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2.3 Transporte do Ferro-Gusa

2.3.2 A Malha Ferroviária e a Dinâmica Operacional

A malha ferroviária de uma usina siderúrgica tem como função principal prover o transporte do ferro gusa. Ela é composta por diversos componentes. A Figura 6 mostra uma malha simplificada de uma usina siderúrgica considerando uma planta de alto forno com quatro furos de gusa e uma planta de aciaria com dois poços de recebimento. Os pontos destacados com a tag BF representam as linhas de recebimento de gusa sob os furos do alto forno. Os pontos com a tag SM são as linhas de descarga de ferro gusa da aciaria.

Figura 6 – Malha ferroviária simplificada de uma usina siderúrgica

Fonte: Autoria própria (2019).

A malha ferroviária é dividida em segmentos que recebem o nome de trecho e são representados pelos retângulos pretos. Os polígonos em formato de “Y” ou em forma de tesoura (detalhes 1 e 2 destacados na Figura 19, respectivamente) representam as chaves de mudança de via e são responsáveis por permitir que um veículo se desloque de um trecho para outro paralelo. Cada trecho possui sensores de linha que detectam a presença de um veículo quando ocupado. A sinalização da malha é feita através de semáforos, representados pelos círculos

29 amarelos. Estes têm a função de indicar ao maquinista se determinado trecho está liberado ou não para que a locomotiva possa seguir.

Em um ambiente automatizado, pode-se ter tanto os comandos dos semáforos e das máquinas de mudança de via quanto os sinais de ocupação de trechos ligados a um equipamento de intertravamento eletrônico (EIE – Electronic Interlocking Equipment), um tipo de Controlador Lógico Programável (CLP) destinado ao controle e gerenciamento da malha ferroviária. No EIE são programadas todas as lógicas de intertravamento de segurança para o controle de tráfego, onde, por exemplo, um semáforo só dará condição para uma locomotiva seguir para o trecho seguinte caso ele esteja desocupado.

Fazendo a interface com o operador, existe uma HMI (Human Machine Interface), ou seja, um sistema de supervisão em que o operador consegue acompanhar a movimentação e localização dos veículos sobre a ferrovia, além de comandar os equipamentos de sinalização. Devido ao ambiente agressivo (altas temperaturas) e ao alto custo de equipamentos para a identificação das locomotivas e torpedos de forma automática, como sensores RFID (Radio-

Frequency IDentification) por exemplo, na grande maioria dos sistemas encontrados

atualmente, os sensores de trecho geram apenas a informação de ocupação ou não do segmento. Portanto uma lógica de rastreamento e consolidação de dados precisa ser criada separadamente. Em alguns sistemas são utilizados um servidor e um sistema de banco de dados para este processamento.

Considerando uma usina siderúrgica dotada de um sistema de rastreamento de veículos e sinalização automatizada, pode-se descrever o processo de transporte e distribuição de gusa da seguinte forma:

1. O sistema do alto forno ou o da aciaria envia o planejamento da próxima corrida para o sistema de supervisão da equipe de distribuição de gusa;

2. O operador da sala de controle de distribuição identifica a quantidade e quais carros torpedo devem ser levados ao alto forno e/ou aciaria para atendimento da demanda;

3. O operador então localiza uma ou mais locomotivas na via para realizar a movimentação do carro torpedo e envia a ordem de movimentação ao maquinista;

4. O operador define o melhor trajeto do ponto de origem ao ponto de destino e realiza a abertura dos semáforos e operação das chaves de mudança de via para dar condição aos veículos de se locomoverem.

A partir do recebimento da requisição de movimentação (item 1) o operador precisa selecionar quais os carros torpedo devem ser levados ao alto forno ou aciaria. Essa decisão

30 descrita no passo 2 é um tanto complexa pois depende de diversas variáveis e deve levar em consideração se o carro torpedo destina-se ao alto forno ou à aciaria.

Uma das estratégias adotadas para a tomada de decisão de escolha do torpedo para o atendimento ao alto forno relaciona-se à perda de calor para o canal de corrida que, como mencionado na seção anterior, é desejável que o carro torpedo ao receber a primeira carga de gusa de uma corrida tenha a maior temperatura possível. Após a carga do primeiro torpedo, tem-se uma redução considerável desta perda, pois o canal de gusa se encontra em uma temperatura próxima a do metal líquido. Portanto, é desejável que os próximos torpedos sejam priorizados pela menor temperatura, mas que tenham condição de chegar com uma temperatura aceitável na aciaria levando em conta os tempos estimados no ciclo do torpedo da Figura 4. Isso é importante pois a temperatura mínima para carregamento do torpedo deve ser respeitada para prevenir danos ao material refratário. Caso a temperatura do torpedo esteja abaixo do limite mínimo, este deverá ser direcionado para aquecimento em um aquecedor, o que gera gastos relacionados à indisponibilidade do veículo e à energia gasta para aquecimento. Além disso, uma vez carregado, o gusa deve ser entregue à aciaria respeitando uma margem mínima de temperatura para tratamento. Caso esse limite não seja atendido, o gusa deverá ser basculado no pátio de emergência, de forma que o ferro líquido é transformado em sucata metálica. Essa sucata poderá ser carregada posteriormente no convertedor, porém tem um preço muito mais alto que a sucata convencional.

Para a aciaria, quanto maior a temperatura de entrega de gusa, melhor. Entretanto, quando o saldo de gusa é alto (situações em que há vários torpedos já carregados), priorizar a entrega pela temperatura mais alta irá ocasionar perda acentuada de calor de alguns torpedos e, consequentemente, este ferro gusa será transformado em sucata. Dessa forma, uma estratégia também adotada é a priorização dos carros com temperatura mais baixa, a fim de diminuir a chance de perda de torpedo por temperatura baixa.

A distância e a localização dos veículos na malha ferroviária devem ser levadas em conta para ambos os casos. Outro fator que também influencia diretamente na qualidade da entrega de ferro gusa é a quantidade de torpedos ativos no ciclo. Sabe-se que quanto menor a quantidade de torpedos no ciclo, maior a taxa de utilização deles, portanto menos perda de energia térmica ocorre, pois eles passam mais tempo carregados e menos tempo vazios. Entretanto quanto menor a quantidade de veículos no ciclo, mais eficiente deve ser o gerenciamento dos torpedos e locomotivas, pois qualquer falha operacional, ou em um dos processos (alto forno ou aciaria), causa impacto quase imediato no outro.

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