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CAPÍTULO 5 – Contribuições e considerações

5.4 É Me organizando que eu posso desorganizar

5.4.3 A gente e a comunidade, possíveis mudanças

Como foi apresentado anteriormente, o projeto de ensino orientado pelo DEP culminou com uma roda de conversa entre os estudantes, o professor e Mauro, pai da aluna Rita, que mora na comunidade há 15 anos e que trabalha na fábrica do grupo Votorantim. Durante a roda de conversa, levantamos questionamentos em relação ao trabalho realizado e interpelamos uns aos outros sobre as mudanças da comunidade e as ações e atitudes que colaboram com essas mudanças.

Nossa conversa iniciou-se com um tom um pouco imobilista, no sentido de que não ocorrem mudanças na comunidade ou de que as transformações ocorrem através de agentes externos, como vemos a partir das seguintes afirmações:

“Não muda nada, desde que eu vim para cá é a mesma coisa”; “Vamos esperar para ver se muda alguma coisa”;

“agora tem que ver se vai melhorar com a administração que vai ter aqui agora né?”. (Transcrição da fala do convidado Mauro, áudio gravado na Roda de conversa do Encontro XI, do dia 05.12.12).

Essas colocações foram apresentadas frente a perguntas sobre as mudanças nas condições de vida da população e sobre a melhoria dos empregos e da renda da população da Fercal. Durante um outro momento da conversa, discutimos sobre a possibilidade de distribuição da renda produzida pelas fábricas e como essa situação mudaria a comunidade. Segundo a fala do convidado, com essa possibilidade,

“Mudaria muita coisa né? Ai teria mais recurso aqui né? Não tem recurso nenhum, ia ter mais recurso. Ia melhorar a cidade né? Ia ter saneamento básico né? Ia ter tudo”. (Transcrição da fala do convidado Mauro, áudio gravado na Roda de conversa do Encontro XI, - 05.12.12).

Ainda com relação às mudanças na comunidade e os diferentes grupos sociais envolvidos nessas mudanças, Mauro afirmou que:

“Algumas pessoas correm atrás. Pede e tal, mas não é todos que tem coragem de chegar e correr atrás. São algumas, uma ou outra você tem”. (Transcrição da fala do convidado Mauro, gravada na Roda de conversa do Encontro XI, do dia 05.12.12).

Considerando essas afirmações, a aluna Kelly alegou que:

“Tem até algumas pessoas que falam que a Fercal foi assim, é assim e vai ser assim pro resto da vida”. (Transcrição da fala da estudante Rita, áudio gravado na Roda de conversa do Encontro XI, do dia 05.12.12).

E na sequência a aluna Rita ressaltou que:

“o que eu acho em relação à Fercal é o seguinte, muitas pessoas correm atrás para estar melhorando a Fercal, já têm as outras que não estão nem ai se a Fercal vai ficar assim, se vai continuar assim. As pessoas que não correm atrás elas ficam: ‘eu quero que a Fercal mude’. Mas como as coisas vão mudar se você não correr atrás? Porque se eu juntar aquelas pessoas, fizer um mutirão e correr atrás eu garanto que a gente consegue, mas se a gente não correr atrás a gente não vai conseguir nada, vai continuar do mesmo jeito”. (Transcrição da fala da estudante Kelly, gravada na Roda de conversa do Encontro XI, do dia 05.12.12).

Analisando essas falas, vemos que ambas as alunas trazem a questão participativa para a discussão. Kelly critica a posição imobilista e Rita destaca que um coletivo organizado é capaz de mudanças, mas é necessário certo comprometimento, senão vai continuar do mesmo jeito.

Vemos que a questão do correr atrás ficou evidenciada nas falas dos participantes. Em alguns momentos, o “correr atrás” remetia ao indivíduo que corre atrás dos objetivos pessoais, que estuda, trabalha e melhora de condição de vida.

“Eles [estudantes], como estão chegando agora, não tem profissão, não tem nada, tem que estudar. Estudar, fazer faculdade para mais tarde não depender das fábricas daqui. As fábricas, praticamente, são só para quem não tem opção né?“. (Transcrição da fala do convidado Mauro, áudio gravado na Roda de conversa do Encontro XI, do dia 05.12.12).

Mas na fala das alunas Rita e Kelly a questão da mudança tomou uma dimensão participativa, para elas, a comunidade tem que se organizar para realizar as mudanças necessárias. A aluna Rita citou uma situação que ela presenciou para ilustrar que as mudanças precisam de um coletivo organizado:

“Como a situação que acontece lá na rua onde a gente mora. Tem uma ladeira lá que é tudo esburacado. Os carros que passam por lá se acabam todinho. Não dá pra andar de salto alto que quebra o salto, é verdade! [risos]. Ai, sempre o Doutor Michel vem para cá fazer reunião com a gente

e acaba que a gente chama todo mundo da rua para poder ir lá, correr atrás. E todo mundo reclama, todo mundo reclama que tá ruim, que tem que melhorar. Quando a gente consegue... quando minha mãe que faz parte da associação consegue trazer o doutor Michel, um deputado, para ver se consegue a gente tentar juntar todo mundo, mas se vai duas pessoas é muito! Ai como é que quer que melhore se não vai correr atrás?” (Transcrição da fala da estudante Rita, áudio gravado na Roda de conversa do Encontro XI, do dia 05.12.12).

Sobre essa fala, Kelly destacou que a desmobilização não é um problema apenas da rua da Rita:

“O ruim Rita é que o fato que você colocou não é só lá no Alto da Bela Vista. É da Fercal geral, inteirinha. Acho que até pior!” (Transcrição da fala da estudante Kelly, áudio gravado na Roda de conversa do Encontro XI, do dia 05.12.12).

Identificamos nessas conversas um diálogo muito produtivo, pela falas das alunas elas demonstraram que não pretendem se resignar frente às dificuldades de mudanças, mas esperam uma participação coletiva da comunidade no enfretamento das dificuldades. E mesmo com as colocações do nosso convidado elas defenderam essa relação dialógica com o mundo e com a comunidade.

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