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2 CONSIDERAÇÕES SOBRE AS NOÇÕES DE EDUCAÇÃO

3.3 A CÉLULA PSÍQUICA

3.3.6 A dinâmica das categorias e a qualidades das interações

Apesar de termos abordado cada categoria separadamente, como meio de sistematização, o STAA as compreende de forma complementar e correlacionada. A alteridade, representada principalmente pela relação com o outro, pode ser considerada a propulsora do movimento que ocorre nas demais categorias, representando a importância das relações que os seres estabelecem com o mundo ao seu redor. Se fizermos uma retrospectiva do estudo individual de cada categoria, iremos perceber a presença da linguagem e das interações humanas em cada uma delas (PALUDO, 2013).

Entretanto, considerar o movimento e a interação como molas desencadeadoras do desenvolvimento dos demais aspectos psicológicos não significa que qualquer interação garanta sucesso no “tornar-se humano”. A busca por interações harmoniosas representa a chave para a construção de indivíduos com identidade, self e resiliência em equilíbrio, conduzindo a outras interações harmoniosas num sistema retroativo.

61 Acrescemos ainda que, cada categoria representa o meio pelo qual uma dimensão da existência se apresenta; com suas especificidades e características. Assim, destacamos as dimensões configurativa, recursiva, criativa e moduladora.

Como vimos, a Identidade pode ser compreendida como as características

intrínsecas ao indivíduo, pelas quais ele pode ser reconhecido; entretanto ela não deve ser entendida como fixa. Segundo o STAA, o ser se compõe nos processos de troca, estando num trânsito contínuo com o outro. Dessa forma, a identidade é alargada do campo individual ao relacional, estruturando-se em uma rede de influências mútuas. Ela [a identidade] é explicada como proveniente da intersecção de diferentes elementos: “das características organizativas do self; das interações vivenciadas nas relações de alteridade; e das possibilidades de expansão e criação providas pela resiliência.” (Ibidem, p.94).

O STAA apresenta a identidade como fundamento da dimensão

configurativa porque é o fenômeno que configura, conforma, delineia, ou seja, estabelece uma certa forma, identificando uma pessoa ou coisa, referenciando-a enquanto algo definido e, ao mesmo tempo, diferenciando-a das demais. (Ibidem, p. 95).

Enquanto a identidade dá forma àquilo que se constrói durante a vida, possibilitando a exposição de si mesmo para o mundo, o Self se constitui com todos os sentimentos e percepções que o indivíduo tem de si mesmo e do outro; sendo ele quem fomenta a identidade. Ele [o self] é o fundamento da dimensão recursiva: guarda todos os recursos psíquicos que o indivíduo desenvolveu e conhecimentos que adquiriu, modulando seus comportamentos e predispondo o indivíduo à ação. Além disso, é ele o responsável por “arquivar” e organizar os conceitos apreendidos e desenvolvidos sobre o mundo, o que significa que está diretamente relacionado aos modos de lidar com a realidade, aos níveis de abstração que o indivíduo atinge e os caminhos que percorre para isso. Porém, vale ressaltar que essa categoria também se organiza de forma relacional e interdependente:

O “eu”, segundo esse raciocínio, é construído nas relações sociais, à medida que se autoavalia e reavalia o mundo, (re)estrutura e (re)significa, o que provoca a reorganização do sistema de crenças autorreferenciadas. Assim, o “eu” deixa de ser um ideal “egoísta” ou “egocêntrico”, liberal(izado) da interdependência mútua que todas as coisas têm. (Ibidem, p. 97).

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Quanto à Resiliência, a terceira categoria aqui mencionada, Sant’Ana-Loos e Loos-Sant’Ana (apud PALUDO, 2013) explicam que ela é

[...] por excelência, a capacidade de se expandir, pois as soluções buscadas para enfrentar qualquer situação nova ou desafiadora

exige, incondicionalmente, esta abertura para novas

reorganizações, portanto, para a criação de novos formatos, novas configurações, conforme as interações demandarem. (PALUDO, 2013, p. 100).

Dessa forma, o STAA não reduz a compreensão desse constructo às

adversidades materiais, mas a amplia, considerando como situações adversas as variadas possibilidades de dificuldades encontradas na lida com o mundo. A ausência desses recursos já “prontos” para a lida com as situações faz com que o indivíduo necessite criar novas estratégias que lhe forneçam expectativas de sucesso e impeçam que ele sucumba. Por esse motivo a resiliência é o fundamento da dimensão criativa.

A quarta categoria, complementar às outras três, é a Alteridade. Podemos dizer, sinteticamente, que ela se configura na relação com o outro e na importância do outro no desenvolvimento do ser; sendo fundamental a existência de relações qualitativas que confluam para uma interação harmônica. Conforme já mencionado, isso não significa a exclusão dos conflitos, uma vez que eles são ensejos de crescimento e busca pelo equilíbrio (PALUDO, 2013). Também podemos dizer que é na relação com o outro que o indivíduo afirma e (re)alinha as crenças sobre si mesmo, constituindo-se assim a dimensão moduladora.

Como podemos perceber, o STAA “busca demonstrar o impacto das diversas forças que influenciam o desenvolvimento humano, tendo como foco primeiro a análise da qualidade das interações: ou seja, como elas se afetam mutuamente.” (PALUDO, 2013, p. 92). Assim, esses constructos são vistos de uma forma ampliada, relacionando-se e influenciando-se mutuamente, compondo o movimento dinâmico do desenvolvimento; não sendo possível tratar de uma categoria sem mencionar as outras.

Tal modo de olhar o desenvolvimento humano nos ajuda a retomar a busca pela visão do ser humano monista, mesmo que categorizado em constructos como meio de estudo e compreensão. Este é um olhar que também podemos encontrar na

63 Antroposofia, filosofia que fundamenta a Pedagogia Waldorf, a qual abordaremos a seguir.

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4 A PEDAGOGIA WALDORF

A Pedagogia Waldorf foi fundamentada por Rudolf Steiner (1861-1925), austríaco nascido em Kralevec. Filho de funcionário da estrada de ferro local, formou-se em engenharia em Viena e se doutorou em filosofia, sendo editor das obras científicas de Goethe. Tem uma extensa publicação de livros e um histórico de palestras e conferências vasto, sendo estas últimas agrupadas em vários volumes bibliográficos. Sua contribuição em diversas áreas, centrando-se e orientando-se sempre pela Antroposofia, se mostra como possibilidade de superação do materialismo e têm, até hoje, repercussão em todo o mundo (LANZ, 2011).

Segundo Lanz (2011), o surgimento da primeira escola fundada por Rudolf Steiner se deu em 1919, quando o diretor da fábrica de cigarros Waldorf-Astoria (Stuttgart, Alemanha) o solicitou que fundasse uma escola para os filhos de seus operários. A essa altura Steiner já havia desenvolvido grande parte de seu arcabouço teórico, além de já ter experienciado a responsabilidade de educar. A primeira escola Waldorf representou o impulso de Rudolf Steiner em achar soluções práticas para situações pedagógicas concretas (LANZ, 2011). Segundo Veiga (2012), a pedagogia Waldorf busca:

Processos educacionais que incitem potenciais espirituais e tenham por fim levar a genuínas inovações científicas e sociais, e não mudanças previamente determinadas que apenas pretendam dar conta de sucessos econômicos. (VEIGA, 2012, p. 45).

Ela se orienta em função do desenvolvimento de um indivíduo em crescimento e se pergunta “de que precisa um ser humano em termos de matéria de ensino e atividade de ensino para se desenvolver integralmente, tornando-se uma personalidade autônoma?” (Ibidem). Nesse sentido, busca formar indivíduos com potencial criador e inovador que possam ir além dos preceitos políticos-ideológicos ou econômicos de uma sociedade (VEIGA, 2012).

Tudo isso pode parecer uma grande utopia. Idealismo puro, incapaz de alcançar a realidade concreta. E nesse ponto, é necessário conhecer as escolas Waldorf para perceber de que maneira ela tem se ocupado da formação de indivíduos com responsabilidades que vão além da ideologia materialista e caminha em direção ao ideal espiritual de educação. Aqueles que buscarem esse reconhecimento (no mundo concreto) perceberão que a Pedagogia Waldorf nos

65 mostra uma real possibilidade de oposição ao modo racionalista de ensino-aprendizagem; e que, neste caminho, integra a arte na educação para além de um conteúdo específico:

Ela [a Pedagogia Waldorf] busca a condução do indivíduo a partir de si mesmo, pelo o que o homem realmente é; é a “educação como arte” que faz o indivíduo experienciar o nexo da realidade. Também instiga a verificação da diversidade percebida da realidade e sua consistência como articulação de um sentido de unidade; é “arte na educação”. Ainda, direciona o sujeito à criação dos movimentos

existenciais que resolvam as dificuldades de ser do homem; é a

“educação para a arte”. Igualmente, coloca o aprendiz no conhecimento das diversas dimensões intelectuais da expressão do pensamento humano; é a “educação por meio da arte”. (SANT’ANA; LOOS; CEBULSKI, 2010, p. 122).

A Pedagogia Waldorf, baseando-se na compreensão de mundo e de ser

humano de Steiner, foi desenvolvida como um dos afluentes da Antroposofia –

ciência desenvolvida por esse autor que centraliza todas as suas contribuições. Assim, falar em Pedagogia Waldorf implica, diretamente, um pequeno conhecimento sobre a Antroposofia, uma vez que a estrutura daquela é organizada segundo a compreensão de mundo desta.

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