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PARTE II Ensino da Formação Musical no 1.º Ciclo do Ensino Básico:

3. Fundamentação teórica

3.2. A educação tradicional

Não existe uma definição simples e taxativa daquilo que poderá ser considerado um modelo educativo tradicional. De qualquer modo, segundo Cook (2004, pp. 10-14), existem três correntes de pensamento que enquadram teoricamente os modelos de ensino tradicionais - a psicologia cognitiva, o behaviorismo e o construtivismo – bem como algumas características estruturais habitualmente presentes na maioria das instituições educativas associadas a estes modelos, nomeadamente: 1) a adoção de um modelo de ensino-aprendizagem centrado na figura do professor; 2) a estruturação de um currículo baseado em disciplinas isoladas; e 3) a importância basilar conferida à medição da aquisição de conhecimentos através de testes de avaliação. De acordo com Hirsch (2001, p. 16), os sistemas educativos tradicionais caracterizam-se também por: 1) estabelecer os mesmos objetivos académicos para todas as crianças; 2) focar as atividades desenvolvidas na sala de aula sobretudo em torno de questões académicas, organizativas e disciplinares; 3) usar grande parte do tempo letivo no ensino e aprendizagem de tarefas específicas; e 4) realizar frequentemente avaliações da performance dos alunos.

Segundo Newby et al. (citado por Cook, 2004, p.11), a psicologia cognitiva foi uma das áreas do conhecimento a influenciar fortemente a filosofia da educação tradicional. Neste sentido, surge então uma abordagem que o autor designa por perspetiva informacional – uma visão educativa que concebe o processo de ensino-aprendizagem como o incremento gradual dos conhecimentos memorizados pelo aluno. No âmbito desta abordagem encontramos, então, uma escola que se dedica sobretudo a incrementar ou a mudar o corpo de conhecimentos armazenados na memória do aluno. Deste modo, a principal responsabilidade do educador torna-se então a de criar condições que ajudem o aluno a receber, codificar e descodificar informações (Newby et al., 2000, p. 30). O papel do professor consiste, assim, sobretudo no de criador ou de implementador de um currículo pré-determinado, processado à posteriori pelo aluno praticamente do mesmo modo mecanizado e frio como um computador processa um qualquer conjunto de dados. Aqui o professor assume geralmente o papel de organizador de informações, estabelecendo conexões e ajudando o aluno nos processos de recuperação das informações memorizadas. Ainda segundo Newby et al. (2000, p. 32), a principal responsabilidade do aluno no âmbito da perspetiva educativa informacional será, então, a de ativamente sintetizar informações

através do emprego de suportes cognitivos fornecidos e desenvolvidos pelo sistema educativo ou por si mesmo. Resumindo, de acordo com a perspetiva informacional, segundo Cook (2004, p. 12), o cérebro do aluno é concebido como uma espécie de computador, passível de ser programado, onde a informação é então processada. É um modelo rígido e mecanicista, centrado na figura do professor, assumindo este a responsabilidade total sobre a organização de conteúdos, excluindo por completo os aprendizes deste processo.

Outra influência teórica significativa para enquadrar os modelos educativos tradicionais é, segundo Cook (2004, p. 12), o behaviorismo. Segundo o autor, de acordo com esta perspetiva o propósito do sistema educativo será, então, o de modificar os comportamentos dos estudantes. De acordo com o modelo behaviorista o professor deverá controlar todas as dimensões do processo de ensino-aprendizagem, estabelecendo, nomeadamente, os objetivos educativos e guiando os estudantes na consecução desses mesmos objetivos. No âmbito de uma perspetiva behaviorista, a principal responsabilidade do professor deverá ser a de organizar as aulas de modo a que seja potenciada a aprendizagem dos conteúdos por parte dos alunos, dando-se especial ênfase ao estabelecimento pelo professor de objetivos concretos a serem alcançados pelos aprendizes. Dentro das linhas estabelecidas por este modelo todo o conhecimento começa e acaba no professor. Segundo Newby et al. (2000, p. 26), a perspetiva behaviorista da educação parte do princípio que o ambiente apresenta um antecedente (A) que estimula o comportamento (B) e que, por sua vez, é seguido por determinadas consequências (C) determinando-se, então, se o comportamento se repete ou não. De acordo com este princípio, os behavioristas defendem que a aprendizagem ocorre quando o aluno se comporta de forma consistente segundo os novos modelos aprendidos. A este processo dá-se o nome de modelagem – o reforço das aproximações sucessivas tendo por fim um determinado comportamento desejado, ou seja, a instalação de novas respostas através do reforço positivo. Segundo a perspetiva behaviorista, a modelagem permite que os alunos aprendam à medida que o professor modifica gradualmente o comportamento dos aprendizes até que o objetivo de aprendizagem seja finalmente atingido. Aqui, novamente, os alunos têm um papel eminentemente passivo visto que o professor determina sozinho os objetivos educativos a serem atingidos, bem como as estratégias didáticas a serem implementadas.

Segundo Cook (2004, p. 12), o construtivismo também contribuiu significativamente para o enquadramento teórico dos modelos educativos tradicionais, sendo, eventualmente, a corrente de pensamento que mais se aproxima dos modelos holísticos. De acordo com Newby (citado por Cook, 2004, p. 12), os construtivistas defendem que o conhecimento é uma construção que nasce através da experiência do sujeito, sendo que esta pode ser ganha de inúmeras formas, nomeadamente através da interação do aluno com objetos, situações ou outros alunos. Ainda segundo Newby et al (2000, p. 34), as perspetivas construtivistas sobre a educação defendem que a aprendizagem é determinada por um conjunto de interações complexas entre o

conhecimento à priori do aluno, o seu contexto social e os problemas concretos a serem por ele resolvidos. Deste modo, o papel do professor será sobretudo o de colocar o aluno perante um conjunto de situações que lhe permitam ganhar experiência e construir, consequentemente, um novo conhecimento a partir dessa experiência. Apesar de através desta abordagem o aluno adquirir conhecimentos baseados em problemas e situações de ensino-aprendizagem realísticos, continua a ser uma abordagem centrada na figura do professor, visto que compete a este criar os referidos problemas e situações de ensino-aprendizagem.

Um dos maiores defensores dos modelos educativos tradicionais, o norte-americano Eric Donald Hirsch, afirma que as escolas com melhores resultados tendem a favorecer, por exemplo, a aprendizagem de conteúdos como a fonética, a memorização da tabuada e o uso de testes padronizados (Hirsch, 1999, p. B9). Defende também que as escolas que alcançam melhores resultados no que diz respeito à equidade entre os alunos são aquelas que usam metodologias conservadoras, baseadas num currículo exigente e na repetição disciplinada e sistemática de conceitos, exemplos e problemas práticos. Segundo Hirsch (1999), os modelos educativos tradicionais favorecem o sucesso de todos os alunos, independentemente dos seus contextos socioeconómicos de proveniência. O autor defende ainda que todas as crianças devem passar por um sistema educativo que as obrigue necessariamente a sentar, parar e ouvir atentamente, procurando-se, deste modo, que memorizem as informações transmitidas pelo professor (Hirsch, 1997, p. 42). Relativamente à importância atribuída pelos modelos educativos tradicionais aos testes de avaliação, Hirsch (1999) defende que os testes padronizados são uma das ferramentas mais válidas que existem para medir conceitos como a excelência e a justiça na educação. Por último, Hirsch (1996, p. 219) defende a estruturação curricular do ensino em disciplinas independentes. Para o autor as competências que considera essenciais, nomeadamente as capacidades de ler, escrever, comunicar, aprender, analisar, compreender e manipular símbolos matemáticos, apresentam componentes que os psicólogos consideram ser específicos de um determinado domínio. Logo, um modelo educativo tradicional que apresente, por um lado, linhas de orientação curriculares detalhadas e, por outro lado, permita que o aluno se concentre durante o tempo de aula apenas nas especificidades de uma determinada disciplina será, segundo a visão de Hirsch, uma mais-valia importante.