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Capítulo I Ensinar e aprender a escrita na infância

1.2. Estratégias de Aprendizagem da Escrita na Educação Pré-Escolar e no

1.2.2. Princípios orientadores das práticas de escrita

1.2.2.3 A escrita em colaboração

No ambiente escolar, as relações afetivo-sociais com os pares são um fator extremamente importante no processo de desenvolvimento cognitivo e social da criança, assim como no processo de ensino-aprendizagem (Gomes, 2006).

Do ponto de vista social, muitos autores defendem que o trabalho de pares ou de grupo na sala de aula deve ser encorajado desde cedo pelos professores e educadores de infância, pois isto permite que as crianças construam um espírito cooperativo e comunicativo que de outra forma teriam mais dificuldade em desenvolver, para além de assimilarem mais facilmente os conhecimentos (Storch, 2005). Este tipo de trabalho visa permitir à criança participar de forma ativa na própria aprendizagem da escrita, atribuindo-lhe significados e sentidos próprios (Ewert, 2009). Neste contexto é necessária uma constante negociação entre os elementos envolvidos, pois assim os pares conseguem resolver problemas de comunicação que surjam durante os trabalhos no espaço de aprendizagem (idem). Ainda segundo este autor, a negociação de tarefas e funções é muito solicitada pelos próprios elementos do grupo, pois permite uma boa distribuição, reflexão e discussão de ideias, elucidação de conhecimentos e reformulação e assimilação de conceitos; do mesmo modo, um aluno com mais dificuldades de comunicação ou expressão pode perder inibições e interagir mais com os colegas e professores.

Neste sentido a atividade de produção escrita pressupõe uma dimensão colaborativa. A escrita colaborativa é um processo pelo qual os escritores partilham conhecimentos, seguindo todo um conjunto de regras para que esse trabalho tenha frutos; assim, é importante que o grupo de trabalho tenha um objetivo em comum, para que a colaboração de todos os elementos esteja focada num mesmo ponto e seja rentabilizada ao máximo (Baptista, 2014).

A escrita colaborativa, ou em conjunto, foi recebida com alguma resistência por parte dos professores, pois muitos deles acreditavam que os alunos com mais dificuldades dificilmente trariam algo de produtivo aos grupos de trabalho, e que os alunos que se encontravam num nível de desenvolvimento mais avançado sairiam prejudicados, ficando retidos ou desmotivados por esta dinâmica de trabalho.

Na realidade, quando se compara o ambiente de sala de aula no ensino tradicional e no ensino colaborativo, constata-se que as salas de aula de ensino colaborativo são mais barulhentas e aparentemente desorganizadas; no entanto, o barulho faz parte do processo de aprendizagem, pois é sinal que os alunos estão ativamente a trocar ideias e a comparar ações, ou seja, estão a ter uma aprendizagem ativa (Morefat, s/d, citado por Baptista, 2014). Numa sala de aula de ensino tradicional, o ensino funciona numa só direção, com o professor a transmitir a informação e os alunos a recebê-la; já numa sala de aula colaborativa, o ensino

funciona em três direções: professor-aluno, aluno-professor e aluno-aluno, num constante circuito de transmissão de informação e conhecimento. Para mais, o professor procura proporcionar aos seus alunos situações que se transformem em experiências ricas, utilizando a linguagem e a cultura para a construção da aprendizagem (Morefat, s/d, in Baptista, 2014).

Este autor afirma também que, enquanto que no ensino tradicional a autoridade no que toca à definição de objetivos, tarefas e avaliação dos alunos se centra exclusivamente no professor, no ensino colaborativo esta autoridade é partilhada, no sentido em que o professor convida os alunos a definirem os seus próprios objetivos e a realizarem a sua própria avaliação. O professor funciona como um “mediador das situações de ensino-aprendizagem” (Baptista, 2014), servindo como uma base para os alunos que não têm ainda a autonomia suficiente para realizarem determinada tarefa. Para além disso, o professor deve ter sempre o cuidado de criar grupos de trabalho heterogéneos, de forma a que todos os alunos tenham oportunidade de adquirir e transmitir conhecimentos, dando diferentes perspetivas sobre os assuntos e beneficiando dos colegas de grupo. Os alunos que apresentam mais dificuldades têm o apoio do professor e dos colegas, que também acabam por assimilar melhor os seus conhecimentos. Baptista (2014) regista que Louth, McAllister e McAllister (1993)

fazem referência a um estudo sobre a qualidade de produções escritas em colaboração e produções escritas individuais. Apesar de terem concluído que nos resultados escritos não houve grandes discrepâncias, os alunos que escreveram em colaboração, tiveram resultados posteriores melhores e pareciam sentir-se mais realizados nos seus escritos do que os alunos que escrevem sozinhos (p.40).

A diversidade de opiniões e ideias permitem uma maior descontração e diminuem a ansiedade face a um problema de maior dificuldade, tornando a sua resolução mais fácil e proveitosa e a aprendizagem daí proveniente mais significativa.

Segundo Murray (1992), o trabalho em grupo exige que haja uma troca de ideias, o que implica que estas sejam explicitadas e negociadas com os restantes elementos e os seus significados interiorizados e racionalizados, vindo daí uma “tomada de consciência dos processos linguísticos presentes na escrita” (Baptista, 2014, p.41). Acresce que é uma forma de os alunos aprenderem novos conteúdos linguísticos e desenvolverem o seu pensamento crítico e reflexivo (Barbeiro, 1999).

O trabalho colaborativo integra-se assim naturalmente no processo de aprendizagem da escrita, pois tanto inicia numa troca de ideias entre os membros envolvidos, como culmina numa avaliação mais abrangente, uma vez que esta decorre de várias perspetivas que também contribuíram para a realização do texto, passando por todo um processo de negociação e

cedências das várias partes, o que representa um papel fundamental no desenvolvimento cognitivo das crianças.

Síntese

Grande parte do processo de aprendizagem da linguagem escrita passa obrigatoriamente pelo processo de familiarização com a leitura; em casa, muitas vezes as crianças vêm os familiares a ler o jornal, um livro, uma revista, e associam esse comportamento ao ato de ler.

Outro fator relevante na aprendizagem da leitura e da escrita é a vontade; muitas vezes o querer aprender a ler e a escrever já representa metade do caminho para uma boa aprendizagem. Muitas crianças demonstram vontade de aprender porque encaram a leitura e a escrita como algo extremamente importante que lhes permitirá comunicar, divertir-se, aprender mais sobre o mundo; outras crianças pensam que têm que aprender porque é uma obrigação imposta pela escola, ou pelos pais. Nesta perspectiva, cabe também ao professor conseguir motivar os alunos e dar-lhes um propósito para realizarem essa aprendizagem, que não seja somente o de terem de o fazer (Martins, 1998).

A aprendizagem da escrita é um processo moroso que já foi alvo de diferentes abordagens. Por um lado, existe a abordagem à escrita que a considera orientada para o produto final. Esta abordagem está normalmente relacionada com o método de ensino tradicional, no qual a atenção se foca na qualidade das produções dos alunos (Martins & Niza, 1998). Por outro lado, temos a abordagem que trabalha a escrita como um processo; o que está em causa é todo o processo da composição escrita, desde a formulação das ideias até à eventual revisão do texto, e não tanto a qualidade do texto em sí. O que interessa mais é como se chegou lá, e não o que está lá. Deste modo, o processo de construção da escrita deve ser estudado para que possamos não só ensiná-lo como também aprendê-lo. Ao longo deste relatório teremos em conta ambas as abordagens, e procuraremos utilizá-las nas práticas pedagógicas, não desvalorizando uma em função da outra, mas procurando complementá-las quando assim for possível.

Outro factor a ter em conta na abordagem ao ensino da escrita, são os princípios orientadores das práticas da mesma. Aqui, abordamos três princípios: a escrita como expressão do imaginário; a escrita no quotidiano; a escrita em colaboração. Estes três princípios remetem para a escrita criativa, a escrita funcional e a escrita colaborativa, que serão desenvolvidos nas práticas pedagógicas presentes neste relatório.

A abordagem ao ensino da escrita, assim como da leitura, são essenciais para o desenvolvimento de capacidades comunicativas na infância; assim, procuramos desenvolver uma prática pedagógica dinamizada e direcionada para o desenvolvimento destas capacidades.

Capítulo II – Formação de professores e investigação da