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V. APRESENTAÇÃO E DISCUSSÃO DOS RESULTADOS

5.1. A trajetória das famílias

5.1.2. A família do CREAS

Nilza é mãe de sete filhos. Somente dois moram e foram criados por ela: Eduardo (10 anos) e Vinícius (9 anos). Eles são filhos de Fábio que tem outros três filhos. Tanto Nilza quanto Fábio tiveram três relacionamento anteriores. Fábio parece ser mais próximo dos filhos dos outros relacionamentos. Já Nilza, tem uma história de abandonos dos filhos: uma desapareceu quanto ela a deixou com uma moça durante uma semana para procurar trabalho, dois filhos de outro relacionamento foram entregues por ela para a avó paterna dos mesmos, e os outros dois de um terceiro relacionamento, para o próprio pai. Ela descreve sua história também marcada por abandonos, assim como Kássia, sua mãe também aparece como protagonista desse abandono. Nilza conheceu o pai depois de muitos anos, em um contato de dois encontros. Nilza diz que seu pai foi preso por matar por acidente um primo e logo depois, sua mãe veio para Brasília, por isso ela não chegou a conviver com ele. Em Brasília, ela foi cuidada pela avó e tias maternas, pois a mãe sempre estava trabalhando. Nilza atribui sua trajetória a essa falta materna e aos cuidados que seus parentes não souberam dar. Ela começou a trabalhar com 12 anos, se envolveu com tráfico e chegou a ser presa durante um ano. Todos os seus parceiros usaram álcool ou outras drogas e seus relacionamentos foram violentos. Sua rede social atual inclui duas amigas que a protegem, seus filhos que são considerados como riscos para eles mesmos e seu companheiro que é considerado metade risco e metade proteção, além de outras pessoas do CREAS, da igreja e alguns médicos que não são tidos como risco nem proteção.

Fábio relata ter uma boa família. Mostra proximidade com os pais e irmãos, é o mais velho de cinco irmãos. Ele e seu irmão mais novo fizeram uso abusivo do álcool. Há dois anos Fábio diz ter parado de beber por ter “criado vergonha na cara”. Fala que enquanto bebia não havia construído nada, perdera relacionamentos, empregos e respeito no meio familiar e social. Relata que agredia sua companheira, Nilza, e seus filhos e que se arrepende. Hoje se considera um bom pai e provedor da família. Sua rede social é composta só por pessoas que o protegem: amigos do futebol, os pais, os dois filhos que moram com ele e a esposa, seu chefe e o pastor da igreja.

Vinícius (9 anos) e Eduardo (10 anos) moram com os pais. Eduardo está na escola, faz aulas de karatê e futebol, foi expulso de três escolas e é considerado o filho preferido e protetor dos pais. Seus pais parecem confusos diante das agressões de Eduardo aos colegas, pessoas da rua e professores. Eduardo considera seus pais e amigos como proteção com relação à agressividade alheia, a escola só aparece na figura de um colega que também o protege e dois colegas aparecem como risco, pois o ameaçam. Em geral, ele convive mais com os pares da mesma idade, inclusive os que o ameaçam. Vinícius foi rejeitado desde sua concepção, conforme relata sua mãe, desde a gravidez, ela se comprometeu a “doar” Vinícius para o casal de traficantes com quem ela trabalhava. No dia em que ele nasceu o casal o recebeu. Depois de dois anos, o casal faleceu em um acidente de carro e Vinícius ficou aos cuidados da avó paterna (mãe do pai que falecera). Neste período, Nilza estava presa em função de um flagrante de tráfico. Depois de cinco anos, Vinícius, que sempre visitava a família biológica, passa a morar com o casal, por vontade de Nilza. Ele sempre foi considerado diferente, quieto e calado. Sua inserção na escola foi conturbada e depois de dois anos, Vinícius tem uma “crise nervosa”, agride os colegas e quebra as coisas ao seu redor. Fez tratamento

psicológico e toma remédios controlados. A família não sabe dizer o que ele tem: o pai acha que é o demônio ou safadeza. Desde que foi “transferido” da última escola (a diretora achava que ele usava Rupinol, depois da intervenção da mãe, mudou de ideia, mas sugeriu uma escola mais adequada), Vinícius passa os dias em casa sozinho, momento em que fica na rua, brincando com os amigos. Ele não lê, nem escreve (apenas seu nome), possui uma dicção comprometida, por vezes gaguejando. Deseja voltar para a escola. Sua rede é composta pelo irmão mais velho que representa risco por bater nele, por seus pais, um pouco mais afastados, enquanto proteção e pelos colegas da rua que estão bem mais próximos e são tidos como proteção. Depois da entrevista, Vinícius pede para mudar o mapa e coloca seus pais mais próximos e o irmão mais afastado, ainda enquanto risco. Vinícius e o pai não compareceram à primeira entrevista. O pai falou que não pode sair do trabalho aquele dia, Vinícius não obedece à determinação da mãe em comparecer e fica de fora da primeira entrevista, lugar que parece sentir ocupar na família.

A família foi encaminhada para o Conselho Tutelar, após a creche constatar as agressões contra Eduardo, na época com 6 anos. No Conselho Tutelar somente Nilza compareceu. Fábio sempre foi chamado e nunca apareceu. Depois, a família foi encaminhada para o CREAS. Nilza foi atendida por psicólogos e separou-se do marido. Seus filhos foram encaminhados para o COSE e os acompanhamentos posteriores se referem a solicitações de benefícios e recursos emergenciais (auxílio monetário).

Figura 2: Genograma da Família de origem de Nilza Josefa José 60 60 Janice Jamile

Eduardo Geraldo Luana

Nilza Júlio 1985 Virgínia 24 1988 Pedro 21 1979 Alex 30 2005 Luís Gustavo 4 Olavo Aparecida Amadeus 1991 Carlos 18 1992 Jonas 17 1971 Fábio 38 1999 Eduardo 10 2000 Vinicius 9

Figura 3: Genograma da Família de origem de Fábio Joaquim 1959 Anapolina 50 1971 Fábio 38 1974 Fernando 35 1976 Júlia 33 1980 Higor 29 1984 Melissa 25 Kátia 1979 Betinha 30 Pablo César ? ? 1972 Tiago 37 1996 Guilherme 13 2004 Débora 5 Graziele 1997 Danilo 12 Jackson 1996 Tatiana 13 2000 Miguel 9 1980 Emanuela 29 1990 Elias 19 1987 Alice 22 1995 Aureliano 14 1982 Vera 27 1998 Mateus 11 1968 Nilza 41 1999 Eduardo 10 2000 Vinicius 9