• Nenhum resultado encontrado

A música da Banda 12 de Dezembro no contexto sociocultural de Cabedelo

Cabedelo é uma cidade portuária localizada a 15 km de João Pessoa, fundada no final do século XVI. Alcançou sua derradeira emancipação política em 12 de Dezembro de 1956 e conta atualmente com uma população estimada em 42.832 habitantes, segundo o censo de 2000. Muitos habitantes vivem da pesca, e durante o verão, a cidade recebe um número considerável de turistas, pois sua costa, de aproximadamente 15 km, é formada por belas praias. Durante o período colonial a cidade de Cabedelo era composta predominantemente de índios e portugueses. Sua economia era baseada na pesca e no cultivo do coco. É importante ressaltar que no período colonial, as primeiras bandas do nordeste pertenciam a fazendeiros que, em larga escala, cultivavam a cana-de-açucar e que mantinham escravos para mão-de- obra, mas que também usavam os negros para entretê-los, entre outras formas, tocando em suas bandas particulares. Por ser uma cidade que não se voltou ao cultivo da cana, prática exercida com a mão-de-obra escrava, a cidade de Cabadelo não tinha uma concentração e circulação significativa de negros. Esses começaram a surgir no final do século XIX, após a abolição da escravatura, com a construção do porto e o crescimento da cidade. Discordo de Pimentel (2002) quando o autor afirma que foi com a fusão cultural das três etnias, indígena, portuguesa e africana, que surgiram as primeiras manifestações populares em Cabedelo, pois a cultura popular emerge de fusões complexas que não podem ser restritas a especificações lineares de raça e etnia.

Até um passado não muito remoto, a cidade de Cabedelo cultivou com fervor muitas manifestações populares, como a festa de São Sebastião, Quadrilhas Juninas, a festa de Santa Catarina, Cocos de roda, blocos de frevo, Cirandas e Naus Catarinetas, entre outras. Muitas dessas expressões, no entanto, vêm desaparecendo da cena cultural da cidade nas últimas décadas. Algumas se situam apenas na lembrança de antigos moradores. Outras se mantêm

com menos “brilho” do que no passado. As transformações políticas, econômicas e culturais, aliadas as inovações tecnológicas dos meios de comunicação de massa, são, para muitos, os principais responsáveis pelas mudanças culturais não só em Cabedelo como em muitas outras cidades brasileiras, fazendo com que tradições seculares caiam no esquecimento da população. A festa de Santa Catarina, por exemplo, mobilizava a cidade de Cabedelo por vários dias, com programações culturais diversas, além da tradicional procissão. Hoje em dia, tendo em vista a dinâmica cultural que vive a cidade, praticamente não há festividades com esse poder de mobilização.

Para melhor compreendermos o movimento de bandas em Cabedelo e no estado da Paraíba, vamos analisar as informações disponibilizadas pela FUNARTE, instituição que desenvolve projetos para atender bandas de música no Brasil, e que mantêm um cadastro das bandas atuantes nos estados brasileiros. Segundo a FUNARTE, a Paraíba tem 102 bandas cadastradas, distribuídas por 87 municípios. Das 28 bandas que informaram sua data de fundação, a mais antiga é a banda de música Duarte Machado, de Santa Luzia, fundada em 1874, a única com mais de cem anos de atividade. Aproximadamente 67,8 % delas têm menos de cinqüenta anos de fundação, e em torno de 35,7 % foi fundada durante a década de 1990, entre elas a Banda 12 de Dezembro. Muitas bandas funcionam sem serem cadastradas na FUNARTE e a grande maioria cadastrada não informou sua data de fundação, mas esses dados nos dão uma estimativa da realidade. Tendo a Paraíba 223 municípios, fonte IBGE/2002, constatamos que mais da metade dos municípios paraibanos (60,9 %), segundo os dados da FUNARTE, possivelmente não possuem uma banda de música.

As poucas informações alcançadas a respeito da tradição da banda de música em Cabedelo em épocas passadas não me permitem fazer nem sequer um breve retrospecto histórico deste conjunto nesta cidade. “Por alto”, fiquei sabendo sobre uma banda particular que existiu em Cabedelo por volta de cinqüenta anos atrás. Quando seu proprietário partiu de Cabedelo a banda chegou ao fim. As bandas que surgiram posteriormente a ela foram as já mencionadas Banda Municipal de Cabedelo e Banda 12 de Dezembro. Desconsidero nesta contabilidade as fanfarras, que funcionam em escolas, pois, muito embora elas contribuam para a dinâmica das bandas nas cidades, trata-se de um outro universo musical, com outra formação e propostas artísticas próprias, que não se situa nos limites da presente investigação. Pelo exposto dos dados da FUNARTE, são poucos os municípios paraibanos onde a banda de música é uma tradição arraigada. Cerca de 35,7 % das bandas hoje atuantes na Paraíba têm menos de vinte anos de atividade. Na opinião de Jorge,

Quando a gente encontra uma cidade que dá um tratamento a uma banda de música assim, que a gente tem como um bom tratamento, é porque aquela cidade realmente tem a tradição, em alguns casos de mais de cem anos, de

banda de música [...] que não era (é) o caso de Cabedelo, e é o caso de pouquíssimas cidades, eu diria três ou quatro cidades, no máximo, na Paraíba, que tem a tradição, assim, de mais de cinqüenta anos de banda de música.

Modestamente, a Banda 12 de Dezembro vem criando alguns costumes, associando a banda de música a muitas manifestações civis e religiosas em Cabedelo. Segundo Jorge, a banda tem as apresentações anuais que podem ser consideradas como “tocatas fixas”, ou seja, que todo ano acontecem nas mesmas épocas, e outras eventuais. Salvo motivos de força maior, todo ano a banda toca durante a festa de São Sebastião em janeiro, uma festa bastante tradicional em Cabedelo; acompanha a procissão da Semana Santa tocando hinos religiosos; toca em junho na festa da padroeira da cidade, que é o Sagrado Coração de Jesus; desfila pela cidade tocando marchas, dobrados e hinos cívicos durante as comemorações do dia 7 de setembro (muitas vezes, a pedido de escolas, a banda também toca e marcha com alunos nos dias que antecedem o desfile de 7 de setembro, como uma espécie de prévia ou ensaio para o evento); toca em novembro na festa de Santa Catarina, a maior festa católica da cidade, e por fim, encerra o ano prestando sua homenagem a cidade de Cabedelo e também a si mesma, tocando no dia 12 de dezembro, data que Cabedelo comemora o aniversário de sua emancipação política. Quando é convidada ou, com satisfação, se oferecendo para tocar, a banda se apresenta também em comemorações eventuais, como inaugurações públicas e eventos políticos e culturais, entre outros. Vejamos algumas ocasiões em que a banda se apresentou, nas quais, entre outras, tive a oportunidade de acompanhar: