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A CONCEPÇÃO TEÓRICA DE REILY SOBRE A EDUCAÇÃO INCLUSIVA

2 UM OLHAR SOBRE A TRAJETÓRIA DA EDUCAÇÃO INCLUSIVA

2.3 A CONCEPÇÃO TEÓRICA DE REILY SOBRE A EDUCAÇÃO INCLUSIVA

Para realização deste item, utilizamos o livro “Escola Inclusiva, linguagem e mediação”, de autoria de Lúcia Helena Reily, que tem como objetivo oferecer uma fonte que de informações abrangentes sobre o trabalho do professor na sala de aula inclusiva, ela organizou com uma linguagem acessível, os problemas mais corriqueiros que acontecem no dia a dia do professor e seus alunos com necessidades especiais da rede de ensino regular. Com esse livro, ela levantou um diálogo com as escolas, a fim de ajudar o professor a elaborar e organizar suas aulas, aumentando e facilitando suas possibilidades de trabalho, pois devido a sua trajetória profissional, ela é ciente das dificuldades e limites enfrentados constantemente pelo professor. Assim, por meio desse livro, ela tenta oferecer um suporte para que o professor construa sua aula, utilizando uma prática reflexiva que contemple também os avanços alcançados pela educação especial.

Segundo Reily (2014, p.22), a escola inclusiva utiliza o princípio da aprendizagem significativa, “aquela em que o pensamento está ancorado na atividade, pois entende-se que o ato precede a compreensão – o ato gera a compreensão, sendo específico ao contexto de significação”. Ela ainda ressalta que em nenhuma instância, literatura ou prática pedagógica, veremos educadores com abordagem construtivista, sociocultural ou freiriana cogitando a possibilidade de que o aluno venha a aprender por meio da simples observação ou imitação.

A autora ainda cita que muitas crianças com necessidades educativas especiais, tanto nas áreas de linguagem e comunicação ou mobilidades, estão nas escolas como meros espectadores. Realidade que ainda permanece na maioria delas, por isso a escolha desse tema para esta dissertação se configurou importante, pois percebo na disciplina de Artes um mecanismo interessante para, além de trabalhar as habilidades dos alunos com deficiência, também trabalhar com os outros alunos sobre a inclusão.

Para que uma escola brasileira seja inclusiva, de fato, e não apenas no discurso da lei, é necessário que esses alunos com deficiência tenham seus direitos garantidos em relação aos recursos e instrumentos de mediação da atividade. Instrumentos esses primordialmente linguísticos, pois para Reily, a linguagem é a base ideológica para o acesso democrático à escola, para que ela seja inclusiva, portanto, para todos. Segundo Vygotsky, como afirma Reily (2014, p.19):

[...] a palavra, a linguagem, é o veículo primordial de mediação. É com a palavra que o homem salienta, marca, destaca aquilo que é relevante num caleidoscópio de estímulos que bombardeiam por todo lado os seus diversos sistemas sensoriais. Mas a marcação daquilo que é relevante se dá em contexto social.

Toda escola possui como objetivo pedagógico que seus alunos venham a dominar a linguagem verbal, no nível oral (falar) e também na dimensão gráfica (ler e escrever), mesmo que esse domínio aconteça por outras modalidades. Reily parte desse princípio, para dizer que “se a palavra é para todos, a imagem também tem de ser” (REILY, 2014, p.26). Nesse sentido, ela esta falando do uso das Artes como veículo de mediação primordial para que o processo de aprendizagem aconteça. Quando o currículo é apresentado visualmente, todos os alunos são beneficiados, alunos surdos, com distúrbios linguísticos, deficiência mental que ainda não são alfabetizados, autistas, entre outros.

Algumas pessoas dão importantes depoimentos sobre como aprenderam melhor por intermédio de imagens e como elas funcionam no seu processo de informações, fazendo com que aprendessem melhor do que quando o conteúdo era aplicado de forma oral ou escrita.

Reily traz como exemplo, Mary Temple Grandim, profissional competente e bem-sucedida que devido ao autismo, vê o mundo de outra forma, ela diz que:

Eu penso por figuras. Para mim, as palavras são como uma segunda língua. Tenho que traduzir tanto as palavras faladas quanto as escritas em filmes coloridos, junto com o som, para que rodem como uma fita de vídeo na minha cabeça. Quando alguém fala comigo, suas palavras são imediatamente traduzidas em imagens. Muitas vezes, as pessoas que pensam com base nas palavras acham que não dá para entender esse fenômeno, mas, no meu trabalho de designer de equipamento para a indústria agropecuária, o pensamento visual é uma vantagem enorme (GRANDIM, 1995, p.19, tradução de Reily).

Porém, não basta somente acrescentar imagens aos conteúdos da aula, durante o trabalho pedagógico. Para que a aula tenha um caráter inclusivo, Reily (2014) afirma que as imagens devem ser selecionadas e avaliadas criticamente pelo professor, tendo o cuidado de buscar conteúdos com qualidade e que instiga os alunos a desejarem aprender mais sobre elas. Além disso, Reily ainda acrescenta sobre a importância do professor também quanto ao seu papel na inclusão.

De acordo com Lúcia Helena Reily (2014), o professor tem um papel fundamental como mediador no processo de ensino aprendizagem. Na escola considerada inclusiva, é o professor quem recebe o aluno com necessidades especiais em sua sala de aula. Sua postura perante o aluno com deficiência é fundamental e determinante sobre como ele irá tratá-lo e como o estudante irá ser visto pelos colegas. É responsabilidade do professor organizar o trabalho pedagógico e elaborar estratégias que garantam que todos os alunos consigam participar e aprender. Entretanto, o professor não é o único responsável pela educação do aluno com necessidades especiais, a escola possui papel fundamental, respondendo também pela inclusão. É uma de suas responsabilidades a promoção de uma mediação entre a família e a escola, solicitando suporte e acompanhamento da escola no decorrer do ano letivo. Assim, percebe-se que a mediação, por meio da inclusão escolar, acontece em vários níveis, envolvendo toda comunidade escolar: trabalho pedagógico, interação na sala de aula e na escola, a socialização no ambiente familiar e na comunidade, envolvendo assim toda comunidade escolar.

Educar crianças excepcionais significa habilitá-las, ajuda-las a se tornarem adultos equilibrados, capazes de lidar com suas próprias dificuldades e limitações – aptos a participar significativamente e dentro de suas possibilidades do grupo social em que vivem.

Programas, métodos e materiais especiais, muitas vezes adaptados individualmente, se propõem a ajudar a criança a vencer cada etapa de seu desenvolvimento – aprender a caminhar, a falar, a brincar, a ler e escrever e a trabalhar. Tratamentos especiais e terapias visam sanar ou melhorar deficiências específicas, corrigir defasagens e ajudar a encontrar maior harmonia e equilíbrio (REILY, 1993, p.XI).

Portanto, não basta apenas receber esses alunos, é necessário que a escola esteja preparada para atendê-los bem, respeitando suas especificidades. A escola inclusiva precisa fazer parte de um processo responsável, que garanta aos seus alunos oportunidades e condições de desenvolvimento.

Reily (2014) também ressalta que os alunos com necessidades especiais estão como meros espectadores nas salas de aula. A escolarização desses discentes no Brasil, em uma escola de fato inclusiva, não somente redigida como palavra da lei, necessita para ser bem- sucedida “atentar para garantir acesso aos instrumentos de mediação da atividade. Instrumentos esses primordialmente linguísticos” (REILY, 2014, p. 23).

Segundo Reily (1993), uma das tarefas mais importantes do professor é ensinar a criança com deficiência a se situar como parte do grupo em que vive. Para conseguir isto, é necessário que ela tenha oportunidades de experimentar situações que possibilitem descobrir o mundo, as relações entre as pessoas e as coisas, entre ela e os outros e, principalmente, descubra que ela possui inúmeras possibilidades e que tenha oportunidade de usá-las.

Isto acontece durante as aulas de Artes, de forma natural ou informal. Durante esse momento é possível criar um ambiente alegre e descontraído, capaz de proporcionar várias experiências importantes e necessárias ao desenvolvimento da criança com deficiência. Trabalhando com os variados recursos que a disciplina oferece, a criança estimula a coordenação fina, observação, memória, percepção visual e tátil, entre outros estímulos ao sentir e experimentar as texturas, espaços, formas e cores. Nessa disciplina ela também irá descobrir semelhanças e diferenças, equilíbrio e ritmo.

Reily (1993) ainda acrescenta que o aluno com deficiência, ao entrar em contato com a variedade de materiais e situações livres que a disciplina de Artes oferece, por meio da combinação de tarefas sempre diferentes, a segurança, evita o estereotipismo, além de estimular a imaginação. E ao estimular a iniciativa, o raciocínio, a intuição, a ordem, responsabilidade, cooperação, apreciação crítica do próprio trabalho e dos colegas, o professor, além de propiciar o autoconhecimento e respeito pelo outro, faz com que seus alunos descubram que existem outros tipos de linguagem, sentimentos e ideias a serem expressas por meio da arte na escola inclusiva.

Em sua obra de 2014, Reily afirma que os recursos pedagógicos são importantes, porém limitados e o professor da escola inclusiva encontra em seu percurso vários limites. Esses limites são as condições de trabalho, falta de recursos pedagógicos, limite de tempo para o trabalho com os alunos com deficiência, profissionais que auxiliem, como por exemplo, no trabalho com alunos surdos, falta de conhecimento e às vezes, a sua própria formação sobre as necessidades educativas especiais de seus alunos. Porém, para Reily (2014), não importa a origem do desafio, poia situações como esta, vão exigir que os professores busquem novas estratégias para resolver o problema. Reily também afirma que o professor possui recursos ilimitados. Ao afirmar que os recursos são ilimitados, Reily quer dizer que as soluções podem vir de várias áreas do conhecimento. Porém, para isso é necessário que o professor conheça bem seu aluno, de forma que seja possível identificar suas possibilidades e seu trajeto para se comunicar e apropriar-se do que está ao seu redor, tendo como objetivo encontrar um caminho que seja compatível com suas possibilidades. E esse caminho não é a aula tradicional centrada somente na palavra oral ou escrita, é preciso que o professor recorra a jogos, músicas, filmes, desenhos, gráficos, dramatizações, livros de história e vários outros recursos alternativos possíveis.

Segundo Reily (2014), para que o aluno com deficiência seja considerado como parte da sala, é preciso que o professor deixe bem claro o que espera dele, que esse aluno também tenha regras e limites como os outros colegas, detalhe essencial para um bom convívio. Para isso, é necessário que o professor conheça bem seu aluno, pois ele enfrentará inúmeras situações desafiadoras, onde a comunicação será um desafio também.

E apesar de todas as dificuldades enfrentadas pelo professor e o movimento de Inclusão caminhar ainda a passos lentos, Reily (2012) já percebe-se um crescimento em relação às pesquisas acadêmicas, educação pedagógica, formas de avaliação, novas propostas educacionais, grupos de discussão e situações novas tramitando em congressos. Ela dá bastante ênfase à necessidade de o professor conhecer bem seus alunos e também a realidade de sua escola, para somente assim, poder ir em busca de soluções que contribuam com a inclusão. Apesar de haver inúmeros momentos de desânimo e cansaço, pois ela sabe que existem professores que insistem em continuar com o repertório limitado, ela também reforça a necessidade de formação continuada.

No próximo capítulo, apresentamos um breve histórico da Educação Especial em diferentes países da Europa e América do Norte e como essa questão chegou ao Brasil.

Figura 3 – Arthur Bispo do Rosário, Manto da Apresentação,1989.

Fonte: http://agenciabrasil.ebc.com.br/cultura/noticia/2016-06/exposicao-com-obras-do-bispo-do- rosario-integra-programa-cultural-da.

3 RECORTES HISTÓRICOS E POLÍTICAS DE ATENDIMENTO À PESSOA COM