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A aplicação do questionário institucional com a gestora da unidade aconteceu em 27 de fevereiro de 2012. O objetivo da pesquisa foi descrito pela pesquisadora, que agradeceu a participação da profissional. A mesma preferiu responder ao questionário em casa e ficou de entregar na sequência.

Para fins de entendimento, transcrevi posteriormente (no apêndice B) perguntas e respostas para respectiva análise das respostas.

Foi notório que, através das respostas da profissional em questão, encontrava-se uma dissertação utópica e que remete a Política de Assistência Social nos seus primórdios, tendo em vista o caráter assistencialista/filantrópico que embasou as respostas do questionário, podendo ser exemplificado com as seguintes palavras:

___ “acredito que através de um trabalho realizado com amor, compromisso e respeito as pessoas se transformem em seres humanos melhores.”;

___ “[...] cuidar do desenvolvimento psicossocial dos menores dentro dos valores da ética e da moral e sobretudo com respeito e amor [...]”;

___ “[...] ocupar esse espaço com amor, respeito, limites e todas as outras necessidades da infância.”

As terminologias utilizadas, como “os menores”, são ultrapassadas, se comparadas às orientações vigentes, como o Estatuto da Criança e do Adolescente, que abona tal denominação desde o fim do Código de Menores, em 1927.

Foi perceptível também uma culpabilização da família em seu depoimento, descuidando o olhar observador e conjuntural que, acredito, deve ter um profissional que trabalha nesta área. A gestora não considerou que muitas destas famílias são tão vítimas quanto seus próprios filhos de uma sociedade capitalista excludente e selvagem, que atualmente deixa à margem os dependentes químicos, os desempregados, os alcoolistas – imersos numa onda de violência e banalização da vida humana, sem perceber que o contingente cresce assustadoramente. Estas respostas demonstram tal aspecto:

____ “o descaso da família dos menores assistidos. Isso repercute negativamente na sua autoestima, causando muito sofrimento para o menor pelo sentimento de abandono.”;

____ “crianças e adolescentes de 07 a 17 anos vítimas de negligência, violência física, abuso sexual e abandono. Atualmente a grande maioria dos assistidos são filhos de pais com dependência química, consequentemente são expostos a todos os tipos de risco social.”

Muitas respostas foram evasivas, sem qualquer tipo de aprofundamento como: “responder depois.”; “parcialmente, ainda precisa melhorar”; “satisfatória”. Tal objetividade, observada empiricamente, se dá pelo desconhecimento e/ou falta de aprofundamento nas orientações vigentes. Não se percebia nesta profissional o interesse em se qualificar e se atualizar, prejudicando sobremaneira sua função de coordenadora e guardiã da unidade. Essa postura assumida refletia diretamente nas funções dos demais profissionais, que, muitas vezes, em suas falas e funções, demonstravam, durante minhas observações, a falta de preparo e de incentivo a qualquer melhoria na realização de suas atividades. Neste sentido, através da observação realizada, concordo com a seguinte citação:

No entanto, observa-se ainda falta de estratégia de coordenação das várias atividades desenvolvidas e que poderiam contribuir para a promoção efetiva da convivência familiar e comunitária para as crianças e os adolescentes que vivem nesses abrigos. Registra-se também uma grande heterogeneidade na forma de organização, no regime de permanência de crianças e adolescentes, no tipo de exclusividade do atendimento e na estrutura física dessas instituições. Em certo sentido, tudo isso encobre a manutenção do desrespeito em relação a alguns princípios do ECA, especialmente no tocante à excepcionalidade e provisoriedade do abrigo e ao direito de todas as crianças e adolescentes brasileiros à convivência familiar e comunitária. Desnecessário lembrar que há ainda no país inúmeras instituições que mantêm práticas que privam quase que totalmente os abrigados da convivência social.Entre as razões que contribuem para essa situação, cabe mencionar que tais instituições enfrentam inúmeras dificuldades para o cumprimento de suas atribuições, relacionadas inclusive a questões de ordem cultural. Basta considerar que, para além das restrições financeiras, materiais e de recursos humanos enfrentadas cotidianamente, ainda é muito presente entre as entidades de abrigo a percepção de que, havendo problemas familiares, o melhor lugar para crianças e adolescentes é a instituição, onde podem “ter melhores condições de vida”. Isto acaba resultando em certa “apropriação” desses meninos e meninas pelos abrigos e na ausência de preocupação com a promoção de seu direito à convivência familiar e comunitária (SILVA; AQUINO, 2005, p.192).

Outro fator interessante que ressalto nas respostas obtidas é que, aparentemente, a guardiã não se atentava para a importância da rede de

atendimento, no sentido de desligamento dos acolhidos e seus possíveis retornos ao convívio familiar e comunitário. Não percebia que o tempo pode ser considerado o pior inimigo para esse público, tendo em vista que, quanto mais os dias passam, mais difícil será encontrar estratégias de desligamento, seja pela via da família natural, da ampliada, ou da substituta.

O Programa Família Acolhedora, citado pela coordenadora, seria uma estratégia para tentar solucionar os problemas dos acolhidos, que, no meu entendimento, precisaria ser fortalecido e acompanhado pela rede de atendimento à criança e ao adolescente. O fato observado sobre tal programa ou projeto foi o que se tornou uma rotina para algumas famílias levar os acolhidos para passar fins de semana, datas comemorativas, dentre outros, sem comprometimento algum com a respectiva criança ou adolescente. Não há um acompanhamento técnico sistemático com as famílias, no sentido de sensibilizá-las para a real situação desses meninos e meninas e chamá-las às suas responsabilidades. Existe um ponto positivo que, no meu entendimento, devo considerar: a suspensão do cotidiano dos acolhidos, que muitas vezes passam por um desgaste institucional. Essas saídas possibilitam uma melhoria na relação acolhido-unidade, mas isso não dá o direito de estabelecer uma suposta relação comercial entre família acolhedora e unidade/acolhido. Descrevo isso, pois observei que tais famílias levam e trazem crianças e adolescentes como se os mesmos fossem mercadorias e que, dependendo dos comportamentos dos acolhidos, estes podem sair para a convivência.

Concordo com Rizzini quando esta afirma que unidades de acolhimento institucional devem investir no apadrinhamento afetivo, pois o mesmo tem como:

idéia principal é promover o convívio familiar de crianças e adolescentes que estejam com dificuldade de reintegração. São casos em que se estabelece a aproximação de pessoas como padrinhos afetivos de crianças, cujas famílias não são conhecidas ou tenham perdido o poder familiar [...] As famílias dos candidatos também recebem orientações e capacitações no sentido de estarem preparadas para o apadrinhamento [...] O processo para apadrinhar começa com uma aproximação lenta e gradual; as crianças não são expostas e escolhidas. Em um primeiro momento, os padrinhos e as crianças se vêem por fotos. Após o interesse mútuo inicial, é feita a apresentação e só depois de um período de acompanhamento da família é que a criança ou adolescente pode freqüentar a casa dos padrinhos, geralmente nos finais de semana, feriados e férias (2007, p. 104 e 105).

De acordo com Rizzini (2007), o Projeto Família Acolhedora é responsabilidade do município, onde os acolhidos passam um período máximo de seis meses na residência de cada família e, em alguns casos, estas recebem um

auxílio financeiro para acolher a criança e/ou adolescente. É disponibilizada para este projeto uma equipe interdisciplinar para realização do cadastro, preparação da família para receber o acolhido e acompanhamento do processo de acolhimento. Maracanaú não dispõe de tal projeto, ficando a cargo das unidades as tentativas permeadas por falas solidárias, realizando, assim, ações amadoras e sem comprometimento de ambas as partes.

Por fim, considero que, através das respostas da gestora da unidade de acolhimento institucional e das observações realizadas, a vida institucional desses meninos e meninas depende integralmente da gestão deste equipamento, pois acredito que, por meio das orientações e encaminhamentos da guardiã, a equipe multiprofissional poderá se articular e desenvolver suas funções, sempre no sentido de buscar estratégias de solução para as situações vivenciadas por cada acolhido e/ou grupo de irmãos acolhidos.