• Nenhum resultado encontrado

A ESTIMATIVA DOS EMPREGOS E DOS ESTABELECIMENTOS DE 1995

As estimativas mencionadas abrangeram 675 municípios, contabilizando 590 inexistentes e outros 85 que perderam mais de 50% de área, entre 1995 e 2005, em razão de divisões territoriais decorrentes de emancipações. Outros 4.889 municípios não sofreram perda territorial ou conservaram mais de 50% do território original de 1995 (Figura 3).

Figura 3 – Brasil. Municípios inexistentes em 1995 e fracionados a partir desse ano, cujos empregos e estabelecimentos foram estimados

BASE CARTOGRÁFICA: IBGE (2005)

A realização deste procedimento foi considerada conveniente, pois, em primeiro lugar, tais estimativas tiveram um erro controlado pela quantidade total de estabelecimentos ou empregos de fato existentes em 1995. Em outras palavras, o que se estimou, na verdade, foram quantidades posteriormente convertidas em proporções para, assim, assumirem o verdadeiro valor estimado. Na prática, isso significa dizer que, em princípio, à quantidade estimada para cada variável (empregos e estabelecimentos dos grupos industriais extrativo, tradicional e tecnológico e de comando) e município não foi atribuída grande importância, desde que os resultados da técnica de regressão utilizada fossem satisfatórios e estatisticamente significativos. Em segundo lugar, como as quantidades de empregos e estabelecimentos observados para cada grupo, no ano de 1995, em relação aos municípios

para os quais se realizou as estimativas eram conhecidas – já que derivam da soma dos estabelecimentos e empregos dos municípios existentes, nesse respectivo ano, que cederam 50% ou mais de sua área para os municípios emancipados –, sabe-se que não se esteve lidando com quantidades significativas de empregos e estabelecimentos ao ponto de se comprometer os resultados da pesquisa. Para se ter uma ideia, no que respeita aos empregos, o maior número de casos a serem redistribuídos, segundo os resultados estimados, integra o grupo industrial extrativo, ao passo que, em relação aos estabelecimentos, estão ligados ao grupo industrial tradicional, não excedendo, respectivamente, ínfimos 0,89% e 1,18% do total de empregos e estabelecimentos desses grupos de atividades, existentes em 1995 (Tabelas 4 e 5).

Tabela 4 – Brasil. Empregos redistribuídos entre os municípios emancipados e com perda territorial superior a 50%, conforme os grupos de atividades propostos. 1995

Nível geográfico Empregos Industrial extrativo Industrial tradicional Industrial tecnológico Comando do capital

Municípios com perda de área igual ou superior a 50% em função de emancipações (A) Norte 0 890 12 0 Nordeste 80 4.440 105 11 Sudeste 440 2.024 1 0 Sul 391 22.421 1.218 288 Centro-Oeste 65 1.597 9 0 Total 976 31.372 1.345 299 Brasil (B) 109.092 3.788.969 1.069.332 82.440 Proporção de A sobre B 0,89% 0,83% 0,13% 0,36%

FONTE DE DADOS: RAIS (1995); Organizado por Cleverson A. Reolon

Tabela 5 – Brasil. Estabelecimentos redistribuídos entre os municípios emancipados e com perda territorial superior a 50%, conforme os grupos de atividades propostos. 1995

Nível geográfico Estabelecimentos Industrial extrativo Industrial tradicional Industrial tecnológico Comando do capital

Municípios com perda de área igual ou superior a 50% em função de emancipações (A) Norte 0 129 8 0 Nordeste 11 274 16 4 Sudeste 11 90 1 0 Sul 27 1.492 91 7 Centro-Oeste 1 139 1 0 Total 50 2.124 117 11 Brasil (B) 5.862 179.891 25.638 2.267 Proporção de A sobre B 0,85% 1,18% 0,46% 0,49%

Como se pode ver, a Região Sul apresentou o maior número de empregos e estabelecimentos a serem estimados e redistribuídos. Isso se deve à criação de 130 novos municípios no transcorrer de 1995 a 2005, embora o maior número de emancipações territoriais municipais tenha ocorrido na Região Nordeste, totalizando 235.

A técnica estatística utilizada para a realização das estimativas foi a regressão ponderada espacialmente (Geographically Weighted Regression) – ou, segundo Rogerson (2012), regressão geograficamente ponderada –, com Kernel do tipo adaptativo e dimensão determinada de acordo com o Akaike Information Criterion (AICc).

Os modelos tradicionais de regressão estatística, também conhecidos como modelos de regressão global, trabalham com a hipótese de homogeneidade espacial, implicando no fato de as correlações entre variáveis serem consideradas constantes entre todos os pontos da área em que os dados foram coletados. Contudo, segundo Charlton e Fotheringham (2009a), existem boas razões para se questionar esses pressupostos ao se trabalhar com informações geográficas, caracterizadas pela heterogeneidade espacial23. A mais elementar delas baseia-se no princípio geográfico em que se supõe que "tudo está relacionado com tudo mais, mas coisas próximas estão mais relacionadas que coisas distantes" (TOBLER, 1970, p. 236). Como exemplo, Câmara et al. (2005) argumentam, hipoteticamente, que locais próximos a uma área poluída de um determinado rio possuem grande probabilidade de também estarem poluídos, embora possa não ser com a mesma intensidade.

Wong e Lee (2005) explicam que são muitos os eventos ou fenômenos de natureza geográfica em que se pode constatar a relação entre os acontecimentos de determinados locais às ocorrências de seu perímetro. Buscando-se dar um tratamento adequado a essa propriedade que possuem as informações geográficas, a regressão ponderada espacialmente consiste uma técnica desenvolvida com objetivo de modelar a tendência espacial de forma contínua, com parâmetros que variam no espaço (CÂMARA et al., 2005). Baseados na obra de Fotheringham, Brunsdon e Charlton (2002), onde são abordados as potencialidades e os procedimentos de execução da regressão ponderada espacialmente, Câmera et al. (2005, p. 8) relatam que ideia subjacente a essa técnica seria

[...] ajustar um modelo de regressão a cada ponto observado, ponderando todas as demais observações como função da distância a este ponto. Serão 23De acordo com Charlton e Fotheringham (2009b), a heterogeneidade espacial corresponde à variação da estrutura de um processo que está sendo modelado, ao longo da área de estudo.

feitos tantos ajustes quantas observações existirem e o resultado será um coeficiente de ajuste para cada localização.

No que se refere a esta pesquisa, a necessidade dos ajustes mencionados pode ser exemplificada pelas características de distribuição espacial dos dados de empregos e estabelecimentos formais, cuja distribuição é flagrantemente tendenciosa, ou seja, propensa à concentração em determinadas parcelas do território, como revelam as análises.

Definida a técnica de regressão estatística a ser utilizada, procedeu-se à escolha das variáveis mais adequadas à execução das estimativas. Essas variáveis são conhecidas como variáveis previsoras, sendo usadas para se “tentar prever valores de outra variável conhecida como variável de saída” (FIELD, 2009, p. 661). A despeito da redundância, a variável de saída consiste uma variável cujo valor está-se tentando prever a partir de uma ou mais variáveis previsoras (FIELD, 2009).

As variáveis previsoras selecionadas foram as quantidades de empregos e de estabelecimentos existentes nos municípios brasileiros em 2005, considerando-se os respectivos grupos de atividades24. Para efeitos didáticos, os modelos das equações resultantes são os seguintes25:

Nota-se que a qualidade de ajuste dos modelos é boa, apesar da multicolinearidade26, já que os valores dos coeficientes de determinação ajustados (R²

Adjusted) superam 0,804.

O coeficiente de determinação consiste uma medida da quantidade de variação da variável de saída que pode ser explicada pela variável ou variáveis previsoras, podendo ser

24Como regra geral, a definição das variáveis previsoras, que irão compor um modelo, dá-se em função do coeficiente de correlação que possuem em relação à variável de saída. Uma matriz dos coeficientes de correlação das variáveis utilizadas é apresentada no Apêndice B. Obviamente, apesar do índice de correlação, as variáveis previsoras não devem ser escolhidas a esmo, isto é, a escolha das variáveis previsoras deve seguir uma lógica racional e, se possível, estar teoricamente fundamentada. Além disso, para efeitos estatísticos, em princípio, elas não devem ser correlacionadas entre si, isto é, apresentar multicolinearidade (HAIR et al., 2006; FIELD, 2009). As variáveis previsoras Empregos (2005) e Estabelecimentos (2005), conforme os grupos de atividades correspondentes, possuem alto grau de correlação entre si. A multicolinearidade, todavia, conforme Hair et. al. (2006), só tem implicação sobre a interpretação dos coeficientes das regressões, não sendo este o caso.

25Os resultados das respectivas equações podem ser consultados no Apêndice C.

26 Conforme Field (2009), um dos problemas da multicolinearidade é a limitação dos valores do coeficiente de determinação.

 995 = + 5 + 5 +

convertido em percentual (FIELD, 2009, p. 143). Sendo assim, para o modelo utilizado para realização das estimativas municipais dos empregos do grupo de atividades que conformam a indústria tradicional, por exemplo, em que o valor do R² ajustado é 0,994, diz-se que a quantidade de empregos mais a quantidade de estabelecimentos existentes em 2005 explicam 99,4% da variação dos empregos municipais de 1995.

As análises dos resíduos também indicam que os modelos utilizados para realização das estimativas são confiáveis. Convertendo-se os resíduos das regressões em valores padronizados (escores-z), vê-se que eles estão normalmente distribuídos, já que, pelo menos, 98,1% dos escores-z estão abaixo de 1,96 e, pelo menos, 99,2% estão entre 1,96 e 2,5827.

Tais informações certificam, portanto, que as análises espaciais baseadas em tais estimativas apresentam resultados consistentes do ponto de vista dos fundamentos estatísticos. Antes da apreciação de tais resultados, no entanto, procura-se investigar a gênese e a trajetória de expansão das atividades industriais no Brasil.

CAPÍTULO 2:

ADIVISÃO TERRITORIAL DO TRABALHO INDUSTRIAL NOBRASIL

Neste capítulo, procura-se analisar o processo histórico de formação industrial brasileira, enfocando-se os aspectos condicionantes da distribuição espacial das atividades dessa natureza.

Constata-se que, durante o século XIX, após a promulgação da Lei de Terras, em 1850, a dinâmica do espaço agrário brasileiro passou a se alterar profundamente à medida que a propriedade da terra rapidamente adquiriu um status central do ponto de vista econômico, impulsionando a expansão dos latifúndios, em detrimento das pequenas propriedades familiares. Concomitantemente, gradualmente se intensificou o processo de mecanização da produção, e também do território, tendo, como corolário, a industrialização da agricultura.

Chama-se atenção, todavia, ao fato de que esse processo de industrialização mencionado passou por um longo período de maturação, dadas as sérias condições de restrição técnica que predominaram até, pelo menos, o último quartel do século XIX. Durante esse tempo, possibilitou-se uma multiplicação de engenhos e de manufaturas rudimentares por todo o Brasil, pois as técnicas elementares de processamento de derivados agropecuários – não intensivas em capital –, não representavam grandes barreiras à produção de bens de subsistência e de comércio local. Assim, combinados às limitações do sistema de transporte, no que diz respeito aos meios e às vias necessárias à sua realização, e ao comércio de exportação – colonialista, eminentemente baseado em economias naturais –, esse perfil produtivo acabou definindo, portanto, o caráter regional dos arranjos socioespaciais do país, analogamente interpretado como um arquipélago, sob a perspectiva das relações comerciais (MOREIRA, 1985; SANTOS, 1993)28.

Esse cenário econômico-espacial do conjunto nacional predominou até a intensificação dos processos de urbanização e industrialização do Brasil, presenciados por volta da década de 1930. Não obstante, atribui-se ao final do século XIX a gênese das relações de produção que surgiram ancoradas numa reorganização social do trabalho com

28Simonsen (1939) argumenta que, até 1920, além da dificuldade e custos elevados dos transportes, que caracterizavam verdadeiras barreiras protecionistas internas, a carência de capitais e – salienta-se – a diversidade de hábitos das várias regiões brasileiras fomentaram a existência de indústrias de pequeno porte para abastecimento de mercados restritos.

vistas à reprodução do capital até então inéditas no país e que, atualmente, figuram na base de sua formação socioespacial.

Notavelmente, essas relações efetivamente se desenvolveram em São Paulo, no âmbito do complexo cafeeiro, antes que nos demais estados. Dentre outros fatores, esse pioneirismo foi primordial para que se gestasse aquele que veio a se tornar o principal centro econômico do país, onde o processo de industrialização se realizou com um dinamismo sem paralelo e onde a primazia das atividades industriais ainda prevalece, mesmo após os estímulos governamentais de desconcentração espacial implementados nos anos de 1960 e 1970, principalmente.

2.1 PRINCÍPIOS DA INDUSTRIALIZAÇÃO DO CENTRO