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A CAMPANHA IDEALIZADA E A CAMPANHA POSSÍVEL

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ª

FASE: A COMISSãO TECNICA DE

HELIO FRAGA (1954-1971)

1. Um modelo construído na luta

2. Reproduzindo o modelo e abrindo a rede

3. Um novo estilo de enfermagem

3

ª

FASE: OS PLANOS NACIONAIS DE

DESENVOLVIMENTO (1972-1979)

1. Da tuberculose à pneumologia sanitária

2. A migração da metáfora

·o passado é lição paro se meditar, não paro reproduzir'

1ª

FASE: O PROJETO PAULA SOUZA

E O FIM DA UTOPIA (1946-1953)

1. A CAMPANHA IDEALIZADA E A CAMPANHA POSSIVEL

Introdução

Este capítulo analisa as circunstâncias em que ocorre a criação_ da CNCT e que determinam as características de seu projeto inicial, a luta pela hegemonia no combate contra a tuberculose, a construção da mística da Campanha e também a mudança de orientação sofrida, após seu primeiro qüinqüênio de existência.

A Campanha surge em uma conjuntura de pós-guerra, quando a intensificação da penetração econômica norte-americana se faz acompanhar por uma marcada influência política, científica e cultural. O setor saúde importa processos e produtos tecnológicos, como a moderna organização hospitalar, métodos de treinamento e supervisão de pessoal, equipamentos e medica­ mentos (como a estreptomicina). Politicamente, a Campanha expressa a vontade presidencial de dar conta de um problema que vinha desafiando todos os governos republicanos, ao tempo em que representa uma prova de confiança na inteligência nacional.

Ao final da 2ª Guerra, nos países capitalistas centrais, a questão social é repensada,

passando-se a pregar uma maior intervenção do Estado nas políticas sociais. Este movimento insere-se em um processo de enfrentamento ideológico da "democracia liberal" com os projetos fascista e socialista de organização da sociedade, no qual a polarização leste-oeste marcou o que veio a se chamar de "guerra fria". Para prevenir o deslocamento dos países ditos subdesen­ volvidos para a "órbita comunista", os Estados Unidos elaboraram uma estratégia, formalizada num programa, cujo Ponto W referia-se à assistência técnica aos países eufemisticamente

situados como "em desenvolvimento", em razão do que em 1950 e em 1953, são firmados acordos Brasil-Estados Unidos. (Cunha, 1980, p.189). A não ocorrência de uma "revolução industrial", na maior parte dos países subdesenvolvidos, tomara-se objeto de reflexão dos economistas que, na procura de explicações para o fenômeno, desenvolveram a teoria do "capital humano": o problema do desenvolvimento não seria apenas uma questão da existência de meios materiais, máquinas e equipamentos, mas também uma questão de qualidade do trabalho. Gunnar Myrdal desenvolve a idéia do "círculo vicioso pobreza-doença" batizando-a de "causação circular cumu­ lativa". (Costa Filho, 1978, p.65-66). A Organização Mundial de Saúde (OMS) e a Organização Pan-Americana da Saúde lOpas) aceitam essa idéia, nela destacando as questões relativas à saúde e enfatizando a possibilidade de se romper o círculo vicioso através de investimentos na ârea da saúde. (Braga & Paula, 1986, p.30-31). Tal conceito envolve "uma constelação circular de forças, que tendem a agir e reagir independentemente, de sorte a manter um país pobre em

estado de pobreza", e corresponde a uma ampliação do raciocínio de que "um homem pobre talvez não tenha o bastante para comer; sendo subnutrido, sua saúde será fraca; sendo fraco, sua capacidade de trabalho será baixa, o que significa que será pobre, o que, por sua vez, implica dizer que não terá o suficiente para comer; e assim por diante." (Nurske in Arouca, 1976, p.109). A saúde da população brasileira passava assim a ser encarada, juntamente com a educação, como um problema básico e suas desfavoráveis condições como um entrave ao desenvolvimento econômico (Bodstein et ai, 1987, p.55 e Rodrigues, 1955, p.13-14), como demonstrava o nosso Jeca Tatú, verdadeiro anti-herói criado por Monteiro Lobato. (Lajolo, 1985, p.28).

Entre nós, a crítica a essa política de saúde foi liderada pelo médico Mário Magalhães da Silveira, em torno do qual se iniciou uma nova escola sanitária. Afirma ele que a teoria segundo a qual a resolução do problema da doença acarreta a solução do problema da pobreza conduziu à adoção do pressuposto de que se os países pobres tivessem a mesma estrutura sanitária que os países ricos e gastassem igualmente com as ações de saúde, alcançariam o mesmo nível de saúde que estes últimos. O grupo que se opunha a essa explicação da doença inverteu o sentido dessa relação saúde-desenvolvimento, apontando a melhoria das condições de saúde da população como conseqüência natural do desenvolvimento, daí porque atribuiam aos serviços de saúde um papel secundário na solução dos problemas sanitários. (Braga & Paula, 1986, p.7-8 e 59-60; Bodstein et ai, 1987, p.56; e Costa Filho, 1978, p.65-66).

A idéia do círculo vicioso reforça as proposições do planejamento como instrumento de "modernização", como forma de intervenção do Estado nos rumos da economia e das técnicas de planejamento como potencializadoras da atividade do Estado como promotor de saúde pública. A rentabilidade dos investimentos em saúde é demonstrada através da utilização das técnicas de custo/benefício, propiciando o entendimento dos problemas de saúde como elementos do próprio processo de desenvolvimento econômico, agora não apenas como efeito, mas como causa. (Braga & Paula, 1986, p.26-28 e Costa Filho, 1978, p.65-66). Essa concepção teórica informa o Plano Salte (Saúde, Alimentação, Transporte e Energia), primeira tentativa brasileira de planejamento global de desenvolvimento, econômico e social. São lançadas campanhas de proteção à maternidade e à infância, de erradicação da malária, e a de combate à tuberculose. No entanto, nas regiões não consideradas estratégicas para a inversão de recursos, sua atuação foi apenas de caráter assistencialista, de modo a atenuar as tensões sociais. Apesar disto, o plano Salte foi importante para a legitimação das ações de saúde como instrumentos da política nacional, em termos do discurso oficial, ao tempo em que serviu ao combate de algumas doenças de grande repercussão econômica. (Bodstein et ai, 1987, p.54-56 e Braga & Paula, 1986, p.56). A intensificação da penetração do capital estrangeiro no país ocorreu principalmente nos setores industriais mais dinâmicos, como a indústria química e farmacêutica. A internacionalização da indústria farmacêutica ajustava-se aos parâmetros desenvolvimentistas, defendidos pela Comissão Mista Brasil-&tados Unidos, na medida em que, por um lado, esse setor apresentava um campo de alta lucrntividade para o capital e, por outro, porque seu desenvolvimento podia ser visto como uma contribuição para a melhoria das condições de saúde da população, por meio da introdução e da utilização de medicamentos modernos. Na verdade, eles causaram um certo impacto no quadro de mortalidade, pelo menos nas capitais brasileiras e principalmente no que

se refere às doenças infecciosas e parasitárias, que no entanto permaneceram como a primeira causa de óbitos. (Bodstein et ai., 1987, p.55,58e fig.l ).

A Campanha: bases legais e pressupostos

À época da instalação do governo Outra, em fins de 1945, e por sugestão do ministro Souza Campos, a luta contra a tuberculose é incluída no programa de governo. Em 1946, ano em que a estreptomicina, primeiro antibiótico específico para o tratamento da tuberculose, descoberto nos Estados Unidos, é lançada no mercado, (Fraga, 1%1, p.16), o presidente Outra, durante a fase de elaboração da nova Constituição, sanciona o decreto-lei nl29387/46, que institui a Campanha Nacional Contra a Tuberculose. A CNCT, sob a orientação, coordenação e fiscali­ zação do SNT, deveria "coordenar e supervisionar as atividades desenvolvidas por todos os ór­ gãos de saúde, governamentais ou particulares, efetivando-se através de medidas de profilaxia e assistência, ensino, pesquisas, educação e ação social ... em todo o território nacional [com] preferência às regiões ou localidades [de] maior incidência de tuberculose". (Brasil, 1966, p.63- 64).

A criação da CNCT trouxe ao diretor do SNT enorme poder e prestígio, na qualidade de supervisor e responsável pela Campanha, que gozava de grande autonomia financeira e técnica. As bases legais da Campanha autorizava o diretor do SNT a:

- solicitar a colaboração de órgãos federais de assistência ou serviço social; firmar ajustes de cooperação com os Institutos e Caixas de Aposentadorias e Pensões; estabelecer acordos com as autoridades estaduais e municipais de sa6de e com outras entidades oficiais; elaborar programas a serem desenvolvidos pela Legião Brasileira de Assistência e outras instituições subvencionadas pela União; dar parecer sobre pessoas ffsicas e jurídicas que se dispusessem a colaborar com a Campanha.

A determinação legal de que o plano da Campanha, bem como a prestação de contas das despesas, deveriam ser apresentados pelo diretor do SNT diretamente ao Minis�ro de Estado, caracteriza sua dimensão política. Ainda mais: o decreto-lei determinava que as verbas destinadas à Campanha (orçamentárias e adicionais) fossem depositadas em conta especial no Banco do Brasil à disposição do Diretor do SNT, que delas podia lançar mão para: o pagamento de serviços de pessoal, mediante simples termos de ajuste; passagens e diárias de servidores federais, estaduais ou municipais; subvencionar instituições públicas ou privadas e manter órgãos de profilaxia e assistência.

As atividades da CNCT seriam desenvolvidas mediante um programa de tipo vertical e centralizado, quanto ao estabele-cimento de diretrizes e normas e à tomada de decisões (como de resto era diretriz geral de governo) através as três Seções do SNT: a de Epidemiologia, a de Organização e Controle (SOC) e a de Administração. Os recursos da CNCT foram garantidos pelo decreto 0222284/46, inicialmente por cinco anos. (Brasil, 1966, p.65). O primeiro Superintendente da Campanha, nomeado ainda no primeiro trimestre de 1946, Raphael de Paula Souza, assim resumiu as diretrizes da Campanha:

1 2 -

e respeitar, na execução de seu programa, a intangibilidade do preceito constitucional relativo 1l autonomia administrativa e política das unidades federativas;

22 - promover ... a mobilização nacional dos recursos oficiais, para-estatais e privados, aplicados ou a aplicar no trabalho comum, daí provindo seu caráter eminentemente impessoal, cooperativo, democrático, tornando-se o combate ao flagelo um movimento de todos, na defesa de nossa sobrevivência;

3 2 - assumir, como órgão central responsável, os encargos relativos aos estudos básicos e ao planejamento da luta sistematizada contra a doença. (Ribeiro, 1956, p.178-179 e MES, 1951, p.8).

Apesar das ressalvas à autonomia dos estados, ao caráter coletivo do empreendimento, e ao interesse geral da comunidade, a criação da Campanha não parece ter recebido a aprovação de todos. As características mesmas de uma campanha revelam_ seu caráter centralizador e concentrador de poder, pois "a execução de uma campanha representa operação em que se adotam métodos de planejamento e ação militar, com setores táticos bem definidos para servir à estratégia global, cuja coordenação está centralizada no estado-maior, sob um comando único". Do ponto de vista técnico, sanitaristas julgavam que este tipo de estrutura deveria ser reservado a programas provisórios, com metas, prazos e esquemas de trabalho predeterminados e não para atividades ordinárias de controle de determinada doença, que por vezes se prolongavam indefinidamente, podendo tornar-se um "mero artifício, visando a permitir maior flexibilidade no emprego dos recursos que são atribuídos, no orçamento, aos vários órgãos da administração ... " (Rodrigues, 1967, p.217).

A partir da criação da Campanha e da nomeação de seu superintendente, equipes de trabalho passaram a reunir os dados disponíveis e a fazer levantamentos estatísticos para a formulação de uma luta sistematizada contra a tuberculose, dividindo o país em zonas, conforme a situação epidemiológica e o montante dos recursos necessários. (MES, 1947). Esses estudos, realizados durante o ano de 1946, demonstraram que:

- "a tuberculose se distribui irregularmente pelo país, com determinados centros altamente infectados e em fase epidêmica, e outros, apenas levemente, ou mesmo até virgens do mal" (p.27);

- "a doença se propaga dos grandes núcleos demográficos aos demais, seguindo trilhas cuja demarcação é assinalada pela intensidade de intercâmbios" (p.27);

- "o contágio inter-humano, favorecido pelo intenso intercâmbio, promiscuidade, habitação, estafa, miséria ... são "fator preponderante da tuberculização intensiva .. ." (p.27,29,31);

- os 3220 leitos construídos no período 1937-1946 não foram suficientes para compensar o aumento do número bruto de doentes ocorrido no período (p.36);

- os cerca de 6800 leitos existentes recebiam cerca de 90% de incuráveis, sem possibilidade de se beneficiarem do esplendor de seu arsenal médico-cirúrgico" (p.38);

- era "baixíssima" a sobrevida dos doentes internados, calculando-se que mais de 90% deles morria com menos de seis meses de internação, 70% com menos de dois meses e 25% com menos de duas semanas (p.36-38).

A proposta tinha como pressuposto básico a valorização da saúde do trabalhador e de sua família, como direito devido à sua condição humana, como questão de justiça social e como necessidade econômica para o progresso da nação, bem dentro das concepções da teoria do "capital humano". No Programa para a Campanha Nacional Contra a Tuberculose (1947), o dire­ tor do SNT ressalta a falta de meios "para custear a enorme massa de tuberculosos considerada indigente", situação esta que "estende seus malefícios tanto aos que dependem de sua capacidade

de trabalho e que são arrastados à miséria, como aos próprios orçamentos públicos ordinários, que não se sustêm sob tão grande peso." (p.10). Observa que o trabalhador brasileiro, "cujo único capital é a saúde", quando contrai a tuberculose, "na hora em que mais necessita do apoio

dos órgãos que, quando tinha saúde, ajudou a manter, recebe auxílio tão reduzido que não dá sequer para seu sustento e o dos seus, quanto mais para seu tratamento" (p.9). As conseqüências desse estado de coisas, argumenta ele, são adversas também para os hospitais e dispensários gratuitos, oficiais ou privados, que se encontram superlotados de comerciários, industriários, servidores públicos, atendidos como "indigentes". &ta "imprevidência" tem efeitos desastrosos para a luta contra a tuberculose e leva os doentes a adotar um comportamento trágico: "o tuber­ culoso, conhecedor do triste futuro que o aguarda e aos seus ... esconde seu mal o quanto pode e só quando sua moléstia se agrava e se torna patente aos olhos do próprio leigo e suas forças se esvaem, é que ele se entrega à dura realidade e já então sem possibilidade de recuperação." (p.9-1 O). A solução para ele é chamar os institutos previdenciários às suas responsabilidades: "a correção nos parece exequível, se os órgãos de previdência participarem ativamente da luta, encarregando-se da profilaxia e da assistência de seus associados e beneficiários. Dessa forma, deixariam estes, doravante, de ser indigentes e passariam a ser indivíduos com o direito à saúde, que, ao

fim,

é seu único capital. Com essa participação, além desse direito à saúde que lhe seria reconhecido, a subsistência dos seus ficaria garantida, recebendo então o trabalhador, na hora exata, o auxllio que lhe é devido. Como já há organizações de previdência, a elas deveria caber o encargo de manter seu associado, com o padrão de vida de antes de adoecer." (p.9-10).

O projeto e as críticas

Da análise do Programa para a CNCT destacamos, embora não na mesma ordem de apresentação, as principais diretrizes e metas que constituíram "os pontos fundamentais do plano", isto é, aqueles que na visão de seu idealizador seriam imprescindíveis "para se compreender o sentido a ser dado a ela e as razões que nos induziram a encaminhá-la dessa forma" (p.58):

- trabalhar nos 66 municípios onde ocorriam 80% dos óbitos: uma primeira etapa considerava apenas a 4 ou 5% dos 1574 municípios brasileiros, entre os quais as 21 capitais (p.3le33);

- isolar 22 mil focos: a meta era a de suprir o deficit de 14 mil leitos, tendo como base de cálculo 1 leito por óbito anual, pondo em funcionamento 1 186 leitos já construidos e sem doentes e mais 2500 por terminar, e depois construir

3500 leitos por ano, durante três anos. (p.42-43);·

- criar um modelo de sanatório popular, de baixo custo e custefo e de fácil adaptação aos variados ambientes do país, e que oferecesse condições mínimas de conforto e funcionamento; (p.42).

- instalar um dispensário por 100020 mil habitantes, para desenvolver medidas profiláticas, terapêuticas e sociais, ll base de abreugrafias em larga escala e educação ativa "sobretudo onde há o exemplo vivo da doença." (p.50e56); - promover a preparação de pessoal: tisiologistas, médicos especializados em organização e administração hospitalares,

enfermeiras de saôde pôblica de alto padrão, educadoras sanitárias, assistentes sociais. (p.17);

- incrementar a vacinação BCG: uniformizar o preparo da vacina, estabelecer um esquema de imunização e um sistema de controle dos vacinados. (p.53-54);

- promover o desenvolvimento científico e tecnológico: organizar um laboratório para a pesquisa e para a fabricação e padronização de produtos biológicos, como a tuberculina e o BCG; e fazer o intercâmbio científico e cultural, dentro e fora do país. (p.23-25);

- promover o controle democrático das ações, com participação das diversas camadas sociais, mediado por "conselhos assessoriais", compostos por "elementos exponenciais" e "classes representativas•, dirigidos pelo representante local da Campanha. (p.12-15);

- contribuir para o levantamento do nível da população, sendo no entanto mais urgente organizar o armamento sanitário, para lutar contra a doença, pois •a tuberculose, antes de ser uma molêstia social, ê molêstia infecto­ contagiosa". (p.55-57).

As fontes de financiamento direto da CNCT eram fundamentalmente as verbas ordinárias do orçamento da União, mais uma porcentagem do selo de educação e saúde. O orçamento previsto para 1947 era de 60 e meio milhões de cruzeiros, os quais foram divididos em apenas três ítens, com uma preponderância de 80% para as obras iniciadas, novas construções e instalações e auxflio _técnico em pessoal e material para os hospitais. Para as providências equivalentes relacionadas aos dispensários couberam 12% da verba. Os 8% restantes eram destinados ao ensino, pesquisa, educação e ação social, incluindo a formação de duzentas "enfermeiras de saúde pública da Escola Anna Nery, a especialização de médicos, e bolsas no exterior. O Programa apresentado por Paula Souza ao novo ministro, Clemente Mariani, foi aprovado em março de 1947. A antevisão das dificuldades a serem enfrentadas na implemen­ tação das propostas da CNCT é explicitada nos comentários finais do plano da Campanha (p.58), onde se reconhece que "o sucesso da empreitada dependerá, em grande escala, da capacidade política de coordenação de esforços para que a luta se processe como um todo", apesar "do imediatismo de nossa geração!', gerado pela "crise ditatorial por que atravessou o país" ... levando

a um conceito exagerado de autonomia e a um "espírito individualista". Por solicitação do diretor do SNT, o plano geral da Campanha foi apresentado à Sociedade Brasileira de Higiene e à Sociedade de Medicina Social e do Trabalho. Apesar desta preocupação de legitimar o plano, sua decisão de priorizar os gastos com sanatórios foi contestada na 4ª Conferência Regional

(Rio-SP) de Tuberculose , realizada sob a presidência do prof. Manoel de Abreu; as Conclusões

Gerais do evento apresentam a declaração da impossibilidade e impropriedade da meta "1 leito

por óbito", pois "a tuberculose resulta em grande parte das condições sociais: educação, padrão de vida, riqueza econômica, parque industrial, nível técnico e científico ... ". Ao contrário, considera-se o Dispensário Dinâmico "o fator decisivo na profilaxia da tuberculose, tendo em vista a situação epidemiológica do Brasil." Propõe-se a obrigatoriedade do exame radiológico periódico da população em geral e dos empregados com falta ao trabalho por motivo de doença, a vacinação BCG obrigatória para os recém-nascidos e para os não reatores à prova tuberculínica, bem como o amparo ao tuberculoso e sua família. (in Ribeiro, 1956, p.376esegs).

A polêmica sobre o órgão que deveria ter a primazia na Campanha correspondia a dois pontos de vista doutrinários. A corrente favorável ao sanatório alegava a necessidade de inter­ romper a cadeia de transmissão da doença, isolando-se a maior parte dos focos, e a ineficácia do tratamento ambulatorial, na maioria dos casos. A corrente favorável ao dispensário baseava­ se na hipótese de que se poderia descobrir, mediante o cadastro torácico em massa, a maioria dos casos em um estágio menos avançado da doença, o que aumentaria as chances de sua recuperação; o dinheiro economizado poderia ser empregado na execução de medidas de promoção da qualidade de vida, o qual produziria resultados mais gerais e duradouros. Paula Souza justifica a decisão por ele tomada, lembrando que "a maioria dos trabalhos de luta

antituberculosa ... em São Paulo, como em todo o mundo, dava realce à hospitalização; e que apesar da abreugrafia ter permitido a "expansão do setor ambulatorial", ao possibilitar o diagnóstico de casos menos avançados, aos quais se poderia aplicar o pneumotórax, "na frieza dos números, não estava dando o resultado sanitário que se esperava", além de que muitas vezes o pneumotórax "resultava em desastre, como empiema e outras conseqüências graves", sendo então necessário se desenvolver muito mais o diagnóstico precoce". E apresenta um argumento convincente ao lembrar que "quando a gente entra em uma técnica tão terrível como a toracoplastia, que deformava o indivíduo, e que muita gente morria depois, de conseqüências cárdio-circulatórias, vê-se que os métodos mais fáceis não tinham sido suficientes"; do mesmo modo alega que "não teríamos tido necessidade de desenvolver a cirurgia torácica ao ponto em que se desenvolveu ... se não fossem tão negativos os resultados obtidos pelos especialistas em

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