• Nenhum resultado encontrado

2. O Nascimento do Reino de Benguela e os Entraves Geopatológicos do

2.3. A Comuna da Catumbela no contexto da Geografia Médica: o nascimento

Benguela

Na atualidade Benguela, Lobito e a Comuna da Catumbela formam conurbação importante e estratégico na economia do Centro Sul da República de Angola.

Há três fatores conjugados, que levaram o desenvolvimento para região, entre elas destacamos: o Porto do Lobito, os Caminhos de Ferro de Benguela e a fronteira com países colonizados pelos ingleses. Lugares estes em que ocorrem não apenas uma luta desenvolvimentista como também entraves sanitário-ambientais.

Nos detalhes sanitário–ambientais, não coube à história oficial uma análise, em função da expansão capitalista que estava em jogo na economia da própria colônia. Assim, a suspensão desta condição, recaiu nas buscas incessantes dos governantes bengueleses afins, de encontrarem um lócus ideal na construção da nova capital do reino, mais tarde capital da província de Benguela.

Na luta pela salubridade, contra o Paludismo, na Vila da Catumbela, quase se tornou capital.

Segundo a Sociedade de Geografia de Lisboa, a vila foi fundada em 1836 através do Decreto de Dona Maria II, Rainha de Portugal. A vila nascera com forte alarde comercial e agrícola, principalmente em função da extração da borracha, matéria-prima importante e básica no século XIX, nas exportações do Porto de Benguela.

Além do comércio, os sobados da Catumbela, tinham grande poder naquelas áreas, assim os acordos de paz, vieram não só conciliar, mas também, determinar o avanço econômico nas fazendas que circundavam toda a Vila da Catumbela.

Situada na margem direita do Rio Catumbela, aproximadamente 06 (seis) quilômetros da praia da Baía do Lobito, na margem esquerda, cerca de alguns quilômetros da Vila atual, tínhamos a Fazenda São Pedro na conhecida Lagoa do Negrão, cercada de pequenas colinas de terras vermelhas.

Ao fundo da bacia do Rio Catumbela ficava a Vila, em local onde o rio desprende da garganta e corre de forma apertada; de um lado, os morros com declividade, onde durante milhões de anos, o mesmo passou e escavou seus meandros.

Na base destes morros, no período da fundação ficavam alguns pântanos, mas que não produziam tantos mosquitos como em Benguela devido ao movimento constante das águas do rio. Mesmo assim, nos meses de janeiro até abril, época das suas cheias, os pântanos aumentavam e conseqüentemente os miasmas e mosquitos malignos tornavam-se insuportáveis originando as endemias de febres palustres, perniciosas e biliares nas várzeas do mesmo.

Atualmente, a Vila é uma Comuna sob administração do Município do Lobito. Os mosquitos vetores, ainda reproduzem-se em grande quantidade, como conseqüência, tem a Malária Epidêmica persistindo no crepúsculo do dia em revoadas pelas ruas da Vila.

Reza a tradição indígena que o primeiro Soba e também fundador da Catumbela não era homem, mas sim uma mulher. Evidenciando que as mulheres sempre representaram uma forte liderança na cultura angolana. A área onde a Vila assentava-se abrangia os bairros do Namano, Cangato e Cuio, nos quais, proliferavam as senzalas da gente da terra. Outra parte da comunidade era oriunda das regiões de Quissange, Cuhula e Hanha.

A Catumbela nos seus primórdios contava com quatro sobados, sendo que três situavam-se na margem direita (Chimbaca, Chirianjamba e Gorongo) e outro na margem esquerda, denominado de Lago do Negrão.

A Catumbela conheceu o crescimento e a decadência comercial num curto período temporal, entre 1837 até 1874. Os produtos deste crescimento eram: cera, marfim e a borracha de primeira qualidade. A partir de 1874, a goma e o couro seco caem violentamente da pauta de exportação, assim, e atinge sua harmônica vida comercial e social, começou a desaparecer gradativamente ano após ano.

A crise passou em todos os setores, mas o que chama atenção é a dizimação gradual da população pela Doença do Sono, pela Tuberculose, Malária e uma forte epidemia de Varíola, em 1864.

Notadamente, Catumbela conheceu 04 (quatro), grande períodos na sua fundação:

• O primeiro, de 1836 até 1846, foi marcado por forte exportação do marfim e borracha.

• O segundo período foi de 1846 até 1856, onde a população urbana se adensou; marcado nas fortes construções nas áreas centrais da vila.

• O terceiro de 1856 até 1864, onde se instalou o início da sua decadência econômica, assim como o sonho de transformar-se na capital do Reino de Benguela.

• O último período foi de 1864 até 1874. O que chama atenção na Vila da Catumbela 54 foi sempre o espírito dos habitantes da vila, conhecidos por serem

hospitaleiros e francos, prontos para receber e cercar de todas as atenções os forasteiros.

Aliás, na Catumbela atual ser hospitaleiro e gentil faz parte da tradição, a Vila é pura simpatia aos seus visitantes.

A Vila prosperou urbanamente, com destaque, e esforço individual do Sr. Francisco José de Freitas, que chegará à Catumbela no início da sua fundação e criou, no caminho da praia, condições deste ser transitado por carros, aterrando o célebre terreno pantanoso, conhecido como “treme-treme”.

A indústria foi outro fator fundamental no avanço da Vila, pois, constituíram- se da fabricação de telhas e tijolos, provenientes das argilas retiradas nas proximidades do rio, além da fabricação de cal.

Houve uma ligeira tentativa de produzir pólvora e sabão, mas tal idéia foi descartada pela indústria por não atingir resultados esperados. A entrada da borracha, que era exportada em pipas, aumentou o movimento comercial, tornando então a Catumbela digna da rival Benguela, aumentando população flutuante, representada pelos gentios que traziam os negócios.

Mesmo com um bom desempenho no campo econômico, com forte comércio, a situação sanitário-ambiental da Vila da Catumbela não era das melhores, tanto

54 “Os poucos os comerciantes de então, viviam em convívio alegre e harmônico, trabalhando

de dia e divertindo–se de noite”.

Não havia então as mesquinhas políticas de desarmonia e guerra entre eles, até mesmo porque estavam isoladas da capital do reino. (...) Com o aparecimento da borracha, começou a praça de Lisboa á conceder mais amplos créditos às casas de Catumbela, e começaram os jogos do negocio, abandonando–se a pouco e pouco o negócio. Estabelece-se neste período o transporte por carros de Catumbela para praia”. (BASTOS, 1912, p. 24).

para os europeus, como para os indígenas. Constantemente havia situações de riscos epidemiológicos, a febre palustre não poupava ninguém dos seus ataques.

O grande drama para os moradores ocorria nos períodos das cheias, os bairros no sopé das colinas ficavam totalmente inundados aumentando a proliferação dos mosquitos. Assim, parte da população, nos períodos epidêmicos, tinha que se deslocar rapidamente para a cidade de Benguela, por não haver hospital na Vila.

Em 1885, o primeiro médico, Dr. Carvalho chegou à Vila, acompanhado dos doutores: Brito de Vasconcelos, Feio de Azevedo Lopes, Henrique Maria de Aguiar Gonçalves, José da Cunha, Carlos Correa Botelho da Silva. A chegada dos médicos foi vista com contentamento pelos moradores que visualizaram a possibilidade da construção do seu primeiro hospital, mais tarde seria denominado de “Hospital da Catumbela” em funcionamento plenamente até os dias atuais.

Desfeito o sonho de mudar a capital para Catumbela, pensaram na possibilidade de mudar a capital para a Baía do Lobito, já que nesta área havia menor insalubridade devido à ausência de pântanos. Porém, o Lobito possuía um grande entrave: nesta baía havia uma dificuldade intensa em obter água potável, isto exigiria um custo enorme por parte do Governo Local e Ultramarino. Toda água encanada deveria ser extraída do Rio Catumbela, este fato levou as autoridades rejeitarem tal projeto e relegaram tais obras para um segundo plano, somente desenvolvido na construção de um novo Porto, que, atualmente, é considerado o segundo em importância na República Angola.

A persistência palúrica ou do Paludismo e o aparecimento de outras epidemias como Cólera, Febre Tifóide e Varíola levaram as autoridades locais procurarem lugares com temperaturas menores e ausência de pantanais, possibilitando ao Lobito, uma alternativa no sentido de se tornar nova capital do reino.

O refúgio desde lugar apareceu como possibilidade para resolver definitivamente todas as situações de mortalidade em função das dificuldades em viver naquela cidade insalubre.

Mesmo com os problemas sanitário-ambientais da época, a população de Benguela cresceu, dobrando entre 1897 e 1933. Tal crescimento ocorreu pelo fato das motivações feitas através do “império português”, entre elas, os projetos de assentamentos dos imigrantes europeus, ao longo do Caminho de Ferro de

Benguela, na linha férrea do Lobito até a Fronteira da Zâmbia, num total de 1.290 (mil duzentos e noventa) quilômetros.

Tal assentamento forçou, no século XX, um crescimento populacional, não só nas zonas urbanas, como também nas zonas rurais, denominado pelo império de “Fazendas Experimentais”, atuavam sob supervisão da Companhia do Caminho de Ferro de Benguela. Conforme observamos na Tabela 10 abaixo:

TABELA 10: CRESCIMENTO POPULACIONAL DA PROVINCIA DE BENGUELA 1897–1933 1897 1.392 Habitantes 1920 3. OOO Habitantes 1930 5. OOO Habitantes 1933 5.742 Habitantes Fonte: Castelbranco, 1935, p. 35

Este crescimento populacional, notadamente no início do século XX, precisamente na década de vinte e trinta, marca nova realidade econômica e social na província de Benguela. Conforme tabela acima, um dos fatores desta mudança foi o avanço da Companhia Caminho de Ferro de Benguela ou C.F.B. Esta alavancou o novo progresso econômico nas exportações do Porto de Lobito, em direção á fronteira da Zâmbia, enfim, o Lobito ligou-se a toda África Austral.

Neste contexto, a Catumbela também passa a ser um local privilegiado com sua famosa Estação Ferroviária frontal para Vila.

A necessidade da criação de novos espaços urbanos vem acrescida dos novos problemas epidemiológicos, que na verdade nunca foram suprimidos, mesmo em pleno século XX, onde a Medicina já havia avançado no campo epidemiológico faltavam recursos para investimentos contra gravíssimas doenças que assolavam Benguela, Lobito e Comuna da Catumbela.

Assim, o Estado passou a receber pesadas críticas em relação às políticas públicas na área da saúde aplicadas nas colônias: Angola, por ser a “jóia do império português” também sofreu com esta demora nas atitudes na saúde pública e ambiental.

Por outro lado, havia algumas perspectivas com viabilidades econômicas, por exemplo, o desenvolvimento do Porto do Lobito, que nascia, não somente como opção econômica, mas também como forma do sanitarismo ambiental.

Lobito deveria ser uma cidade planejada nos moldes sanitários, onde questões como: insalubridade e epidemias deveriam ser questionadas na implementação urbanística da cidade.

Neste aspecto, as residências deveriam ficar totalmente do lado oposto do Porto e também com certa distância razoável das salinas, onde conseqüentemente até hoje existem águas paradas. Tais providências evitariam uma luta que somente seria amenizada no século XX, através da administração do Dr. João Ornelas. Este eliminou os pântanos e lagoas, que rodeavam toda a cidade através do aterro dos mesmos, terminando, assim, com o ciclo ou “lenda de Benguela”, conhecida como terra dos mosquitos, do Paludismo, na qual a peste era principal causa dos óbitos diários.

Já para Lobito não poderia ser desta forma, o planejamento urbano buscaria uma solução para colocar fim da insalubridade, além do Paludismo e da falta de higiene sanitária.

Lobito acenava um sonho antigo de ser a capital da província, porém faltava apenas o dinheiro, que viria da Inglaterra, na implementação do “Porto de Lobito”.

A área, era considerada geograficamente ou geomorfologicamente ideal na construção de desembarque dos navios de grande porte. A natureza foi generosa com o lugar onde apareciam os famosos manguezais e a brilhante formação de restinga, resultado dos aluviões, com constantes regularidades das areias carregadas tanto pela baía de Benguela, como do rio Catumbela, o que deu origem em forma de língua a uma larga faixa de terra ao longo do local portuário.

3. O CAMINHO DE FERRO DE BENGUELA E O DESENVOLVIMENTO