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O DESENHO DA PESQUISA

2.1.4. A escolha da técnica para análise dos dados

localização dos sujeitos envolvidos na situação estudada e outros impedimentos de natureza ética, a análise de documentos como fonte de dados foi a que se demonstrou mais eficaz. Além desses motivos, também atuou em favor da opção o fato reconhecido de que o objeto de estudo, por implicar a análise de inquéritos policiais e processos judiciais, resulta numa dificuldade na coleta de dados, em razão de aspectos estruturais do Poder Judiciário, somados à falta de tradição na realização de pesquisas empíricas na área jurídica (PIMENTEL et alii, 1998).

Outra questão que deve ficar clara é que os conteúdos dos processos (policiais e judiciais) traduzem o próprio contraditório da Justiça. Em razão disto, pode ocorrer a perda de informações, o desaparecimento de processos e a ocultação de dados. Muitas vezes, o conteúdo do processo pode não revelar, de forma fiel, a realidade dos fatos, uma vez que há situações em que ocorre um jogo entre acusação e defesa na busca de informações que interessam a cada um, de provas, segundo as possibilidades e capacidade de cada ator em formá-las, formulá-las e apresentá-las (FALEIROS et alii, 2003).

2.1.4. A escolha da técnica para análise dos dados

As pesquisas qualitativas apresentam características multimetodológicas, pois colocam uma grande variedade de procedimentos e instrumentos de coleta de dados à disposição dos pesquisadores (ALVES-MAZZOTTI e GEWANSDSZNAJDER, 2002). Igualmente, para a análise dos dados obtidos através de documentos, existem várias técnicas, dentre elas, a Análise Discursiva e a Análise de Conteúdo, que foi aquela pela qual optamos.

A Análise de Conteúdo pretende investigar principalmente as formas de comunicação verbal, escrita, ou não escrita, que se desenvolvem entre os indivíduos. Pode ser utilizada em textos literários, em entrevistas e discursos. Enfim, tudo é passível de análise por essa técnica (QUEIRÓS, 2003). Portanto, aplica-se à análise de textos escritos ou de qualquer comunicação (oral, visual, gestual) reduzida a um texto ou documento.

A técnica de Análise de Conteúdo envolve vários procedimentos e surgiu nos Estados Unidos no início do século XX, podendo-se destacar duas funções na sua aplicação: uma referente à verificação de hipóteses e/ou questões, e outra que diz respeito à descoberta do que está por trás dos conteúdos manifestos (GOMES, 1994).

Uma se refere à verificação de hipóteses e/ou questões. Ou seja, através da Análise de Conteúdo, podemos encontrar respostas para as questões formuladas e também podemos confirmar ou não as afirmações estabelecidas antes do trabalho de investigação (hipóteses). A outra função diz respeito à descoberta do que está por trás dos conteúdos manifestos, indo além das aparências do que está sendo comunicado. As duas funções podem, na prática, se complementar e podem ser aplicadas a partir de princípios da pesquisa quantitativa ou qualitativa

(GOMES, 1994, p. 74).

A Análise de Conteúdo tem como principal objetivo compreender criticamente o sentido das comunicações, seu conteúdo manifesto ou latente, as significações explícitas ou implícitas, podendo se utilizar diferentes procedimentos para a decodificação de um documento. Dentre esses, destacamos as unidades léxicas (análise lexicológica), a classificação por categorias (análise categorial), o desvelamento ou a revelação do sentido de uma comunicação no momento do discurso (análise de enunciação), os significados dos conceitos em meios sociais diferenciados (análise de conotações)  ou qualquer outra

forma de decodificação de comunicações impressas. Tudo depende do material a ser analisado, dos objetivos da pesquisa, e da posição ideológica e social do pesquisador.

Se existe um primeiro passo para análise das informações coletadas através dos documentos, seria parar de pensar sobre o que interessa e prestar atenção ao que é criado, guardado ou deixado pela passagem do cotidiano, iniciando-se, assim, a desfamiliarização do dia-a-dia, parando de assumi-lo como dado, expressão dos etnometodológicos, taken for granted, para registrar seus elementos e artefatos. Às vezes não é um documento ou uma série específica de documentos que importa, mas a presença ubíqua de uma temática de documentos distintos que serve como sinal para a desfamiliarização inicial (SPINK, 1999).

Pimentel (2001) afirma que se trata de um processo de garimpagem, pois se as categorias de análise dependem dos documentos, há a necessidade de eles serem encontrados, "extraídos" das prateleiras, dando-lhes um tratamento que, orientado pelo problema proposto pela pesquisa, estabeleça a montagem das peças como num quebra-cabeça. Muitas vezes, a delimitação do problema da pesquisa é resultante do que os documentos apontam sobre o contexto em que se insere.

Na análise documental há a construção de quadros de atores, termos-chave, observações ou comentários com as possíveis relações com as questões da pesquisa.

A análise de conteúdo deve ser feita cronologicamente, abrangendo as seguintes fases: pré-análise, exploração do material, tratamento dos resultados obtidos e interpretação. A primeira fase é a de organização do material a ser analisado, de acordo com os objetivos e questões de estudo, definindo-se a unidade de registro, unidade de contexto, trechos significativos e categorias. Na segunda fase, aplica- se o que foi definido na fase anterior, podendo ser a mais longa, exigindo-se várias leituras de um mesmo material. A terceira fase inicia-se a partir de um pressuposto quantitativo, contudo, deve-se tentar desvendar o conteúdo subjacente ao que está sendo manifesto, centrando-se a busca para ideologias,

tendências e outras determinações características do fenômeno analisado

(GOMES, 1994).

Portanto, os dados coletados devem ser decifrados, atingindo-se o núcleo emergente que serve ao propósito da pesquisa, num verdadeiro processo de decodificação, interpretação e inferências sobre as informações contidas nos documentos, desvelando seu conteúdo manifesto e latente (PIMENTEL, 2001).

A principal limitação na utilização de documentos refere-se ao fato de que suas definições operacionais, e as possibilidades de sua manipulação experimental fogem ao controle do pesquisador. Apesar dessas restrições quanto a sua utilidade, os documentos são de grande importância, apresentando-se como o único meio de apreciar situações sociais passadas e algumas atuais, em que a observação por outra forma seria difícil e onerosa. Ademais, são dados coletados em um ambiente natural. A impossibilidade de o pesquisador impor seus próprios padrões de validade e fidedignidade é clara (ANGELL e FREEDMAN, 1974). Uma crítica marcante à Análise de Conteúdo é aquela que entende essa análise como uma técnica de interpretação de textos, com pouca articulação com os contextos das mensagens veiculadas (GOMES, 1994).