• Nenhum resultado encontrado

2 OS ESTUDOS SOBRE FORMAÇÃO CONTINUADA DE PROFESSORES

6.3 A escola, contexto da formação e do trabalho docente

As falas das professoras apontam a importância do ambiente escolar para a consolidação de suas possibilidades de diálogo e desenvolvimento profissional.

Como ressalta Rios (1996), a escola é parte da sociedade em que está inserida e é também subordinada aos órgãos centrais do sistema educacional, mas nesse contexto social e institucional que delimita a atuação de seus agentes pode contar com uma autonomia relativa, pois “[...] não se trata de uma dependência absoluta ou de uma completa independência - o que existe é uma interdependência” (RIOS, 1996, p. 76). Segundo a autora, é nessa relação de interdependência que os educadores devem definir as ações e organizar os projetos que nortearão os trabalhos na escola, atendendo às exigências específicas de cada unidade, mas também com conexões com outros projetos orientados para os interesses da sociedade. Para Rios (idem, p. 76) o desafio “[...] está mesmo, para os educadores, na busca de explorar o mais eficazmente possível as condições - suas, de profissional e de seu contexto - para a construção da Educação Escolar”.

No caso do Letra e Vida e, posteriormente, do Ler e Escrever, o foco está nos Programas propostos pelo sistema de ensino, que por isso tendem a receber apoio das equipes de gestão escolar. Mesmo assim, os depoimentos das participantes mostram os conflitos e contradições na implantação dos programas, o lembra o alerta de Sarmento (1994, p. 122): “[...] são, em última análise, sempre os indivíduos quem atribui significado às coisas, ainda que dentro de pautas propostas pelo grupo, a organização ou a sociedade em que se inserem” (grifo do autor).

A escola sede do trabalho das participantes deste estudo é descrita por elas como um ambiente agradável e acolhedor, onde puderam exercitar os conhecimentos adquiridos e partilhar as práticas desenvolvidas. Mas os relatos apontam também resistências encontradas em outras unidades, gerando dúvidas e insegurança num processo de mudança já por si desafiador:

Por ser o começo, pra bem dizer a verdade, não foi fácil, além de que todas as escolas que eu passava, de ensino fundamental, tinha colegial tudo junto e muitas não acreditavam, então foi bem assim difícil, no começo, foi bastante difícil, não foi assim fácil não...

(Professora 9).

Os depoimentos das professoras mostram que poder compartilhar seus saberes, ouvir e ser ouvido, perceber-se competente e produtor de conhecimentos profissionais gera forças para saber lidar com as discrepâncias entre o professor e a cultura escolar, dando maior segurança para as mudanças no trabalho em sala de aula. Mas incentiva também a mudança na percepção dos demais atores escolares em relação às novas propostas, reduzindo as resistências no ambiente escolar.

Segundo Nóvoa (2009), a integração entre os professores auxilia na construção de uma cultura profissional em que a integração faz a profissão avançar, fortalecendo um trabalho em equipe. Diz o autor:

[...] ser professor é compreender os sentidos da instituição escolar, integrar- se numa profissão, aprender com os colegas mais experientes. É na escola e no diálogo com os outros professores que se aprende a profissão. O registro das práticas, a reflexão sobre o trabalho e o exercício de avaliação são elementos centrais para o aperfeiçoamento e a inovação. São estas rotinas que fazem avançara a profissão (NÓVOA, 2009, p. 12).

Em Day (2004), encontra-se uma declaração ainda mais incisiva, que relaciona o bom professor com o seu desejo de partilhar com os colegas, independentemente de ordens institucionais:

[...] irão querer abrir a sua sala de aula aos outros para poder partilhar e aprender, assegurando-se de que o seu pensamento e as suas práticas não se baseiem unicamente na sua própria experiência. Não se sentirão satisfeitos por se submeterem aos imperativos institucionais dos processos de gestão do aproveitamento escolar ou dos planos para a melhoria das escolas, mesmo que estes sejam bem geridos (DAY, 2004, p. 157).

Ao que parece, no caso em análise a atuação das professoras, a continuidade das trocas e a partilha dos conhecimentos vão legitimando o seu trabalho, vencendo as resistências iniciais e provocando mudanças na própria cultura organizacional:

A minha experiência foi muito parecida, eu tive apoio por parte da equipe gestora onde eu estava, mas as próprias colegas de trabalho que não faziam, elas não acreditavam e criticavam, mas com o tempo, eu mesma fazendo fui podendo assim provar que estava dando certo.

(Professora 5)

De acordo com Day (2007), as escolas que conseguem criar espaços para a troca de conhecimentos entre os professores, para a colaboração e para a reflexão coletiva sobre os temas pertinentes a ela têm a possibilidade de ser bem-sucedidas: “[...] a colaboração tende a reduzir o sentimento de impotência dos professores e a aumentar a sua auto-eficácia colectiva e individual” (DAY, 2004, p. 2007).

O que se pode concluir dos depoimentos das participantes é a compreensão da escola como um espaço no qual os condicionantes institucionais são importantes delimitadores do trabalho docente, mas onde as concepções, crenças e valores dos diferentes sujeitos que constituem a organização interagem e afetam o trabalho coletivo. Pode-se inferir que, embora estimulado e oferecido pelo estado, em muitos casos os programas de formação não se articularam a um projeto pedagógico coletivo, partilhado pelo conjunto dos atores escolares. Como explica Rios (1996), o trabalho coletivo é cooperativo e solidário. Um instrumento para o trabalho coletivo eficaz é o Projeto Político Pedagógico, construído e elaborado em conjunto, não apenas para atender a fins burocráticos, mas para ser vivenciado em todo o processo da prática educativa, “[...] utilizando os recursos de que dispomos e que vamos construindo, planejar e encaminhar desde já o esforço na busca de uma direção competente de nossas escolas” (RIOS, 1996, p. 75).

Assim, parece que o âmbito de influência dos Programas Letra e Vida e Ler e

Escrever é principalmente o espaço da sala de aula, não se integrando realmente à