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A Construção Jurídica da Menoridade: o Código de Menores de 1927 e o Código

de Menores de 1979

A doutrina jurídica do direito do menor no Brasil é inau- gurada a partir da necessidade de compilar num único sistema normativo todas as leis até então existentes em matéria de infância e adolescência. Coube ao Juiz de Menores da cidade do Rio de Janeiro, José Cândido de Albuquerque de Mello Mattos siste- matizar essa proposta. O projeto de criação de um instrumento normativo específico para a infância brasileira foi aprovado pelo Decreto n. 5.083, de 01 de dezembro de 1926.

Em 12 de outubro de 1927 entrou em vigor o Decreto n. 17.934-A que estabeleceu o primeiro Código de Menores da 8 Em 1991, ano da primeira edição do Livro “História da criança no Brasil”,

organizado por Mary Del Priore, Lima e Venâncio (1996, p. 73) já afirmavam que a Lei do Ventre Livre, editada em 1871, contribuiu imensamente para o aumento do número de crianças negras abandonadas no Rio de Janeiro e denunciou também a reescravização em que eram submetidos esses pequenos ingênuos. Por isso, verfica-se que “[...] ao menos no Rio de Janeiro, esse prognóstico se cumpriu, prenunciando o trágico futuro que esperava a criança negra no Brasil. Hoje, há mais de cem anos da Abolição, convivemos com cerca de 12 milhões de crianças abandonadas nos centros urbanos do País, das quais a maioria absoluta é de origem negra.

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República e o primeiro da América Latina.9 O Código de Menores

de 1927 classificava as crianças e adolescentes com o rótulo da menoridade, sendo essa normativa legal apenas dirigida aos que eram considerados em situação de abandono e delinquentes,

conforme previa o artigo 1º.10

No artigo 26 do Código de Menores é possível encontrar oito definições diferentes indicadoras do menor em situação de abandono, entre as quais se destacam: não ter habitação certa, nem formas de subsistência, ter os pais falecidos, desaparecidos ou desconhecidos, e nem ter pessoa responsável por sua guarda e tutela (inciso I); que os pais, tutor ou guardião não tenham condições de garantir a subsistência do menor por condição de pobreza ou que sejam incapazes de cumprir com os deveres do pátrio poder (incisos II e III); que se encontrem em estado habitual de vadiagem, mendicidade ou libertinagem (inciso V); que sejam vítimas de maus-tratos, violência e negligência pelos pais ou quem tenha o dever de guarda (inciso VII).

Assim, é possível perceber, a exemplo do que consta no artigo 26 que a própria condição de pobreza das famílias foi motivo para a que o Estado excluísse os pais do pátrio poder e detivesse para si a tutela de crianças e adolescentes. O Estado foi negligente ao não investir em políticas públicas básicas às famílias empobrecidas e encontrou nas medidas de internamen- to a solução perfeita para os chamados filhos da pobreza. Além disso, culpou a criança, vítima de maus-tratos ou de negligência dos próprios pais, retirando-as do convívio familiar.

9 Além do Brasil, outros países instituíram uma legislação específica voltada

para a regulação e controle sobre a infância e a adolescência, como o Chile (1928), Uruguai (1934) e Equador (1938). Ver Pilotti (1995) e Veronese (1999).

10 “Art. 1º - O menor, de um ou outro sexo, abandonado ou delinqüente, que

tiver menos de 18 anos de idade, será submetido pela autoridade competente às medidas de assistência e proteção contidas neste Código.” (BRASIL, 1927)

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As crianças e adolescentes pobres, ditos menores, não eram possuidores de direitos, eram considerados meros objetos e esta- vam à disposição do Estado, que representado no Poder Judiciário encontrou na internação a solução pedagógica para resolver os conflitos urbanos e o problema da criminalidade.

Por isso, a proposta de Mello Mattos se materializou na intensificação da atuação do Estado frente aos problemas dos “menores”, tirando-os das ruas e dos ambientes viciosos atra- vés das práticas da institucionalização. Os menoristas da época acreditavam que isolando as crianças e os adolescentes em ins- titutos disciplinares conseguiriam moldá-los aos padrões sociais e reconstituir sua identidade, formando futuros trabalhadores. (MOURA, 2008, p. 276)

É preciso registrar que o Código de Menores de 1927, ao impor a medida de internamento aos menores, o fez em uma pers- pectiva, pelo menos em âmbito formal, que previa a reeducação mediante práticas pedagógicas de caráter não punitivo. Buscou-se resolver a questão da assistência ao menor sob o enfoque edu- cacional e distante de uma visão punitiva imposta anteriormente pelo Direito Penal, principalmente porque o Código de Menores de 1927 alterou e substituiu “[...] concepções obsoletas como as de discernimento, culpabilidade, penalidade, responsabilidade,

pátrio poder [...]” (VERONESE, 1999a, p. 28). A lógica foi investir

em práticas pedagógicas que melhor conduzissem os menores ao mercado de trabalho e ao convívio social.

Na visão de Mello Mattos era imprescindível investir em novos institutos disciplinares e modernizar e ampliar os já existentes para que dessem conta de atender a crescente demanda de crianças e adolescentes em situação de abandono e aquelas consideradas delinquentes. De acordo com ele, os problemas assistenciais na área infantojuvenil se resolveriam em curto prazo, uma vez que o Poder Judiciário teria onde colocar esses menores, exercendo

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sobre eles maior vigilância e controle, próprios do modelo edu- cacional implantado nos institutos disciplinares.

“Ao escolher políticas de internação para crianças aban- donadas e infratoras, o Estado escolhe educar pelo medo” (PASSETTI, 2008, p. 356). E cria todo um aparato institucional capaz de satisfazer essa escolha, desde a própria instituição em si, como no treinamento dos profissionais. Entende-se, no entanto, que não deve a intervenção pedagógica ser pautada pelo medo, pois

O medo é impositivo, suscita um desequilíbrio psicológico e físico, exerce uma ação de fora para dentro no indivíduo e o leva, pela incapacidade ou impossibilidade de enfrentá-lo, à obediência. A prática de educar pelo medo, pela punição, atua fortemente, predeterminando uma ação ou um comportamento através da inibição de outros. O medo impede determinadas ações, não porque desencadeia no indivíduo uma maior compreensão sobre algo, não necessariamente porque o conduz a um processo consciente de aprendizagem, mas porque faz com que o indivíduo, na maioria das vezes, se sinta sem iniciativa, podendo, consequentemente, comprometer suas ações futuras, o seu processo de socialização e sua auto-estima. (VERONESE; OLIVEIRA, 2008, p. 49)

Portanto, a proposta de uma política social sob os moldes da institucionalização para infância idealizada no Código de Menores de 1927 não resolveu o problema. Os institutos disci- plinares ficaram superlotados, não havia infraestrutura suficiente para comportar a quantidade de crianças e adolescentes que estes estabelecimentos recebiam, contribuindo para tornar ineficaz a proposta de reeducação. Os institutos se concentravam apenas nas principais cidades brasileiras, estando de fora regiões periféri- cas. Faltavam recursos para aprimorar o atendimento as crianças e adolescentes nessas instituições.

Além disso, o Código de Menores de 1927 procurou combater os efeitos da delinquência infantil, perseguindo e

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institucionalizando crianças e adolescentes ao invés de criar me- canismos que efetivamente fossem capazes de atuar nas causas da carência infantil, que tinha um viés muito mais econômico.

Como alternativa complementar à ineficácia na aplicabi- lidade do Código de Menores de 1927, José Sabóia de Souza Lima instaurou um inquérito em 1938 para investigar os motivos do fracasso das instituições de internamento que estavam sob o controle do Juizado de Menores. Constada as falhas, propôs a criação de um Patronato Nacional de Menores, a exemplo do que já havia sido instalado na Argentina. (VERONESE, 1999a, p. 31).Trava-se de uma política centralizadora para a infância com a finalidade de instituir uma autarquia que ficasse responsável pelas questões administrativas e econômicas dos institutos disciplinares. Porém, a proposta não saiu do papel e três anos mais tarde, foi criado o Serviço de Assistência a Menores (SAM), editado pelo Decreto n. 3.779. de 5 de novembro de 1941. O SAM estava vinculado ao Ministério da Justiça e Negócios Interiores e teve a finalidade de prestar atendimento assistencial em todo território nacional aos menores considerados desva- lidos e infratores. A edição do SAM transformou o Instituto Correcional Sete de Setembro, localizado no Rio de Janeiro, num lugar específico para assistência aos menores.

A criação do Serviço de Assistência aos Menores demarca uma mudança importante com a inclusão de uma política de assistência social nos estabelecimentos oficiais que até então estavam sob a jurisdição dos juizados de menores. (CUSTÓDIO, 2009, p. 17)

O Serviço de Assistência aos Menores (SAM) continuou a resolver o problema do abandono e da delinquência infantil sob a ótica da internação introduzindo métodos pedagógicos extremamente repressivos que visavam apenas transformar o “menor” no adulto disciplinado e trabalhador.

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A dificuldade na aplicação do Código de Menores de 1927 e no SAM por profissionais que prestavam atendimento direto às crianças e adolescentes e, principalmente, pelos juízes de todo o país suscitou no final da década de 1940, a organização de cur- sos e debates para tentar compreender e solucionar a questão da criminalidade e da delinquência infantil.

Diversos profissionais, como médicos, religiosos, assistentes sociais e, sobretudo, juristas, que percebiam a infância brasileira como um “problema”, promoveram, quase que anualmente, a Semana de Estudos dos Problemas dos Menores como alterna- tiva para viabilizar a aplicação do Código de Menores de 1927 e sistematizar uma forma de atendimento aos menores de todo o

país. (MORELLI, 1999)

Analisando a trajetória histórico-social da infância brasileira é possível perceber que o SAM, enquanto modelo assistencial foi responsável pela perpetuação de uma política centralizado- ra e repressiva. A assistência aos abandonados e delinquentes continuou atrelada às práticas de institucionalização. O SAM fracassou principalmente porque manteve uma estrutura física e operacional deficiente, não tinha autonomia e utilizava métodos

de atendimento inadequados. (PEREIRA, 1996, p. 18)

A partir do ano de 1954 iniciou no país um processo de construção de um novo modelo jurídico-assistencial à infância brasileira, consubstanciando dez anos mais tarde, na aprovação da Política Nacional do Bem-Estar do Menor (PNBEM).

A Política Nacional do Bem-Estar do Menor (PNBEM) foi aprovada alguns meses após o Golpe Militar, que interrompeu abruptamente a vida democrática do país, dando início a um go- verno sob os moldes autoritários e em sintonia com a Doutrina da Segurança Nacional da Escola Superior de Guerra. Para o novo governo o problema do menor não seria mais uma questão social, mas um problema de segurança nacional.

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A Política Nacional do Bem-Estar do Menor (PNBEM) nasceu a partir da aprovação da Lei n. 4.513, de 1º de dezembro de 1964, que extinguiu o SAM definitivamente e autorizou o Poder Executivo a criar uma Fundação Nacional do Bem-Estar do Menor (FUNABEM), que deveria trocar a lógica repressiva do SAM para uma perspectiva educacional.

A FUNABEM estava instalada no Distrito Federal e tinha autonomia administrativa e financeira, tendo jurisdição em todo o território nacional. Teve como objetivos a formulação e implantação da PNBEM, mediante o estudo dos problemas dos menores e o planejamento de possíveis soluções, além de coordenar e fiscali- zar as entidades responsáveis pela execução direta dessa política (artigo 5º). A FUNABEM teve como correspondente estadual as Fundações Estaduais do Bem-Estar do Menor (FEBEMs).

A implantação da PNBEM foi uma resposta dada pelo Governo militar as questões da delinquência na infância e ado- lescência que se agravava cada vez mais. A ideia foi adotar uma política centralizadora para a infância e adolescência que estivesse atualizada com os segmentos do governo. A PNBEM insistiu nas práticas de institucionalização como uma forma de promover a segurança social. A PNBEM:

[...] implantou no Brasil uma rede de atendimento assistencial, corre- cional-repressivo, que atuava com vistas na irregularidade da condição infantil, reforçando o papel assistencialista do Estado numa prática absolutamente centralizada, com motivações ideológicas autoritárias do regime militar. A solução do “problema do menor” era a política de contenção institucionalizada, mediante o isolamento, como forma de garantir a segurança nacional e a imposição de práticas disciplinares com vistas à obtenção da obediência. (CUSTÓDIO; VERONESE, 2009, p. 65)

A política repressiva de institucionalização adotada no Brasil contra crianças e adolescentes em situação de marginalização

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social, colocou o país na contramão da história. Isso porque, em âmbito internacional, desde a década de 1920 já se pensava numa política para a infância levando em consideração a sua situação de fragilidade em razão de sua idade. Em 20 de novembro de 1959, a Organização das Nações Unidas (ONU) proclamou a Declaração Universal dos Direitos da Criança respaldada princi- palmente no reconhecimento da criança como sujeito de direitos.

Registra-se que os próprios documentos oficiais do gover- no na época tiveram a finalidade de explicar para a sociedade do que se tratava a Política Nacional do Bem-Estar do Menor, pois afirmavam que essa nova política pensada para resolver os “pro- blemas dos menores” estava em consonância com a Declaração dos Direitos da Criança de 1959. A publicação “Política Nacional do Bem-Estar do Menor em ação” do ano de 1973 trouxe um capítulo específico sobre a Declaração da ONU, reafirmando o país como Estado membro e apresentando os princípios basilares norteadores da proteção à infância, como se o país respeitasse

tais princípios. (BRASIL, 1973)

De fato, a Declaração dos Direitos da Criança de 1959 não passou de letra morta no Brasil, pois o Estado brasileiro foi signatário apenas no papel, e suas ações políticas e a normativa interna estavam na realidade às avessas do projeto de proteção à infância que se discutia em âmbito internacional. Ser signatário da Declaração da ONU não alterou em nada a condição de vida de milhares de crianças e adolescentes, ao contrário, o ordena- mento jurídico brasileiro do período continuou a atuar apenas sobre os “menores ditos abandonados e delinquentes”. Isso tudo, reflexo de uma política centralizadora e institucionalizante que culpabilizou os próprios menores pela sua condição de pobreza.

Foi nesse cenário que, dez anos mais tarde após o golpe militar de 1964, o senador Nelson Carneiro encaminhou ao Senado Federal o Projeto de Lei n. 105, de 5 de setembro de 1974,

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propondo um avanço legislativo para a questão infantojuvenil. Vários juristas, magistrados, professores universitários, humanistas e legisladores entenderam que o Código de Menores de Mello Mattos não atendia mais as necessidades sociais e que por isso merecia uma revisão.

O Projeto de Lei n. 105/74 previa proporcionar uma proteção especial aos menores de zero a de 18 anos, reconhe- cendo para eles o “[...] direito ao mínimo vital indispensável à sua dignidade e ao livre desenvolvimento de sua personalidade

física, intelectual e moral.” (BRASIL, 1982, art. 2º)

O senado federal constituiu uma comissão especial para discutir e votar o Projeto de Lei n. 105/74. A primeira reunião da comissão especial foi em 11 de setembro de 1974, na qual elege- ram para presidir, o senador Daniel krieger, e o mesmo indicou

o senador José Lindoso, para relator. (BRASIL, 1982)

A comissão especial do Senado apresentou treze emendas ao Projeto de Lei n. 105/74. No dia 16 de agosto de 1975 o Relator José Lindoso apresentou o Parecer n. 296, recomendando a aprovação das treze emendas e propondo um novo Substitutivo da proposta inicial, já alterado com as propostas sugeridas pelas emendas.

O Parecer n. 296/75 entendeu que o “problema do menor” no Brasil era um problema social. Dados levantados no parecer demonstraram que naquela época 53% da população brasileira era composta por pessoas de 0 a 18 anos de idade, o que correspondia a cerca de 57 milhões de pessoas. Reconheceu a condição de pobreza das famílias como a única resultante da mar- ginalização social em que estavam submetidas milhares de crianças e adolescentes, desvalidos das condições mínimas de sobrevivência

e que essa situação carecia de medidas urgentes. (BRASIL, 1982)

O parecer ainda pontuou a condição dos “menores” nos seguintes termos:

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[...] o menor deve ser considerado como vítima de uma sociedade de consumo, desumana e muitas vezes cruel e como tal deve ser tratado e não punido, preparado profissionalmente e não marcado pelo rótulo fácil de infrator, pois foi a própria sociedade que infringiu as regras mínimas que deveriam ser oferecidas ao ser humano quando nasce, não podendo, depois, agir com verdadeiro rigor penal contra um me- nor, na maioria das vezes subproduto de uma situação social anômala. Se o menor é vítima, deverá sempre receber medidas inspiradas na pedagogia corretiva.

[...] o legislador ao tratar de matéria permeada de tão vastos e difusos aspectos da vida nacional deve dispor-se à audácia – desde que conscien- ciosa – de instituir princípios, medidas e instrumentos capazes de, por um lado, assegurar a base jurídica da proteção e da assistência ao menor, e por outro, de assentar normas que viabilizem, em escala abrangente, a implantação da Política Nacional de Bem-Estar do Menor. Em outras palavras: trata-se de compor, dentro da melhor técnica legislativa, o relacionamento e as ações das entidades administrativas encarregadas da execução dessa política, almejando reintegrar o menor à vida social útil e produtiva, bem assim prevenir o processo que o marginaliza. (BRASIL, 1982, p. 449-450)

É possível visualizar os valores ideológicos impregnados nessas afirmativas, mascarados pelo princípio moralizador e institucionalizante do Estado frente à situação de miserabilidade de milhares de crianças e adolescentes. A discussão de como re- solver os problemas dos menores esteve pautada na necessidade de melhorar a execução da Política Nacional de Bem-Estar do Menor. Não se pensou em como investir em políticas públi- cas que atendessem as famílias nas suas necessidades básicas e garantissem condições de sobrevivência.

O parecer n. 296 apresentado pela comissão especial do senado continuou a insistir que a marginalidade infantojuvenil era decorrente da falta de trabalho ou ocupação de crianças e adolescentes. O parecer reforçou as práticas de institucionali- zação como solução de enfretamento a situação de delinquência e abandono infantojuvenil.

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O novo substitutivo ao Projeto de Lei n. 105/74 apresentado pelo parecer n. 296/75 foi encaminhado a Câmara dos Deputados e nessa casa figurou como relator o deputado Claudino Sales. A Câmara dos deputados montou uma Comissão de Constituição e Justiça e após algumas discussões, ofereceu um novo Substitutivo à conjectura do Senado. De acordo com o relatório e parecer da Câmara dos Deputados ficou estabelecido que o novo Código de Menores, enquanto instrumento normativo regulador do Direito do Menor, deveria se ocupar de tutelar apenas os me- nores emergenciais, ou seja, não se deveria ampliar a proteção e assistência àqueles que não necessitavam, pois estariam numa situação regular. De acordo com o relatório da Câmara,

A pessoa que constitui o sujeito do Direito do Menor não é qualquer criança, mas o menor em estado de patologia social ampla, pois que a solução do problema em que se encontra será dada através de uma decisão judicial, emanada de um processo judicial, fiscalizado pelo Ministério Público.

As emendas propostas aos artigos 1º e 2º do Projeto objetivam esta- belecer nítida distinção entre o que se constitui, genericamente, em Direitos da Criança, e o que pertence ao campo específico da tutela jurídica do Direito do Menor. Da Declaração dos Direitos da Criança, aprovada pela ONU, resulta o reconhecimento de que as necessidades básicas de toda a criança são aquelas acolhidas pelo Projeto. A projeção básica dessa Declaração é a elaboração e efetivação de programas de atuação os mais amplos possíveis, nos quais a preocupação é garantir às populações infantis e jovens as melhores condições de desenvol- vimento social e maturação biopsíquica. Já o Direito do Menor – e o Código de Menores como seu instrumento – é restrito a peculiares situações em que se encontrem certas crianças, a exigirem prestação jurisdicional. A emenda propõe que tal situação seja identificada pela expressão “situação irregular”. (BRASIL, 1982, p. 473)

Reafirma-se que a nova redação dos artigos 1º e 2º do Substituto da Câmara dos Deputados foi contra a Declaração dos Direitos da Criança de 1959 da Organização das Nações Unidas

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(ONU) que já contemplava todas as crianças como sujeitos de direitos e merecedores de uma proteção especial devido ao seu estado peculiar de pessoa em desenvolvimento. Concentrou exclusivamente no Poder Judiciário a tutela sobre as crianças