• Nenhum resultado encontrado

A efetividade da ZEIS como instrumento de Regularização

Capítulo 3 A ZEIS como instrumento de Regularização Fundiária: Balanço e

3.3 A efetividade da ZEIS como instrumento de Regularização

Os programas de regularização fundiária e urbanística de favelas e intervenções em área de mananciais são precedentes à instituição das ZEIS no município de São Paulo. Agora a circunscrição de assentamentos informais como ZEIS é um procedimento recente, que reforça a base legal de intervenção municipal na regularização de assentamentos informais mas, sobretudo, no que se refere às ações de usucapião individuais ou coletivas, cuja natureza da propriedade é privada.

Examinou-se que a municipalidade não dispõe de programas ou convênios para interposição de ações de usucapião. Quando há interesse da comunidade, a HABI está estruturada para produzir e fornecer os elementos técnicos necessários ao ingresso da ação de usucapião, como a planta de regularização ou cadastral; mas, para isso, é imprescindível que a área esteja inserida em ZEIS.

Na prática, a delimitação dos assentamentos informais como ZEIS garantem aos moradores o direito à moradia e a manutenção da posse direta das áreas ocupadas. Mas, não é regra. Em regiões de crescentes conflitos de interesses e embates sociais o processo é mais complexo. Vejamos os casos, da favela Real Parque, localizada no bairro do Morumbi, inserida no perímetro da Operação Urbana Águas Espraiadas; e o da favela do Moinho, em Santa Cecília, ambas demarcadas como ZEIS 1. Apesar deste gravame e por se tratar de propriedade privada, em 2007, foram objeto de ação de reintegração de posse, porém com desfechos distintos.

As ações de despejo de mais de 80 famílias, ocorridas na favela do Real Parque, não foram revertidas pela defensoria pública, pois se tratava de uma ocupação recente; o caso, no entanto, permanece em tramitação. Já para a favela do Moinho, apesar da similaridade, foi concedida a tutela antecipada na ação de usucapião coletiva, pela Justiça Federal de São Paulo, em meados de abril de 2008. Na decisão, o juiz reconhece o direito à moradia como uma das vertentes do princípio da dignidade humana, baseando-se no artigo 11 do EC.

Essa última decisão é de suma importância, marco referencial para o encaminhamento de novas ações de usucapião coletivo ou individual. Estes casos ilustram que a delimitação da área ocupada gravada como ZEIS, não garantirá por si só a regularização fundiária, dependendo de outros fatores específicos a cada situação, como: a natureza da área – pública, privada ou híbrida; os condicionantes e prazos legais estabelecidos no EC e na MP 2.220/2001; e a qualidade física e ambiental da área, entre outras situações peculiares ao local.

Como exemplo, temos a já mencionada favela do Moinho: é uma ocupação de 1999, em área particular, incrustada entre duas linhas férreas, de acesso precário. Estima-se uma ocupação superior a 375 domicílios, em uma área de 3 ha., demarcada como ZEIS 1, com instrução para ação de usucapião coletiva, entretanto, a área está contaminada. A normativa municipal e estadual veta a ocupação de áreas contaminadas para fins habitacionais de interesse social.

Para serem (re)integradas ao mercado imobiliário essas áreas necessitam de altos investimentos em ações de remedição e obras de recuperação do terreno. Portanto, é um procedimento duradouro, complexo e oneroso, demandando tempo para a consolidação das ações de descontaminação.

Advertimos que as ZEIS 1 ou 3, demarcadas sobre áreas remanescentes ao uso industrial, cujo zoneamento anterior era Z6 ou ZUPI, constituem um conjunto de prováveis áreas com potencial de contaminação60 e contaminadas, portanto impróprias para o uso habitacional.

Provavelmente, a população da Favela do Moinho terá seu direito à moradia reconhecido pela justiça, porém em outro lugar. Cabe considerar que as características do local já prenunciavam a inadequação da área ao uso habitacional. Além da possível potencialidade de contaminação, o local apresenta índices de ruídos e de poluição do ar inadequados ao uso habitacional, decorrente da localização.

60

Áreas Potencialmente Contaminadas são aquelas onde estão sendo ou foram desenvolvidas atividades potencialmente contaminadoras, isto é, onde ocorre ou ocorreu o manejo de substâncias cujas características físico-químicas, biológicas e toxicológicas podem causar danos e/ou riscos aos bens a proteger (CETESB, 2008).

A prefeitura não possui um programa de regularização fundiária para favelas ocupantes de área particular. Nesses casos, a solução fundiária dependerá fundamentalmente do interesse e disponibilidade da municipalidade em atender a comunidade ou da adoção de medidas jurídicas, a serem requeridas pelos moradores. Para a solicitação de ação de usucapião o assentamento deve atender integralmente os requisitos previstos em lei, conforme exposto no capítulo 1.

O gravame de áreas particulares como ZEIS, não significa apenas o reconhecimento do direito à moradia e a imposição de um zoneamento especial. É um indicador municipal de que se deve restabelecer ordem e controle urbano para o cumprimento da função social da propriedade, através da adoção de medidas de regularização. Nesses casos, os interesses sociais associados ao interesses coletivos (difusos) sobrepõem- se ao direito de propriedade (individual).

Das ocupações inseridas em ZEIS, 672 favelas estão em áreas municipais, 132 ocupam áreas particulares e 150 estão parte em área pública e parte em particular (situação híbrida). De acordo com os dados do HABISP, 38% das favelas demarcadas como ZEIS ocupam áreas particulares ou em situação híbrida. Nesses casos, a demarcação do assentamento como ZEIS 1 é um atributo essencial de acesso aos programas de atendimento municipal, além de reforçar a base legal para o encaminhamento das ações de usucapião (cf. quadro 08 – Ações de Regularização de Favelas em ZEIS).

Das 514 favelas que não estão demarcadas como ZEIS, 291 situam- se em área municipal, 99 ocupam áreas partículas e 124 apresentam condição híbrida (público e privado). Certamente as áreas que conjugam naturezas distintas tendem a apresentar maior complexidade jurídica. Espera-se que, com a revisão do plano diretor, esses assentamentos sejam definidos como ZEIS e que o município estabeleça um programa de atendimento a essa população.

É importante atentar que ao longo do tempo revisões normativas ocorreram, de forma que o instrumento ZEIS foi sendo integrado a essas alterações, especialmente na legislação ambiental e nas diversas esferas de governo – municipal, estadual e federal.

No que se refere à lei especifica da bacia Guarapiranga, que tem por finalidade a recuperação e a preservação dos mananciais (APRM), a ZEIS tornou–se pré-requisito para o estabelecimento dos PRIS. Esse instrumento permitirá o licenciamento ambiental e conseqüentemente a regularização jurídica – urbanística e fundiária – dos assentamentos existentes em áreas de mananciais.

É possível afirmar que, ao longo dos sete anos de vigência do PDE, a adoção do instrumento ZEIS estabeleceu novas perspectivas além da escala local. Tornou-se primordial para a aplicação da legislação ambiental estadual, que possibilita a articulação de soluções de escala regional. Outros conceitos surgiram, como a regularização fundiária sustentável da área urbana, incorporados à legislação ambiental federal61, embasados na declaração das áreas como ZEIS e no instrumento do plano de urbanização.

Apesar desse cenário favorável de novas perspectivas, reitera-se que o instrumento ZEIS oferece amparo à ação, mas não é a ação efetiva, cabendo ao poder público municipal providenciar as medidas necessárias para a regularização jurídica, observando os ditames da legislação ambiental.

A pesquisa revelou a importância do gravame ZEIS para o assentamento informal, constituindo-se em uma ação inicial, no entanto, insuficiente para alcançar os propósitos estabelecidos no EC. Verifica-se que a efetividade do instituto depende fundamentalmente da capacidade de gestão do poder público e da relação que se estabeleça com os diversos agentes institucionais e sociais, confirmando a hipótese norteadora desta tese.

61 Cf. a Resolução CONAMA 369/2006, que reforça o procedimento da aprovação dos Planos de

Regularização Fundiária para o âmbito dos agentes ambientais municipais e estaduais. A área em questão deve estar demarcada no plano diretor ou em lei específica como ZEIS. Cabe comentar que os assentamentos informais gravados como ZEIS, em áreas ambientalmente protegidas, desde que atendam os pressupostos da MP 2.220/2001, podem requerer apenas a posse da terra por meio dos instrumentos da Concessão de Direito Real de Uso e da Concessão de Uso Especial para Fins de Moradia.

3.4 Casos de implementação do Plano de Urbanização de acordo com