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A CONSTRUÇÃO CONJUGAL

No documento MESTRADO EM PSICOLOGIA CLÍNICA São Paulo (páginas 37-40)

1.2 QUESTÕES PARA A PSICOLOGIA CLÍNICA

1.2.1 A CONSTRUÇÃO CONJUGAL

Partimos da premissa básica que o processo conjugal é um processo construído. É nos dizeres de Féres-Carneiro (2009), um processo de fascínio e desafios, pois

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traz, ao mesmo tempo em sua dinâmica, duas individualidades e uma conjugalidade. Nos dizeres da autora:

(...) o casal conter dois sujeitos, dois desejos, duas inserções no mundo, duas percepções do mundo, duas histórias de vida, dois projetos de vida, duas identidades individuais que, na relação amorosa, convivem com uma conjugalidade, um desejo conjunto, uma história de vida conjugal, um projeto de vida de casal, uma identidade conjugal (2009:3).

Como já vimos na abertura deste trabalho, na atualidade, muitas mudanças afetam a construção da conjugalidade e segundo Norgren (2002) na interação e experiência conjugal são valorizados aspectos tais como: a comunicação aberta e assertiva entre os pares, o amor, a satisfação sexual, a intimidade, as demarcações pessoais e autonomia de cada cônjuge, o projeto conjugal.

A aspiração, o desejo de construir uma vida a dois, de compartilhar, amar e ser amado numa relação conjugal nos remete diretamente sobre a uma condição e necessidade básica de sobrevivência do ser – humano, que é construir vínculos afetivos.

Na construção conjugal e na busca de parceiros existe uma expectativa entre os pares acerca de cuidados, proteção, carinho, troca afetiva, enfim que o estabelecimento desse vínculo afetivo também possa suprir e ou satisfazer necessidades afetivas básicas.

Tendo como base as idéias de Bowlby (1997 [orig.1979]) e Ainsworth (1989), Souza e Ramirez (2006) descrevem sobre a importância em se compreender o vínculo e a interação conjugal adulta como sendo laços afetivos duráveis, caracterizados pela reciprocidade e um intercâmbio fluido e dinâmico entre os papeis de apego e cuidado entre os pares, situando o “amor romântico como uma emoção, um vínculo de apego que é estimulado pela familiaridade do outro, pela satisfação de necessidades do self que este outro possibilita e pela confiança e segurança que ele inspira” (Souza e Ramirez, 2006 p. 45).

Na visão de Hazan e Shaver citado em Norgren (2002), o amor conjugal é conceituado como um vínculo de apego, como uma ligação, um laço afetivo duradouro caracterizado por uma dinâmica emocional e complexa de troca entre iguais adultos que envolvem os sistemas de apego por intermédio da manutenção de proximidade física e contato com o par que lhe forneça segurança física e psicológica, que possa prover cuidados recíprocos e a vivência da sexualidade.

Assim percebemos que o desejo da conjugalidade esta diretamente relacionada à necessidade das pessoas em estabelecimento de vínculos e laços afetivos duradouros, de sentir-se ligado a alguém, que proporcione apoio emocional, material, continência.

Por essa ótica podemos argumentar que a construção conjugal, submetida a relações mais flexíveis e igualitárias mostra-se um desafio para as pessoas. Desafio no sentido de vivenciar o processo de conhecer alguém, namorar, noivar e enfim casar – transições que outrora era tão bem delimitadas que constituíam o processo de uma construção afetiva e, quiçá conjugal.

Sabemos que hoje em dia, esses processos e transições não ocorrem necessariamente na seqüência citada acima. Como exemplo disso podemos citar o fenômeno do “ficar” – tão difundido atualmente em nossa cultura, principalmente entre os adolescentes e os jovens. Féres-Carneiro (2009) descreve a atitude de ficar como uma relação de experimentação entre as pessoas que a priori tem como característica principal a falta de compromisso entre os parceiros que buscam obter prazer a partir da vivência da sedução. Em estudos realizados com adolescentes sobre a atitude do ficar, revelou que muitas vezes esse tipo de comportamento funciona como um teste, uma verificação de possíveis afinidades entrando em jogo a possibilidade de desenvolver sentimentos de amor e desejo pelo parceiro que levaria a um possível enlace de enamoramento – situação essa considerada como ideal e preferida por adolescentes e jovens (MATOS, FÉRES-CARNEIRO, JABLONSKI, 2005; JUSTO, 2005).

Porém o que se persegue na busca de um relacionamento amoroso com o outro é a possibilidade de viver vínculos afetivos, pois, apesar do fascínio da experimentação, independência, autonomia, diversidade e igualdade preconizada no afrouxamento de crenças, condutas e atitudes que incidem sobre a construção de tais relacionamentos, o ideal do amor romântico que traz em seu imaginário promessa de segurança, confiabilidade, fidelidade é muito presente e também objeto de busca nesses relacionamentos contemporâneos levando a uma paradoxo e uma coexistência de aspectos tradicionais e modernos nas transições e na construção desses vínculos afetivos (GIDDENS, 1993; FÉRES-CARNEIRO, 2001, 2009; FÉRES-CARNEIRO, PONCIANO E MAGALHÃES ,2007; BAUMAN, 2003; SOUSA E RAMIREZ, 2006; NORGREN, 2002; NORGREN, SOUZA, KASLOW et. al., 2004 ; SIMÕES, 2007 ).

A respeito da construção conjugal e das transições que envolvem esse processo, Simões (2007) em sua dissertação de mestrado buscou compreender de que maneira se processa a transição pré-nupcial para a conjugalidade legal extraindo de seus participantes – três homens e três mulheres heterossexuais, todos adultos jovens, suas experiências sobre as demarcações rituais desses processos. Através de entrevistas a autora captou a impressão desses jovens sobre o significado de sentir e estar casado. Encontrou como resultado que o

“morar juntos” antes de uma formalização legal foi muito importante para esses casais, já que funcionou como um teste de convivência e ajustes antes de optarem pela legalidade do casamento. A festa de casamento e outros rituais foram vistos como importantes elementos para esses casais que legitimaram suas relações frente a amigos e familiares. Simões (op.cit.) concluiu que esses arranjos conjugais oscilam entre o casamento moderno e o tradicional já que possuem elementos característicos dessas duas modalidades de relações.

Essas transições acontecem também com os homossexuais na construção de suas conjugalidades, porém como descreve Féres-Carneiro (2009) não há modelos, rituais ou normas disponíveis como exemplos para a integração de casais do mesmo sexo á família, estes casais têm de inventar seus próprios “rituais de pertencimento” que servirão para fortalecer e validar a sensação de ser membro de uma família.

Torna-se importante concluir que a construção da conjugalidade, o desejo de viver uma vida a dois acontece independente da orientação sexual do sujeito, pois revela uma condição essencial que nos faz humanos – a de construir vínculos afetivos, portanto os homossexuais constroem seus vínculos afetivos e conjugais a despeito de uma série de estressores que cercam esse tipo de arranjo, aspectos esses que exploraremos a seguir.

No documento MESTRADO EM PSICOLOGIA CLÍNICA São Paulo (páginas 37-40)

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