• Nenhum resultado encontrado

A Guerra Civil na Síria e os Desafios para a União Europeia

Vinte e cinco anos após a queda do Muro de Berlim e o fim da Guerra Fria, o processo de democratização global começou a estagnar, quando não a regredir. Mesmo se durante décadas uma vaga de democratização varreu o mundo, o problema é que o que acontece na prática nem sempre se ajusta às teorias. Em 2010, iniciou-se uma série de Revoltas Árabes na região do Médio Oriente, que apelavam para uma mudança democrática e a destituição dos regimes autoritários vigentes. Contudo, as esperanças iniciadas em 2011 com a revolução de Jasmim e as manifestações da Praça de Tahrir, depressa chegaram ao fim, e, em 2015, a Primavera Árabe apenas continua digna desse nome na Tunísia. O Egipto voltou à ditadura militar, agora maquilhada por eleições, a Síria afundou-se na guerra civil e a Líbia fragmentou-se num caos de milícias e senhores da guerra. O próprio modelo ocidental de democracia perde brilho, bastando recordar a crise no seio da União Europeia, que está a por em causa todo o projeto europeu. Qual será a ligação entre a Primavera Árabe e uma organização como o autoproclamado Estado Islâmico do Iraque e do Levante (ISIS13, sigla inglesa) que está a redesenhar o mapa do Médio Oriente com sangue? Estarão estes eventos relacionados? As sublevações democráticas da última década e os grupos terroristas são ambos produtos da atual desordem de um mundo multipolar, em que os antigos modelos de política externa tornaram-se obsoletos.

Neste capítulo pretende-se abordar a atual situação da Síria, sendo necessário recuar no tempo de forma a perceber a importância do país na região do Médio Oriente e as razões que estiveram por de trás da revolta primaveril de Damasco em 2011. Além disso, o avanço do Daesh para o território sírio acrescentou mais um peão neste “jogo de xadrez” geopolítico, que vai desde os 1000 grupos armados da oposição ao regime de Assad às forças do Daesh.

13 Em junho de 2014 a organização assumiu o nome “Estado Islâmico”. Contudo, nos últimos anos o

grupo mudou de nome várias vezes. Inicialmente fazia parte da organização al-Tawhid al-Jihad, de Abu Mussab al-Zarqawi, e mais tarde tornou-se o Estado Islâmico do Iraque (EII, ou ISI na sigla inglesa), que acabou por se fundir com a Al-Qaeda do Iraque. Todavia, em 2010, o grupo recuperou a sua antiga designação de Estado Islâmico do Iraque. Em 2013, com a sua fusão com a Frente al-Nusra, um grupo jihadistas filiado à Al Qaeda, a organização adotou outra designação, passando a intitular-se Estado Islâmico do Iraque e do Levante (al-Sham), mais conhecida pelos acrónimos EIIL e EIIS (e pelos acrónimos ingleses ISIL ou ISIS). No Ocidente recomenda-se que se deve intitular Daesh, acrónimo de “Al-Dawla al-Islamiya fi al-Iraq wa al-Sham”, uma vez que o grupo armado não é nem um Estado e nem é islâmico. Ao longo desta dissertação, será usado o acrónimo Daesh.

86

Também será aqui discutida a problemática dos refugiados sírios, tema central da investigação, abordando os números, as rotas e os seus destinos. Além disso, de forma a incluir o ator em estudo, a União Europeia, será feito ainda um balanço das relações entre a União e a Síria, bem como as repercussões e oportunidades do conflito para a organização.

3.1 – A Evolução da Política da Síria: da Independência à Dinastia Política

Síria

3.1.1 – Ascensão do Partido Baath

As fronteiras da Síria são uma criação e construção negociada e acordada entre a Inglaterra e a França logo a seguir à Primeira Guerra Mundial, ou seja, tal como sucedeu no continente africano, é o fruto da divisão a régua e esquadro dos colonizadores europeus. Antes da ocupação europeia existia a “Grande Síria” designada como Bilad al-Sham (Terras do Norte). Esta zona, que compreendia o Líbano, Israel, Jordânia e Palestina, foi dividida pelas grandes potências europeias, que, através da constituição do chamado sistema de mandatos, controlaram e administraram toda a região (Kamrava 2005, 35). Contudo, a criação de uma Grande Síria acompanhou sempre a política da Síria numa visão alargada que pretendia a criação de uma única nação árabe (Kamrava 2005, 35). Esta ideia concedeu ao país uma posição de liderança política no mundo árabe.

Em 1946, com o fim da ocupação colonial no país, a Síria recuperou a sua autonomia, mas só em 1958 é que a construção de uma Grande Síria passa a ser uma realidade com a constituição da chamada Republica Árabe Unida, que só foi possível através do apoio egípcio e do seu líder Gamal Abdel Nasser (Bill e Springborg 1999, 158). Até então, a Síria era caracterizada por uma forte instabilidade e fragilidade política, agravada por uma possível tomada de poder de forças afetas aos norte-americanos como aos soviéticos devido ao clima de Guerra Fria instalado.

Contudo, a ideia de uma pátria árabe, que se estenderia do Nilo ao Tigre, depressa teve os seus dias contados, acabando por desaparecer em 1961 através de um golpe de Estado militar em Damasco (Bill e Springborg 1999, 158). Dois anos depois, dá-se um novo golpe

87

que impõe uma nova ideologia política, o chamado Pan-Arabismo, na altura protagonizado pelo Partido Baath.

O conceito de Pan-Arabismo não se baseia apenas numa ideologia confinada a um país, mas sim numa lógica internacional que una todos os Estados árabes. São diversas as características deste ideal nacional: prossupõe a criação de um único Estado árabe que se estenderia desde o Iraque até Marrocos; a separação definitiva do poder religioso e político; em termos socioeconómicos baseia-se no modelo Marxista com uma forte componente populista (Hinnebusch 2003, 6).

Apesar do domínio Baath ser efetivo desde 1961, em que vigorou uma república parlamentar na Síria, em 1963 uma outra fação Baath, liderada por Hafez al-Assad, ainda mais devota ao Pan-Arabismo tomou conta do poder, instaurando o sistema de partido único em damasco. Esta junta militar Baath, tal como grande parte dos países árabes, alimentou o seu apoio através da hostilidade contra Israel. Essa forte rivalidade é apontada como uma das razões para a eclosão da guerra Israelo-Árabe de 1967, conhecida pela Guerra dos Seis Dias (Bill e Springborg 2000, 226). A Síria saiu derrotada tendo perdido os estratégicos Montes Golã.

Hafez al-Assad governou o país durante 30 anos até à sua morte em 2000. Através dele, a Síria entrou oficialmente nas equações da Guerra Fria, aliando-se ao bloco soviético já que, nesta posição, o governo de Damasco encontrou proteção contra o seu inimigo número um, Israel, apoiado pelo outro lado da “cortina de ferro”. Contudo, o partido Baath consegue manter-se fortemente autónomo dos soviéticos, aproveitando apenas o seu apoio para promover os interesses nacionais. De referir, no entanto, que se inspirou na planificação soviética da economia, tal como a semelhança entre o partido único soviético e o partido Baath da Síria. Em 1973, Hafez al-Assad saiu mais uma vez derrotado da Guerra do Yom Kippur com Israel, mas desta vez recuperou parte dos Montes Golã (Hinnebusch 2003, 265).

Com Assad o nacionalismo pan-árabe passa a ser apenas uma fachada e uma alavanca para ser usada de forma a estabelecer alianças, nomeadamente com todas as forças que combatem Israel. Há muito que a ideia de criar uma única nação árabe não passou de um sonho, aliás a própria presença síria no Líbano é na realidade baseada na antiga ideia de constituir uma Grande Síria, onde o Líbano seria apenas uma província.

88

O governo de Hafez al-Assad baseia-se na instituição do partido Baath, que controla por completo a sociedade civil. Este controlo passa por exercer uma repressão política, imposição do culto da personalidade e técnicas de propaganda. Além disso, à sua longa liderança pode-se também evocar a astuta lógica política. Na chamada Segunda Guerra do Golfo, entre 1990 e 1991, Hafez al-Assad surpreendentemente alinhou-se com a coligação liderada pelos EUA contra o Iraque (Bill e Springborg 1999, 296). Aliás, esta posição é demonstrativa do abandono definitivo da criação de um modelo político internacionalista pan- árabe por parte da Síria, uma vez que o Iraque constituía uma outra nação onde a liderança é controlada pelo partido Baath. Mas a posição contra Bagdad encontra-se justificada pelo fim da Guerra Fria e pela tentativa de acabar com o isolamento político e económico que a Síria sofria. Nesse mesmo ano, a Síria reconheceu, de facto, o Estado de Israel.

3.1.2 – Bashar Al-Assad e a Dinastia Política Síria

A questão da sucessão política no Médio Oriente é sempre um fator de instabilidade, nomeadamente quando se referem ao aparecimento de dinastia política em países totalmente laicos e sem qualquer monarquia. No caso da Síria, só houve um período monárquico, quando o Faiçal saiu do Iraque para assumir o poder em Damasco entre 1919 e 1920. Basicamente, esta sucessão de poder dá-se dentro da própria família, e a Síria é o primeiro exemplo de sucesso desta passagem de poder dinástica.

De facto o presidente Bashar Al-Assad parece ser o herdeiro da política do seu pai, no entanto, não se pode incorrer no erro de os comparar, até porque o filho é a favor de extensas reformas económicas na Síria, a difusão da internet e da reforma das instituições de ensino. Já no que diz respeito à liberdade de expressão os bloqueios permaneceram. Contudo, os avanços tecnológicos dos órgãos televisivos no Médio Oriente e o consequente aparecimento de novos canais restringiram fortemente o sucesso de qualquer censura.

Internamente, Bashar Al-Assad teve que lidar com as revoltas da minoria curda, em 2005, um dos efeitos da guerra do Iraque de 2003, uma vez que os curdos iraquianos impuseram um Estado no norte do Iraque, influenciando os países vizinhos onde esta minoria está presente a fazer o mesmo, como foi o caso da Síria. Mas houve outras consequências para

89

a Síria proporcionadas pelo conflito no Iraque: o aparecimento de fações radicais muçulmanas a operar no território.

No que diz respeito às relações internacionais, a dinâmica criada no pós-11 de setembro impôs pesadas sanções ao país. Se inicialmente existiu uma aproximação em relação aos EUA na luta contra ao fundamentalismo islâmico e a Al-Qaeda, depressa foi relegada para o afastamento devido à posição síria em relação ao Líbano e ao seu apoio ao movimento Hezbollah. Aliás, a posição em relação ao Líbano continua a condicionar qualquer abertura.

Contudo, o crescente isolamento internacional só veio aumentar a ligação com o Líbano e o apoio ao Hezbollah, bem como veio estabelecer um acordo de cooperação e defesa com o Irão, inserindo, desta forma, a Síria no chamado “Eixo do Mal”14

. Esta aproximação resultou em pesadas sanções aplicadas pelos EUA, baseadas na alegada posse de armas de destruição maciça por parte da Síria. Além disso, os assassinatos de figuras políticas e públicas libanesas, perpetuados pelo regime sírio, bem como o posterior conflito entre Israel e o Líbano, em 2006, com o país a apoiar logística e militarmente o Hezbollah, veio pior a situação do país, condenando a um profundo isolamento.

3.2 – Assad e a União Europeia

3.2.1 – Parceria Euro-Mediterrânea: Declaração de Barcelona

Na Conferência de Barcelona de 27 e 28 de novembro de 1995, foi criada a Parceria Euro-Mediterrânea (PEM) entre os então quinze Estados membros da União Europeia e os doze do Mediterrâneo15. O Processo de Barcelona constitui o primeiro grande passo da dimensão institucional da PEM no pós-Guerra Fria, que visava assegurar uma cooperação política e o reforço da cooperação em matéria de segurança, focando-se numa dimensão multilateral capaz de complementar a dimensão bilateral das relações euro-Mediterrâneas (Declaração de Barcelona 1995). Do acordo assinado é possível destacar três objetivos

14 Nem um ano após o 11 de setembro de 2001, George W. Bush, presidente dos Estados Unidos, na sua

guerra contra o terrorismo, nomeou três países como ameaças - o Irão, o Iraque e a Coreia do Norte. Países que, segundo o Presidente, com os seus “aliados terroristas”, constituem um “eixo do mal”.

15 Países da PEM: Argélia, Autoridade Palestiniana, Egipto, Israel, Jordânia, Líbano, Líbia, Marrocos,

90

fundamentais: 1) Parceria política e de segurança; 2) Parceria Económica e Financeira e a criação de uma área de prosperidade partilhada; 3) Parceria em assuntos sociais, culturais e humanos (Declaração de Barcelona, 1995).

Todavia, a UE foi completamente incapaz de evitar a escalada de instabilidade na região, nomeadamente no que ao conflito Israelo-Palestiniano diz respeito, bem como de garantir a aplicação do Direito Internacional e dos direitos humanos (Aliboni e Ammor 2009, 13). Já no que respeita à segunda componente da Declaração a União pretendia que o aumento da integração económica, à semelhança do que aconteceu com o Processo de Construção Europeu, poderia gerar uma mudança política na região, promovendo, nomeadamente o processo de democratização (Aliboni e Ammor 2009, 14). Contudo, a cooperação económica fracassou, bem como o volume de comércio entre a UE e os seus parceiros do Mediterrâneo manteve-se reduzido (Youngs 2006, 90; Aliboni e Ammor 2009, 17).

Se estes dois últimos domínios fracassaram nos seus objetivos, o terceiro pilar da Declaração de Barcelona também não foi exceção. O envolvimento da União nas questões dos direitos humanos, Estado de Direito e democracia evidencia o seu desejo de aproximar as duas margens do Mediterrâneo. Porém, esta abordagem normativa viu no apoio dado pela UE a regimes autoritários a sua grande limitação (Youngs 2006, 91). Aliás, a cooperação com regimes autocráticos de pouco tem de democrático, mas esta foi vista como necessária para promover o processo de paz no Médio Oriente e o processo de controlo de armas (Youngs 2006, 97). Além da parca promoção dos direitos humanos e de uma mudança democrática, a realização de acordos bilaterais tornou a ação da UE pouco consistente e igualitária. Além disso, essa ajuda e acordos bilaterais feitos pelos Estados-Membros resultou na venda de armas para esses territórios (Youngs 2006, 98).

Desde a sua criação que a PEM não tem surtido grandes efeitos, nomeadamente no que toca à promoção da democracia. Se alguns sucessos foram registados, como o aumento do diálogo intercultural e o intercâmbio de jovens entre as duas margens do Mediterrâneo, as transformações verificadas no campo da democracia foram fracas ou praticamente inexistentes, permitindo o domínio de regimes autoritários na Argélia, Tunísia ou na Síria (Aliboni e Ammor 2009, 14).

91

Apesar de não ter tido um grande impacto, a PEM começou a forçar a região a adotar um novo discurso na reforma política. De facto, o pós-11 de setembro trouxe o reforço direto da abordagem da segurança e de novas iniciativas na área da reforma política. Contudo, os objetivos do processo de Barcelona fracassaram devido à incapacidade da UE em levar os parceiros da orla sul do mediterrâneo a acreditar que o estabelecimento de uma segurança comum poderia significar um futuro próspero para a região (Aliboni e Ammor 2009, 24).

De facto, a cooperação da UE com regimes autoritários vigentes na região do Mediterrâneo na última década do século XX é reveladora do desejo da União em manter o status quo na região. Esta posição contradiz a democratização progressiva dos Estados da parceria estipulada na Declaração de Barcelona. A introdução da “Política Europeia de Vizinhança”, em 2005, e a tentativa de relançamento do Processo de Barcelona, sob iniciativa do Presidente da República Francesa, Nicolas Sarkozy, tentariam colmatar as diversas lacunas e relançar o que viria a ficar praticamente estagnado durante aproximadamente dez anos (Aliboni e Ammor 2009, 24).

3.2.1 – A dimensão Mediterrânica da Política Europeia de Vizinhança

Em 2003 surgiram as bases do que em 2004, aquando do alargamento da União Europeia a 25, se viria a chamar “Política Europeia de Vizinhança” (PEV). Este novo enquadramento teve o propósito de permitir um relacionamento mais profundo entre a União Europeia e os países vizinhos a leste16 e a sul, na orla do Mediterrâneo.

Não obstante a ideia do Reino Unido seria a de alargar a intervenção da UE à Bielorrússia, à Moldávia e à Ucrânia, deixando de lado os países do sudeste Europeu. Deste modo, o governo britânico não pretendia uma política de vizinhança que interferisse com o quadro institucional da Declaração de Barcelona e que os Estados do Cáucaso estivessem incluídos nesta política. Porém, no Conselho Europeu de Copenhaga de dezembro de 2002, determinou-se que, como forma de relançar o Processo de Barcelona, os países do sul do Mediterrâneo seriam incluídos, tal como os Estados do Cáucaso seriam igualmente incluídos na política de vizinhança.

16Parceria Oriental: Arménia, Azerbaijão, Bielorrússia, Geórgia, Moldávia e Ucrânia. Parceria

Mediterrânica: Argélia, Autoridade Palestiniana, Egipto, Israel, Jordânia, Líbano, Líbia, Marrocos, Síria e Tunísia.

92

Assim, a PEV tem como objetivos a criação de uma “zona alargada de estabilidade, segurança e prosperidade, na qual se estabeleça uma relação de paz e cooperação entre a UE e os seus vizinhos”. Na perspetiva da UE, apoiar o desenvolvimento político e económico dos seus vizinhos constitui a melhor forma de garantir a paz, a segurança e a prosperidade a longo prazo” (Comissão Europeia, 2006).

De facto as questões securitárias encontram-se no cerne da estratégia: conflitos na região de vizinhança estão indubitavelmente associados a movimentos migratórios ilegais massivos, problemas de criminalidade, nomeadamente tráfico de armas e transposição da atividade de organizações criminosas para o espaço da União Europeia. Assim, a PEV nasce como uma importante resposta da Comissão Europeia ao desejo dos Estados-Membros de criar um background estratégico na região. Este apelo foi reiterado na Estratégia Europeia de Segurança de 2003, que referia que a União deveria:

(...) desenvolver relações especiais com os países vizinhos, com o objetivo de promover um anel de países bem governados a leste da União Europeia e nas fronteiras do Mediterrâneo, com quem podemos usufruir de relações próximas e cooperativas (EES 2003).

A PEV vai ao encontro de “expectativas, esperanças e receios dos cidadãos em relação aos desafios e ameaças resultantes da pobreza, insegurança, pressões migratórias e carência de recursos que caracterizam a sua vizinhança comum” (Comissão Europeia, 2006), surgindo assim como uma solução passível de resolver alguns problemas que apesar de se situarem além-fronteiras, afetam a estabilidade económica, social e securitária da União Europeia. A PEV tem como objetivo criar um “ring of friends” à volta da UE, onde reine o diálogo, a cooperação, e onde decorram reformas a nível político, económico, social. Assim, a PEV é um conjunto de políticas pensadas para países “a quem não será oferecida a possibilidade de adesão à UE, mas que alinham em políticas com a União em troca de assistência política e financeira” (Kuus, 2011). A gestão da migração e das fronteiras é um dos pontos fulcrais da PEV, isto porque a União Europeia é um destino atrativo e a migração descontrolada pode originar graves problemas sociais, de segurança e mesmo económicos. Aliás, os Planos de Ação, que surgem com a PEV, refletem muito do interesse próprio da UE, nomeadamente no que toca às Políticas de Migração e Asilo da União.

93 3.2.3 – A Síria e a Parceria Euro-Mediterrânea

A Síria é um claro caso de divisão entre uma Europa proactiva em alcançar um acordo positivo e uma política norte-americana de ameaça e coerção. No rescaldo do 11 de setembro nem os EUA nem a UE revelaram um interesse significativo na promoção democrática da Síria. No entanto, a União apelou à urgência de concluir um acordo de associação com o país (Youngs 2006, 129).

As divergências transatlânticas emergiram quando os EUA tentaram ofuscar a Síria, em 2004. Bashar relutante em fazer ligações com o Hamas e a Jihad Islâmica, acelerou os seus esforços para desenvolver a sua capacidade de armas químicas, de forma a desafiar a presença norte-americana no Iraque, e facilitou ainda o movimento de jihadistas na fronteira entre o Iraque e a Síria. Estas tomadas de posições iniciaram assim um novo e penoso ciclo de sanções económicas ao país.

Claro que a evolução da política dos EUA condicionou a estratégia europeia no país. As pressões dos EUA para a União não assinar o acordo de associação aumentaram a determinação de alguns Estados-Membros para fazer precisamente o contrário.

Damasco adotou uma posição tolerante nas suas negociações com a UE, incluindo com o processo de democratização. As negociações foram concluídas em dezembro de 2003, mas o acordo foi adiado devido à cláusula de não-proliferação de armas de destruição maciça. A inflexão de Bashar em relação às armas químicas levou a que o Reino Unido impedisse a assinatura do acordo e a ele juntou-se a Alemanha, Dinamarca e Holanda. Outros Estados- Membros foram flexíveis em relação às armas de destruição maciça, citando a prioridade de

Documentos relacionados