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Segundo a visão experiencialista, os sistemas conceituais são organizados em termos de categorias, e grande parte — e por que não dizer todo o nosso pensamento — envolve essas categorias. Porém, os fundamentos dessas categorias conceituais diferem daqueles adotados pela visão objetivista, o que implica, também, uma percepção diferente da razão humana que, dentre outros aspectos e a partir de evidências provenientes dos estudos sobre a forma como as pessoas usam a atividade de categorização, passa a ser compreendida como incorporada e imaginativa. Nesse enfoque, a base de nossos sistemas conceituais está na percepção, no movimento corporal e na experiência realizada tanto no ambiente físico como no ambiente social. Os conceitos não fundamentados diretamente na experiência vinculam-se ao emprego da metáfora, da metonímia e das imagens mentais, indo além de uma representação especular da realidade externa, de forma que a capacidade imaginativa deve ser vista como indiretamente corporal, posto que as metáforas, as metonímias e as imagens mentais são também baseadas, freqüentemente, na experiência. Além disso, é essa

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In fact, until very recently, the classical theory of categories was not even thought of as a “theory”. It was taught in most disciplines not as an empirical hypothesis but as un unquestionable, definitional truth.

capacidade imaginativa que leva em conta o pensamento ‘abstrato’ e conduz a mente além do que nós podemos ver e sentir25 (Lakoff, 1987:xiv). De uma maneira menos óbvia, o caráter imaginativo do pensamento emerge cada vez que categorizamos alguma coisa de uma forma que não espelha a natureza, utilizando capacidades humanas imaginativas gerais. Por isso, Lakoff (1987) defende que

sem a habilidade de categorização, nós não poderíamos funcionar em plenitude, nem no mundo físico nem em nossa vida social e intelectual. O entendimento de como categorizamos é fundamental para o entendimento de como pensamos e como funcionamos, e portanto, fundamental para uma compreensão do que nos torna humanos26 (Lakoff, 1987:6).

Lakoff (1987) também chama a atenção para o fato de que a maior parte da atividade de categorização se processa de forma automática e inconsciente. Com efeito, categorizamos pessoas, animais e objetos físicos automaticamente, o que, na maioria das vezes, conduz à falsa impressão de que categorizamos as coisas justamente como elas são e de que nossas categorias mentais naturalmente se ajustam aos tipos de “coisas” que existem no mundo, numa perfeita relação de correspondência. A inconsistência desse pressuposto diz respeito à questão de que boa parte de nossas categorias simplesmente não são categorias de “coisas”, mas categorias que representam entidades abstratas, tais como eventos, ações, emoções, relações espaciais e sociais, bem como outras entidades abstratas de um enorme alcance. Nesses termos, segundo Lakoff (1987), qualquer descrição adequada do pensamento humano precisa propiciar uma teoria que englobe todas as categorias, tanto as concretas quanto as abstratas.

Outro aspecto importante na concepção das categorias, sob a ótica experiencialista, é que os conceitos possuem uma estrutura global, não sendo atomísticos, ou seja, tal estrutura vai além de um mero agrupamento de blocos conceituais por meio de regras gerais. Ademais, considerando que o pensamento também tem uma estrutura ecológica, a eficiência do processo cognitivo depende tanto da estrutura global do sistema conceitual quanto do significado dos conceitos, o que justifica a crítica de que o pensamento é muito mais do que a manipulação mecânica de símbolos abstratos.

Para Lakoff (1987), os estudos contemporâneos sobre a categorização (Rosch e colaboradores), conforme trataremos posteriormente, evidenciam que essa matéria é mais

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It is this imaginative capacity that allows for “abstract” thought and takes the mind beyond what we can see and feel.

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Whithout the hability to categorize, we could not function at all, either in the physical world or in our social intellectual lives. An understanding of how we categorize is central to any understanding of how we think and how we function, and therefore central to an understanding of what make us human.

complexa do que sugere a visão clássica, urgindo a substituição desse ponto de vista por concepções que sejam não somente mais precisas, mas também mais humanas. Segundo o autor, esses estudos, tomados em conjunto, parecem prover evidências favoráveis à visão experiencialista, em contraposição à visão objetivista.

Evidências de que a mente é mais do que um mero espelho da natureza ou um processador de símbolos, que não é acidental para a mente que nós temos corpos, e que a capacidade para a compreensão e significação de pensamentos vai além do que qualquer máquina pode fazer27 (Lakoff, 1987:xvii).

Entendemos que o processo de categorização não pode ficar restrito à visão objetivista, uma vez que essa vertente, do ponto de vista dos nossos objetivos, apresenta-se bastante limitada, ao tempo em que contraria o nosso princípio de trabalho com a concepção de cognição incorporada. De forma que seria pouco provável falar de (re)categorização metafórica, nosso objeto de estudo, seguindo tal linha de pensamento, que se molda numa visão especular da natureza da cognição. Assim, a visão experiencialista mostra-se mais propícia aos nossos objetivos, uma vez que trabalha a natureza do conhecimento numa perspectiva muito mais ampla, na qual prevalece o entendimento de que a razão humana é incorporada e imaginativa, compreendendo-se que a categorização não pode ser vista simplesmente como uma matéria do intelecto, pois ela é parte daquilo que nossos corpos e

cérebros estão constantemente envolvidos em fazer28 (Lakoff e Johnson, 1999:19). Abre-se espaço, então, para estudos do tipo deste, que agora empreendemos.

Como a atividade de categorização está diretamente vinculada à formação de conceitos, julgamos necessário apresentar as diferentes concepções sobre a natureza dos conceitos. Antes, porém, é importante definir esse termo. Para tanto, recorreremos a Lakoff e Johnson (1999), que definem os conceitos como estruturas neurais que nos permitem

caracterizar mentalmente nossas categorias e raciocinar sobre elas29 (Lakoff e Johnson,

1999:19).

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