• Nenhum resultado encontrado

A inserção do Maranhão no processo de modernização da agricultura

TOTAL 1.227 Fonte: INCRA/DFQ, 2012.

3 AS COMUNIDADES REMANESCENTES DE QUILOMBOS NO CONTEXTO DA MODERNIZAÇÃO AGRÍCOLA

3.1 A inserção do Maranhão no processo de modernização da agricultura

Compreender o processo de inserção do estado do Maranhão no contexto de modernização da agricultura, e ao mercado nacional, é de suma importância para o entendimento de como o desenvolvimento da economia, ancorada às mudanças do capitalismo brasileiro, a partir dos anos de 1970, foi fundamental para retração da agricultura familiar e das práticas extrativistas.

Desse modo, concordamos com Silva (2006) quando fala que, com o advento da modernização da agricultura, o Maranhão adota um modelo de desenvolvimento agrícola que não privilegia a produção de alimentos, pois não possui uma política agrária definida, e ainda, com políticas de incentivo fiscal, fomenta a concentração da terra no estado.

No caso específico do Maranhão, com a mudança no padrão de acumulação, e em especial, entre os anos de 1970 e 1985, o seu processo de incorporação ao mercado nacional, deu-se a partir de gordos subsídios por parte do governo às grandes empresas comerciais e agropecuárias com objetivo de modernizá-las tecnologicamente, bem como gerarem demanda de insumos ao pólo dinâmico do capitalismo brasileiro. A principal meta dos órgãos governamentais – SUDAM E SUDENE –, para o caso maranhense, pautava-se no aceleramento da absorção de grandes áreas devolutas de terras por grandes empresas agropecuárias (MESQUITA, 2008, p. 9)

Nesse sentido, o desenvolvimento da economia no Maranhão é contextualizada a partir de projetos urbanos-industriais no processamento intermediário de minério vinculado a grandes projetos do extinto Programa Grande Carajás (PGC) e, para produção de matérias-primas em grandes metalúrgicas, onde o destino da produção são os mercados europeu e asiático. Também, alguns empreendimentos estão localizados na zona rural, ligados aos grandes projetos agropecuários que foram subsidiados pela farta disposição de crédito rural (SILVA 2006; MESQUITA, 2008).

Observa-se, nesse processo de desenvolvimento, uma via de mão dupla: de um lado temos a geração de emprego e renda para determinada camada populacional, e de outro, a crescente devastação da vegetação, degradação dos ecossistemas e a desarticulação de produção das populações atingidas, que, na sua

grande maioria, são as comunidades tradicionais. Em conjunto, esses empreendimentos representam a expansão da atividade econômica sob a forma de movimento oscilatório, no território maranhense, com as consequentes modificações nocivas das condições necessárias para um desenvolvimento de qualidade.

Assim, a característica nítida desse processo é a incorporação pontual e seletiva de insumos modernos no setor agropecuário, pois a política de incentivos fiscais era direcionada para as grandes empresas e latifúndios subsidiados, onde a preocupação principal era produzir para o centro dinâmico do capital, e não a expansão do mercado local. Compreende-se que a expansão das atividades numa economia dependerá da disposição do capital e das expectativas de lucros, e ainda, da robustez e tipo de mercado predominante.

A partir da década de 70, o Maranhão secundariza as culturas agrícolas tradicionais e de subsistência, pois prioriza as culturas agrícolas comerciais quando dá condições favoráveis à vinda de capitais estrangeiros e de grandes empresas do centro-sul do país. Desse modo, precariza a situação dos agricultores familiares na produção de alimentos, como também, os colocam como mão de obra temporária para atendimento das demandas sazonais das grandes fazendas instaladas nos municípios maranhenses (SILVA, 2006).

Nesse sentido, Silva (2006) citando Arcangeli (1987), aponta a terra como elemento de especulação capitalista no contexto fundiário maranhense, fomentado pela intervenção estatal, através de órgãos como a SUDENE e SUDAM, na qual irão trazer a desarticulação da produção agrícola mercantil de base familiar, tradicional responsável pelo abastecimento alimentar do Nordeste. Assim, “os desdobramentos que, atualmente, são observados no âmbito da produção de alimentos, da estrutura fundiária, dos conflitos agrários, das aglomerações populacionais nas margens das estradas e, em grande medida, da caótica expansão das periferias urbanas” (p.92), são explicados por este viés, ou seja, a dinâmica agrária do estado a partir da década de 70.

A década de 90 foi marcada pelo avanço da fronteira da agricultura extensiva, a qual provocou a emigração de enormes massas populacionais para o Maranhão, que resultou em um dos estados brasileiros com maior concentração fundiária, por um lado, e maior proporção de trabalhadores autônomos e empregados não remunerados, por outro. Essas duas categorias de trabalhadores representavam

75,4% dos trabalhadores do meio rural contra apenas 59,5% para média do Brasil (SILVA, 2008, p. 25).

De um modo geral, pode-se destacar que a inserção do Maranhão, em particular, e dos demais estados da Amazônia Legal no processo de acumulação do capital em escala planetária, desde o seu início no período colonial, acentuando-se no século XIX e reafirmando-se no presente momento, caracteriza-se pelo fornecimento de matérias-primas ao mercado internacional (SILVA, 2006, p. 91).

A política fundiária inicia uma ação de reforma agrária liderada pelo INCRA e pelo Instituto de Colonização e Terras do Estado do Maranhão (ITERMA), a fim de consertar a situação causada pelas condições em que se encontrava. Como resultado, o Maranhão possui o maior conjunto de assentamentos do Brasil. Esse número expressivo de áreas de assentamento é resultante de grandes mobilizações de trabalhadores sem-terra que promoveram várias ocupações envolvendo famílias agrícolas.

Apesar do acentuado crescimento econômico observado, no Estado, nos últimos anos, por taxas de crescimento do PIB e da renda per capita, com uma variação real acumulada do PIB, no período de 2002 a 2009, de 43% acima dos 32,8% do Nordeste e 27,4% do Brasil (IMESC, 2010), o Maranhão ocupa a pior posição no ranking brasileiro do Índice do Desenvolvimento Humano Municipal. Isso, sem dúvida, significa avanços, porém os níveis da desigualdade social e da pobreza se sobressaem.

É nessa realidade que o Maranhão se encontra: com 36,9% (2.427.640) dos 6,5 milhões do total da população vivendo em áreas rurais, sendo o estado que detém o maior percentual no país (BRASIL, 2010). Destes, 42,1% a renda não passa de um salário mínimo mensal. Este é o fator preponderante que gera a pobreza rural, e como consequências a má qualidade de vida, saúde e alimentação, o que contradiz as prerrogativas dos direitos humanos e da Organização das Nações Unidas para Agricultura e Alimentação (FAO), que pressupõe o direito de alimentação de qualidade e quantidade suficiente para a sustentabilidade.

De fato, a inserção do Maranhão no processo de modernização agrícola não colhe frutos positivos. Nesse sentido, Silva (2006, p. 184) conclui:

No Maranhão, em particular, não se efetivou plenamente o processo de modernização da agricultura verificado em alguns estados do país. A partir do início da década de 1970, entretanto, esse estado passou, de forma deliberada, a perseguir um modelo de desenvolvimento rural baseado no incentivo à grande propriedade rural, renunciando, dessa forma, a oportunidade de se consolidar a produção de alimentos para abastecimento do mercado interno e de se ampliar a geração de emprego no campo, por meio do fortalecimento da agricultura familiar.

Em síntese, fica claro que a política agrária implementada no Maranhão, no processo de modernização da agricultura, distancia-se do restante do país, ou melhor, não se pode falar em modernização. Temos é a renúncia do estado na produção de alimentos, e, como consequência, o enfraquecimento da agricultura familiar e/ou tradicional, pois não caminha para produzir um mercado interno forte. Também, uma concentração fundiária geradora de conflitos agrários que torna precárias as condições de vida das comunidades rurais. Enfim, vejamos mais pontualmente essas implicações na agricultura tradicional quilombola.