendo um período particularmente desafiante para o desenvolvimento da criança, pois enfrenta as exigências de uma escolaridade formal, a construção do raciocínio e desenvolve relações significativas com os pares, afirma a sua identidade de género e o seu desenvolvimento moral. Para Fontaine (1991), a autoestima influencia o modo como os indivíduos estão motivados, persistem, adquirem e atingem os níveis de sucesso desejados, nas mais diversas áreas de atividade.

Decorrente do exposto, é possível estabelecer uma relação entre a construção da autoestima e o comportamento socioemocional, pois é, sobretudo, através das relações sociais que as crianças vão construindo a perceção de si e dos outros e aprendem a regular o seu comportamento emocional. Para Lozada & Halberstadt (2015), o desenvolvimento emocional das crianças está estreitamente relacionado com os aspetos biológicos e com os sistemas sociais onde o processo de desenvolvimento de cada criança se vai desenrolando. É no seu contexto de desenvolvimento que se confronta e tenta dar resposta aos desafios que lhe são propostos. Segundo Schaffer (2010), estes desafios são colocados através das interações sociais que requerem um forte mecanismo de ajuste.

Segundo Denham (1998), um desenvolvimento socioemocional equilibrado é a componente-chave adequada para as crianças interagirem com seus pares, onde o conhecimento emocional é fundamental para a construção das relações sociais positivas.

Nas crianças com dislexia esta gestão no relacionamento socioemocional não é simples. Como já foi referido, apresentam, normalmente, problemas caracterizados por comportamentos de oposição e desobediência perante as figuras de autoridade,

sentem-se desmotivados, do que decorre um menor bem-estar emocional comparativamente com as outras crianças das suas idades.

Devido às suas dificuldades de aprendizagem, estas crianças vivenciam vários tipos de constrangimento que, segundo Frank & Livingston (2004), provocam pressão interna sobre a criança, gerando medos que causarão sempre um impacto emocional no seu dia a dia, comprometendo a sua interação social.

Neste sentido, é necessário apoio para que estas crianças possam interagir, de forma positiva, nos seus ambientes sociais.

Tendo como ponto de partida a análise de dois casos concretos, este estudo pretende compreender as vivências e conflitos socioemocionais das crianças com dislexia e identificar as suas dificuldades na gestão das interações com os seus pares e adultos de referência.

Capítulo II - Metodologia Empírica