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3 – A CORRENTE MIGRATÓRIA SULISTA E A OCUPAÇÃO DOS CERRADOS PIAUIENSES

3.1 – A mobilização do trabalho no Brasil: algumas considerações

O território brasileiro se formou a partir da migração de nacionais e de estrangeiros desde os anos de sua formação num processo contínuo de ocupação e re-ocupação de áreas. Dos primeiros portugueses49 que desembarcaram nessas terras até os nossos dias, uma das características que define a construção da sociedade brasileira é o fato dela ter sido constituída por diferentes grupos étnicos que se deslocaram para esse país, servindo de mão-de-obra e estoque de mão-de-obra às sucessivas etapas do processo de modernização capitalista. Essa modernização passada, no entanto, que teve como um dos seus pilares a disponibilidade de força de trabalho aproveitada ou em reserva, já não se efetiva plenamente no nosso atual período histórico, na medida em que a massa marginal de hoje não encontra mais os meios para empregar-se, portanto, está em disponibilidade, mas não se consumam mais as alternativas para tornar-se explorada. Isso evidencia, nesse sentido, o caráter de colapso do atual estágio da modernização.

O fato de uma mercadoria ser elevada à condição de protagonista em determinado momento histórico ou desaparecer em outro se dá pela lógica global de formação do sistema produtor de mercadorias, da qual o Brasil, assim como os demais países colonizados, tornaram-se alicerces para o processo de acumulação primitiva capitalista.

A dinâmica migratória da população brasileira esteve condicionada, seja no período colonial ou no pós-independência, pela escolha de novas áreas para a produção de mercadorias, atendendo ao sentido determinado pela demanda do mercado externo (Prado Jr., 1965). Assim, ao mesmo tempo em que o capital elege uma área para tornar-se o centro de produção de determinada mercadoria, elege também o grupo social e o coloca em movimento não importando onde ele esteja, escolhendo aquele que poderá

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Não estamos considerando os portugueses como migrantes estrangeiros, visto que o Brasil colônia era território luso.

concretizar melhor o projeto do capital. O sujeito é mobilizado ou se mobiliza quando ele internaliza as exigências de valorização do capital, em ambos os casos, entretanto, resulta numa mobilização forçada. Essa perspectiva parece-nos mais adequada para entender a lógica que comanda os movimentos migratórios populacionais. Descarta-se, assim, a adoção do enfoque escolhido pelos chamados economistas neoclássicos, segundo os quais a migração resulta de atos de vontade dos indivíduos, na medida em que, acreditam, possuem autonomia para se colocar em movimento (Salim,1992). O deslocamento espacial dos indivíduos, nessa corrente interpretativa, assenta-se numa decisão pessoal e não nas forças econômicas produtoras da mobilidade. Ou seja, o trabalhador, ao optar pretensamente por outra área de moradia, faz antes um balanço dos ganhos e das perdas de seu deslocamento; a decisão de partir passa também, em certa medida, pelo crivo da subjetividade do migrante (Becker, 1997).

A intenção aqui é olhar a migração de uma outra perspectiva, qual seja, a do trabalho. Este, ao nosso ver, é o elemento central da discussão migratória, na medida em que representa um lado do tripé da acumulação capitalista (Marx, 1968 [1894]). Para dispor do trabalho, o capital define as estratégias e aciona os mecanismos necessários para sua mobilização. O trabalhador, por outro lado, coloca-se à disposição do capital e se vê forçado a migrar, pois a única mercadoria que possui é a si próprio; vende, então, seus atributos pessoais para se manter vivo. Sujeita-se, em última análise, à ação do capital (Becker, 1997). Ou seja, é necessário que os homens disponibilizem sua força de trabalho e tornem-na móvel para poder acompanhar o movimento do capital (Gaudemar, 1977). Nesse sentido, ao recorrer ao deslocamento, o migrante busca, sobretudo, garantir que haja a possibilidade de vender sua mercadoria, a força de trabalho, em outro lugar. Ao fazer isso, o migrante não faz simplesmente um cálculo individual de ganhos que possam existir em sua mobilidade espacial, mas está sendo forçado a participar do processo migratório para poder manter a sobrevivência sua e da família. Igualmente porque o capital está exercendo sobre ele uma pressão para colocá-lo em movimento, como nos esclarece Gaudemar (1977: 17):

“Com a ‘mobilidade’ do trabalho manifesta-se sempre o modo como os homens submetem o seu comportamento às exigências do crescimento capitalista. Toda estratégia capitalista de mobilidade é igualmente estratégia de mobilidade forçada. O discurso econômico serve de verniz para demonstrar, quer a inevitabilidade do fenômeno, quer à existência de vantagens individuais ou coletivas que teoricamente ele deve apresentar”.

Exceto a situação dos negros escravizados, os distintos grupos sociais colocados em movimento no Brasil resultam dessa lógica. Formaram-se, ao longo desses cinco séculos, correntes migratórias específicas que adquiriram importância num dado momento da história econômica do país, por serem requisitadas de acordo com suas características sócio-demográficas para tornar possível a reprodução ampliada do capital.

A questão migratória brasileira do século XX, assim como em outros períodos, é ilustrativa de como o capital lança suas estratégias para colocar em movimento grupos sociais determinados. Apesar de sua complexidade e das diversas trajetórias envolvendo um volume considerável de pessoas de todos os lugares do país, dois grupos regionais ganham importância nos movimentos migratórios da população brasileira, constituindo-se duas correntes com grande destaque no cenário nacional, quais sejam: a nordestina e a sulista.

Os nordestinos representam uma corrente migratória relevante, com várias ramificações pelo território brasileiro. Essa corrente inicia-se com a decadência da cana-de-açúcar como mercadoria protagonista de transferência de riqueza para Portugal, em meados do século XVIII. O fim dessa etapa da modernização do Nordeste brasileiro fortalece o movimento populacional para fora de seus limites regionais. Mas, foi no século XX que a força de trabalho nordestina torna-se fundamental para a economia do Sudeste, sobretudo de São Paulo. Desde 1920, o governo paulista reordenou paulatinamente sua política de atração de força de trabalho, visando substituir, nas lavouras de café, os trabalhadores estrangeiros pelos nacionais. A condução dessa política contou com ampla participação do Estado brasileiro, que foi o responsável pela elaboração de leis dificultando a entrada de estrangeiros no país e, ao mesmo tempo, lançando mecanismos que possibilitassem a transferência de trabalhadores, predominantemente nordestinos e mineiros, para São Paulo (Paiva, 2000). São esses migrantes que, a partir de então, se

tornarão referências dos grupos econômicos, inicialmente dos cafeicultores e, posteriormente, dos industriais do Sudeste. Se a corrente nordestina direcionou-se, principalmente a partir da década de 1930, para o Sudeste e, posteriormente também para o Centro-Oeste e áreas da Amazônia, ou seja, seguindo uma orientação mais para o “sul”; a sulista, também de grande relevância no cenário migratório brasileiro, toma um sentido inverso seguindo mais para o “norte” (mapa 10). Enquanto a primeira direciona-se para o rural e para o urbano, a segunda apresenta um perfil mais rural, embora com implicações diretamente no urbano, pois na trajetória do grupo que acompanha a expansão da agricultura capitalista moderna deslancha uma urbanização crescente. A corrente migratória sulista foi uma das principais responsáveis pela expansão da agricultura moderna no campo brasileiro nas últimas décadas. Atualmente, essa corrente se difunde velozmente nos cerrados nordestinos respondendo por uma nova dinâmica espacial urbana e agrícola naquela região.

Identificar um fluxo migratório que se direciona para uma área do interior do Nordeste parece, à primeira vista, contraditório, na medida em que tradicionalmente a região se inseriu no contexto de modernização brasileira como fornecedora de força de trabalho para outros centros econômicos do país. Esse fato não se alterou com o florescer de uma nova conjuntura econômica local; continua do mesmo modo gerando levas de migrantes para outras regiões, trabalhadores em busca de ocupação onde ainda se vislumbra que ela possa existir; muitas vezes isso se constitui apenas num ato iludido, devido a sua implosão no mundo moderno (Grupo Krisis, 2003). A diferença que ocorre atualmente nos cerrados nordestinos, quando se compara ao seu passado recente, é o fato de agora tornar-se também um espaço que recebe migrantes. Ou seja, os cerrados nordestinos configuram-se, a um só tempo, receptor de força de trabalho de outras regiões e fornecedor de força de trabalho para fora dos limites regionais, confirmando que a modernização é sempre um processo permanente de descontinuidade.

Tal situação nos coloca diante da necessidade de buscar paradigmas que nos dêem conta de entender o fenômeno migratório na sociedade capitalista contemporânea, a qual se move cada vez mais pela crise do trabalho (vivo). Adotar aquela visão dicotômica de que a migração se mede pelo balanço entre espaços que ganham e os que perdem população não dá mais conta de explicar esse fenômeno atualmente, se é que em algum momento foi possível explicar a migração da moderna sociedade produtora de mercadorias considerando apenas esse modelo interpretativo. No processo de formação do capital, os espaços se metamorfoseiam constantemente, de acordo com as necessidades de cada momento histórico, para que aconteça a reprodução do sistema. Segundo Gaudemar (1977: 13), “Desde os inícios do capitalismo, o capital tende a subjugar todas as esferas que podem contribuir para a sua valorização e, portanto, destruir todas as esferas concorrentes, a monopolizar toda a esfera produtora ou realizadora de mercadoria”.

O direcionamento das forças produtivas obedecerá, nesse sentido, à orientação dada pelo capital. Pensar, portanto, a formação do território brasileiro para o capital, seja do passado ou do presente, requer debruçarmos sobre a questão da mobilização do trabalho, pois é necessário que os homens disponibilizem sua força de trabalho e sejam móveis para seguirem o movimento da

A tentativa, nesse capítulo, será a de compreender a corrente migratória sulista como fazendo parte das estratégias do capital de tornar os grupos sociais móveis para ampliar o processo de acumulação. Para tanto, pretende-se fazer um breve percurso histórico de tal mobilidade e a maneira pela qual a presença desse grupo no Piauí resulta na formação de uma nova dinâmica econômica, social e espacial naquele estado, particularmente na região dos cerrados.

3.2 – A corrente sulista: do núcleo irradiador à sua expansão pelo território brasileiro

A corrente sulista ou “gaúcha” – como é predominante reconhecida – possui ramificações em quase todo o território nacional, principalmente acompanhando a expansão das áreas de produção agrícola do Brasil, mas também para além de nossas fronteiras políticas, adentrando em países vizinhos como Paraguai, Uruguai, Bolívia e Argentina (Haesbaert, 1998; Oliveira & Barcelos, 1999). Em tais países, a presença de população sulista caracteriza-se também pela sua dedicação às atividades agrícolas, freqüentemente associadas a lavouras modernas de soja.

Destacam-se, nessa corrente, fortes manifestações étnico-culturais que permanecem como identidade na trajetória do grupo e que são, deliberadamente, difundidas, dentre outras: a ideologia da positivação do trabalho, advinda da cultura européia trazida pelos primeiros imigrantes; o pioneirismo na ocupação dos cerrados para o desenvolvimento da agricultura capitalista moderna; os hábitos alimentares originários principalmente no Rio Grande do sul, como o chimarrão e o churrasco; as instalações dos Centros de Tradições Gaúchas (CTGs) nas áreas onde o grupo se fixa. Tais manifestações são reveladoras das preocupações em preservar e difundir as identidades da região Sul do Brasil, especialmente no que diz respeito à “re-territorialização” das tradições gaúchas. (Haesbaert, 1997).

Os precursores dessa corrente são os imigrantes que desembarcam no Brasil nos seus primeiros anos pós-independência, liderados pelos alemães que, em 1824, fundaram a colônia de São Leopoldo, no Rio Grande do Sul. Direcionada pelo recém-constituído Estado brasileiro para ocupar terras do Sul, a colonização visava não somente garantir a manutenção do território nacional, mas também arregimentar grupos humanos para a execução do projeto de produção de gêneros agrícolas destinado ao abastecimento do mercado interno, haja vista que partes

daquelas terras, da Campanha Gaúcha, eram aproveitadas para as atividades pastoris cujo interesse maior recaía sobre os lusos brasileiros. Nos arredores dessas zonas de campos, em terras de florestas e serras, foram assentados os primeiros imigrantes, sobretudo, os teutos e os italianos.

O projeto de colonização baseou-se na pequena propriedade fundiária ocupada por imigrantes agricultores que já possuíam essa condição desde seus países de origem, na Europa. Mesmo os que não eram, converteram-se em lavradores no Brasil por imposição do Estado nacional, permanecendo nesse ramo também as gerações posteriores. Ao estudar a colonização alemã no Rio Grande do Sul, Roche (1969: 243), ressalta a importância dos imigrantes teutos para o desenvolvimento da agricultura gaúcha, como fica claro em suas palavras:

“Com efeito, é à colonização alemã que o Rio Grande do Sul deve o ressurgimento de sua agricultura. Os imigrantes alemães e seus descendentes, dos quais nove décimos ainda são agricultores, corresponderam largamente ao desejo e à esperança da administração brasileira, que encorajara sua imigração para povoar as zonas até então abandonadas pelos luso-brasileiros, e para explorá-las, desbravando-as e cultivando-as depois. De sorte que, em 1885, um autor alemão pôde escrever a propósito do Rio Grande do Sul: ‘a agricultura é exclusivamente nossa’”.

Acrescenta ainda:

“Se a legislação favorece a agricultura, o governo provincial envia, para as colônias que fundou, o maior número possível de imigrantes e faz deles agricultores, por bem ou por mal (...)” (p.103).

O fato de possuírem, em sua grande maioria, anteriormente uma forte ligação com a terra facilitou, sobremaneira, o cumprimento dos objetivos traçados para essa colonização. Além disso, pôde-se manter uma maior coesão entre os colonos povoadores, na medida em que eles puderam preservar, em solos brasileiros, certos costumes do mundo agrário europeu. Se, por um lado, os colonos lograram manter suas tradicionais técnicas no cultivo de alimentos, por outro, incorporaram, ao seu cotidiano, vários traços da cultura indígena, principalmente as práticas de uso da terra, tais como as queimadas, a rotação de

(milho, feijão preto, mandioca, batata-doce) e “até mesmo a ferramenta indígena, a cavadeira e o bastão de plantar” (Waibel, 1979: 246).

O pouco avanço, em terras brasileiras, dos métodos agrícolas trazidos da Europa e a incorporação de outros também rudimentares resultaram num rápido esgotamento do solo e, em conseqüência, tornou-se necessário avançar sobre novas áreas para continuar produzindo mercadorias agrícolas. Essa expansão freqüentemente ocorria sobre as matas virgens no planalto rio-grandense e, posteriormente, nos demais estados do Sul do Brasil. O uso de instrumentos agrícolas com pouca tecnologia ainda era bastante freqüente nas propriedades do Rio Grande do Sul ao longo de todo século XX, principalmente na sua primeira metade. Essa situação passa a se alterar apenas no pós-Segunda Guerra Mundial, quando acontecem as primeiras iniciativas de incorporação de equipamentos mais modernos, conforme relata Brum (1988: 56/59):

“(...) Os instrumentos de trabalho eram simples: foice e machado, para o desbravamento e derrubada do mato; enxada e arado de tração animal, para o preparo do solo e controle das ervas daninhas; máquina manual de plantar; foicinha de cortar trigo, arroz, etc.; máquina manual de matar formiga; carroça e outros veículos de tração animal, para o transporte, além de outros. As técnicas de preparação do solo, cultivo, colheita, etc. eram fruto da experiência e se transmitiam de uma geração para a seguinte, aperfeiçoadas lentamente. A sabedoria da vida e do trabalho tinham grande valor. As principais energias utilizadas eram oriundas diretamente da própria natureza: energia humana e animal, da água e do vento. (...) Após a Segunda Guerra Mundial foi se tornando cada vez mais sensível o declínio da agricultura tradicional. Essa queda progressiva manifestou-se primeiro nas áreas de ocupação mais antiga e avançou, com relativa rapidez, para as áreas de colonização mais recente”.

Outro fator importante da migração do colono para novas terras diz respeito ao tamanho dos lotes concedidos pelo governo brasileiro, variando de 25 a 30 hectares, normalmente em relevo irregular, o que era considerado insuficiente para as características das famílias de imigrantes. Elas demandavam extensões maiores, tendo em vista que as técnicas adotadas limitavam o uso mais prolongado dos terrenos. Ademais, o acelerado crescimento populacional decorrente das altas taxas de natalidade nas famílias imigrantes provocava uma pressão por terra e, conseqüentemente, uma rápida divisão da propriedade da família. A expansão demográfica fazia desaparecer rapidamente as áreas ainda disponíveis para colonização. No término da década de 1940, por exemplo, registrava-se que nas

colônias do Alto Jacuí e Alto Uruguai, no Rio Grande do Sul, não havia mais terras suficientes para absorver os contingentes populacionais, devido à elevada formação de novos cônjuges que demandavam terras livres (Roche, 1969).

Tais fatores produziam uma situação que se tornou comum nas regiões de colonização estrangeira no sul do Brasil, qual seja, poucos anos após a ocupação esgotava-se uma zona de povoamento, e logo se partia em direção a uma outra que pudesse abrigar as novas gerações de produtores agrícolas. Waibel (1979: 256/7), ao comentar o tamanho da propriedade concedida aos imigrantes colonos, manifestava seu descrédito com o sucesso de um tipo de colonização que se efetivava a partir do modelo de lotes pequenos, famílias numerosas e parcos recursos financeiros e que se valia do uso de sistemas agrícolas deficitários num relevo de topografia irregular. Nesse sentido, diz que:

“Por todo o sul do Brasil, o tamanho médio da propriedade de um colono da mata é de 25 a 30 hectares. É de surpreender como a maioria dos colonos e até agrônomos aceitam este tamanho, sem sequer duvidar da sua justificação e sua conveniência. Na minha opinião, uma propriedade de 25 a 30 hectares é excessivamente pequena para a aplicação do sistema de rotação de terras, especialmente em regiões montanhosas. O problema do tamanho adequado as propriedades é vital para qualquer projeto de colonização, e devia ser estudado cuidadosamente de todos os ângulos, antes de ser iniciada a colonização. Para a compreensão alemã minimale ackernahrung; refere-se ela à mínima quantidade de terra necessária para proporcionar a um agricultor e sua família um padrão econômico e cultural decente. O minimale ackernahrung depende principalmente de dois fatores: as características de terra e o sistema agrícola que o lavrador deverá aplicar”.

A rápida divisão da propriedade – tornando inviável a absorção dos novos membros da família de colonos – teve como conseqüência imediata o avanço da fronteira agrícola sobre as terras devolutas gaúchas e, posteriormente, para os demais estados do Sul (mapa 10). Na medida em que elas também se esgotavam, surgiam novas modalidades de relações de produção, as quais asseguravam que parte da população pudesse permanecer em sua área de origem, como as relações de arrendamento. Esse sistema começa a se difundir pelas áreas de colonização, sobretudo nas mais antigas. De acordo com Roche (1969: 322):

“Esperando, sem dúvida, o não fracionamento da propriedade, vemos surgir uma nova tendência, ainda tímida, mas clara, a do reagrupamento da exploração: os últimos censos revelam-nos que há menos estabelecimentos agrícolas que propriedades. Essa evolução, demasiado recente para ter modificado profundamente a estrutura agrária das colônias, é a conseqüência da contradição que existe entre o direito sucessório e o modo de exploração. O sistema de empréstimo por arrendamento começa a difundir-se, em correlação com o florescer das vilas rurais, onde se estabelecem os pequenos proprietários que já não podem viver em suas terras. Assim, modificam-se, sob nossos olhos, as relações ‘tradicionais’ da propriedade e da exploração”.

No mesmo ritmo acelerado com que se desencadeava a ocupação de novas terras, seguia também a especulação imobiliária. O comércio de terras nas frentes de expansão dos estados do Sul do Brasil torna-se um negócio lucrativo para alguns colonos e para empresas privadas de colonização. A abertura de uma nova área significava para o colono uma garantia de possuir terra própria para morar e produzir, mas também para aplicar seus recursos financeiros. Adquirir um ou mais lotes representava, para os agricultores mobilizados, uma poupança segura, na medida em que, ao empregar as suas economias nesse tipo de investimento, tinha-

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