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A ESTÉTICA E A HISTÓRIA

No documento reginaluciameirellesbeghelli (páginas 33-37)

Desde o surgimento do pensamento filosófico, estabeleceu-se a necessidade de conceituar o humano. O homem é a medida de todas as coisas, nos diz Protágoras (OS PENSADORES, 1999, P.38). Com a modernidade, fixaram-se conceitos de cunho idealista e racionalista sendo que o último, em seu privilégio ao cogito, anulou qualquer outra possibilidade mais abrangente de compreensão.

Já a contemporaneidade, com as conceituações do homem ainda impregnadas de idealismos e racionalismos, parece ter se deslocado do primado do ideal e da razão, necessidades da razão, para a causa dos homens concretos, necessidades humanas. Esse deslocamento ressoa, também, nas concepções estéticas. As abordagens idealistas tinham como objeto de reflexões e teorizações a idéia do Belo. Por conseguinte, o tratamento racionalista privilegiava o juízo estético, ou seja, o uso correto da razão em relação ao fenômeno artístico e a submissão da validação estética a esta mesma razão.

Com as reflexões desenvolvidas pela Analítica Existencial surge uma outra possibilidade de se pensar a Estética a partir do seu entendimento acerca do humano enquanto ser-no-mundo - dasein - cuja essência é sua transcendência enquanto historicidade.

A Estética pôde ser pensada, então, enquanto modalidade de conhecimento sensível, das sensações, da sensibilidade. É uma via na qual o eu humano - a subjetividade - pode experienciar-se e ao mundo para, a partir dessa experiência descobrir e delimitar a realidade do eu e do não-eu. Em outras palavras, pode tomar posição em relação à sua própria história e quanto às suas relações no e com o mundo certamente porque se viu no artista aquele que não desconsiderava, em sua própria vida, a dimensão estética, ainda que essa visão também tenha se quedado em nome da obra enquanto produto.

Pôde, ainda, ser compreendida como reflexão filosófica procurando dar respostas a uma questão mais genérica: o que é Arte? Portanto, procurou saber o sentido da arte, como este sentido se constitui e qual o seu valor para a estruturação intelectual, afetiva, social, psicológica e política do homem.

A palavra estética, no sentido moderno, data de 1750, ano em que o filósofo alemão Alexandre G. Baumgarten (1714-1762) publicou, com o título de Aesthetica o primeiro volume de uma obra sobre o assunto, tal como o entenderíamos hoje. Este

autor incorporou ao conteúdo desta disciplina a perspectiva do Belo como domínio da sensibilidade, da percepção, dos sentimentos e da imaginação. Antes dele, entendia-se por esthetica, palavra grega, o mundo das sensações em oposição à lógica.

Em 1735, em suas Meditationes Philosophicas, apresentou-nos "a ciência de como as coisas podem ser conhecidas pelos sentidos.” Dividiu-a em duas partes, a saber, a estética teórica - ciência do conhecimento sensível - e a prática - reflexão acerca das condições internas da criação poética.

Mikel Dufrenne (1910 - 1995) traz em sua teorização sobre a Estética a idéia de articulação de um novo humanismo num momento em que a radicalização de alguns legados da modernidade - morte de Deus, morte do homem, morte da arte - fazia supor a impossibilidade de tal ciência da arte.

Como dizer, em todo caso, que ela significa a morte do homem? Antes nos conduz à sua nascença, é com ela que o homem renasce para o mundo e para si mesmo. Neste sentido, a arte é humanista, e o humanismo de hoje poderia ser uma meditação sobre a nascença e a individuação, sobre a invenção do homem pelo homem. (DUFRENNE, Mikel, 1982, vol.II, p. 245)

Umberto Eco, nascido em 1932, entende que Estética é a indagação especulativa sobre o fenômeno arte em geral, sobre o ato humano que o produz e sobre as características gerais do objeto produzido. Diante de uma obra de arte, assim como do mundo, o que conta é uma compreensão enquanto um processo de interpretação e não verdades expressas em termos dogmáticos e simplistas. "A Estética, como disciplina filosófica, procede, portanto, como uma fenomenologia de experiências concretas para elaborar definições compreensivas de experiências possíveis sem lhes prescrever o conteúdo.” (ECO, s/d, p. 59 a 61)).

Luigi Pareyson (1918 - 1991) afirma que o primeiro dos problemas da Estética é o que diz respeito à própria estética: sua natureza, seus limites, suas incumbências, seu método. Qualquer que seja o campo escolhido, entretanto, mais artificial e arbitrário ele será quanto mais longe ao teste concreto da experiência ele estiver. "Precisamente porque a Estética é filosofia, por isso mesmo ela é reflexão sobre a experiência, isto é, tem um caráter especulativo e concreto a um só tempo.” (Pareyson, 1984, p. 18).

A partir das propostas destes autores, algumas questões se colocam: Que espécie de discurso é o estético? Qual é o objeto da Estética? O que é um objeto estético?

origem do discurso estético? Qual sua eficácia enquanto exercício intelectual humano? À Estética cabe um só método ou uma pluralidade de métodos segundo a abordagem escolhida? Muitos autores contemporâneos tentaram respondê-las.

O problema sobre a dissolução do estético em todas as esferas do espaço social e cultural pode ser encontrado no texto do autor cubano José Rojas Bez, professor do Instituto Superior de Arte da Universidade Técnica de Holguín, Cuba. Ao constatar as profundas mudanças ocorridas na vida cultural e em todos os âmbitos do humano a partir da década de 50, alerta-nos para a pertinência da legitimação do objeto estético:

no se trataba, dijimos, de simples adiciones; sino de un nuevo status social donde lo artístico se "dissolvía" en todas las esferas, y los medios de comunicaciones permitían - o imponían - una nueva relación de los seres humanos con lo estético, a menudo seudoestético y antiestético, mas también propriamente estético. (BEZ, José Rojas, 1991, p. 23).

Quanto ao estatuto filosófico do estético, o autor Romano Galeffi (1979), professor de Estética da UFBa, acredita que se por problema filosófico considerarmos todo aquele não efêmero, insilenciável porque se prende à cada homem dotado das prerrogativas essenciais pelas quais merece ser chamado com este nome, conclui-se que o objeto estético pode, assim, ser considerado como verdadeiro problema filosófico.

Em um enfoque da Estética especificamente na área educacional, temos o trabalho de Maria do Carmo Loubet (1979). Ela propõe que, ao elegermos o trato da arte para mediação pedagógica, como primeiro passo deve-se aclarar o que é educar - educação pela arte - e o que é arte - educação sobre a arte. Assim, a educabilidade pode se dar por três vertentes. A primeira é a do alertamento, ou seja, levar o educando a descobrir os lugares onde a arte se aloja no mundo de hoje, a perceber que existe arte no cotidiano. A segunda, da visitação, visa criar meios para propiciar ao educando um contato direto com as várias formas de arte. Aqui o importante é a experiência que vai surgir. É graças a este fator de excedência da experiência estética que a arte se impõe como mediador educativo. Por último, a vertente da reflexão.É esta que permite surgir o estético aqui entendido como uma teorização, uma reflexão, um discursar sobre a experiência feita em relação à arte. O conteúdo da Estética, portanto, é aquele reflexivo que parte da experiência em face de uma obra de arte.

A autora aponta duas maneiras didáticas de constituir e ler o mundo. A primeira seria através da presença objetiva por meio do nosso entendimento. O mundo, então, é

constituído pelos instrumentos do saber, da ciência, da filosofia. A segunda seria pela presença estética em conformidade com nossa sensibilidade. Nesse caso, o mundo se constitui pelos instrumentos de nossa percepção sensível, de nossos sentimentos, pela contemplação, pelo jogo, pelo encantamento, pelo gozo, pelo espanto, pelo poético.

O modo como organizamos, ordenamos, interpretamos, utilizamos as coisas por meio de uma ligação de familiaridade, de hábito, de proximidade, de habitação, é o modo como essas mesmas coisas ordenam e determinam os projetos de minha subjetividade, de mim como sujeito, o meu Ser. Esta característica de utensilidade de mundo nos aponta para a compreensão da arte como mediadora educativa. Constitui-se em um caminho de mão dupla enquanto diz respeito não só ao modo como usamos a arte, mas também como educador para a utilização do mundo. Trata-se não mais de tomar o estético como puro objeto de contemplação desinteressada, mas como instrumento mediador para a experiência e determinação do mundo.

ora... arte, o que é isto diante de um mundo em caos?, responderemos que só o clima lúdico favorece a gratuidade, berço da liberdade, pois esta nada mais é do que a possibilidade de brincar de não, a possibilidade de colocar a antinomia falso/verdadeiro sem o peso das conseqüências. O caboclo que, no fim de um dia de enxada em punho, assovia ou toca sua viola na porta do barraco, exerce uma atividade que o mantém humano, da mesma forma que dos navios negreiros se faziam ouvir as canções de lamento de um povo em degredo que precisou cantar para sobreviver.

No documento reginaluciameirellesbeghelli (páginas 33-37)

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