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CAPÍTULO II: MAMANGUAPE (PB): CONSTITUIÇÃO URBANA E CENTRALIDADE

2.2 A decadência econômica e a retração da centralidade

Mamanguape era considerada até o ano de 1900 como uma das cidades mais promissoras do Estado e conhecida como a cidade dos sobrados e das grandes casas pertencentes a comerciantes e senhores de engenho (COSTA; LINS, 1992, p. 41). Havia alcançado uma posição relevante na região: tinha um ancoradouro de pequenos barcos, açúcar, sobrados de azulejo, agências de Pernambuco e o comércio dos brejos de Guarabira, sertões de Picuí e zonas convizinhas, inclusive do Rio Grande do Norte (MARIZ, 1985, p. 29). No entanto, alguns acontecimentos de cunho econômico e político provocaram transformações que custaram grandes prejuízos à Mamanguape.

A abolição da escravatura, o colapso dos engenhos e o enfraquecimento da indústria canavieira geraram um primeiro impacto e contribuíram para o enfraquecimento da economia e do comércio mamanguapense.

Outro fato reputado como influente na decadência de Mamanguape, foi o fechamento e a transformação dos Engenhos após a Abolição da Escravatura. [...]. Na lavoura açucareira o escravo foi o fundamento de toda produção colonial. O Engenho para funcionar bem, dependendo do seu tamanho, necessitaria de 50 a 100 escravos. Com a abolição da Escravatura, veio o enfraquecimento dos Senhores de Engenho e Fazendas (COSTA, 1986, p. 168).

Era de se esperar uma recessão econômica após essas mudanças, principalmente, porque a base da economia nordestina e, concomitantemente, a mamanguapense foi, durante muitos anos, a açucareira. Porém, o maior golpe nas suas atividades mercantis ocorreu quando entrou em funcionamento a estrada de ferro que ligava Cabedelo-João Pessoa-Sapé-Guarabira-Natal, deslocando o fluxo comercial para Guarabira, isto no fim do século XIX e início do século XX. O

projeto vinha sendo estudado desde 1870, mas este acabou deixando de lado a cidade de Mamanguape (COSTA, 1986, p. 73). Com o tráfego da Conde d'Eu, Mamanguape decai violentamente (MARIZ, 1985, p. 29). Projetos para contemplação de Mamanguape na rota dos trilhos foram pensados, no entanto, ficarou apenas no papel; e o caos se instala.

A população de Mamanguape entrou em verdadeiro pânico, quando verificou que as riquezas estavam fugindo de lá. As mercadorias antes comercializadas e embarcadas pelo Porto de Salema, estavam sendo comercializadas em outras cidades e transportadas em vagões sobre os trilhos da Conde D'Eu, depois, Great Western.

Cada comerciante que via sair outro da Cidade, no dia seguinte, também fugia dela. Desta forma, em pouco tempo estavam fechadas as casas comerciais e as residências... Parecia ter havido uma peste na Cidade, onde não seria mais possível a vida (COSTA, 1986, p. 167).

Era a cartada final para o desmoronamento da economia de Mamanguape, os comboios vindos do sertão agora paravam ao pé das locomotivas e até as águas da maré se afastavam do Salema, deixando o porto assoreado, o que impediu o tráfego das embarcações. Ao referir-se ao romance Fretana de Carlos Dias Fernandes, Celso Mariz traz algumas curiosidades que sintetizam a situação deplorável daquele momento. “Até o próprio cemitério, no alto de sua colina cretácea, jamais descerrava o portão de ferro para acolher um defunto. Nem mesmo gente para morrer havia no triste empório em ruínas dentro em cujas ruas e praças tanta gente outrora se movera, em tarefas de trabalho em ruidosas expansões de jovialidade” (MARIZ, 1985, p. 27).

As transformações e impactos não foram apenas sentidos em escala local, pelo contrário, trouxeram consequências que mudaram a configuração econômica paraibana em relação aos estados vizinhos. Silva (1997, p. 03) afirma que, com a estrada de ferro, uma nova regionalização se impôs, secionando o território paraibano cuja produção econômica passava a fluir para as cidades de Natal, Mossoró, no Rio Grande Norte, Fortaleza e Recife; tornando-se a Paraíba submetida a esses centros comerciais, em decorrência do traçado da linha férrea.

Essas decisões tinham, de acordo com alguns autores contemporâneos à época, um cunho fortemente político em defesa do crescimento da Capital da Província, que se sentia ofuscada com o esplendor galgado por Mamanguape; e isso contribuiu não só para a decadência desta última, mas também para essa submissão comercial que a Paraíba passou a ter em relação a outros estados.

Até 1900 ainda resistiam ali os últimos elementos de vida do antigo esplendor. Roque de Paula Barbosa e João Rafael tinham fábricas de cigarro, os Finizola tratavam de montar um maquinismo de beneficiamento da borracha e da mangabeira. Outros estabelecimentos de algum vulto porfiavam de portas abertas. Mas em 1904 os trilhos da secção da Conde d'Eu se ligavam a Natal sob o controle da Great Western e as rotas do comércio regional se alteravam de vez como um assédio sobre Mamanguape. Encerrava-se o ciclo de ouro da vida da cidade. Parecia pré-histórico o tempo dos armazéns repletos de freguesia, da navegação constante para outros portos, do poderio das firmas e do comércio local (MARIZ, 1985, p. 28).

Encerra-se o período de maior relevância econômica de Mamanguape e, juntamente, decai o poder de atração que a cidade tinha em relação às de seu entorno as quais dependiam do seu comércio e serviços (principalmente do porto). Mas, após algumas décadas de recessão, surgiram oportunidades que deram um novo fôlego econômico para a cidade.

O primeiro relampejo de desenvolvimento deu-se em 1917 quando estrangeiros começam a adquirir terras pertencentes ao município de Mamanguape, correspondente às terras do antigo Engenho Preguiça, aonde iria se assentar a Fábrica de Tecidos Rio Tinto, que ficava distante seis quilômetros da cidade de Mamanguape. Assim, em 27 de dezembro de 1924, é inaugurada a fábrica. Apesar das instalações não se localizarem na sede da cidade, não há como negar que a região foi muito beneficiada, pois novos volumes de negócios surgiram, benefícios indiretos se evidenciaram e uma perceptível melhoria no comércio de Mamanguape. Eram recursos novos que passaram a circular, trazendo novo alento à economia da região (COSTA, 1986, p. 79).

Porém, ainda estava longe de Mamanguape recuperar o vigor de outrora e, para complicar mais ainda a situação, a cidade enfrentou, entre as décadas de 1930 e 1940, um tumultuado período correlacionado à administração pública, tendo sido a prefeitura ocupada por vários prefeitos, alguns exercendo essa função por menos de um ano de duração. Esses fatores prejudicavam ainda mais o andamento de projetos relacionados à recuperação econômica do município (COSTA, 1986, p. 82). No entanto, posterior a toda essa crise, Mamanguape com a chegada de alguns empreendimentos, mas uma vez tendo como base econômica o setor sucroalcooleiro, novas configurações reacendem, serviços antes inexistentes na cidade começam a ser oferecidos, recolocando Mamanguape ao papel de ponto, nó de centralidade de uma região.