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A IMAGEM – Organização territorial vs Processamento Disco Rígido

Como foi reconhecido no capítulo anterior, para o “mapa-projecto” comunicar (ser utilizado e editado pelo público), exige a associação a uma imagem mais ou menos corrente, ou pelo menos, que faça parte de um universo comum. Não constitui objetivo declarar a metáfora proposta como real e irrefutável, mas usá-la como base imagética para uma exploração conjunta do fenómeno variável do espaço construído.

Desse modo, justifica-se a analogia entre o desenvolvimento da cidade contemporânea e o modo de organização e desenvolvimento de um disco rígido de computador, porque este combina velocidade com cruzamento de dados mutáveis enquanto organiza

múltiplos ficheiros. Essa “mobilidade” está dependente de uma correcta disposição da

informação. Apesar da importância do conteúdo dessa informação, o mais relevante é que se encontre bem atribuída no espaço disponível do disco. Assim como um sistema urbano, o processo é feito de complexas adições e subtrações, composto por múltiplas camadas. Os diferentes elementos que compõem a organização de um disco rígido proporcionam uma infinidade de relações e justaposições, fazendo com que elementos do mesmo tipo, dispostos de maneira diferente (tamanho e proporção), se traduzam em composições integralmente diferentes.

Funcionamento de um disco rígido

Para se compreender melhor o sentido da analogia convém descrever sinteticamente como funciona um disco rígido.

Inicialmente, um computador de origem, contém os obrigatórios ficheiros de sistema operativo e escassa informação arquivada. O hardware, particularmente o disco rígido, encontra-se organizado, agindo a um ritmo rápido sem defeitos. O espaço encontra-se dividido em espaço utilizado e espaço livre, bem delimitados, sem grande correspondência entre eles.

A partir do momento em que se desinstala algum programa ou se elimina arquivos, o disco rígido, facilitando, grava os novos elementos de acordo com o espaço livre total e o espaço livre parcial (o espaço deixado livre entre programas na altura da remoção de qualquer programa ou arquivo). Este processo vai tornando cada vez mais complexa a relação entre programas e espaços livres, sendo o mesmo programa gravado em áreas

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distintas, o que dificulta o desempenho do computador, tornando os arquivos numa

complexa malha desordenada e fragmentada.

Uma incorrecta disposição da informação aumenta os designados espaços “mortos” do disco, “buracos de informação”, impossíveis de serem re-escritos, levando o sistema a atingir um ponto se saturação que torna a situação irrecuperável. Desfragmentar o disco rígido é uma tarefa normal e necessária para quem utilize um computador com o sistema operativo Microsoft Windows, para que este se mantenha operacional. Outros sistemas, como os desenvolvidos pela Apple, não necessitam de ser desfragmentados porque contêm um sistema de ficheiros designado HFS+ (Hierarchical File System), que previne e evita a fragmentação contínua dos ficheiros guardados. Se no primeiro a fragmentação e o bloqueio de vírus é discretamente desvinculada (por razões estratégicas), o segundo é programado para atrair a fiabilidade dos consumidores. Na realidade funcionam como duas faces da mesma moeda, dois polos de atracção opostos, para o mundo desenvolvido e para o mundo dito terceiro.

Comparando com a cidade

Qualquer rede (seja a organização e processamento de um disco rígido ou a evolução de uma cidade) vai produzindo erros/fracturas, que afectam a eficiência do sistema. Em teoria não existem espaços impossíveis de serem (re) desenhados num conjunto urbano, mas sistemáticas más decisões podem condicionar inevitavelmente grandes áreas territoriais, prejudicando a qualidade de vida geral da população.

O rápido desenvolvimento da cidade contemporânea fez com que determinados espaços ficassem disseminados nesse processo. Depois de inserida uma multiplicidade de informação diferente no “disco da cidade”, alguns espaços transformam-se em vazios ou fragmentos, descontextualizados do sistema, contagiando o desenvolvimento saudável da metrópole.

Contudo, uma ruptura representa sempre uma oportunidade de regeneração. “As rupturas, quando se operam, e sejam quais forem as suas causas aparentes, têm sempre lugar numa vizinhança, digamos catastrófica, das interacções múltiplas que constituem

a realidade concreta em movimento, ou seja, a história de um corpo, de um organismo ou de um sistema. A existência pressupõe provavelmente a continuidade,

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aparecem como condição da mecânica de transformação endógena da realidade – é ela a «catástrofe» que garante e justifica a própria dialéctica universal – a permanência, o devir e a lógica das coisas.”103

Aceitando as rupturas como consequência natural da história de uma “realidade concreta em movimento”, procura-se construir um método que sirva de base de desenvolvimento para identificar e classificar essas falhas, reparando o sistema através de projectos de “infiltração”. Através da analogia entre o crescimento da cidade contemporânea e o modo de organização/desenvolvimento de um disco rígido de computador, procura-se desenvolver a base que interprete o aparecimento de falhas

nos sistemas urbanos e propor um método de os decifrar (desfragmentação) baseado

na cidade do Porto.

Quando se fala em desfragmentação fala-se em aproveitamento do espaço, em

sobreposição (multifuncional) ao contrário de agregação (linear), em reversibilidade

(estrutural) ao contrário de permanência (monumental), em mapa (prospectivo) ao contrário de representação (literal), em processo (evolutivo) ao contrário de figurativo (regulamentar). Para crescer economicamente deve-se continuar a crescer fisicamente? Podem as cidades crescer para dentro? É possível gerar ordem sem impor controlo?104 O tecido urbano contém uma dotação infraestrutural que é uma espécie de “capital fixo colectivo” cujo uso (pelo edificado), se deve maximizar até a um nível óptimo de densificação. Interessa potenciar esse capital, inserindo-o num processo de optimização espacial.

Na impossibilidade real de conhecer o todo, define-se “sustentabilidade” como uma melhor utilização de recursos, contra projectos de grande escala e pequeno alcance, através de um “mapa sensorial” construído por todos os agentes espaciais, sustentado na realidade virtual, na procura de determinar a relação e a composição formal entre os fragmentos. Na sobreposição destes dois “mapas-projecto” (utilizadores vs. profissionais) poderá ser criada uma visão mais aproximada do espaço em que devemos actuar.

103 António Cerveira Pinto, Rescritos para uma Exposição, Depois do Modernismo, Catálogo, 1983:19 104 Vicente Guallart, Willy Müller , Manuel Gausa, Barcelona Metapolis- MET 1.0, Actar, 1998

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