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A EDIÇÃO DE B OM DIA A LEGRIA 63

No documento Anti-heróis no cinema (páginas 68-72)

6   PROJECTO FINAL 61

6.2   A EDIÇÃO DE B OM DIA A LEGRIA 63

A montagem deste filme foi feita com a intenção de manter constantemente um bom ritmo para o espectador, conseguindo exprimir a ideia da história que o realizador, João Lourenço, tinha em mente e retirar o melhor emocionalmente de cada ator. Algumas obras serviram de referencia para a criação deste filme, tais como “The Moonrise Kingdom” (2012), “The Royal Tenenbaums” (2001) e “The Life Aquatic with Steve Zissou” (2004) de Wes Anderson, “Eternal Sunshine of the Spotless Mind” (2004) de Michel Gondry e “2001: A Space Odyssey” (1968) de Stanley Kubrick. Como o “Bom Dia Alegria” (2014) é altamente influenciado pelo trabalho de Wes Anderson, a realização, direção de fotografia, direção de arte, montagem e banda-sonora tiveram em conta as suas obras e isso foi transposto para a tela, essencialmente devido a toda a centralidade observada durante o filme, especialmente observada através da direção de fotografia e da direcção de arte. Durante a montagem o objetivo era exacerbar este tipo de composição na imagem e ao mesmo tempo demonstrar a relação do género

da representada no filme “Eternal Sunshine of the Spotless Mind” (2004), que as personagens principais mantinham e desenvolviam.

No primeiro rough-cut da curta-metragem, a duração do filme rondava os vinte e dois minutos, algo que não era de todo pretendido pois originalmente o filme estava apontado para os dezassete minutos. Algo que o João Lourenço pretendia era que o filme fosse uma “montanha russa” do início ao fim, ou seja, o objetivo passava por fazer com que o filme fosse bem dinâmico e mantivesse um ritmo alucinante durante a sua duração. Para o efeito, era necessário cortar várias partes que de uma ou outra forma abrandassem a narrativa rítmica. Este objetivo foi conseguido ao fim de várias semanas de edição e de análise conjunta do que seria ou não pertinente para o projeto.

A construção da personagem de Óscar através da montagem foi feita de forma a que se conseguisse retirar o melhor do ator, de forma a que o público sentisse as emoções que a personagem estaria a sentir. A montagem deste filme, tendo em conta a personagem como um anti-herói, foi efetuada de forma a Leonor fosse a protagonista e Óscar o antagonista. No entanto, com o desenrolar da narrativa, a personagem de Óscar ia tendo mais tempo na tela, e consequentemente, como previsto no argumento, iria transformar-se no protagonista.

O que interessava fazer, era demonstrar que cada uma, tanto o Óscar como a Leonor tinham as suas qualidades, mas também tinham os seus defeitos. Embora no ínicio do filme o publico pudesse interpretar a Leonor como uma pessoa autoritária e arrogante, ao longo do filme ia compreendendo os seus motivos para o ser, e desta forma racionalizava as suas atitudes. Já com Óscar acontece o mesmo, no ínicio do filmes é depreendido como a personagem cómica, o que cria logo um laço com a audiência, mas a certa altura no filme o público começa a entender que ele é simplesmente um miúdo mimado que se quer divertir. Esta ideia é alterada no momento em que se revela que o Óscar foi abandonado pelos pais, e ainda é acentuada no momento em que também a Leonor o abandona. Neste momento, o público sente pena pela personagem. Karl Iglesias (2005) diz que quando uma personagem é abandonada por um ente querido gera pena por parte do espectador.

Durante a rodagem foi possível compreender quais seriam os melhores momentos protagonizados pelo ator, pois a reação no set de rodagem à sua representação foi unânime, em certos momentos, o Cristóvão Carvalheiro foi sublime na criação da personagem do Óscar.

A cena onde Leonor e Óscar jogam ténis de mesa é o clímax dramático do filme. Nesta cena, Leonor fala abertamente com Óscar, confrontando-o com a sua infantilidade, o seu desinteresse por tudo e sua falta de vontade de quebrar a sua rotina. Num primeiro instante opta- se pela inclusão de um plano geral, mostrando que ambas as personagens estão em pé de igualdade, antes da sua discussão.

Figura 26 - Imagem de "Bom Dia, Alegria!" (2014) de João Lourenço

A cena prossegue com variações de planos médios de ambas as personagens, até que a conversa começa a ficar intensa e começam a tocar-se em pontos pertinentes e começa a haver uma interpretação de sentimentos de ambas as partes, começando a progredir para planos aproximados e por último para close-ups. À medida que a escala de planos vai sendo apertada, percebe-se figurativamente que a cena está-se a intensificar, mas também vai havendo uma aproximação do público a nível emocional. Se a escala de planos tivesse sido abordada de forma inversa, ou seja a ir do close-up para o plano geral, tinha-se criado um distanciamento do público, pois as personagens iam ficando mais distantes.

Figura 27 - Sequência de imagens de "Bom Dia, Alegria!" (2014) de João Lourenço

Esta cena acaba com o mesmo plano que começou, demonstrando que as duas personagens nesta cena voltaram ao ponto de partida, distanciando-se uma da outra.

Figura 28 - Imagem de "Bom Dia, Alegria!" (2014) de João Lourenço

Esta cena é a primeira e única no filme onde as duas personagens demonstram os seus sentimentos. Enquanto que nas outras cenas, Leonor mantem a sua postura profissional, e Óscar a sua postura irreverente, nesta é mostrado ao público o lado emocional de cada um. Daí ter sido escolhida para demonstrar como a perceção de cada uma das personagens poderia ter sido alterada. Devido à escala de planos utilizada nesta cena, ela servirá para explicar como se poderia ter alterado, através da montagem, o tipo de personagem que a Leonor ou o Óscar são. Se a escala de Óscar se não sofrer alterações e ficasse conforme está, mas a escala de planos de Leonor fosse alterada, e durante toda a cena só se mostrasse Leonor no plano americano, isto resultaria numa aproximação do público da personagem de Óscar, e haveria um distanciamento da personagem de

Leonor. Isto também significaria que Leonor não tem qualquer tipo de empatia com a personagem de Óscar e queria manter a sua distância social.

No entanto, se ao invés se tivesse mantido a escala de planos de Leonor, mas se tivesse mantido Óscar no plano americano durante toda a cena, o distanciamento ocorreria na personagem dele. Neste caso, a imagem de Óscar que passaria, seria a de uma personagem irresponsável que não quer ser mudada. Devido ao tema da conversa, o público ficaria confuso pelo contraste entre as palavras dele, que apelavam a que Leonor ficasse com ele, e a distância resultante do permanente plano americano em que ele seria mostrado. No entanto, há que ter com conta que esta análise só se aplica devido ao contexto emocional da cena. Se as duas personagens tivessem a abordar outro assunto(como acontece noutras cenas do filme), a questão da alteração das escalas de planos poderia confundir o espectador.

Na construção de Óscar nesta história, começou-se por mostrá-lo como sendo o antagonista, pois Leonor era o principal foco da história no ínicio do filme. Isto foi feito de forma a que Óscar aparecesse pouco no ínicio do filme, e à medida que a narrativa ia evoluindo, ele fosse aparecendo cada vez mais. Isto fez com que ele se tornasse no protagonista, pois na segunda parte do filme, ele é o principal foco da história. Para o efeito, chegou-se a tirar duas cenas de Leonor, dando mais destaque a Óscar. Isto fez com que houvesse uma aproximação por parte do público à personagem de Óscar, como era pretendido.

No documento Anti-heróis no cinema (páginas 68-72)