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A EDUCAÇÃO FÍSICA COMO CENTRO DAS FESTAS ESCOLARES

4. ENTRE MODOS DE SIGNIFICAR A EDUCAÇÃO FÍSICA NA ESCOLA: CONFIGURAÇÕES DE

4.3 A EDUCAÇÃO FÍSICA COMO CENTRO DAS FESTAS ESCOLARES

A EDUCAÇÃO FÍSICA COMO CENTRO DAS FESTAS

ESCOLARES

Consolidando a ideia de que a Educação Física da escola é determinada na ação docente expressa no fazer do professor, o posicionamento de Júlia contribuiu para um novo direcionamento com relação à inserção das professoras de Educação Física nas demais reuniões de pais e em outros momentos. As pedagogas passaram a reservar um tempo para a fala desses profissionais, com uma organização diferenciada, na qual se solicitou a contribuição dos estagiários da escola. Nesse sentido, é importante dizer que não era essa a organização inicial quando começamos a observação. Antes, as professoras de Educação Física ministravam suas aulas e não tinham oportunidade de participar dos encontros; elas ministravam aulas no momento das reuniões para que nenhum aluno fosse dispensado cedo, como exige a Secretária Municipal de Educação.

Também observamos essa mesma preocupação das pedagogas com relação ao Conselho de Classe. Elas organizaram os tempos para que o Conselho acontecesse com a participação das professoras de Educação Física, de Arte e de Língua Inglesa, juntamente com as regentes. Isso só ocorreu em função da primeira reunião de pais na qual a professora Júlia se posicionou. Para essa nova organização, as pedagogas também contaram com a colaboração dos estagiários.

No segundo momento do primeiro Conselho, cada pedagoga solicitou que as professoras expusessem a situação dos alunos em termos de aprendizagem e comportamento. Nesse sentido, cada professora, inclusive as professoras de Educação Física, pôde falar e ser ouvida sobre o que vivia em aula e o que sabia a respeito de cada aluno. Após essa explanação, as pedagogas solicitaram que as professoras apontassem algumas alternativas. As professoras lançaram algumas propostas, como: conversar com os pais, elaborar propostas de intervenção e até remanejar alunos de uma sala para outra.

Outro espaço em que observamos o esforço de articulação das pedagogas foi nas reuniões da escola que tinham a finalidade de discutir e encaminhar situações pertinentes ao cotidiano escolar. Em um desses encontros com as professoras

regentes, elas tentaram dar coesão ao trabalho integrado dos diversos professores. A motivação para esse acontecimento foi a festa junina. Assim, elas organizaram com as professoras os dias e os horários em que as regentes ajudariam as professoras de Educação Física nos ensaios das danças para a festa. Percebemos aí um empenho das pedagogas e da diretora para que o planejamento acontecesse em função da festa.

O segundo ponto da pauta, nesse planejamento, foi encaminhado pela coordenadora Daniele. Refere-se à data para a festa junina, que não daria mais para acontecer no dia 28 de junho. Primeiro, porque estava muito próximo; segundo, porque, nessa data, os pais ou responsáveis ainda não teriam recebido pagamento. Após essa fala, o grupo manifestou sua concordância em mudar a data, passando para o dia 5 de julho. Data em que os pais e ou responsáveis já teriam recebido pagamento.

O assunto festa junina assegurou o que se desejava em termos de articulação do trabalho na escola. A diretora comunicou ao grupo que a professora Júlia precisava de ajuda e outra organização do tempo foi pensada para os ensaios, uma vez que a professora só estava na escola às terças e quintas-feiras. A pedagoga sugeriu, conforme indicação das professoras no planejamento, a junção das turmas por séries, explicando que uma professora ajuda nos ensaios e duas ficam com as demais crianças que não estão ensaiando. Não houve nenhuma manifestação em contrário. As professoras de Educação Física apontaram a necessidade de as pedagogas encaminhar aos pais ou responsáveis um bilhete, solicitando autorização para os alunos ensaiarem e, ao mesmo tempo, comprometendo-se em levar o aluno no dia da festa para dançar.

Júlia estava preocupada com a organização da festa que ocorreria em junho de 2008. Como pesquisadora, fiquei em dúvida e perguntei a ela o que pensava sobre as atribuições da disciplina Educação Física relacionada com as festas nas escolas. A professora, então, respondeu: “[...] vejo como um estigma, uma cultura da escola, mas, eu gosto e não me importo de participar com essa atribuição. Alguns colegas não fazem de jeito nenhum”. Nesse ponto, o reconhecimento da possibilidade de tensões cotidianas, particularmente, vividas em cada um dos espaços escolares

pesquisados influenciou diferentemente não apenas as representações produzidas, como também as práticas concretas.

Considerando que a prática docente é decorrente de uma intencionalidade, perguntei novamente: “Como você articula os conteúdos que está desenvolvendo com as festas previstas?”. Ela respondeu: “É por isso, que vim perguntar a data da festa junina. Gosto de saber antecipado, de forma que haja uma articulação. Exemplo: trabalhar os ritmos para as danças, pensar nas coreografias, etc.”.

Nota-se, na fala de Júlia, uma certa ambiguidade nos modos de atuar dos professores de Educação Física. A impressão que tivemos é que, mesmo reconhecendo o estigma de relacionar com a Educação Física à festa, a professora abre mão de alguns princípios na tentativa de ver reconhecido o lugar da disciplina e da sua intervenção na vida escolar.

Podemos identificar que essa ambigüidade pode vincular-se à compreensão de Goodson (2008 p. 21) quando considera que as formas de conhecimento que produzimos e utilizamos estão estreitamente ligadas às percepções que temos de nós próprios e às projeções que fazemos de nós mesmos. Do mesmo modo, as formas de conhecimento que os profissionais possuem estão substancialmente implicadas no tipo de pessoas que são e que acreditam ser. Contudo, essas formas de conhecimento podem ser reestruturadas. Como resultado disso, acirra-se a tensão entre o tipo de pessoa que os docentes são e aquilo que os outros entendem que eles são.

Percebe-se, no processo de organização da festa junina na Escola Tempo de Agir, um potencial de integração entre profissionais tendo em vista a festividade. É uma lástima que se articule a intervenção profissional a um momento que já perdeu o seu sentido em termos pedagógico, uma vez que essa festa, para a escola, tornou-se um fim em si mesma, inquestionável. Sem reflexões, a festa junina, na maioria das escolas, é apresentada como se cultura só se adquirisse no mundo globalizado, ou socialmente desenvolvido. Descaracteriza-se, assim, a imagem do ruralista que aplaude ao ver sua cultura exibida, sem perceber que está sendo cobaia das estratégias de mercado, fortalecida nos meios educacionais (CAMPOS, 2007).

Por meio da apresentação, os professores teriam elementos riquíssimos para fazer da festa um excelente momento pedagógico e esclarecer os educandos que a cultura rural nasce também do sofrimento e das precárias condições de vida do homem no meio em que está inserido. Assistimos, ainda, nesse contexto, ao discurso da festa como possibilidade de integração escola-família, mas, se considerarmos as discussões preliminares e os argumentos colocados sobre a data em que festa deveria ocorrer, percebemos aí, o sentido e os indícios de uma integração utilitária nesse processo.

No dia da festa, a diretora da Escola Tempo de Agir anunciou à comunidade que toda a renda da festividade seria utilizada para a comemoração do dia das crianças e dia dos Professores. Neste caso, a festa representa uma oportunidade de angariar algum fundo para além daquele determinado pela política municipal. Nesse momento, a Educação Física ganha centralidade e, a partir dela, busca-se a integração profissional e a organicidade da instituição.

4.4 EDUCAÇÃO FÍSICA ENTRE LUGARES: TENSA RELAÇÃO ENTRE