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1.3 A NARRATOLOGIA PARA TARANTINO: ANÁLISE DE SEUS ELEMENTOS

1.3.3 A construção do significado na narrativa cinematográfica: o caso do disfarce

Outro caso que vale dedicar uma atenção reflexiva, em se tratando de análise fílmica, é a presença de Mr. Orange/Freddy Newandyke (Tim Roth) na trama de Cães de Aluguel. Como outrora explicado, o filme trata da história de um grupo de ladrões contratados por Joe Cabot (Lawrence Tierney) para a realização de um assalto à joalheria. O bando, por questões de segurança, resguarda seu anonimato por meio de apelidos - Mr.

Blue (Edward Bunker), Mr. Withe (Harvey Keitel), Mr. Pink (Steve Buscemi), Mr. Brown

(Quentin Tarantino), Mr. Blonde/Vic Vegas(Michael Madsen) e Mr. Orange (Tim Roth). O enfoque por ora recai sobre a figura de Mr. Orange, o policial infiltrado no bando. Após a realização do assalto, parte dos sobreviventes reúnem-se num específico galpão que, previamente combinado, seria o local de encontro para o pagamento e repasse dos diamantes. Contudo, como já relatado, o assalto à joalheria não sai como planejado, fazendo com que os personagens comecem a especular a respeito de um possível infiltrado no grupo. E o espectador, desta vez, possui um entendimento parcial e limitado a respeito desta diegese - diferentemente do que acontece na supracitada análise de Django Livre, por exemplo. Somente depois de quase uma hora de filme, após assistir todo a discussão entre

Mr. Pink e Larry, no galpão, então, é que o espectador é informado a respeito da identidade

e da trama do personagem infiltrado. A história de Mr. Orange, apresentada por meio do cartão “Mr. Orange”, se propõe a explicitar a trajetória do dúbio personagem e sua entrada para o bando. Antes disto, porém, o espectador ainda não detém um conhecimento superior do que a dos próprios personagens envolvidos na trama, em se tratando do caso da traição. Fazendo-o compartilhar, por assim dizer, da mesma sensação de desorientação e especulação que Mr. White e Larry.

O cartão “Mr. Orange” se propõe a narrar todo o trabalho cênico do personagem em questão nos momentos anteriores à sua entrada para o bando. Trata-se, na realidade, do treinamento para a “fixação” de seu disfarce, uma espécie de ensaio. Para tanto, Orange conta com o auxílio do “mestre”, o sábio, supostamente seu superior dentro de sua divisão policial - uma referência aos personagens mais velhos que desempenham a função de

orientação na jornada do herói . É este personagem o responsável pelo repasse dos 9 procedimentos adequados para que seu disfarce não seja desvendado pelos criminosos. O que inclui, inclusive, “aulas” de contação de histórias e encenação. O enfoque do trabalho, para o momento, no entanto, recai sobre a “história do banheiro”: uma narrativa fictícia que Mr. Orange conta a seus comparsas criminosos, na qual o seu entendimento é tido como um relato, uma experiência pessoal. A história se passa no ano de 1986, onde um sujeito entra no banheiro da estação de trem carregando consigo uma quantidade de maconha. Contudo, quando o mesmo adentra ao local se depara com um grupo de cinco policiais mais um cão farejador - que de imediato começa a latir em sua direção. O pânico, portanto, toma conta de si, fazendo-o cogitar a possibilidade de se retirar do ambiente. Todavia, ele persiste e realiza suas necessidades para, tranquilamente, se retirar do ambiente. A essência do ensinamento transmitido a Mr. Orange reside na ideia de que o policial disfarçado se caracteriza, sobretudo, como um ator. E que, portanto, se faz necessário que o indivíduo em campo desempenhe sua encenação da maneira mais natural possível. Na qual o sucesso da operação, do disfarce, por assim dizer, dependerá diretamente da execução dessa mesma encenação. A recomendação do “guia” de Mr. Orange, destarte, é que o mesmo interiorize a mensagem e a função da história: a dimensão da experiência pessoal; imaginar-se como vivenciado a situação em questão. Pois somente assim, segundo seu superior, poderá elencar o máximo de detalhes possíveis da narrativa ao ponto de torná-la crível. Afinal, Mr. Orange busca se passar por um criminoso, e o detalhamento, desta maneira, acaba por possuir a função de critério de definição da verdade. Pois quanto mais detalhada a história, mais seus ouvintes acreditarão que, de fato, o próprio Mr. Orange tenha experenciado o que esteja narrando. Consequentemente seu disfarce como criminoso terá maior aceitação pelo bando de Cabot.

“Esta história se passa em um banheiro masculino. Precisa lembrar todos os detalhes do banheiro. Se tinha toalhas de papel ou secador. Tem que saber se portas, se havia sabonete líquido ou aquele pó cor de rosa. Se tinha água quente. Se fedia. Se havia alguma coisa nojenta, suja, imunda… espalhada nos vasos. Precisa saber tudo sobre este banheiro. Pegue todos os detalhes e faça sua história. Lembre-se que esta história é sobre você. Como reage aos acontecimentos. E o único jeito, irmão, é repetir isso, repetir e repetir.”. (Cães de Aluguel Reservoir Dogs, 1992).

VOGLER. p. 62. 2006. 9

O que chama atenção nesta sequência são justamente as orientações para tornar uma história, um disfarce crível - precisamente, o que se faz para que outros aceitem e acreditem nas propostas que as narrativas levantam. Abrindo espaço, desta forma, para a reflexão da verdade dentro do cinema, não se tratando, contudo, de concebê-la única e exclusivamente a partir de tais termos. O que o cinema de Quentin Tarantino faz descortinar aos olhos do espectador com a questão do disfarce de Mr. Orange, por exemplo, é a dimensão do significado e sua construção na narrativa cinematográfica. Ou seja, não é especificamente a verdade na narrativa fílmica que interessa aos objetivos deste trabalho. Mas, sim, precisamente, a produção do significado na narrativa cinematográfica; não é, portanto, a construção da verdade no cinema que se desdobra nesta análise, e, sim, a maneira pela qual se constrói o significado dentro da logicidade da narrativa cinematográfica - e como este mesmo significado se torna crível, aceito, tanto dentro do contexto da relação do mundo diegético, quanto na relação do cinema com o seu espectador. E todas estas dinâmicas assumem caracteres e dimensões problemáticas quando se analisa, como é o caso, a partir das obras de Quentin Tarantino. Pois o mesmo busca expressar esta relação de produção do significado a partir da postura meta- cinematográfica. Ou seja, discutir como a produção de narrativas se organiza dentro da logicidade do cinema, utilizando como veículo, para tanto, o próprio cinema. O que se pretende discutir com isso é o que esta atitude fílmica meta-cinematográfica representa e o que ela pode significar. Tarantino ao expressar, dentro de uma diegese, como uma história deve ser contada, e quais os elementos que nela devem existir, ao representar isso cinematograficamente, certamente está pretendendo discutir o que cinema faz para que seu significado se torne “crível” - o que para as categorias da produção do significado se entende por coesão.

O que o parceiro e “mentor” de Mr. Orange em Cães de Aluguel busca incutir em seu colega, é a ideia de que a consagração do disfarce se fundamenta nos detalhes que o ator (em verdade, um policial disfarçado) consegue expressar - quanto mais, melhor. É, portanto, nesta perspectiva, o detalhe o elemento responsável por tornar crível, verdadeiro - entendendo-se “aceito como verdade”. Acredito, contudo, que dentro da lógica da produção do significado no contexto da narrativa cinematográfica, este elemento possua profundas relações com a dimensão da coesão. O número de elementos que são representados, mostrados, levantados durante a encenação, em consonância com o todo maior, é que torna as histórias críveis dentro da dinâmica da narrativa fílmica. Não é,

então, somente a quantidade de informações e seus consequentes detalhamentos o critério decisivo de adesão ao que se fala, ao que se representa. As informações se articulam como fragmento, para utilizar-me da narratologia de Gaudreault e Jost, como dimensão primária de sentido, ou seja, como enunciado. A coesão, desta forma, se refere à conectividade das partes com o todo, isto é, do enunciado com o discurso. Em se tratando do caso de Cães de Aluguel, acima analisado, tem-se o seguinte: o discurso, o todo, se refere à vontade, à necessidade de Mr. Orange em se expressar como criminoso - a finalidade de seu disfarce; os detalhes, como bem cita seu amigo, elencar imaginativamente o que havia dentro do banheiro, por exemplo, é operar com a dimensão primária de sentido, os enunciados; e a naturalidade que tanto é remetida, fruto da articulação do diálogo das partes com o todo, se expressa justamente como coesão. É a prova, por assim dizer, que o diálogo entre o todo (discurso) com as partes (enunciado) de fato se fez efetivo. Esta relação entre entre enunciado, discurso e coesão, como se vê, faz evidenciar a reflexão a respeito da produção de significado na obra de Tarantino. Uma reflexão precisamente orientada pela perspectiva de uma narratologia, isso é bem verdade. Mas que possibilita compreender de uma certa maneira como a produção de sentido é encarada pelo cineasta.

Acredito que estas mesmas conclusões, guiada por este específico viés teórico, que se aplicam ao caso de Mr. Orange e sua “história do banheiro”, acabam se estendendo à própria produção de significado realizado pelo cinema (como é o caso da “predomínio da palavra sobre a imagem” em Cães de Aluguel e Pulp Fiction: tempos de violência; da criação de narrativas dentro da narrativa cinematográfica, como em Os Oito Odiados e

Django Livre; além da questão do detalhe como agente fomentador de coesão). Pois

entendo que esta seja a intencionalidade do diretor ao se portar de maneira meta- cinematográfica. Ao representar uma discussão de como uma história se torna crível, verdadeira, dentro de uma obra fílmica, o cineasta está, precisamente, a refletir a respeito do que, também, torna uma narrativa fílmica “aceita” pelo espectador. Novamente, não se trata de conceber toda esta relação a partir dos termos de critérios de verdade dentro da narrativa fílmica. Já fora citado, de fato, a partir da análise de Mauro Baptista, da vontade e disposição de Tarantino em quebrar uma linearidade causal em suas obras. Acredito, inclusive, que este tipo de pensamento não se posicione de maneira contrária à ideia de que o autor busca, sempre que possível, justamente nestes posicionamentos meta- cinematográficos, discutir a questão da produção do significado no cinema. Ao contrário, até. Toda esta esta movimentação de romper com uma lógica causal quase que pré

estabelecida pela história do cinema (drama), acaba por suscitar no espectador uma vontade de reflexão, de pensar a respeito de como se produz uma narrativa cinematográfica. Ao se posicionar com esta quebra, com esta ruptura, digamos assim, Tarantino possibilita ao espectador sentir as possibilidades da própria narrativa cinematográfica.

Mas afinal?

Até aqui buscou-se analisar a obra de Quentin Tarantino a partir da perspectiva teórica da narratologia de Gaudreault e Jost. Narratologia esta que é altamente influenciada e substanciada pela semiologia de Christian Metz. Procurei trabalhar, assim, como se pôde observar, específicos elementos e estratégias cinematográficas que o diretor vem ao longo dos anos trabalhando, e que permite refletir a respeito da dimensão da produção do significado na narrativa cinematográfica. Evidente se fez, portanto, que trata-se de uma busca por elementos de atitudes fílmicas específicas. Priorizou-se, desta forma, por exemplo, o predomínio da palavra sobre a imagem, analisando dois elementos presentes em Cães de Aluguel e Pulp Fiction: tempos de violência: respectivamente, o assalto à joalheria que não é mostrada, cenicamente, bem como conteúdo da maleta que não nos é revelado. Abrindo espaço, desta forma, para a especulação a respeito do que de fato possa ter ocorrido. Esta atitude em desvalorizar o fulcral do entendimento da trama faz aproximar, num primeiro momento, como disse, o cinema da história. A partir, precisamente, da ideia de que a história se condiciona por uma característica peculiar: o seu objeto de pesquisa não mais está, o passado enquanto materialidade se faz como ausente.

Noutro momento procurei analisar a criação de narrativas dentro da narrativa cinematográfica, utilizando como estudo de caso a carta de Abraham Lincoln ao Major Marquis Warren (Samuel L. Jackson) em Os oito Odiados. Além da história criada por Django (Jamie Foxx) para se livrar de seu destino cruel em Django Livre. Ambos os casos permitem-nos iniciar a discussão a respeito do detalhamento como critério de adesão de outros ao que está sendo contado, narrado. Acontece, porém, que o procedimento de levantamento de detalhes na narrativa cinematográfica faz suscitar uma outro elemento: a dimensão da coesão na produção do significado. Algo que enquadra, retoma, pra ser mais preciso, elementos basilares da narratologia de Gaudreault e Jost: o enunciado e o discurso.

Para o fechamento deste primeiro ciclo de análise de Tarantino pela narratologia, aglutinando, assim, a questão do detalhe com a dimensão da coesão e do significado na narrativa cinematográfica, tomei como objeto de discussão o caso de Mr. Orange em Cães

de Aluguel. Pois neste recorte o cineasta propõe ao espectador a reflexão de como se

estabelece, se configura, a produção do significado no cinema. Mas esta proposição de Tarantino se desenrola por meio da problemática de como tornar uma história, um disfarce, no caso, crível - aceito por outros personagens.

O que também se evidencia nisto tudo são os muitos elementos e as muitas voltas que são necessárias para se chegar à exposição da centralidade do trabalho. Que é, vale retomar, a discussão da narrativa histórica por meio da trâmites, do movimento da narrativa cinematográfica. Mas toda esta movimentação de, primeiramente, exposição de um aparato que nos habilite significar, teoricamente, a narrativa cinematográfica, para posteriormente, num estudo de caso, ler a obra de um específico cineasta por meio desta mesma tecnologia teórica, todos este movimento a meu ver se faz necessário. Mesmo sendo cansativo tais procedimentos este é, dúvida, a meu ver, o caminho mais didático para se chegar à conectividade das atividades narrativas. E este giro, esta conexão se estabelece por meio do questionamento mais elementar e simplório: qual a relação que todas estas análises e todos estes elementos, supostamente aleatórios, estabelecem com a dinâmica da narrativa histórica? Ou seja, o que tudo isso tem haver com a narrativa histórica?

Tarantino ao propor a ausência da encenação do fundamental para a compreensão da trama; ao criar uma narrativa dentro de outra narrativa, potencializando, assim, a função do detalhe e da argumentação como elementos decisivos no estabelecimento da verdade; ao trabalhar justamente este detalhe como agente fomentador da coesão na produção do significado; ao propor todas estas dinâmicas fílmicas, acaba por viabilizar questionamentos da seguinte ordem: a história possui as mesmas estruturas?; estas mesmas logicidades? O “melhor” significado (“mais verdadeiro”) a respeito do passado, expresso numa narrativa histórica, se efetiva por meio da melhor argumentação? Argumentação esta tida como consequência da própria habilidade do historiador - espécie de sagacidade no uso e na criação das palavras. Seria, portanto, o historiador o responsável por trazer a verdade sobre o passado à luz por meio justamente de seu poder de convencimento? Afinal de contas, como bem colocado, outrora, a história lida com o passado que, em sua dimensão lógica, não mais está; não mais se faz presente; sua concretude como testemunho ocular, portanto, jánão se faz possível. E a história como campo do saber que sempre privilegiou a verdade,

passa, agora, portanto, a se sustentar no critério de argumentação? Afinal, como nos supracitados exemplos fílmicos de Tarantino, a verdade aceita pelo espectador é aquela que melhor desempenha seu poder de argumentação e contemplação de detalhes. O que entra em jogo, neste momento, é o potencial criativo dentro da configuração do texto histórico. A chance em ficcionalizar que o historiador em seu oficio (não) possui. É evidente, sabemos, que dentro do quadro de possibilidades que a narrativa cinematográfica apresenta, a ficção acaba por potencializar o ato de narrar, aumentando, assim as formas de se produzir cinema. A reflexão central que se evidencia e permanece diante de todo estes questionamentos é a seguinte: tais comportamentos narrativos do cinema se estendem à narrativa histórica?

Encerrar esta discussão a partir da ideia de que a história possui, indubitavelmente, um compromisso com a verdade e consequentemente se pretensa ciência; e a partir e somente disto, jamais se aproximará em absoluto da narrativa cinematográfica, acredito, é hierarquizar a atividade histórica. O argumento de que a história se comporta como ciência, e juntamente com isto a aceitação de que a dimensão criativa (e até ficcional) não residem dentro de sua estrutura, é engessar por completo as relações da narrativa histórica. Portanto, neste momento, na tentativa de elaboração de respostas aos supracitados questionamentos, deve-se suportar teoricamente numa estrutura de pensamento que realize um deslocamento hierárquico. Que se possível, também, questione princípios e teorizações que engessam as relações narrativas dentro da escrita da história, numa perspectiva científica. Para tanto, recorro à filosofia da linguagem de Frank Ankersmit. Por acreditar que seu comportamento teórico autoriza e legitima uma reflexão a respeito das dinâmicas criativas da narrativa histórica. Ankersmit reflete acerca do significado dentro da história, que é precisamente o ponto de inflexão entre as duas atividades narrativas em questão: o significado é o que torna possível a conectividade entre elas. Enquanto na narrativa cinematográfica enfatizei a produção de significado, articulada por meio da relação do discurso com o enunciado - narratologia; na história, para Ankersmit, o significado se articula dentro da dimensão de representação da história - ou seja, a aceitação de que a história detém, sim, um aspecto de representação. Acontece que o significado nestas duas acepções, para a narratologia de Gaudreault e Jost, e para Frank Ankersmit, possuem sistematizações e fundamentações distintas - respectivamente, a semiologia e a filosofia da linguagem. Contudo, deve ser o significado, a articulação do todo, o elemento que estabeleça a conexão, mesmo que suportados por matrizes teóricas

distintas. É neste sentido, portanto, que se evidencia a relevância da coesão no processo de formação do significado. A coesão entendida aqui como o dialogo do todo com as partes: o meio que torna possível a construção do significado.

1.4 FRANK ANKERSMIT E A REPRESENTAÇÃO NA HISTÓRIA: O SIGNIFICADO NA NARRATIVA HISTÓRICA

1.4.1 VISÃO GERAL

Refletir acerca da aproximação da narrativa cinematográfica com a narrativa histórica é o objetivo deste tópico. Mais especificamente, perguntamos se a narrativa histórica possui as mesmas estruturas da narrativa fílmica, em se tratando da produção do significado. Esta reflexão parte da filosofia da linguagem de Frank Ankersmit, Obrigando- me a justificar mais detalhadamente o uso de suas ferramentas teóricas. Tal pretexto se fundamenta na constatação de que o autor fornece ao significado, dentro da configuração da escrita da história, uma dinâmica inteiramente distinta do que outros teóricos da história vem trabalhando. As possibilidades reflexivas deste trabalho, ao tratar das similaridades entre as narrativas, se encerram por completo diante da argumentação de que a história se faz essencialmente como ciência - regulação empírica como legitimador da pretensão de verdade. E que por conta disto, única e exclusivamente, a sua dimensão criativa não se estabelece, em nenhum sentido, como nos moldes da narrativa cinematográfica. É exatamente o que se constata ao lidar com a teoria da historia de Jörn Rüsen, por exemplo. Suas colocações e fundamentações teóricas, de fato, conseguem lidar e responder uma série de questionamentos e problemáticas que há muito a história vinha lutando - como é o caso da força explicativa de sua matriz disciplinar e sua concepção de consciência histórica. Contudo, para um tipo de reflexão que aproxima as atividades narrativas, se faz necessário deslocamentos hierárquicos de específicas categorias da história - as do tipo basilares, sobretudo. Como por exemplo - no mínimo - a relativização do seu status de cientificidade. Transferindo, assim, categorias que outrora foram responsáveis por legitimar justamente seu caráter de ciência. Rüsen aborda , a dimensão orgânica da narrativa no pensamento histórico - ou seja, pensa a prática historiográfica em sua necessidade interpretativa (subjetividade) e sua essência temporal acaba por se configurar de forma narrativa.