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Capítulo 4 – A AVALIAÇÃO NA PESQUISA

4.1. A avaliação como instrumento de pesquisa transdisciplinar

Este estudo é uma pesquisa avaliativa, em que o conhecimento científico e sua conexão com as necessidades objetivas da sociedade de conhecimento aponta a necessidade de superação dos paradigmas sobre educação e trabalho, para o entendimento e ampliação de novos conceitos, ante esta nova conjuntura.

O ato de avaliar significa compreender, de forma contextualizada, todas as dimensões e implicações do objeto ou política avaliada. Isto é, visa a uma compreensão panorâmica do objeto, segundo Belloni et al (2007, p. 26), e não apenas uma visão diagnóstica ou uma comparação entre o previsto (metas) e o realizado (resultados), ou, ainda, a determinação de rankings. Tal compreensão deve estar enraizada social e historicamente no contexto social, político e econômico do objeto ou política avaliada.

Alguns estudiosos apontam para a tendência cíclica de perda de eficácia dos paradigmas científicos vigentes e para sua consequente crise e renovação. Essa perda de eficácia manifesta-se por crescentes instabilidades e assimetrias entre a teoria científica, os problemas propostos pela ciência e as demandas da sociedade. Segundo essa análise, a variação e a instabilidade de paradigmas constituem um fenômeno permanente na evolução das ciências. Entre os processos contemporâneos que aceleram a frequência dessas crises, destaca-se a transdisciplinaridade da pesquisa, que inferiu importância crescente ao longo das últimas décadas.

Na lição de Thomas Kuhn (1991, p. 221), “um paradigma é aquilo que os membros de uma comunidade cientifica partilham e inversamente, uma comunidade cientifica consiste em homens que partilham um paradigma”. O conceito de paradigma, na esteira desse pensamento, é atribuído no sentido de crenças, valores, técnicas e métodos que são compartilhados por determinada comunidade científica.

A ruptura de paradigmas é necessária, para que se possa atingir uma visão transdisciplinar da realidade, ou seja, é preciso ver a realidade também do olhar do outro, principalmente quando estamos avaliando. O foco de pesquisa pode ter uma nova dimensão se avaliado em conjunto, baseado em vários prismas de conhecimento, formados pelos diferentes pesquisadores-avaliadores.

Na transdisciplinaridade, o reconhecimento da existência de variados níveis de realidade é fundamental, em contraposição ao pensamento clássico da existência de nível único.

Apesar de reconhecer a importância das disciplinas, Morin (2006) argumenta que a disseminação de variadas disciplinas e a hiper-especialização das pessoas impedem tanto a percepção do global quanto do essencial, caracterizando uma visão fragmentada do mundo moderno.

As políticas públicas desenvolvidas atualmente refletem essa fragmentação. O aparato governamental, como anota Inojosa (2001), preocupa-se com cada uma de suas fatias e seus produtos, isoladamente. Dificilmente, conseguimos perceber, nos vários níveis de governo, a prática da avaliação de resultados. Faz-se a avaliação dos produtos oferecidos – quantas consultas foram realizadas, quantas cestas básicas estão sendo distribuídas, quais as obras terminadas – mas, de fato, que diferença isso fez para o grupo que vive em tal região, com tal perfil, para segmento tal ou qual, que tem determinadas características? Isso é algo que não se sabe nem se pergunta, ou, pelos menos, não está como fator de prioridade na avaliação feita.

inerentemente os fundamentos da ciência da complexidade. Ela propõe a supressão dos limites disciplinares, o que não significa a suprimir as disciplinas (OLIVEIRA, 2005).

Através de interações e parcerias, utilizando os instrumentos adequados para se fazer traduções e transposições entre áreas do conhecimento, sem as limitações das abordagens disciplinares, obteremos uma boa oportunidade de fazer avançar o conhecimento naqueles pontos em que as abordagens disciplinares, com seus reducionismos contextualizados, não conseguem romper com seus próprios limites. (OLIVEIRA, 2005, p. 248).

A esse respeito, a formação de espaços institucionais e acadêmicos para uma pesquisa transdisciplinar deve corresponder, em sua concepção, segundo Ricardo Toledo Silva (2005, p.01), “a um desenho diversificado e rico de conexões entre áreas de conhecimentos e entre estas e as entidades que planejam, operam e avaliam as políticas públicas”.

A atitude transdisciplinar é fundamental para que as pessoas envolvidas na avaliação, principalmente de políticas públicas, por serem de abrangência social ampla, possam, de fato, trabalhar de forma integrada e cooperativa, com uma visão menos fragmentada do mundo, com vistas a resolver problemas cada vez mais complexos.

No caso da pesquisa avaliativa de uma política de educação profissional, a complexidade dar-se-á principalmente pela proximidade e inter-relações de elementos de ordem biológica e psicossocial que necessitam ser considerados no processo global de desenvolvimento da pessoa humana. Também não é possível esquecer daqueles que envolvem e definem a estrutura da sociedade, bem como das expectativas de vida dos trabalhadores. Com efeito, Belloni et alii (2007) destacam que as inter-relações se articulam, entre outros, com o nível e democratização do conhecimento e com a inserção do trabalhador na educação.

O objeto da transdisciplinaridade, principalmente, em se tratando de uma política de educação profissional, que, por si, possui cunho ambivalente, por atender as expectativas do capital, e, por outro lado, ser vista como um direito universal do cidadão, é o complexo. E o complexo, segundo o paradigma da complexidade

proposto por Morin (2006), pressupõe a complexidade do raciocínio do observador, capacitando-o para apreender a complexidade da realidade a ser observada. Este é o par de contraditório no qual se debate o discurso interdisciplinar: a complexidade dos instrumentos utilizados pelo pesquisador e a própria dificuldade da realidade ontológica.

Não vemos como resolver esta contradição dentro de uma lógica de raciocínio binária, que é a base de nossas ciências, mesmo as sistêmicas, bem como das culturas de nossas instituições. Daí a necessidade de uma dialógica ternária, de pertinência difusa e simultânea, multidimensional e multirreferencial, como proposto pelo paradigma da transdisciplinaridade, principalmente quando estamos tratando da área social, que abrange as políticas públicas.

Para isso, é preciso que haja, como afirma Inojosa (2001), uma mudança de paradigma, um projeto político transformador.

Assim, a atuação em rede de compromisso social pode ser uma parte dessa solução, pois significa que o Estado vai se permeabilizando e se abrindo à sociedade, trabalhando não em setores, não em clausuras, mas com outros parceiros, uma verdadeira rede de compromisso, na qual instituições, organizações e pessoas se articulam em torno de uma questão da sociedade, programam e realizam ações integradas e articuladas, avaliam juntos os resultados e reorientam a ação.

Em resumo, a função avaliadora de eficácia pública de uma política e dos programas e ações que a compõem depende de uma articulação refinada entre diagnóstico, monitoramento e avaliação final, para a qual é imprescindível, em cada segmento das políticas públicas, o concurso de conhecimento gerado em pesquisa aplicada nas respectivas áreas, tendo como base a atitude transdisciplinar, que deve ser inerente a cada participante da equipe de trabalho, que é peça-chave para que a avaliação a ser feita realmente funcione sob a égide da transdisciplinaridade.

O que propomos, então, é uma pesquisa avaliativa que busque dar vazão a aspectos não tratados, ou melhor, não valorizados em outras pesquisas; ou seja, a

abrangência dos resultados e seus impactos na vida, não só no aspecto econômico, mas também social, dos beneficiários da política de educação profissional avaliada.

Na discussão teórico-metodológica sobre a educação profissional, Belloni et alii (2007) argumentam que, historicamente, predominam dois enfoques:

Um pragmático e utilitarista decorrente de uma perspectiva estrutural-funcionalista onde a educação deve adequar-se às necessidades da estrutura ocupacional, derivando daí uma visão economicista. Diante da preocupação predominante com o crescimento econômico e da estrutura ocupacional, esta perspectiva percebe restritamente a educação profissional como formadora de mão-de-obra para uma determinada profissão ou ocupação definida pelo mercado de trabalho; desta forma, omite grande parte da complexidade existente nas relações estabelecidas entre o âmbito educativo e o sistema produtivo. (P. 29).

Contraposição a este, há o segundo enfoque, pautado

[...] em uma concepção de sociedade, voltada para a justiça e igualdade, construída a partir da reflexão e da crítica às propostas vigentes, baseada em uma teoria mítica e histórica da educação. Busca superar os desafios apresentados pelos processos econômicos e formular uma proposta pedagógica que trate articuladamente os setores envolvidos, ou seja, os trabalhadores (protagonistas-sujeitos da relação entre trabalho e educação), o processo formativo, os requisitos atuais da organização do trabalho e da produção. (idem)

A esse propósito, importa lembrar que, a partir da segunda perspectiva, as pesquisas sobre as políticas públicas implementadas, os seus processos de formulação e o desenvolvimento das ações realizadas, salientam a importância de se adotar uma atitude de desenvolvimento que não seja excludente, ou, pelo menos, que atenue essa exclusão, que favoreça o acesso à educação de qualidade em todos os níveis, equalizando as diferenças das desigualdades regionais e privilegie o pensamento crítico, estabelecendo como regra a criatividade, na busca da inovação.

Considerando a ideia de que “avaliar significa compreender as atividades, fatos ou coisas avaliadas com vistas a estimular seu aperfeiçoamento” (BELLONI, et al; 2007), podemos dizer tratar-se da ênfase concedida à compreensão contextualizada de todas as dimensões e implicações da política, tendo em vista seu aperfeiçoamento, mediante a busca do envolvimento de todos os sujeitos (internos e externos) significativos ao objeto da política avaliada.

Nesta perspectiva, entendemos como importante – neste momento do percurso em que caminhamos em direção ao encontro de nosso objeto de investigação – a necessidade de apresentar ao leitor um breve relato da história da cidade – sede de uma extensão desse Centro de Educação Profissional. Dessa forma, pretendemos aproximá-lo das expectativas despertadas nesta pesquisa sobre as condições de desenvolvimento local e a inserção social dos capacitados neste Centro para a promoção de bem-estar social na região, por intermédio de uma educação que vise não só ao contexto mercadológico, mas também à de inclusão e desenvolvimento social.

Com base nessas, este capítulo contém reflexões teóricas e metodológicas para a avaliação da política de educação profissional do Instituto Centec, especificamente o Centro Vocacional Tecnológico – CVTEC do Aracati.