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5 Aspectos formais e conceituais

5.3 A influência das cores

(...) Sou o pintor do espaço, para pintá-lo, coloquei-me no seu lugar, no próprio espaço.(Yves Klein)) (...) A integração da obra com o espaço do mundo aparece na pintura de modo sistemático com o Expressionismo Abstrato, quando a cor efetivamente parece sair da tela e invadir o espaço. As pinturas são de grande formato, de modo que o espectador perde o olhar analítico, centralizado, sendo obrigado a estabelecer uma relação física com o quadro. Uma nova concepção de forma passa a ser expressa através da cor: manchas cromáticas, dos mais variados matizes, desafiam a geometria e escapam da tela. Recusando o aspecto volumétrico criado por contrastes de valor (chiaroscuro), as cores parecem pulsar no espaço à medida que se expandem ou se contraem. A pintura cria um campo de experiência, um espaço existencial; não cabe mais ao artista descrever um mundo dado, mas transformá-lo a cada instante. A percepção não deve ser mais contemplativa e sim ativa. O espaço não se constitui

mais exclusivamente através de contrastes de cores presentes na superfície da tela, não é visto como uma realidade em si, mas como algo que surge a partir da experiência humana. Cria-se deste modo uma sensação física que escapa da superfície do quadro: “um ambiente”. Cada vez mais a superfície da tela confunde-se com a parede. O espaço que a pintura define não é para além‚ mas para aquém da superfície pintada, como os mosaicos das igrejas bizantinas que colorem o ar do vão arquitetônico. Estas pinturas procuram criar um lugar (...) desde Lascaux houve sempre uma integração da obra com o espaço arquitetônico, visto que esta integração entre arte e arquitetura sempre ocorreu” (GIANNOTTI, 2010)

O presente capítulo trata da influência da cor do Novo Muralismo na cidade e seus impactos no corpo, a relação entre a cor e o espaço (influência geográfica/climática e do tipo de superfície).

Imagem120: Jackson Pollock em Action Painting.

A evolução do material que houve no decorrer das gerações permitiu a ampliação da paleta de cores usadas. Tanto na tinta spray, como na tinta acrílica. As imagens abaixo ilustram como isso aconteceu no caso do spray.

Imagem121: John Howard mural dos anos 1980.

Imagem 122:mural do Ramon Martins dos anos 2000.

O que ocorria nas décadas de 1980 e 1990, quando se começou a usar spray automotivo para pintura de muro, era a subversão do meio. O spray que até então era usado para pintar carro e superfícies metálicas, passou a ser aplicado, provavelmente, entre os operários do guetos de Nova Yorque, não se sabe, nas paredes. Nos anos 2000, com a grande demanda de pintores de rua, provocada pelo movimento hip hop,se deu o surgimento de marcas que desenvolveram um

spray específico para pintar muros, com válvulas e concentração da tinta mais

de spray especializada em mural é diferente do spray automotivo usado anteriormente, além de ser muito mais diversificada.

Imagem123: paleta de cores

da linha automotiva da Colorgin.

Fonte:

WWW.colorgin.com.br. Acesso: 12/10/2016

Imagem124: paleta de cores da linha94 da Montana.

Fonte:WWW.mtn.com.br Acesso: 12/10/2016.

Imagem125:paleta de coresda linha Hardcore da MTN.

Fonte: WWW.mtn.com.br. Acesso: 12/10/2016.

Imagem126: paleta de cores da linha Arte Urbana da

Colorgin.

A variação de luz de um local, uma determinada região, tem suas consequências na paleta de cores usada pelos artistas. Isso é perceptível quando comparamos as cores vivas que aparecem nos trabalhos dos artistas em um território tropical, como São Paulo, em relação ao Novo Muralismo europeu, onde há menor incidência de sol durante o ano.

Imagens 127 e 128: Acima, obra de Yá!(Brasil).

Abaixo, obra de dir. Bitxo (Espanha).

Essas diferenças aparecem, também, na publicidade e no design locais que, por sua vez, influenciam as obras dos muralistas. Mas há uma grande distinção entre a arte utilizada na publicidade, que está extremamente embasada no estudo das cores. O que a publicidade usa para provocar o desejo de consumir, o artista urbano usa para trazer vida e arte à cidade. É o caso dos artistas Highraff e Boleta, também conhecidos como os “psicodélicos” do Novo Muralismo.

Boleta tem uma bagagem de estudo das cores que vem de sua experiência anterior em estúdios de tatuagem em São Paulo. Somado a isso, o

artista continuou sua exploração cromática com a aplicação das cores Imagem129: mural do artista Boleta.

florescentes. Já Highraff utilizou todo seu estudo acadêmico das cores para causar efeitos de luz e sombra e dégradés com a variação da tonalidade das cores quentes e frias, buscando sempre o equilíbrio entre as duas em suas composições.

Pra mim, foi muito marcante a pintura que eu fiz em Amsterdam, até por ter pela escala dela, né? E por ser um prédio e pelo que é o prédio, né? Ali é uma escola muçulmana, uma escola árabe, então eu tava num bairro árabe, dentro de uma cidade européia, trazendo uma arte que não tem nada a ver, nem com os árabes, nem com os holandeses (...) isso parece um planeta me provou muito que a arte é uma linguagem universal. Que não interessa a sua religião, não interessa sua cultura, não interessa a sua educação, se a expressão for sincera, ela vai cumprir o papel da comunicação que você tá trazendo essa essência para os outros. Então de tá pintando naquele tamanho que foi mais ou menos o quê? Uns 25metros por 15metros, que tinha parede. (...) isso a localização do mural por ele ser perto da linha de trem do metrô, que são duas linhas paralelas, e por ele ter um recuo, uma visualização muito boa que até de dentro do trem dá para você ver, me trouxe um impacto muito grande de eu tá aqui no Brasil e alguém me mandar uma mensagem: “cara eu tô aqui na Holanda dentro de um trem e eu passei ali e da janela eu vi um trabalho seu gigante cara” Tipo, muito louco isso: você do outro lado do mundo uma pessoa se identificar ali porque um pedaço meu que eu deixei ali... então é um impacto muito grande, assim, não só pelo tamanho, como pela localização, como pelo contexto do ambiente, esse trabalho foi marcante.(Highraff, entrevista, 10/09/2015)

A abstração na arte urbana está cada vez mais presente, e faz um grande uso das cores para fazer a cidade vibrar. Um exemplo disso, além do já mencionado mural de Highraff na Holanda, é o trabalho do artista Zezão. Ele usou a referência das manchas encontradas em fotos queimadas, que saíram

Imagem130: mural relatado de Highraff em Amsterdã.

com deformação ao serem reveladas e transcreveu esse efeito nas ruas com cores vivas.

A pintura se torna um fragmento real do espaço. Ao invés de reproduzir uma atmosfera em um espaço virtual, abre-se a possibilidade de se criar um ambiente a partir da superfície da tela. Esta experiência, ao invés de empregar da perspectiva linear, recorre a cor para produzir uma nova forma espacial. O Atelier Vermelho de Matisse de 1911, por exemplo, “foi um marco na libertação moderna da cor, alcançava-se ali pela primeira vez a dimensão planar mediante a força de estruturação da cor. O espaço transformava-se em pulsação, inconstância, no mesmo lance adquiria uma nova potência lógica, deixava de ser um a priori, ponto pacífico, para emergir vivo e descontínuo, na vibração da luz. (GIANNOTTI, 2010)

Existe muito autodidatismo na experimentação de combinação de cores na pintura urbana, e o resultado de toda essa experimentação faz esse enorme contraste com o predominante cinza da cidade.

Imagem131: Artista urbano Zezão, conhecido por seus trabalhos abstratos.

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