• Nenhum resultado encontrado

6. Conclusões

6.7. A Gestão Estratégica: o Projecto Educativo

Apenas cerca de um terço das escolas ou agrupamentos dispunha de um Projecto Educativo formalmente aprovado, não havendo dados que permitam detectar um efeito dinamizador da nova legislação nesta matéria. As escolas secundárias e os agrupamentos, por razões diferentes, parecem revelar mais dificuldades na formalização deste "instrumento" de gestão. O discurso sobre o Projecto Educativo revela adesão a uma abordagem tecnicista da gestão estratégica, de que o referido documento seria o instrumento privilegiado. Contudo, existem indícios para suspeitar que tal adesão não decorre de uma efectiva experiência gestionária compatível com tal discurso, exprimindo antes a assimilação de uma retórica gerencialista com impacto crescente na documentação oficial e na literatura de divulgação sobre gestão escolar.

6. 8. Os actores

6.8.1. Os educadores e professores

A pesquisa revelou que os educadores e professores se envolveram na aplicação do novo regime de autonomia e gestão das escolas e agrupamentos, nomeadamente participando nos processos eleitorais, na constituição dos órgãos de direcção e gestão, e na elaboração de documentos fundamentais como o Regulamento Interno e o Projecto Educativo. Contudo, tal envolvimento parece concretizar-se num contexto de cepticismo e de desconfiança em relação às intenções das autoridades governamentais a respeito das mudanças em curso. Assim, pode entender-se esta mobilização em torno da aplicação do regime em questão como uma atitude pragmática centrada na preocupação em garantir o funcionamento das escolas e em manter a estrutura de gestão escolar sob a tutela do corpo docente.

6.8.2. Os pais e encarregados de educação

O reforço do envolvimento parental nas estruturas de direcção e gestão das escolas tem constituído um dos objectivos enunciados de forma mais insistente no contexto da iniciativa governamental que lançou o regime cujo processo de aplicação agora se avalia. Os dados obtidos revelam uma participação generalizada dos pais e encarregados de educação nos processos eleitorais de constituição dos novos órgãos de direcção e gestão das escolas e agrupamentos, com uma intervenção

dominante das respectivas estruturas associativas. Os gestores escolares inquiridos revelam uma atitude pragmática relativamente às vantagem da participação dos pais e encarregados de educação, mas não deixam de evidenciar reservas sobre a qualidade dessa participação, nomeadamente sobre a representatividade e as motivações do activismo parental, recusando contudo uma visão radical sobre os pretensos efeitos perversos desse activismo.

6.8.3. O pessoal não docente

A participação dos funcionários não docentes foi suficiente para assegurar o envolvimento nos processos eleitorais e a respectiva representação dos órgãos colegiais, embora com algum défice de mobilização e pouco impacto no perfil do desempenho profissional. De qualquer modo, os responsáveis docentes inquiridos parecem reconhecer-lhes capacidade de intervenção, e efectiva participação naqueles órgãos.

6.8.4. Os alunos

A configuração das estruturas de direcção e gestão das escolas com recurso a instâncias colegiais de participação social fundamenta-se na intenção de promover dispositivos e práticas democráticas com impacto positivo na governabilidade das instituições, através do alargamento dos processos decisórios formais a um número crescente e diversificado de actores organizacionais. Pretende-se ainda um efeito de socialização através da promoção de vivências e o desenvolvimento de atitudes congruentes com a aquisição e consolidação dos valores básicos da democracia. Tem sido justamente neste segundo nível, ou seja, no valor educativo da experiência da participação social, que se têm fundamentado as iniciativas de envolvimento dos alunos nos órgãos de direcção e gestão das escolas, pensando-se que a escola também pode ser "uma escola de democracia".

Os dados recolhidos no presente estudo não parecem constituir motivo para uma avaliação optimista da consecução destas finalidades formativas. A informação relativa aos processos eleitorais revelou índices de participação modestos, principalmente quando comparados com os dos outros grupos envolvidos nesses processos.

A imagem da participação estudantil neste processo, transmitida pelos gestores escolares inquiridos, corresponde a uma visão claramente pessimista sobre a motivação e o envolvimento dos alunos, fazendo crer que se está longe de atingir

os objectivos socializadores da escola, no fomento de uma cultura democrática entre os jovens.

Quanto ao impacto do processo nos comportamentos e atitudes dos estudantes, a imagem transmitida não permite inferir efeitos formativos assinaláveis.

As causas do desinteresse estudantil pelo processo não parecem residir numa pretensa imaturidade dos jovens. Provavelmente, terão a ver com o próprio contexto organizacional em que as propostas de participação são apresentadas. Numa lógica em que se valorizam sobretudo os aspectos formais e processuais, os alunos sentem que, no quotidiano escolar, a sua influência real nos processos de tomada de decisões permanece insignificante. Assim, este exercício de participação estudantil corre o risco de se transformar numa formalidade ritual, irrelevante para a expressão dos interesses e pontos de vista dos alunos, ou seja, numa caricatura da democracia que contraria a aquisição de uma verdadeira cultura democrática.

6.8.5. As autarquias locais

A representação autárquica na Assembleia Constituinte e na Assembleia de Escola fez-se sempre por intermédio de um único elemento, e concretizou-se efectivamente em todas as unidades sobre que se recolheu informação. A participação dos representantes autarcas nas reuniões da assembleia de escola revelou um índice modesto, pouco ultrapassando os 50%. Os dados apontam para a convicção de que os responsáveis autárquicos se preocupam principalmente com a execução formal das responsabilidades legalmente cometidas ao poder local, manifestando de forma implícita um certo distanciamento político face ao processo em curso, não assumindo um papel activo e dinamizador. Na relação tripartida entre as escolas, a autarquia, e os serviços da administração educativa, marcada frequentemente por pontos de vista e interesses diferentes, o que pareceu marcar o posicionamento autárquico em todo o processo foi a tentativa de manter uma posição equidistante em relação às escolas e ao serviços do Ministério da Educação.

6.8.6. Os serviços da administração educacional

A imagem geral da actuação dos serviços de administração educacional parece caracterizar-se por um posicionamento de acompanhamento e apoio, sem autoritarismos mas sem o exercício efectivo de um papel dinamizador, com reduzida eficácia, défice de preparação técnica capaz de responder às dúvidas colocadas pelas escolas, e de coordenação quanto ao teor da informação emitida pelos diversos serviços. A ideia geral é a de que a intenção declarada de reduzir a

pressão regulamentadora e de aumentar a capacidade de decisão na escola, não teve (ainda) impacto apreciável no quotidiano escolar e nas representações dos professores.

6. 9. O olhar dos gestores escolares sobre o processo

6.9.1. As consequência do novo regime

Um dos fundamentos centrais para as mudanças promovidas na direcção e gestão das escolas consiste no pressuposto de que se produzem impactos positivos na melhoria do funcionamento e na qualidade do serviço prestado.

Em síntese, pode afirmar-se que, tanto quanto os dados recolhidos indiciam, a aplicação do novo regime de direcção e gestão significou um aumento da democraticidade do governo das escolas, e a abertura de perspectivas de maior integração comunitária, estando porém ainda muito distante o desiderato da definição de políticas educativas locais. Os impactos na eficiência da gestão e na qualidade e equidade da educação proporcionada parecem ser pouco significativos ou tendencialmente irrelevantes, assim como o efeito nas relações entre as escolas e a administração educativa, as quais continuam centradas na pressão normativa do controle burocrático. Finalmente, no que se refere aos parceiros associativos, o inquérito indicia que apenas o movimento parental parece ter obtidos ganhos significativos.

6.9.2. Questões críticas globais

Em geral, a argumentação crítica desenvolvida em torno do debate político sobre o regime em análise teve um eco apreciável entre os docentes responsáveis pela gestão escolar, embora não assuma proporções muito significativas. Os pontos críticos que parecem mais populares centram em argumentos aparentemente "neutros" (falta de preparação para a participação), de teor mais corporativo (o governo evita os problemas e responsabiliza os docentes perante o público), ou de conteúdo vincadamente político (expressão de uma política economicista de redução do investimento na educação).

6. 10. Síntese final

Na maior parte das situações, a instalação das novas estruturas de direcção e gestão parece estar a concretizar-se sem sobressaltos significativos, num registo de evolução na continuidade. Não se registam rupturas nas rotinas e nos procedimentos correntes, próprios de culturas organizacionais específicas desenvolvidas na interacção entre a pressão normativista da administração central da educação, e a colegialidade docente expressa em práticas auto-gestionárias consolidadas no processo de "naturalização" da gestão democrática.

O ensaio de reordenamento da rede escolar, traduzido na criação dos agrupamentos, parece deparar com maiores dificuldades, dada a necessidade de enfrentar a inércia de dispositivos e procedimentos de gestão muito consolidados. De um modo geral, pode dizer-se que a iniciativa política contida nas mudanças veiculadas pelo novo "Regime de Autonomia, Administração e Gestão" não parece ter produzido um efeito mobilizador significativo entre os actores com intervenção no contexto escolar, numa lógica de transformação da escola, e no sentido de melhorar a qualidade do serviço público de educação, notando-se, nomeadamente, algum distanciamento e desconfiança entre os docentes, manifesto desinteresse entre os estudantes, e uma prudente reserva entre os autarcas, embora pareça ter dinamizado a participação parental, pelo menos no que respeita à acção das respectivas estruturas associativas.

Documentos relacionados